Conjuntura Macro / Renda Fixa

CARTA DE CONJUNTURA TRIMESTRAL – 3T24 - No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do terceiro trimestre do ano de… Continue reading →
Carta de Conjuntura Trimestral – 2T24 - No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do segundo trimestre do ano de… Continue reading →
Carta de Conjuntura Trimestral – 1T24 - No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do primeiro trimestre do ano de… Continue reading →
Curva de Juros: Estimação, Modelos e Métodos de Otimização - A Estrutura a Termo da Taxa de Juros (ETTJ), também conhecida como Curva de Juros, expressa uma relação temporal entre… Continue reading →
Relatório Macro – Terceiro Trimestre - No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do terceiro trimestre do ano de… Continue reading →
Carta de Conjuntura Macro – Junho - O avanço da atividade econômica, a decisão de aumento de juros pelo Copom e a desaceleração da inflação ganham destaque… Continue reading →
Carta de Conjuntura Macro – Maio - A melhora nos resultados domésticos relativos à atividade econômica, com destaque para o mercado de trabalho, e a piora do… Continue reading →
Carta de Conjuntura Macro – Abril - A melhora nos resultados domésticos relativos à atividade econômica, a persistência inflacionária e o aumento das incertezas globais, com a… Continue reading →
Carta de Conjutura Macro – Março - Introdução O mês de março foi marcado, principalmente, pelas consequências inflacionárias causadas pelo conflito entre Rússia e Ucrânia, com destaque… Continue reading →
Carta de Conjuntura Macro – Fevereiro - O mês de fevereiro ficou marcado pelo início do conflito no Leste Europeu, com a invasão russa à Ucrânia, culminando… Continue reading →
A relação entre inflação, juros e câmbio.

A relação entre inflação, juros e câmbio.

Introdução

As transações entre países estão cada vez mais rápidas e tenderão a evoluir conforme a globalização e a expansão da tecnologia. A necessidade de importar bens de outros países, realizar viagens internacionais ou até mesmo investir no exterior está presente na rotina de várias pessoas, junto com a dúvida de qual é o valor da sua moeda em relação ao do outro país. Com intuito de prover os primeiros passos para aqueles que desejam conhecer os fundamentos do mercado cambial, este artigo abordará como o preço dos bens e do dinheiro afetam a taxa de câmbio. Vale lembrar que existem diversas óticas para observar o mercado de câmbio a longo prazo, como a análise das transações internacionais através do balanço de pagamentos, dos efeitos da política fiscal e monetária no modelo de Mundell-Fleming conforme o regime cambial e também através da construção de portfólios, mas compreender a paridade do poder de compra e a paridade de juros é um bom começo.

A taxa de câmbio é um indicador macroeconômico que evidencia o elo econômico entre os países e representa um dos mercados mais voláteis do mundo, com baixos custos de transação, alta liquidez e velocidade de negociação. A pesquisa feita pelo Banco de Compensações Internacionais (BIS) em 2016 aponta que a captação média diária no mercado cambial foi de US$ 5,1 trilhões, sendo que os pares negociados euro-dólar e dólar-yene corresponderam a 41% de todo o mercado cambial negociado nesse ano. Por ser um ativo extremamente volátil, o dólar é considerado um instrumento de hedge pelos investidores brasileiros principalmente por ter, na maioria das vezes, correlação negativa com a bolsa brasileira. Ao atuar no mercado cambial com intuito de especular moedas e gerar lucros, é importante saber que a moeda adquirida não se multiplica pela mesma unidade monetária aplicada na transação, o investimento não gerará fluxos provenientes da aplicação. É possível lucrar através das oscilações, mas diferentemente das ações, que geram valor à uma empresa, ou uma debênture cujo investimento agregará em capital, ao comprar esse ativo de hedge o retorno estará sujeito apenas à paridade de valor com a moeda negociada bilateralmente.

Define-se taxa de câmbio como o preço de uma moeda em relação a outra. Quando se diz que o câmbio dólar real é de US$/R$ 5,00, isso significa que é necessário R$ 5,00 para comprar US$1,00 e alcunha-se a cotação em termo direto, isto é, quando a unidade monetária estrangeira é expressa em relação à unidade monetária nacional. Como a taxa de câmbio é a relação de troca entre duas moedas diferentes, ela é definida a partir da oferta de divisas -provenientes dos exportadores, entrada de turistas e capital externo e dos demais agentes que trocam dólares por reais – em comparação com a demanda por divisas entregue pelos importadores, pela saída de turistas e capitais externos e de outros agentes que trocam reais por dólares. A oscilação da cotação do câmbio pode ocorrer de duas formas: Quando há uma maior oferta de divisas, significa que tem mais moeda internacional em circulação do que moeda nacional e a taxa de câmbio é reduzida, esse fenômeno é chamado de valorização cambial. Caso aumente a demanda por divisas, a cotação do câmbio aumenta e ocorre a desvalorização na taxa de câmbio.

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Paridade de poder de Compra

A paridade de poder de compra (PPC), ou lei do preço único, tem o conceito de que em um mundo ausente de barreiras ao livre comércio entre países o preço de um mesmo bem deverá ser o mesmo em qualquer lugar ao mesmo tempo. Proveniente disso, a taxa de câmbio oscilará em torno de um valor de equilíbrio a longo prazo para garantir a igualdade dos preços dos bens em diferentes moedas. As principais hipóteses para PPC ser válida são:

  1. Não há barreiras comerciais ou arbitragem entre os bens
  2. Não há custo de transações entre os países
  3. Os bens negociados entre os países são perfeitamente homogêneos

Ou seja, como a taxa de câmbio é o preço que equilibra as ofertas e demandas por moeda estrangeira no mercado de câmbio, a paridade de poder de compra é uma forma de garantir que os negociantes não pratiquem arbitragem de moedas entre os países. Define-se arbitragem o processo de comprar um ativo por um preço mais barato e vendê-lo mais caro em outro mercado, o mecanismo funciona da seguinte forma: Considere que a taxa de câmbio entre dólar e euro seja de US$/€ 1,10 em Nova York e em Londres a taxa de câmbio seja US$/€ 1,20. O investidor poderá converter US$ 1,1 milhão para euros em Nova York e receberá € 1 milhão conforme a taxa de câmbio local, em seguida ele converterá todo o euro recebido para dólar vendendo-o no mercado de câmbio em Londres, recebendo US$ 1,2 milhão graças à taxa de câmbio local e auferirá um lucro de US$ 100 mil apenas arbitrando entre duas moedas. Essa é uma estratégia que investidores exploram sempre que possível pelo simples fato de que pessoas preferem mais dinheiro ao invés de menos e, apesar do exemplo considerar o mercado de moedas, a arbitragem poderá ser explorada para qualquer ativo quando a hipótese do preço único de que dois fluxos de caixa idênticos devem ter o mesmo preço for quebrada. Ao abrir essa janela de oportunidade, o investidor fará um short selling e auferirá lucro positivo com risco zero.

Ao lidar com o mercado cambial de dois países nem sempre será possível arbitrar, o mais provável será explorar a desvalorização relativa condicionada quando a taxa de câmbio não estiver em seu equilíbrio de longo prazo conforme a PPC. Aqui vale o exemplo de um comprador que deseja adquirir uma moto negociada tanto na Alemanha quanto na República Tchéquia, dado a hipótese de que a moto é um produto homogêneo entre os países e equivale a cesta de bens definitiva para PPC ser válida. O consumidor observa que a taxa de câmbio entre os países está em Kč/€ 20, verifica os preços e percebe que a moto vale € 10.000 na Alemanha e Kč 100.000 na República Tchéquia, então a taxa de câmbio de equilíbrio entre o euro e a coroa tchéquia será de €/Kč 10. As hipóteses implicam que a coroa tchéquia está significativamente desvalorizada em relação à PPC e deve-se apreciar ao passar do tempo, permitindo ao comprador em euro adquirir o produto na República Tcheca por um preço menor. Essa vantagem comercial será inibida quando todos os consumidores perceberem que a moeda tchéquia está mais barata que o euro, aumentando a demanda por bens desse país através de uma maior oferta de euro, levando a apreciação da moeda local até o nível de equilíbrio de longo prazo. Ao abstrair esse exemplo numa situação onde o preço dos bens oscila dentro do próprio país, o consumidor considerará a taxa de câmbio real para tomar decisão por desejar descontar os efeitos inflacionários, esse comportamento trará uma relação intrínseca entre paridade de poder de compra e taxa de câmbio real. Se a PPC é válida no longo prazo, então a taxa de câmbio real será constante pelo fato da PPC garantir o diferencial de preços entre os países com os ajustes devidos da taxa de câmbio nominal e, salvo os impactos econômicos proveniente desses ajustes no curto prazo, a taxa de câmbio real sempre tenderá a sua média histórica enquanto a PPC for válida. Quando a taxa de câmbio real é constante, a competitividade dos preços dos bens transacionados entre os países é mantida pelo seguinte mecanismo: Quando um país sofre um aumento inflacionário, os bens negociáveis tornam-se menos competitivos por apresentarem preços maiores e, ao invés de tomar a depreciação da taxa de câmbio nominal para “contrabalancear” o efeito, a taxa de câmbio real deixa de apreciar (através do aumento inflacionário) por manter-se constante ao longo do tempo. Vale esclarecer o argumento pelo fato de que se ganha competitividade não através de uma desvalorização nominal do câmbio, mas através da desvalorização real da taxa de câmbio.

Nas condições práticas, o investidor deve reconhecer que outros fatores influenciam na taxa de câmbio e que as premissas da PPC são frágeis. É de amplo conhecimento que não existe livre negociação entre os países, a exemplo da guerra comercial entre Estados Unidos e China, assim como os mecanismos de ajustamento da taxa de câmbio não são necessariamente imediatos por conta de que não apenas os bens – cujos preços não são necessariamente flexíveis – afetam na oferta e demanda por câmbio, mas também os ativos financeiros transacionados entre os países, sem contar que a heterogeneidade dos bens fará com que a cesta de bens analisada entre os dois países seja inconsistente para determinar a verdadeira PPC. Essas condicionantes devem ser consideradas no curto prazo, mas a longo prazo a PPC é uma boa ferramenta para determinar a taxa de câmbio de equilíbrio. O método de PPC mais conhecido entre os analistas é o Big Mac Index desenvolvido pela revista The Economist, .

Mecanismo de transmissão e a Paridade de Juros.

A Teoria Quantitativa da Moeda afirma que os preços de uma determinada economia estarão relacionados com a quantidade de moedas em circulação. Através desse pilar da teoria clássica pode-se assumir que a política monetária – determinada pelo Banco Central – translada efeitos entre oferta monetária e preços e, conforme observado anteriormente, os preços dos bens em um país influenciarão na PPC e em sua respectiva taxa de câmbio de longo prazo, ou seja, a política monetária fornece um mecanismo de transmissão que impacta taxa de câmbio através dos preços. Ao determinar o quanto de moeda deseja distribuir na economia, a autoridade monetária irá precificá-la ao equilibrar a oferta à demanda exigida. Ao depararem-se com a taxa de juros definida do seu país em relação ao mundo num cenário de livre mobilidade de capitais, as pessoas escolhem entre manter parte do dinheiro em mãos ou aplicá-los em títulos de investimento proporcionais às taxas de juros. Isto é, as pessoas sempre comparam quais as taxas de juros mais atrativas para elas e aplicam seu dinheiro onde for mais rentável, dado o quanto ela é propensa ao risco, e optam por manterem em mãos parte do dinheiro que pretendem usufruir para consumirem bens e serviços. Caso o investidor enxergue uma taxa de juros mais atrativa no exterior, ele oferecerá sua moeda em troca da estrangeira e irá adquirir o título de investimento estrangeiro que lhe for conveniente, desvalorizando a moeda onde reside. Por esses fatores, a política monetária também é um mecanismo de transmissão que impacta taxa de câmbio através da taxa de juros. Na prática, esse mecanismo de transmissão não é instantâneo e esse atraso afetará na tomada de decisão de um investidor.

Resumindo, o preço dos bens define a taxa de câmbio e parte da condição de equilíbrio é dada pela paridade de poder de compra, assim como a taxa de juros também afeta taxa de câmbio. Antes de descrever qual a condição de equilíbrio da taxa de câmbio pela ótica monetária, entenda o raciocínio dos investidores: Se o investimento no exterior depende da taxa de câmbio e da taxa de juros externa e o investimento interno apenas da taxa de juros interna, como definir qual terá o maior retorno? Simplificando a questão, considere um investidor nos Estados Unidos que compara entre investir no seu país ou investir na Europa, se ele usar dólares para comprar um depósito em euro, quantos dólares receberá após um ano? Ele observa as seguintes condições de mercado:

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Considerando que a expectativa da taxa de câmbio esteja correta, o investidor seguirá os seguintes passos: Primeiro, ele converterá US$ 1,10 em euro e terá € 1,00. Sabendo que o título europeu renderá 5% ao ano, então no final do período obterá € 1,05. Como o investidor aguarda uma desvalorização, então ele converterá esse euro em dólar cujo resultado será a multiplicação da expectativa do câmbio com a rentabilidade obtida (€ 1,05 vezes US$/€ 1,20 = US$ 1,26). Ao final dessa operação, o retorno do investimento foi de 14,54% ao ano e será mais vantajoso investir na Europa do que nos Estados Unidos, pois mesmo a taxa de juros exterior sendo menor ela é compensada por uma desvalorização significativa da taxa de câmbio.

Os incentivos para se investir no exterior é que os depósitos externos tenham retornos esperados maiores com base nas expectativas de desvalorização cambial e taxa de juros, mas existe uma condição que acalma os ânimos dos mercados e impõe indiferença entre os investimentos dos países e iguala. Essa neutralização ocorre quando o mercado de câmbio está em equilíbrio, isto é, os depósitos em todas as moedas oferecem a mesma taxa de retorno esperada. A condição de paridade de juros implica que os detentores potenciais de depósitos em moeda estrangeira consideram esses depósitos como ativos igualmente atraentes e, nesse ponto, não há excessos de oferta e de demanda, os depósitos ficam equilibrados e todas as taxas de retorno esperada são iguais. Em termos gerais, a paridade de juros – Interest Rate Parity – assume que a variação da taxa de juros é igual à taxa de câmbio futura em função do prêmio ou desconto ao investir no estrangeiro, implicando que o câmbio futuro – termo referente quando a liquidação do contrato se dá em dois dias ou mais – entre duas moedas deve se igualar ao diferencial de juros conforme o prêmio ou desconto do país. Como os contratos futuros são instrumentos sujeitos às condições de oferta e demanda do mercado, o prêmio ou desconto podem oscilar da sua condição de equilíbrio e oferecem uma janela de arbitragem nessa ocasião.

No cenário de ruptura da paridade de juros, pode-se aplicar a estratégia de carry trade ilustrada no seguinte exemplo: Suponha que títulos brasileiros tenham maiores rendimentos que os títulos chilenos por conta do desequilíbrio entre o diferencial de juros e taxa de câmbio, isso implica que os chilenos irão se endividar em moeda local (pois eles apresentam taxas de juros menores) e demandarão títulos brasileiros, nessa operação a rentabilidade deles oferecerá margem suficiente para pagar os empréstimos tomados e e ainda obter lucros positivos. Enquanto essa janela estiver aberta, os chilenos continuarão a realizar essa operação e os preços dos títulos brasileiros se elevará ao ponto de reduzir o diferencial de juros ao nível de equilíbrio, exaurindo a oportunidade ao voltar à paridade de juros. Na realidade, essa estratégia é complexa de ser aplicada e requer uma compreensão minuciosa de como calcular o prêmio de risco na curva de juros. Através desses insights, podemos entender como a paridade de juros e a paridade de poder de compra se relacionam.

Considerações sobre a Paridade de Juros e Paridade de Poder de Compra

Descrevemos que a paridade de juros relaciona o preço da moeda com a taxa de câmbio e que a paridade de poder de compra estabelece a relação entre o preço dos bens com a taxa de câmbio, essas condições clássicas de paridade permitem a expansão de teorias entorno dos mercados de bens, monetário e cambial. Uma dessas combinações é a famosa extensão do efeito Fisher: a variação entre taxas de juros no modelo nacional é igual à variação da inflação e, no modelo internacional, a variação entre taxa de juros é igual a variação da expectativa da taxa de câmbio. As relações impostas pelo efeito Fisher permitem as projeções da taxa de câmbio e inflação dada a taxa de juros caso as paridades clássicas sejam válidas.

Cumby e Obstefeld (1982) afirmam que o mercado de bens e de ativos são cruciais para a determinação da taxa de câmbio, sendo necessário um estado de equilíbrio entre os dois mercados para que haja a determinação do terceiro, dado que a paridade do poder de compra determina a relação entre nível de preços e taxa de câmbio e a paridade de juros mantém a taxa de câmbio futura conexa à taxa nominal de juros. O pressuposto da pesquisa assume que se ambas as condições clássicas de paridade são verdadeiras no curto prazo, a política monetária não poderá influenciar a taxa de juros real ex ante, isto é, o rendimento real dos ativos não será abalada por qualquer decisão da autoridade monetária. Entretanto, caso uma das relações de paridade venham a falhar por conta de incertezas ou aversão a riscos, a política monetária terá efeitos sobre a taxa de juros real ex ante e poderá haver um desequilíbrio entre a taxa de juros internacional e a do seu próprio país. A pesquisa traz consigo aplicações reais das teorias de paridade e conclui a necessidade de outros métodos para a formulação de uma taxa de câmbio de equilíbrio que correspondam a macroeconomia atual, mas mantém a validade delas em economias pequenas e abertas. Por mais que as paridades clássicas não se adequem de forma perfeita à realidade e necessitem de outras métricas para estimarem a taxa de câmbio, elas são os pilares para a compreensão do mecanismo básico que rege as leis da oferta e demanda no mercado monetário de qualquer país. Essas teorias são utilizadas principalmente para desvendar os rumos da taxa de câmbio a longo prazo, onde os efeitos de seus mecanismos de transmissão são observáveis, e devem ser complementadas conforme o horizonte temporal de quem deseja estimar o preço relativo das moedas.

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Referências:

Rudiger Dornbusch, 1980. “Exchange Rate Risk and the Macroeconomics of Exchange Rate Determination,” NBER Working Papers 0493, National Bureau of Economic Research, Inc.

Rudiger Dornbusch, 1976. “Expectations and Exchange Rate Dynamics,” The Journal of Political Economy, Volume 84, issue 6(Dec.,1976), 1161-1176.

Callum Henderson, 2012. Currency Strategy: The Practitioner’s Guide to Currency Investing, Hedging and Forecasting, 2º edição. John Wiley & Sons Ltd, The Atrium, Southern Gate, Chichester, West Sussex PO19 8SQ, England.

CUMBY, R. E. OBSTFELD, M. (1982). International Interest-Rate and Price-Level Linkages Under Flexible Exchange Rates: A Review of Recent Evidence, NBER Working Papers, n. 0921, National Bureau of Economic Research.

Cristina Terra, 2014. Finanças Internacionais: Macroeconomia Aberta, 1º edição. Elsevier Editora LTDA.

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Carta de Conjuntura Mensal – Maio 2020

Carta de Conjuntura Mensal – Maio 2020

  • Política Nacional

A reforma da previdência era a maior, porém não única, reforma promovida pelo governo eleito em 2018. Após ser aprovada, estavam na fila outras também com grande impacto como as reformas tributária e administrativa, bem como autonomia formal do Banco Central e marcos regulatórios. Com a inesperada pandemia, atividades legislativas se voltaram a medidas urgentes e a economia, que começou o ano com esperanças de retomada, já tem um ano negativo pela frente. Apesar disso, o governo puxado pelo Ministério da Economia continua com uma retórica de que as reformas irão passar em breve e com isso o ambiente para recuperação será facilitado com investimentos privados e externos atraídos, essas mesmas que deveriam alavancar a economia que vinha em tímida recuperação agora são prometidas para tirá-la do buraco.

O que parece ficar alheio ao governo é que reformas desse calibre não são simples decretos presidenciais, requerem a construção de uma ampla base de apoio a um conteúdo que seja consenso entre as alas políticas, o que leva tempo e muita discussão. A experiência das últimas vitórias da agenda reformista tem muito a nos ensinar, voltando ao período de Temer na presidência, podemos ver como um governo com consenso formado conseguiu aprovar com rapidez suas propostas.

A PEC do teto de gastos levou seis meses para ser aprovada e teve quantidade de votos favoráveis quase igual àquelas que aprovaram o processo de impeachment de Dilma, tanto na Câmara quanto no Senado, mostrando o embalo de apoio que o novo governo teve. No mesmo mês que o teto era promulgado, as reformas trabalhista e da previdência foram postas em tramitação, sendo que a primeira foi sancionada após um semestre, prazo semelhante à PEC do teto porém com apoio menor nas casas. É preciso destacar que o apoio a Temer não era simples inércia do impeachment, o MDB é um dos maiores partidos do Brasil, com presença essencial em todos os governos desde a redemocratização. Tal histórico de poder entre períodos tão diversos prova que ele só chegou a esse patamar de destaque com grandes ligações entre os demais partidos e capacidade de encontrar consensos para fazer política, mesmo que seja por troca de favores e vias ilícitas. Quando o MDB chegou à presidência da república, ele tinha todos os ministérios para serem montados ao seu dispor. Um governo cujo projeto político não tinha sido escolhido pelo voto direto e que teve impopularidade recorde pouco teve o que prestar de contas ao povo e as nomeações a altos cargos e secretarias puderam ser feitas conforme acordos com demais partidos em troca de alianças. O grande apoio e momento favorável de ruptura com o modelo petista puderam ser aproveitados para passar os dois grandes projetos, porém investigações revelaram esquemas de corrupção envolvendo os partidos governistas, com o MDB de Eduardo Cunha, Romero Jucá, Geddel Vieira Lima e de Michel Temer, no centro da trama. Cada vez mais capital político era gasto na defesa do presidente e seus aliados ao invés de na aprovação de suas reformas. Com o decreto de intervenção federal no Rio de Janeiro em fevereiro de 2018, legalmente a PEC da reforma da previdência ficou impossibilitada de ser aprovada, até foi cogitado suspender a intervenção para uma rápida tramitação da reforma antes do fim do ano, porém não havia mais o apoio necessário.

O começo de 2019 para Bolsonaro foi harmônico com o legado das reformas de Michel Temer. De ideologia conveniente as do presidente eleito, O Partido Social Liberal (PSL) elegeu a segunda maior bancada na câmara dos deputados – maior que a do MDB no final de 2018 -, mostrou sua ampla influência perante outros partidos com a agenda de reformas estruturantes e obteve o apoio dos presidentes do legislativo. Cumprindo a promessa eleitoral em reduzir os ministérios, Bolsonaro os preencheu com critérios técnicos e nomeou tanto militares da reserva quanto civis aclamados pelo público. A popularidade do novo governo permitiu uma das pautas mais complexas de se instaurar em qualquer democracia: a reforma da previdência, desde o início do milênio os presidentes tentaram angariar votos para reestruturar o item de maior peso no orçamento público. A chamada “lua de mel” foi quase inexistente. No início do mandato a família Bolsonaro e seus aliados entraram em atrito com Rodrigo Maia, peça chave para a aprovação de medidas na câmara, as divergências entre a rígida proposta de Paulo Guedes e a bancada de oposição acirrou debates no congresso e dissipou as convicções dos parlamentares de situação com as exigências do governo, esse cenário distinguiu aqueles que realmente apoiavam o governo dos oportunistas eleitos pela onda popular. Após os desgastes promovido pelos governistas, votações adiadas, concessões feitas na proposta original, liberação de emendas parlamentares e até ruptura no PSL, a reforma da previdência foi promulgada nos últimos meses do ano.

Esse longo histórico ainda tem muitas nuances não descritas, mas é suficiente para vermos que, se no cenário favorável no qual Bolsonaro chegou ao Planalto passar uma grande reforma já foi tão lento e desgastante, num ano com pandemia e crise entre os poderes passar uma segunda é quase impensável. A atual situação se acumula a perda de renda da população, que não ficará restrita a poucos meses, e investigações contra o governo, fatores que ainda podem abalar a popularidade do presidente junto com uma certa sazonalidade do fim de ano, quando as negociações partidárias para as eleições municipais e para presidência da câmara dos deputados tomam o espaço da tramitação de projetos não urgentes.

  • Economia

A queda do PIB no primeiro trimestre de 2020 de 1,3% foi em linha com a expectativa de mercado, desde o segundo trimestre de 2015 não é registrado um resultado tão negativo na produção brasileira. Os setores da indústria e serviços foram abalados pela cisão da cadeia produtiva ocasionada pelo lockdown, apenas o setor agrícola sobressaiu com crescimento de 0,6% por conta do aumento de preços do setor alimentício. Ao analisar a demanda, denota-se resquícios nos processos de reformas estruturantes e de consolidação fiscal anteriores à recessão presentes no aumento de 3,1% em investimentos, mas ao compararmos com a queda de 27,5% do indicador de Formação Bruta de Capital Físico (FBCF) entre abril e maio torna-se evidente a queda no consumo de máquinas e equipamentos durante o agravamento da pandemia, sendo esse resultado confluente com a redução abrupta de 2,0% no consumo das famílias. Mesmo com a flexibilização das restrições sociais e uma reabertura gradual da economia, as expectativas apontam para uma queda ainda mais significativa para o segundo trimestre e recuperação nos próximos trimestres devido a redução do Índice de Confiança do Consumidor e pela característica do setor de serviços de demorar para reestruturar sua capacidade ao nível pré-crise.

A redução do consumo também afetou diretamente os preços. Desde agosto de 1998 não se registrava uma deflação tão significativa quanto em abril e maio deste ano, com o IPCA registrando -0,31% e -0,38% nesses meses e acumulando 1,88% em 12 meses. A queda da demanda na economia faz com que o efeito pass-throught do câmbio sobre a inflação fosse nulo durante esse período atípico, também é ela quem protagoniza a redução de preço na maioria dos bens: após o período de maior turbulência, é esperado que os preços de bens duráveis e serviços livres mantenham-se em queda até junho enquanto os preços administrados aumentarão por conta da expectativa de aumento no preço da gasolina derivado dos reajustes nas refinarias. Atrelados a produção, é esperado que os preços se reajustem ao decorrer da retomada econômica, entretanto a expectativa de inflação para o final de ano é menor que 2%, valor abaixo do intervalo inferior de tolerância da meta de inflação.

O resultado fiscal do governo central apresentou um déficit primário de R$ 92,9 bilhões em abril em consequência das medidas de combate ao efeito do coronavírus. As despesas mais significativas desse resultado foram os créditos extraordinários de R$ 41 bilhões e subsídios de R$ 17 bilhões, sendo contabilizado nessas rubricas o auxílio emergencial, despesas adicionais aos ministérios e concessão de pagamento da folha salarial (PESE). A queda na arrecadação federal de R$ 101,5 bilhões representa redução de 29% quando comparado no ano, as receitas tiveram esses resultados por conta da postergação de pagamento de impostos e a utilização do crédito tributário para injeção de liquidez nas empresas. É esperado que a arrecadação continue em baixa enquanto as empresas não retomarem as atividades em forma plena. Apesar das projeções do orçamento do governo mostrarem déficits ainda maiores ao decorrer desse ano, a reabertura gradual da economia e as possibilidades de estímulos monetários permitiram um melhor ajustamento dos ativos financeiros do governo e uma melhora na percepção de risco do Brasil, dado a queda de 11% no CDS de 5 anos entre abril e maio.

No cenário internacional, as tensões políticas entre EUA e China reaqueceram ao longo do mês, dando continuidade ao conflito que se estende desde 2018 e colocando em risco o acordo econômico fechado no início do ano. Desta vez a centelha que provocou a volta da discórdia entre os dois países foram as críticas do presidente Donald Trump, responsabilizando o governo chinês pela pandemia do coronavírus, aliado à essa acusação há também a corrida pelo desenvolvimento e implantação da tecnologia 5G e o apoio dos EUA aos protestos de Hong Kong contra a interferência da China em sua região. Por enquanto a disputa está apenas na área política, no entanto investidores temem que haja uma retomada do conflito na linha econômica com a volta de imposições de barreiras de mercado e tarifas. Já é possível ver a tensão chegando ao mercado, durante o mês de maio certas medidas propostas no senado americano afetariam diretamente as empresas chinesas listadas nas bolsas americanas, essas medidas fariam com que as agências regulatórias locais pudessem exigir acesso sistemático aos documentos de auditoria das empresas, no entanto, a nova lei chinesa que regulamenta investimentos externos proíbe as empresas de seu país de fornecer documentos a agências regulatórias estrangeiras. Caso as medidas entrem em vigor e a agência chinesa regulatória não conseguir fazer um acordo existe a possibilidade da proibição da negociação de ações de empresas do país asiático.


Autores: Arthur Barbosa Magdaleno, Caetano Konrad & Erik Naoki Kawano

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Carta de Conjuntura Mensal – Abril 2020

Carta de Conjuntura Mensal – Abril 2020

O mês de abril foi marcado não apenas pelas incertezas econômicas provenientes do coronavírus e de suas vítimas, mas também pela instabilidade política. O governo central não manter coesão num plano de reestruturar o país é mais um fator de preocupação, principalmente após a saída inesperada de Sérgio Moro do Ministério da Justiça. A insatisfação do presidente em relação às medidas adotadas pelo ministro da saúde Luiz Henrique Mandetta era clara e sua demissão já estava encaminhada, mas o desentendimento imediato entre Jair Bolsonaro e Moro em relação ao cargo da diretoria da Polícia Federal do estado do Rio de Janeiro foi culminante à incerteza sobre como o governo manterá sua própria sustentação. Independente do motivo alegado pelas partes, é necessário restaurar a união nacional nesse momento de pandemia.

No âmbito legislativo, foram aprovadas mais de trinta medidas provisórias em auxílio às entidades públicas e privadas no combate à Covid-19 e a pauta central do mês foi a promulgação da emenda constitucional nº106 através da PEC do “orçamento de guerra”, medida que aborda independência do Banco Central e sua atuação no mercado secundário e implicação de despesas temporárias em períodos de calamidade. Espera-se que essa medida restrinja os impactos na dívida do Tesouro Nacional – dado a projeção de R$ 500 bilhões de déficit primário para esse ano – assim como a fiscalização dos recursos distribuídos para estados e municípios no intuito de inibir fraudes.

O ânimo do mercado ainda é de alta volatilidade. Indicadores de risco como EMBI+ e o CDS de 5 anos dispararam na segunda metade do mês e, em conjunto com a alta volatilidade do dólar, mostram a continuidade do comportamento perante ativos de maior segurança pelos investidores em geral. Os sinais de instabilidade também apareceram na empenada da curva de juros após as demissões dos ministros. Esse cenário continuará enquanto o Brasil não demonstrar decisão uníssona para enfrentar a crise e até as ações adotadas surtirem efeitos. É esperado que as medidas do Banco Central o permitam estruturar a parte longa da curva através das compras e vendas de títulos em conjunto com a proposta de transparência orçamentária para que o ambiente de investimentos se torne propício.

Na parte curta da curva de juros, a mudança da postura do BC vem em linha com o que havíamos escrito na carta passada. Em live, durante o meio do mês, o presidente Roberto Campos Neto deu a entender que estava aberto a novos cortes na taxa Selic, contradizendo seu discurso anterior de que tanto o corte quanto as outras medidas tomadas durante março seriam suficiente para manter a estabilidade financeira no país. A decisão de cortar 0,75 p.p. da Selic foi um pouco acima da expectativa do mercado de 0,5, essa diminuição fez o dólar valorizar 2,51% fechando o dia 7 de abril a R$5,72. O câmbio continua apresentando alta volatilidade apesar das tentativas do BC de amenizar a desvalorização da moeda brasileira atuando com o uso de leilões de dólares e operações com derivativos, ao todo foi injetado quase 50 bilhões de dólares no mercado desde o início da crise do Covid até agora. Um ponto levantado no comunicado da reunião do Copom de abril foi de que eles estariam abertos a uma nova diminuição de 0,75 p.p. na próxima reunião, um valor razoável, visto que o corte atual foi conservador considerando a necessidade imediata de maiores incentivos econômicos para o combate contra a crise atual. Campos Neto se mostra confiante em relação a capacidade do Banco Central de regular a economia com o uso de política monetária, visto que os pacotes econômicos anunciados anteriormente vêm surtindo um bom efeito na liquidez de crédito, um vantajoso sinal para o BC de que estamos longe de cair em uma armadilha de liquidez.

A inflação vem se mostrando baixa conforme o esperado. O IPCA de abril ficou em -0,31%, o principal fator responsável por esse número foi a redução de 0,54% nos preços de transportes ocasionada pela redução do preço do barril de petróleo. A queda do petróleo era inevitável, com um cenário de desaceleração econômica cada vez mais intensa e diminuição da demanda por combustível, a queda foi uma consequência natural de momentos de crise como esse, que tem como característica gerar deflação. A expectativa do mercado é de que o IPCA desse ano seja de 1,97% de acordo com o boletim Focus, muito abaixo da meta definida pelo BC de 4,0%. Essa baixa expectativa de inflação colabora ainda mais com a perspectiva de a taxa Selic continuar a diminuir nas próximas reuniões.

No mês passado, escrevemos que a superação da crise seria dependente do sucesso de medidas de saúde e econômicas combinadas. Desde lá, muita coisa mudou. Alguns estados tiveram quarentenas relaxadas, e em outros, mesmo com o isolamento determinado pelas autoridades, foi grande o número de pessoas que saíram às ruas seja por ignorar a importância da doença, seja por necessidade de buscar sua renda. Apenas hoje, quando registramos por volta de 500 mortes diárias pela doença , que vemos medidas de lockdown sendo tomadas, não para achatar a curva de contágio de forma antecipada, mas por necessidade dado iminente colapso dos sistemas de saúde, como é o caso regiões populosas de Pernambuco, Maranhão, Pará e Rio de Janeiro.

Desde o começo do contágio no país, não houve consonância entre as esferas municipal, estadual e federal quando falamos de medidas de contenção do contágio. Claro que, dada a proporção continental do Brasil, cada região tem suas particularidades, de início da doença, pirâmide etária e capacidade de atendimento médico. Porém a ausência de diretrizes conjuntas tanto confunde a população a respeito do que fazer quanto pode levar a doença a cidades e estados vizinhos que tenham adotado uma conduta mais cautelosa. O mais próximo que chegamos de ter uma consonância nacional foi sob a gestão de Luiz Henrique Mandetta no Ministério da Saúde, que reforçava a recomendação de isolamento social conforme as experiências internacionais. Porém, o Ministro foi demitido por seu discurso ser contrário ao do presidente, que desde o início da pandemia não teve o comprometimento esperado de um líder nacional. Jair Bolsonaro minimizou a gravidade da doença, agiu de forma contrária às medidas de saúde e preferiu tentar faturar com disputas políticas ao invés de agir para prevenir mortes, em um descaso único entre os países mais afetados.

Além da divergência em relação ao isolamento, o Brasil testou muito pouco. Sem uma testagem em massa e sem acompanhamento de quem teve contato com os infectados, o vírus se espalha entre mais facilmente entre os casos assintomáticos. Com isso, acabamos com uma subnotificação, que distorce a visão sobre o comportamento da doença e dificulta a tomada de decisões.

Em países que foram atingidos mais cedo, como os europeus, Coreia do Sul e China, a volta à normalidade está sendo discutida gradualmente com base em alguns princípios. Passados os picos de mortes e com uma boa taxa de leitos de UTI disponíveis, pouco a pouco barreiras à movimentação vão sendo retiradas e são acompanhados dois números: a taxa de ocupação dos leitos e o número de reprodução do vírus (quantas pessoas um infectado pode contaminar). Caso algum desses indicadores suba a nível preocupante, voltam a apertar as restrições. A situação crítica em capitais e interiorização do vírus pelo Brasil levanta dúvidas em relação ao desfecho do isolamento, o Brasil está poderá estar passando por seu pior momento no mês de maio. A falta dados robustos pela carência de testes e as dificuldades de gestão governamental da crise afastam por hora qualquer previsão de volta à normalidade.


Autores: Erik Kawano, Arthur Magdaleno & Caetano Konrad. 

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Carta de Conjuntura – Março de 2020

Carta de Conjuntura – Março de 2020

Existem sintomas semelhantes entre as recessões, como maior desemprego e realocação para ativos seguros por parte do mercado financeiro. Apesar desses fatores em comum,  toda recessão é antecedida por uma crise, que pode começar tanto na economia real quanto na financeira. 

A crise do subprime é o exemplo de uma crise que inicia na economia financeira. A bolha começou quando o Federal National Mortgage e o Federal Home Loan Mortgage Corporation elaboram o Mortgage-Backed Securitie (MBS), instrumento cujo valor está atrelado ao valor de várias hipotecas de risco semelhante. Esse instrumento é utilizado atualmente, inclusive o FED realiza política monetária com ele, o problema surge quando os bancos resolvem utilizar “pedaços” desses MBS, misturando hipotecas de baixo risco com os empréstimos imobiliários de mau devedores (subprime mortgage), de forma a oferecer um seguro em caso de inadimplência. Esses seguros são chamados de credit default swap (CDS).

A combinação desses MBS, os Collateralized Obligation Debt (CDO), eram negociados com o mais alto nível de segurança pela Standard & Poors e era cabível à maioria dos investidores pela vasta possibilidade dos bancos em modelarem os CDOs como bem desejassem. O produto teve vasta popularidade entre os hedge fund traders por conta da alta demanda dos investidores. Em meados de 2006 os preços das casas começaram a decair, os hipotecantes depararam-se com taxas de juros exorbitantes e não conseguiam mais vender a propriedade porque a dívida superava o valor da mesma. Já os investidores que possuíam esse CDOs perceberam a perda de valor e acionaram o CDS e, por conta da alta alavancagem, a seguradora AIG quase veio a falência. Bancos como Lehman Brothers, Washington Mutual, CIT Group e várias outras empresas decretaram falência. A recessão não ficou isolada no Estados Unidos, o mundo inteiro negociava os CDOs emitidos por esses bancos e, em consequência da bolha imobiliária, o mundo sofreu uma das maiores recessões já registradas. 

O mercado de equity sofreu grande oscilação quando o banco Bear Stearn decretou falência em março de 2008. O Ibovespa registrou uma queda significativamente maior em relação ao S&P no decorrer da recessão, investidores estrangeiros enxergaram que o momento de investir em mercados emergentes não era adequado e retiraram seus recursos. Entretanto, após alguns meses, o Brasil se recompôs rapidamente.

De certa forma, a recessão estava antecipada quando a curva de juros americana inverteu em 2006 – fenômeno atípico, pois os investidores então exigem maiores retorno no curto prazo por observarem risco iminente – mesmo com o FED aumentando a taxa de juros desde 2004 na tentativa de romper a bolha imobiliária. A falta de liquidez entre os bancos também era evidente no mercado monetário do Reino Unido com a elevação contínua da taxa LIBOR. Veja no gráfico a seguir: os títulos americanos de curto prazo oferecem rentabilidades maiores antes da crise eclodir e, quando ela ocorre, os de longo prazo disparam. O sinal negativo da inversão na curva de juros se repetiu para crise atual.

Apesar dos sintomas de recessão serem os mesmos, é importante distinguir o que diferencia ambas as crises. A crise do Covid-19 surgiu na economia real quando a produção de proteína na China reduziu por conta da gripe suína africana em dezembro de 2019 e, ao importar mais para suprir a demanda interna, aumentou o preço da proteína. O primeiro caso do coronavírus foi identificado no mesmo mês e só tomou proporção epidêmica no final de janeiro de 2020. As expectativas dos mercados eram de restrições comerciais, entretanto, a proliferação da doença forçou a economia global a entrar em recessão de forma repentina. Atualmente, a crise que enfrentamos provém do distanciamento social, fator que provoca queda na cadeia produtiva, restrições de movimentação e acesso através do fechamento de locais públicos.

A consequência do forte impacto sobre serviços e da inatividade do setor produtivo fazem os agentes econômicos postergarem investimentos e correrem por liquidez como forma de precaução, com a incerteza de quanto tempo durará esse lock down. Parte da queda na bolsa pode ser explicada por conta desses fatores, o Brasil foi o país mais afetado e já registra a perda de R$ 1,6 trilhão.

Vale notar que o Brasil tem desempenhado esses resultados em crises por ser um país emergente, é comum que haja saída de capital estrangeiro para ativos de maior segurança, como os treasuries americanos. Veja que a curva de juros brasileira aumentou em 120 p.b na parte longa e reduziu em 78 p.b na parte curta desde o início do ano até o começo de abril. No mês de março a curva empenou por conta das expectativas e teve uma redução considerável após o pronunciamento do Banco Central sobre a liberação de R$ 1,2 trilhão na economia, já a queda na parte curta da curva ocorreu pela sequência de cortes na taxa Selic. É importante que o país mostre celeridade tanto na política monetária quanto na política fiscal para que a curva mantenha estabilidade. Se a curva de juros continuar com essa volatilidade, as empresas enfrentarão dificuldade em acessar os recursos disponibilizados pelo Banco Central.

Em resposta ao grande aumento no número de casos do COVID-19 e à retração dos mercados globais, vários governos colocaram em prática medidas econômicas e de saúde pública com o intuito de amenizar os danos causados pelo vírus. 

No geral, as iniciativas econômicas propostas pelos países que adotaram formas mais rigorosas de isolamento social são semelhantes, no sentido de que grande parte deles focou na liberação incentivos econômicos pelo lado da oferta em uma tentativa de amenizar falências de empresas e demissões em massa. Medidas como diminuição da cobrança de impostos, renegociação de dívidas, possibilidade de dar férias antecipadas durante a quarentena e apoio financeiro governamental para pagamento de funcionários foram essenciais. Também houveram complementos de renda para a população, no Brasil, por exemplo, foi aprovado um auxílio de 600 reais durante três meses a trabalhadores informais, autônomos e MEIs. 

O grau do impacto que medidas econômicas e de saúde causarão ainda é incerto. As projeções atuais da efetividade futura no controle do vírus vão, no cenário mais pessimista, desde a possível falha total na contenção, com a doença se espalhando sem controle até a criação de uma vacina ou até a metade da população ficar infectada; à um cenário otimista em que a resposta das autoridades de saúde seriam altamente eficazes, nesse caso estima-se que o controle da propagação do vírus seria atingido em um prazo de 2 a 3 meses. No caso dos pacotes econômicos, em um cenário pessimista a intervenção das autoridades financeiras não seria suficiente, com um grande número de falência de empresas e inadimplência resultando em uma possível crise no sistema bancário, e no cenário otimista os incentivos liberados seriam eficazes em promover uma rápida recuperação no crescimento econômico após a normalização das atividades.

No Brasil, a estimativa de crescimento para 2020 no fim de fevereiro era de 2,17% de acordo com o boletim Focus, já no dia 3 de abril ela foi para -1,18%, uma queda abrupta que deve se ampliar conforme novos resultados de indicadores são anunciados. Há uma certa volatilidade nas expectativas de crescimento, com o Banco Central projetando expansão de 0,02% enquanto o Santander chega a projetar uma queda de 2,2%. A incerteza não é apenas com o resultado da economia, mas também com o fim do isolamento. Durante o mês de março o Brasil teve a maioria dos estados decretando quarentena, contrariamente à vontade do presidente, cujos prazos vão sendo prorrogados cada vez mais, dificultando o planejamento das empresas e famílias.

Dada a situação de iminente recessão, foi consenso entre os bancos centrais ao redor do mundo cortar as taxas básicas de juros, com destaque para o FED, que em duas sessões extraordinárias levou a sua a níveis nulos. No Brasil não foi diferente, porém a sinalização do nosso BC deixou dúvidas.

Vemos que o Banco Central demonstra-se satisfeito com a Selic reduzida a 3,75%, que falha ao ter excessiva cautela em sua comunicação num momento turbulento que demanda condução das expectativas e, dado a visão pessimista para a ociosidade brasileira, ele possa se ver na necessidade de aplicar novo corte mesmo que a contragosto.

Na penúltima reunião do Copom, o comitê indicou que o ciclo de cortes terminou, com a Selic em estimulativos 4,75% a.a, taxa esperada para ser mantida até o fim do ano. Agora em março, foi feito novo corte de 50 p.bs como resposta ao choque. Houve uma comunicação dúbia e ampla: apesar de considerar maior o risco de inflação abaixo da meta (justificando o corte), uma redução maior é vista como contraproducente, sendo falado que a variância de expectativas prescreve cautela mas não necessariamente gradualismo.

Em entrevista a integrantes da XP Investimentos no começo de abril, Roberto Campos Neto teve que negar repetidas vezes quando questionado se a Selic deveria cair mais. O presidente enfatizou que o papel do BC é assegurar a liquidez e solidez do sistema financeiro, para evitar principalmente a quebra de contratos entre empresas e bancos, objetivo que um conjunto de medidas busca atingir. Segundo ele, tais medidas (como a redução do compulsório) já reduzem suficientemente o custo de crédito (ao tomador) pelo lado de menores custos (para os bancos) de liquidez e de capital, não sendo preciso uma redução pelo custo de fundeio, relacionado à Selic.

Avaliamos que, com projeções de crescimento sendo revistas para baixo a cada semana, e planejamento para contenção do contágio sem unidade nacional e cheio de incertezas, o choque negativo sobre a demanda e emprego  tem grande potencial para reduzir a trajetória de inflação a níveis relevantes para a política monetária já nos próximos meses. Sendo assim, mesmo com todo o dito “arsenal de medidas” do BC para amenizar os danos, é difícil que até a próxima reunião do Copom, no início de maio, não seja incluído nessa lista um novo corte de juros.


    Autores: Erik Kawano, Arthur Magdaleno & Caetano Konrad. 
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Carta de Conjuntura Mensal – Fevereiro 2020

Carta de Conjuntura Mensal – Fevereiro 2020

O coronavírus causou um choque no cenário econômico internacional no mês de fevereiro, resultando em quedas nas bolsas europeias, americanas, asiáticas e brasileira decorrentes da preocupação com os efeitos da doença no mercado. Nesse mês foram registrados novos casos em diversos países, com ênfase na Itália e no Irã, que tiveram a maior taxa de aumento de contaminação fora da Ásia. As medidas que estão sendo adotadas pelos governos para conter a proliferação do vírus, como diminuição na mobilidade, fechamento de portos e paralisação de trabalhadores, vêm causando uma queda nas produções industriais locais, particularmente a queda da produção chinesa se mostra mais perceptível devido à importância que a China tem na cadeia de suprimentos de produtos e serviços em grande parte do mundo. O FMI reduziu para 5,6% a perspectiva de crescimento do PIB chinês, 0,4 pontos percentuais abaixo da projeção feita em janeiro, dando continuidade às séries de desacelerações que aparentavam ter acabado com o fim da guerra comercial. Estima-se que o impacto econômico negativo do vírus será semelhante ao ocasionado pela epidemia da SARS, que representou aproximadamente 0,5% do PIB da china em 2003.O mercado financeiro chinês foi bem agitado, logo no primeiro dia do mês o índice CSI 300 fechou em queda de 7,88% em relação ao fechamento anterior, apesar disso, houve uma recuperação progressiva ao longo do mês acarretada pelo discurso do presidente Xi Jinping, que deu indícios de ter intenção de proporcionar estímulos econômicos em resposta aos danos. O índice terminou fevereiro com queda de apenas 1,57% com 3940 pontos. As bolsas europeias também registraram baixa no mês, com os índices FTSE 100 (britânico) e Stoxx 600 (pan-europeu) tendo perdas de 9,68% e 8,54%, respectivamente, que se devem principalmente ao vírus. A saída do Reino Unido da União Europeia ocorrida não teve grandes efeitos aparentes, no momento o mercado não tem consenso em relação aos efeitos econômicos que o Brexit desencadeará, mais negociações devem ser realizadas ao longo do ano para definir as mudanças efetivas que entrarão em vigor.

No fim de fevereiro foi confirmado o primeiro caso do coronavírus no Brasil, afetando negativamente tanto a bolsa, que no dia teve uma queda de 6,95%, quanto o câmbio brasileiro. O índice Bovespa teve uma queda total de 8,43% no mês, motivada principalmente pelo temor causado pelo coronavírus e pela queda das bolsas internacionais. As vendas brasileiras para a China (responsável por 27% das nossas exportações) não sofreram mudança significativa em razão de grande parte dos produtos exportados serem comumente negociados antecipadamente por meio de mercado futuro (como soja e minério de ferro), no entanto, já é possível perceber uma diminuição nas importações de produtos industrializados chineses consequente da diminuição da atividade industrial. Não se espera que haja uma diminuição drástica nas vendas para a china, pois grãos e carnes compõe quase metade do valor das exportações totais e naturalmente alimentos não costumam ter grande variação de demanda.

Os resultados do IBC-Br de dezembro mostraram um fim de ano mais fraco do que o esperado. Calculado pelo Banco Central e divulgado antes do PIB (IBGE), é um indicador utilizado pelo Copom para estimar a evolução da atividade brasileira, como forma de tendência do PIB, mas não como sua prévia. No mês de dezembro, o IBC-Br teve variação de -0,27% em relação a novembro, acumulando crescimento em 2019 de 0,89%, o resultado anual mais baixo desde 2017. Em relação ao mês de novembro, dezembro apresentou resultados negativos na produção industrial (-0,7%), serviços (-0,1%) e vendas no varejo (-0,1%), o que frustrou as expectativas de maior impacto sobre o consumo da liberação de saques do FGTS, demanda que foi abalada pela forte inflação dos alimentos no mês com destaque para a alta das carnes.

Segundo a PNAD Contínua, a taxa de desemprego caiu para 11,2%, no último trimestre terminado em janeiro, frente a 11,6%, no trimestre de agosto a outubro de 2019. Comparando esse último trimestre com o mesmo intervalo em 2019, a taxa teve queda de 0,8 ponto percentual. Apesar da taxa ainda alta e recuperação gradual, em relação ao trimestre anterior houve uma melhora na composição do índice com aumento do emprego com carteira assinada (acréscimo de 540.000 pessoas) superior à queda no trabalho informal (diminuição de 479.000 pessoas). O aumento da formalização se deve em parte a empregos temporários para a temporada de fim de ano, cabendo avaliar como se sustentará essa estrutura nos primeiros meses de 2020.

Em janeiro se observou uma dinâmica nos preços administrados, alimentos e bebidas diferente do fim de 2019, onde estes sofreram com grande alta no preço das carnes, gasolina e energia elétrica. Nesse primeiro mês do ano, pode se considerar que a reversão no preço dos alimentos (alta de 0,39% em janeiro contra 3,38% em dezembro), aliada a baixo aumento dos demais componentes do índice, em especial os preços administrados, foram responsáveis pela inflação abaixo da esperada pelo mercado. O IPCA de 0,21% foi o menor resultado para um mês de janeiro desde o início do Plano Real, acumulando 4,19% nos últimos 12 meses. O IPCA-15 de fevereiro, considerado uma prévia do IPCA, registrou alta de 0,22%, o menor resultado para o mês em 25 anos. Os componentes com maiores altas refletem reajustes anuais de preços nos transportes públicos e táxis e em educação. Dos nove itens que compõem o índice, três apresentaram deflação, com destaque para alimentação e bebidas, que variou -0,10% frente a 1,83% em janeiro. De maneira geral, tivemos influência da redução do preço da energia elétrica, dado que em fevereiro passou a vigorar a bandeira verde, refletindo as condições hidrológicas mais favoráveis.

Na primeira reunião do Copom no ano, continuou a ser avaliado que as medidas de inflação indicando cumprimento da meta, com expectativas bem ancoradas, o cenário externo favorável com grandes economias também cortando juros e a alta ociosidade interna prescrevem corte na taxa básica de juros. Agora, apesar de o comitê ainda ver a conjuntura como prescritiva para outros cortes, foi priorizada a cautela na condução da política monetária. Como os estímulos do ciclo de cortes agem sobre a economia com defasagem, foi considerado necessário avaliar no futuro como se dará a transmissão para a atividade e inflação, especialmente dado que estamos em um cenário de juros historicamente mínimos e que recentes mudanças na intermediação financeira e mercado de crédito podem afetar a potência e velocidade da política. Dado isso, considera-se que nessa última carta o Copom tenha sinalizado o fim do ciclo de cortes. Pelo boletim de expectativas Focus, é esperado que a Selic se mantenha no patamar atual até o fim do ano. No que tange aos efeitos do coronavírus, o comitê avaliou que há potencial para uma maior desaceleração do crescimento mundial, sendo os efeitos relevantes dependentes de como o surto evoluirá.

A taxa de câmbio no Brasil está sofrendo constantes desvalorizações ao decorrer dos cortes sucessivos na taxa de juros realizados pelo Copom desde agosto do ano passado. No início da política monetária expansionista a volatilidade do dólar estava em 2,21% com mínima de R$/US$ 3,822 e máxima de R$/US$ 3,899 no mês, já em fevereiro deste ano a volatilidade foi de 7,62% com mínima de R$/US$ 4,237 e máxima de R$/US$ 4,498. No balanço de pagamentos está inserido a rubrica ativos de reserva, onde registra-se as operações cujos ativos estão sob controle do BC. O saldo da conta em janeiro apresentou superávit de US$ 705,6 milhões (0,48% do PIB mensal) ante US$ 813,5 (0,55% do PIB mensal) milhões do mesmo período do ano passado. Entretanto, o saldo acumulado em 12 meses vem decaindo desde 2017 e no final de 2019 apresentou um déficit de US$ 26 bilhões (1,42% PIB anual). A autoridade monetária se dispôs a ficar passivo em variação cambial e ativo em SELIC ao realizar leilões tradicionais de contratos de swap cambial com intuito de esterilizar a desvalorização e volatilidade da moeda assim como ofertar instrumentos de hedge cambial às empresas. O mercado aceitou 287,85 mil contratos de compra por parte da autoridade monetária no valor nocional de US$14,3 bilhões, entretanto 70 mil contratos iniciaram em fevereiro com valor nocional de US$ 3,5 bilhões com vencimentos em agosto, outubro e dezembro. Em março iniciarão 3 mil contratos e em abril outros 197,85 mil com valor nocional total de US$ 9,8 bilhões. A última oferta de leilões foi em 2018 no valor de US$ 1,5 bilhões durante a crise econômica na Argentina, a utilização desse instrumento não é usual e é exclusivo em períodos de grande turbulência.

Os Estados Unidos têm crescimentos do PIB há onze anos consecutivos, sendo o maior período de crescimento já registrado no país. Em um aspecto geral, os níveis de emprego e consumo apresentam solidez apesar do declínio recente em manufatura, investimentos e exportações decorrente da guerra comercial com a China. A preocupação atual do Federal Reserve está em elevar o índice de Preços para Gastos de Consumo Pessoal – PCE (Personal Consumption expenditures price index) – próximo à meta de 2% e, em decorrência disso, Jerome Powell deixou claro na primeira reunião do FOMC no ano que haverá pouco espaço para cortes de juros ao longo de 2020. Na reunião de fevereiro sobre panorama econômico, o vice-presidente do Fed, Richard Clarida, disse que o banco central americano ainda está monitorando os efeitos do coronavírus na economia e prefere não especular sobre impactos imediatos, a expectativa é de um choque notável na China, pelo menos neste primeiro semestre. Ele enfatiza a eficácia da política monetária no apoio ao crescimento e manutenção do mercado de trabalho, retoma a persistência do banco central em cumprir a meta de inflação e diz que aplicará medidas para manter a taxa de juros em nível apropriado conforme o surgimento de novas informações desse período de epidemia. Sobre as eleições, em fevereiro iniciou a disputa entre os democratas para decidir quem debaterá com o presidente Donald Trump em setembro. Os candidatos democratas buscam angariar votos tanto dos delegados eleitos pela população quanto da convenção composta por apoiadores (caucus). Na maioria dos casos, os Partidos Democratas de cada estado concedem os votos do colégio eleitoral aos candidatos que apresentaram a melhor performance nas convenções. A primária da eleição americana começou em Iowa, onde o ex-prefeito Pete Buttgieg obteve vantagem com 14 votos e manteve liderança com mais 9 votos em Nova Hampshire, entretanto cedeu o primeiro lugar a Bernie Sanders em Nevada. Por fim, Joe Biden surpreende a todos ao vencer na Carolina do Sul com 39 votos e por conta disso decorre a desistência de Buttgieg da campanha. Biden e Sanders acumulam 54 e 60 votos respectivamente e devem intensificar a disputa no dia 3 de março, onde 16 estados distribuirão seus votos aos candidatos. Essa data é conhecida como “Super-tuesday” e contém estados de grande peso como Califórnia, Texas e Carolina do Norte.

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Carta de Conjuntura Mensal de Novembro 2019

Carta de Conjuntura Mensal de Novembro 2019

  • Economia Internacional

A eleição do novo presidente dos Estados Unidos ocorrerá dia 3 de novembro de 2020 e a corrida eleitoral já iniciou. Poucos foram nomeados para o partido Republicano, como Roque de La Fuente e Bill Weld, mas Donald Trump tem grande vantagem sobre seus concorrentes com o orçamento de US$ 56 milhões registrados em junho. No dia 20 de novembro o partido democrata iniciou o debate para as primárias da eleição e, entre os dez candidatos, destacaram-se Elizabeth Warren, Bernie Sanders e Pete Buttigieg , sendo esperado que participem do próximo debate em dezembro. Caso o partido democrático traga um candidato extremista fará com que boa parte dos votos se direcionem à Donald Trump, as expectativas são de que o candidato seja de centro-esquerda e que traga consigo apoio do establishment democrático e um discurso energizante. Trump teve sucessivas vitórias durante seu mandato que invalidariam qualquer discurso extremista, por exemplo, sua vitória na reforma da justiça criminal que possibilita a ressocialização de ex-detentos e suavização das punições judiciais. Os principais indicadores deste mês evidenciam valorização do dólar, os dados de estoque no atacado dos Estados Unidos, que mensura a variação no valor dos bens não vendidos na posse de atacadistas, atingiu o valor de 0.2% conforme previsto pelo mercado. O núcleo de pedidos de bens duráveis superou o valor previsto pelo mercado ao atingir 0.6%, indicando aumento significativo na atividade desse setor. Já o mercado imobiliário atingiu US$ 100 mil abaixo do esperado, o valor da venda de casas usadas desse mês foi de US$5.46 milhões. Por fim, o PIB do Estados Unidos para o terceiro trimestre superou a expectativa de 1.9% e disparou para 2.1%. Segundo o Chairman Jerome Powell, os resultados otimistas reduziram o risco de recessão no curto prazo. Entre os países vizinhos, o governo chileno de Sebastián Piñera começará a reformulação da constituição de 1980 em detrimento da crise política e social iniciada em outubro. As manifestações no Chile iniciaram por conta do aumento na tarifa do metrô e desencadearam na assembleia constituinte que formulará reformas econômicas, sociais e programas sociais para combater a desigualdade, como o aumento de 20% das aposentadorias. A constituição herdada de Pinochet tem como característica um estado mínimo e com incentivos à privatização, as políticas de saúde, educação e infraestrutura são de responsabilidade do setor privado. Na Bolívia, a presidente interina Jeanine Áñez promulgou a “lei do regime excecional e transitório para a realização de eleições gerais” aprovada por unanimidade pela câmara dos deputados, onde retira os efeitos das eleições realizadas no dia 20 de outubro e permite uma nova eleição presidencial no pais em até vinte dias corridos a partir da aprovação dos regulamentos na assembleia legislativa plurinacional. Já a Argentina está em período de transição para o governo de Alberto Fernández e Cristina Kirchner e nomes como Matiás Kulfas e Guilermo Nielsen são os mais esperados para assumirem a área econômica, Santiago Cafiero assumirá o cargo chefe do gabinete e o ex-governador Felipe Sola assumirá o ministério das relações exteriores. No aspecto geral da américa latina, o Indicador de Clima Econômico (ICE) divulgado pela FGV caiu pelo terceiro trimestre seguido, passando de -26.4 para -28.2 de julho para outubro, assim como o Indicador de Expectativas (IE) reduziu de 17.2 para 15.5, sendo a Argentina o país que mostrou os piores resultados entre todos.

  • Economia Nacional

Destacamos a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) contra a prisão em segunda instância que permite a prisão dos réus condenados somente após o trânsito em julgado, desencadeando na libertação de Lula. Políticos de centro e direita se reuniram para a tramitação de três Propostas de Emenda Constitucional (PECs) com objetivo de inibir a decisão do STF na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). No dia 20 deste mês foi aprovado o relatório favorável à PEC 410/2018 de autoria de Alex Manete, o objetivo desse dispositivo é alterar o artigo 5º da constituição embasando-se na constituição alemã, permitindo a prisão em segunda instância desde que haja evidência de culpa do acusado no ato investigado. Como parlamentares da oposição possuem fortes argumentos de que o dispositivo altera uma cláusula pétrea da constituição, Alex Manete elaborou a PEC 199/2019 que propõe alteração dos artigos 102 e 105 da constituição, semelhante à PEC 411/2018 de autoria do deputado licenciado e atual ministro da casa civil Onyx Lorenzoni. Após os deputados aprovarem a constitucionalidade das propostas apresentadas na CCJ , os textos serão encaminhados conjuntamente à comissão especial onde os parlamentares debaterão o conteúdo que aglutina as PECs. Após as análises, a última etapa será no plenário da Câmara para votação. No âmbito do judiciário, o presidente do STF Dias Toffoli revogou a decisão de pedir à Unidade de Inteligência, o antigo COAF, as cópias de todos os relatórios de inteligência financeira produzido nos últimos três anos. Ao todo eram mais de 19 mil relatórios sigilosos que tinham informações de 600 mil pessoas físicas e jurídicas, incluindo políticos com foro privilegiado. No documento assinado, o presidente declara que a corte não realizou os cadastros necessários para acessar os documentos via sistema eletrônico. Após reforma da previdência, os investidores estão tomando maiores confianças e buscam alternativas para garantir a estabilidade futura. Os fundos de previdência complementar estão cada vez mais em alta, dados da FenaPrevi indicam que as contribuições para essas aplicações somaram R$ 34 bilhões neste terceiro trimestre, representando uma alta de 35.4% em comparação com 2018 e a captação líquida foi de R$16.6 bilhões nesse trimestre, realizando um aumento de 104% em comparação ao mesmo período em 2018. O secretário do Tesouro Nacional Mansueto Almeida apontou que a dívida bruta do governo geral (DBGG) deverá encerrar entorno de 76% a 77% do PIB, sendo um projeção otimista quando comparada ao 80.8% dado no mês passado, decorre da antecipação do ressarcimento de R$ 30 bilhões do BNDES ao tesouro nacional e do baixo nível da taxa de juros da economia que segura o endividamento do governo. Sobre os juros, no dia 30 de outubro o Comitê de Política Monetária (COPOM) realizou o corte de 0.5 pontos base na meta para a Selic, levando a taxa de juros para 5.00% (a.a). A justificativa para essa queda foi embasada no cenário macroeconômico brasileiro atual onde há um maior incentivo à produção atrelado a inflação baixa, com espaço para uma nova queda de juros. Entretanto, a ata do COPOM cautela para os próximos cortes, o previsto é para que em dezembro haja um corte de 0.5 p.p e 0.25pp na reunião de 2020. O câmbio de R$/US$ 4.20 chegou ao patamar histórico em consequência da queda de juros e quedas no saldo em transações correntes de -R$5.3 bilhões para -R$7.8 bilhões e investimento estrangeiro direto de R$7.7 bilhões para R$6.8 em consequência das ocorrências nos países vizinhos.

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Prêmio de Risco na Curva de Juros: Caso Brasileiro

Prêmio de Risco na Curva de Juros: Caso Brasileiro

Introdução

A curva de juros é uma fonte inestimável de informações para os bancos centrais e demais agentes do mercado, visto que possibilita um feedback instantâneo e a compreensão das expectativas do mercado em resposta a mudanças nas condições econômicas. Para uma melhor compreensão da Estrutura a termo das taxas de juros (ETTJ) devemos separar expectativas para taxas de juros futuros e prêmio de risco. Em termos gerais, esse prêmio é uma ”taxa” extra exigida para compensar o risco de determinado investimento. Todavia, este, não é diretamente observável, sendo necessário estimá-lo com base em um modelo que decomponha a ETTJ, separando o que é expectativa futura da taxa de juros e prêmio de risco. Para o Brasil, expectativa futura da taxa de juros pode ser assimilada como o nível esperado para a taxa Selic no futuro

Este artigo procura abordar os conceitos centrais sobre prêmio de risco na curva de juros e algumas das principais teorias que o cercam. São abordadas ligeiramente técnicas para construir uma série para o prêmio. Posteriormente, utilizando o estudo Buratto  (2017) e Kim e Orphanides (2005) a curva de juros é decomposta através do método de pesquisa das expectativas do mercado sobre a trajetória dos juros. Desta forma, obtém-se a série do prêmio de risco na curva de juros brasileira. Tendo em vista que decompor a ETTJ através de pesquisa das expectativas dos agentes de mercado é uma técnica simples e condizente com as condições históricas da curva brasileira.

Como já mencionado, quando decompomos a curva de juros obtemos duas principais curvas: a de expectativa futura dos juros e a curva que apreça a incerteza futura. Fazer esta decomposição está longe de ser um consenso e, no geral, não é tão simples quanto parece. Algumas teorias e modelos tentam explicar e distinguir estes dois conceitos, mas vale lembrar que há relativamente pouca consonância sobre as propriedades empíricas do prêmio de risco. Como podemos observar, logo abaixo, a existência de múltiplas hipóteses. Valls e Marçal (2007) trazem a tona uma ilustração sobre os tipos de modelagem para o prêmio, visto em Curthbertson e Nitzsche (2005, p. 494-498), são eles:

  1. Hipóteses de Expectativas Puras: nesta versão o prêmio exigido é igual a zero, assumindo neutralidade ao risco dos agente e a ausência de oportunidades de arbitragem;
  2. Hipótese de Expectativas com Prêmio pelo Prazo (forma fraca): nesta versão o prêmio é dependente apenas do prazo de maturidade, o que explica o formato da curva ser em geral positivamente inclinado, mas constante ao longo do tempo;
  3. Hipótese do prêmio de risco variante no tempo: o prêmio exigido pelos agentes não depende apenas da maturidade, mas também de outros fatores como tamanho da incerteza futura, risco da taxa de juros, ciclos econômicos, risco país, habitat preferido e etc.; 
  4. Hipótese de segmentação de mercado: o valor dos ativos depende de alguma forma do estoque disponível dos mesmos e isso tem influência nos prêmios.

Conceitos e Teorias:

Hipótese das Expectativas

A teoria básica da ETTJ é a Hipótese das Expectativas (HE), abordada primeiramente por Irving Fisher (1896). Assume que os agentes são neutros ao risco e que não há oportunidades de arbitragem, assim propõe que as taxas de juros de longo prazo são formadas pela média das expectativas em relação às taxas de curto prazo futuras. Dessa forma, todas as mudanças na curva de juros são atribuídas a choques nas expectativas dos agentes de mercado. Não há prêmio.

Entretanto, em sua forma fraca, a HE assume que há um prêmio dependente do prazo de maturidade, explicando, assim, o formato da curva “normal” ser positivamente inclinada e o prêmio constante ao longo do tempo. Há, também, uma expectativa que a economia vá reagindo a esta taxa de juros e gerando uma maior inflação, sendo necessário um aumento de juros para contê-la, mas não entraremos nesse mérito.

Embora a HE possibilite uma maneira simples e intuitiva de interpretação da curva de juros e tenha um importante papel em diversos modelos macroeconômicos, é amplamente aceita na literatura¹ como insuficiente para explicar mudanças na ETTJ da maioria dos países. ¹(ver Friedman (1979), Fama e Bliss (1987), Froot (1989), Campbell e Shiller (1991), Gravelle e Morley (2005), Cochrane e Piazzesi (2005), Wright (2011), Joslin et al. (2014)).

Uma forte crítica à HE é que ela ignora a aversão a risco dos investidores. A menos que um investidor compre um título de longo prazo pensando em levá-lo até o vencimento, o retorno nominal é incerto (marcação a mercado), sendo natural que o investidor exija um prêmio para compensar esse risco, segundo Hugo Takimoto (2016). Destaca, ainda, que o prêmio pode variar de acordo com o tamanho do risco percebido. Logo, é natural supor que o prêmio varie no tempo conforme muda a percepção da incerteza sobre inflação, ciclos econômicos, política monetária, liquidez dos ativos, fluxos internacionais, habitats preferidos etc.

Hipótese de Preferência por Habitat

Outra teoria que também diz respeito a curva de juros é a Hipótese de Preferência por Habitat. Em resumo, essa hipótese destaca a tendência de agentes de mercado preferirem demandar títulos em vértices específicos da curva. Desta forma, amassa o prêmio naquele vértice, em outras palavras, uma demanda maior por uma determinada maturidade afeta negativamente a taxa de juros dele. Concluindo que a oferta vs demanda por títulos de determinado vencimento tem um papel importante na explicação do prêmio de risco. Geralmente, tal hipótese pode ser vista em conjunto com outras teorias sobre este assunto. Swanson (2007), exemplifica o caso dos fundos de pensão, que atuam no longuíssimo prazo e podem estar dispostos a aceitar um prêmio menor (ou até negativo) para não terem a necessidade de rolagem de seus investimentos. Dessa forma tentam evitar o risco das taxas de juros flutuarem nos próximos períodos, pois já vão estar posicionados. Posteriormente, Swanson (2011), chega em conclusões similares quando observa a Operação Twist (trocas de títulos de curto prazo por títulos de longo prazo na carteira do Banco Central dos Estados Unidos) cujo objetivo é diminuir as taxas de juros dos títulos de longo prazo e, dessa forma, estimular a economia.

Hipótese do Prêmio de Risco Variante no Tempo

A literatura moderna sobre a ETTJ fornece maneiras alternativas para extrair o prêmio de risco da curva de juros e ainda justificar as falhas da HE. A Hipótese do Prêmio de Risco Variante no Tempo tem o nome autoexplicativo e dita o tom das pesquisas e estudos que estão a seguir:

Os primeiros estudos sobre a variabilidade do prêmio de risco ao longo tempo eram modelos puramente estatísticos
estruturados com base em regressões lineares dos principais componentes da curva: Fama e Bliss (1987), Campbell e Shiller (1991) e Cochrane e Piazzesi (2005).

O modelo de Fama e Bliss (1987) tem o objetivo de verificar se a taxa forward carrega informações sobre retornos em excesso, para isso utilizam treasuries com maturidades de um a cinco anos e comparam com taxas forward de mesma maturidade. A principal conclusão dos autores foi que há retornos em excesso e que variam ao longo do tempo. 

*Retornos em excesso: Fama e Bliss utilizam essa nomenclatura, é sinônimo de prêmio de risco. Retornos que excedem as expectativas, ou ainda, retornos extras que apreçam os risco.

**Taxa forward: como ilustrado na figura abaixo, a taxa spot, simplificadamente, é o retorno que um título possui no momento t0 (hoje) com vencimento daqui a 504 dias. A taxa Forward, por exemplo, é o retorno que um título possuí hoje para compra daqui a 252 dias com vencimento de 504 dias após a compra. Para saber mais sobre taxa forward (pag 8)

TXforward vs Txspot

Campbell e Shiller (1991) testaram se a inclinação da curva de juros pode prever mudanças futuras nas taxas de juros. Principal conclusão foi rejeitar a HE. Cochrane e Piazzesi (2005) utilizando os mesmos dados de Fama e Bliss (1987) rodam-os em outros modelos. Em suma, chegam na conclusão de que combinações lineares de taxas forward tem capacidade de antecipar os retornos em excesso de títulos de todas as maturidades e intitulam essas combinações lineares de “Fator de previsão de retorno”.

Ao mesmo tempo foram vindo à tona modelos de “não arbitragem” que mostraram ser eficientes para a decomposição da curva em mercados maduros e são utilizados até hoje. Tais modelos são similares ao de Fama e Bliss (1987), utilizam os principais componentes da ETTJ (nível, inclinação e curvatura) para tentar explicar este prêmio. No entanto partem da imposição de não arbitragem entre títulos de mesmo risco/maturidade, assim como a HE.

Essa imposição impede que um título de vencimento em um ano tenha um retorno diferente da combinação de dois títulos de seis meses onde o segundo é comprado logo após o vencimento do primeiro, por exemplo. 

A condição de não arbitragem restringe o modo que os retornos dos títulos de diferentes vencimentos podem se mover em relação ao outro, facilitando a formulação dinâmica para a curva inteira. E assim, extrair o prêmio embutido na curva torna-se um processo um pouco mais assertivo, segundo Buratto (2017).

Dentro dessa classe de modelos, merecem destaques os modelos Gaussianos do tipo Afim. Vale ressaltar que alguns desses modelos utilizam apenas os retornos dos títulos e variáveis obtidas através da interpretação da curva, como o modelo ACM (2013). Outros incluem dados de cross-section como o modelo de Kim e Wright (2005). Ainda, podem ser vistos modelos com variáveis macroeconômicas embutidas para extrair o prêmio.

Ainda sobre o prêmio de risco variante no tempo, temos uma abordagem alternativa que foge dos modelos puramente estatísticos e de não arbitragem. Essa abordagem procura captar as expectativas futuras de variáveis econômicas dos agentes de mercado através de pesquisas. Exemplo de pesquisas são o Boletim FOCUS (Brasil) e U.S Survey of Professional Forecasters (EUA). A lógica para a decomposição da curva é simples, o prêmio de risco é a diferença entre os rendimentos observados na curva de juros e as expectativas dos agentes para as taxas de juros.


➧ Onde  é o prêmio de risco observado na taxa de juros de mercado acumulada do período j até o período T, no momento t.
➧  é a taxa de juros acumulada do período j até o período T, no momento t.
é a expectativa do mercado para a taxa de juros de curto prazo do período j até o período T, no momento t. 

Wright (2011) realizou um estudo para mercados maduros utilizando dados de expectativas de pesquisas com agentes de mercado e outro em paralelo através do modelo de ETTJ Afim. Sua conclusão mais relevante foi que o prêmio de risco correlaciona positivamente com medidas de incerteza da inflação.

Crump (2016) utiliza uma abordagem com pesquisa e busca encontrar o prêmio de risco na ETTJ americana. Conclui que: 1. Oferta, demanda e outros fatores macroeconômicos desempenham um papel importante para compreender os prêmios. 2. A queda na inflação esperada é a maior responsável pela diminuição das taxas de médio e longo prazo, quando observamos um período grande. 3. Em boa parte dos casos a flutuação na parte intermediária e longa da curva é relacionada a variação no prêmio de risco.

Para o caso brasileiro podemos dizer que não é muito similar ao de países desenvolvidos (mercados maduros). Os históricos inflacionários foram recém estabilizados e o mercado de juros, apesar de uma grande liquidez, ainda é muito recente. Ainda, compreende profundos choques com política monetária em períodos de crise interna e externa, resultando em juros nominais altos e quebras estruturais na série histórica dos juros.

Portanto, a literatura sobre a decomposição da ETTJ para o caso brasileiro é ainda limitada a testar a hipótese das expectativas ou em tentativas de entender a dinâmica das altas taxas de juros nominais. Na maioria a HE é considerada como insuficiente para o caso brasileiro (Tabak e Andrade (2001), Brito et al. (2004), Fortunato (2006), Marçal e Valls (2007) e Guillen e Tabak (2009)).

Algumas conclusões para a ETTJ brasileira

Favero e Giavazzi (2002) concluíram, através da regra de Taylor (1993), que grande parte da taxa de juros ser elevada é devido a um alto prêmio de risco exigido pelos agentes e não a uma expectativa de alta nas taxas de juros de curto prazo.
Ganem e Baidya (2011) vão além e apontam que o prêmio de risco brasileiro é consequência do seu histórico de combate de crises através de choques positivos de juros para evitar a fuga de capitais, o que faz com que agentes do mercado demandem uma gordura extra (prêmio maior) para carregar títulos brasileiros.

Em outros estudos, são vistos que os determinantes para o prêmio de risco brasileiro é o nível de solvência do governo, oferta de títulos, liquidez internacional, composição da dívida, volatilidade da inflação e histórico de calotes (ver em Segura-Ubiergo (2012); Jaeger (2012); Guillen e Tabak (2009); Loureiro e De Holanda (2004)).

Colocando em prática

Visto que há quebras estruturais nas séries temporais de juros brasileiras, existe uma incerteza ainda maior na hora de usar modelos puramente estatísticos para decompor a curva.

Encorajado por estas conclusões e na tentativa de explorar mais a Hipótese do Prêmio de Risco Variante no Tempo, construiu-se a série do prêmio de risco para o Brasil através da modelagem de pesquisa. Foi utilizado o Boletim FOCUS para traçar a curva de expectativa e contratos futuros de DI como referência para curva de juros.

A base inicial de dados foi composta por observações diárias da curva de juros à vista e da curva de expectativas dos agentes de mercado entre 28/06/2017 e 21/06/2019. Período de 2 anos. Após certa normalização de um evento atípico nos mercados brasileiros em 17/05/2017, conhecido como “Joesley Day”.

Para a curva de juros à vista, a escolha foi o mercado futuro de DI. Entendo ter algumas vantagens sobre os outros mercados, como por exemplo LTNs e Swaps, pois é o mercado mais líquido em termos de volume e horizonte. Um obstáculo encontrado foi que em alguns vértices não há nenhuma ou quase nenhuma negociação, sendo assim estes foram excluídos da base de dados. Restou, em média, 30 contratos diários utilizados a preço de fechamento. Abaixo, o gráfico de evolução da curva à vista. Interpoladas exponencialmente – explicação do motivo de adoção deste método de interpolação é encontrado logo abaixo.

Como descrito em parágrafos anteriores, o prêmio de risco não é diretamente observável e para estimá-lo recorremos a pesquisas de expectativas do mercado sobre a trajetória da taxa básica de juros da economia (Selic), representando a taxa de curtíssimo prazo. Para a construção desta curva os dados foram extraídos do Boletim FOCUS, obtidos diariamente no Sistema Gerenciador de Séries Temporais do Banco Central Brasileiro. A coleta da FOCUS compreende tanto expectativas para Selic nos próximos 16 meses com dados de fim de cada mês e expectativas da Selic para os próximos 5 anos com dados de fim do ano. Compilando essas duas séries de dados e retirando os dados conflitantes, obtém-se, em média, 20 observações diárias. Cerca de 75% delas estão até 16 meses.
Ao longo da construção do modelo foi utilizado duas principais interpolações: Cubic Spline e Exponencial. É visto na literatura que elas têm vantagens significativa em comparação com outros tipos de interpolações. Principalmente a interpolação cúbica (C-Spline) que apresenta curvas suaves, sendo uma das principais exigências para a interpolação da curva de juros.

No método exponencial ou log linear (mesmos resultados apenas há variações na metodologia e cálculo) também obtivemos curvas com partes côncavas e convexas entre vértices, mas nos vértices ela forma pontas que são indesejáveis para uma boa interpolação. Mesmo assim ela atende a maioria das exigências para o construção da ETTJ.

Já o método cúbico é a forma mais bela visualmente, onde é resolvida por um sistema de equações que envolvem a curvatura, inclinação e continuidade. O ponto fraco é que os vértices do começo da curva influenciam significativamente os pontos mais distantes.
É amplamente difundido estes dois métodos no mercado financeiro brasileiro, porém no nosso caso preferimos interpolar pelo método exponencial por apresentar resultados, empiricamente, mais coerentes com as observações diárias. Isto porque 75% dos dados de pesquisa do FOCUS ficam bem no começo da curva, influenciando demasiadamente os valores no restante da ETTJ, resultando em anomalias na curva. Abaixo uma ilustração de alguns métodos de interpolação.
Então, através da equação de decomposição da curva (diferença entre os dados do FOCUS e os dados do DI futuro), foi elaborada as séries diárias do prêmio de risco da curva brasileira. O horizonte de tempo, do Boletim FOCUS, tem certas limitações. Desse modo, as séries de maturidade constantes são de 12, 24, 36, 48 e 60 meses (252, 504, 756, 1008 e 1260 dias úteis respectivamente). Abaixo as séries de maturidade constante do prêmio de risco no mercado brasileiro:
Desde do final de 2015 vem sendo feito afrouxamentos monetários na economia brasileira. Saímos de um juros nominal de 14,25% para atuais 5,5%, uma mínima histórica. De modo geral o prêmio de risco tem um comportamento anticíclico: em um momento de otimismo o investidor exige um prêmio menor do que em momentos de incerteza sobre o futuro da economia.

Podemos ver uma dependência da percepção dos agentes em relação a condução da política monetária (PM). Segundos as observações, o prêmio de risco na barriga da curva (24, 36 e 48 meses) apresenta valores negativos em quase todo segundo trimestre de 2019, conflitante com a teoria de que os agentes demandam um prêmio positivo para se expor ao risco da incerteza futura.

No gráfico abaixo, a série verde escura é a curva de expectativa com prazo de 4 anos (eixo esquerdo) e a curva verde clara é a do prêmio de risco de 4 anos (eixo direito). A partir das observações podemos ver que a curva de juros formada pelos contratos de DI oscila mais do que a curva formada pelas expectativas. Desta forma a terceira conclusão de Crump (2012) se aproxima das observações deste modelo, diz que em boa parte dos casos a flutuação na parte intermediária e longa da curva tem relação com variações no prêmio e não na expectativa. Dado que o nível de prêmio exigido pode variar conforme o tamanho do risco percebido no mercado. A curva de expectativa da taxa de juros com maturidade constante em 252 dias úteis (azul) é ilustrada apenas a fim de comparação.

No melhor dos mundos, a ideia de encontrar um valor justo do prêmio de risco em determinado momento no tempo e fazer decisões de investimentos baseada nisso, é tentadora. A realidade é que cada metodologia para decomposição da curva de juros pode trazer um valor diferente. Swanson (2007) roda alguns modelos de extração do prêmio implícito e observa estimativas diferentes para cada um dos modelos rodados, como podemos observar na imagem abaixo.

Por fim, observamos que o enfoque dos mais recentes trabalhos é encontrar variáveis que ajudem a explicar o comportamento do prêmio de risco implícito na ETTJ. Com o amadurecimento do mercado brasileiro é esperado estudos mais profundos e conclusões mais robustas acerca deste assunto.

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Posted by Bernardo Ramos in Conjuntura Macro / Renda Fixa, 1 comment
Carta de Conjuntura Mensal Outubro 2019

Carta de Conjuntura Mensal Outubro 2019

Comentário Macroeconômico Mundial

No contexto global, a segunda metade do mês de setembro apresentou uma menor tensão entre Estados Unidos e China com relação a guerra comercial, devido à rodada de negociações que estava por vir no dia 11 de outubro, em Washington. Contudo, os resultados desse encontro representam passos pequenos na direção de resolver um conflito de tamanha escala, em linha com nossa expectativa exposta na carta anterior.
Entre as medidas mais importantes anunciadas, a China concordou em comprar de 40 a 50 bilhões de dólares da agricultura americana e o governo estadunidense comprometeu-se em não elevar tarifas de importação de produtos chineses. Além disso, houveram conversas sobre um possível pacto monetário, que, para os EUA, significaria uma menor manipulação do Yuan pelo governo chinês, porém nada de concreto foi estabelecido. Dessa forma, observamos que o mini acordo mantém em vigor todas as tarifas previamente impostas e não se refere aos principais assuntos que deram início a guerra comercial 15 meses atrás, como os subsídios à agricultura e o desrespeito às leis de propriedade intelectual por parte da China. Em razão disso, seguimos com nossa visão de que a guerra comercial deva se estender para 2020 sem qualquer direcionamento para uma resolução definitiva.
Ademais, outros conflitos emergiram na China com a escalada de tensões nos protestos de Hong Kong. As manifestações, que ocorrem desde junho, começaram como parte de um movimento contra a Lei de Extradição e ganharam uma escala muito maior, incluindo pautas como a liberdade e autonomia da ex-colônia britânica. Esse clima de violência afetou de maneira severa a economia, com a redução da expectativa de crescimento local em 2019 de 3% para 1%, além da queda de 23% nas vendas do varejo em agosto contra o mesmo período em 2018. Desse modo, entendemos esse cenário como mais uma fonte de incertezas na economia global, uma vez que Hong Kong é uma grande parceira comercial de Japão e Estados Unidos – economias que já demonstram fraqueza – e é porta de entrada de muitos produtos na China.
Outra fonte de incertezas em setembro foi o ataque de drones às refinarias na Arábia Saudita no dia 14, destruindo 5% da capacidade de produção de petróleo mundial em questão de instantes. Consequentemente, os preços do petróleo dispararam, chegando a subir quase 20% em um único dia e gerando a maior alta desde a Guerra do Golfo de 1991. Contudo, um mês após o incidente, a Saudi Aramco – companhia de petróleo saudita – anunciou que já retornou ao ritmo de produção que apresentava antes da tragédia, de modo que o preço do petróleo Brent já se encontra no mesmo patamar de antes do dia 14. Ainda assim, o ataque expôs uma fragilidade entre os maiores produtores da OPEP e levanta o questionamento sobre a sustentabilidade da rápida recuperação apresentada pela Aramco. Isto posto, esperamos maior risco associado às questões do petróleo no mundo, prejudicando ainda mais a já enfraquecida economia global.
Na Europa, a decisão sobre a nova rodada de quantitative easing pelo BCE sofreu oposição interna. Embora tenha sido aprovada, nove dos 25 membros do conselho votaram contra a medida, mostrando a divergência de opiniões dentro da instituição. Assim sendo, a nova presidente do BCE, Christine Lagarde, que deve assumir o cargo no dia primeiro de novembro, terá que alinhar as ideias do comitê se quiser manter as medidas de Draghi. Nessa linha, entendemos que a manutenção dos estímulos é fundamental para evitar uma desaceleração econômica ainda maior da zona do euro, que continua sofrendo das incertezas relativas ao Brexit e à trade war.
No Reino Unido, a situação do Brexit inseriu ainda mais incertezas no mercado após um desentendimento entre Boris johnson e Angela Merkel, em que a chanceler da Alemanha enfatizou que um acordo seria extremamente improvável. Nossas expectativas são de que um acordo antes do dia 31 de outubro, data limite estabelecida por Boris Johnson para saída do RU da UE, não se realize. No entanto, a lei aprovada pelo parlamento britânico que dá o poder para o primeiro ministro prorrogar por três meses a saída do RU deixa a situação do Brexit sem qualquer direcionamento.
A economia dos EUA, em setembro, mostrou-se enfraquecida, com dados das vendas do varejo abaixo do esperado, caindo 0,3% como resultado das tensões comerciais. Dados como este forneceram mais munição para os membros votantes do federal reserve que estão tomando uma posição mais dovish, frente aos cortes de juros. Os dirigentes do Fed estão, em comparação com meses anteriores, mais divergentes em relação ao seu posicionamento quanto ao grau de estímulo que a entidade deverá influenciar na economia do país, evidenciado pelo voto de corte nas taxas de juros em 50 pb pelo presidente do St Louis Fed, James Bullard. O Federal Reserve também anunciou que expandirá a sua balança com a compra de 60 bilhões de dólares em Treasury Bills, com o objetivo de injetar liquidez nos mercados de curto prazo, fortalecendo uma perspectiva de um corte na taxa de juros na próxima reunião em novembro. Acreditamos que, apesar das divergências dentro do Fed, acontecerá um corte de 25 pb, seguindo o padrão dos cortes antecedentes.

Outro ponto de estresse para o mercado americano é a abertura do processo de impeachment contra Donald Trump. A acusação teve origem em uma conversa com o presidente da Ucrânia em que Trump supostamente pede para que investiguem o filho de Joe Biden, que é o primeiro nas pesquisas dos pré-candidatos entre os democratas. Observamos que a possibilidade de impeachment seja baixa, visto que este é um processo demorado e as eleições para presidente dos EUA estão muito próximas.

Comentário Macroeconômico Brasileiro

No cenário doméstico, continuamos acreditando em um Brasil com uma recuperação gradativa para o médio prazo, porém, ainda lenta para o ano de 2019. Essa perspectiva se deve aos dados divulgados não tão fortes quanto as expectativas do mercado – vide IBC-BR, Pesquisa Mensal de Serviços e Vendas no Varejo – que tem impactado nas projeções para o PIB deste ano.

Fonte: Bacen

Com relação às políticas monetárias conduzidas pelo Bacen, vislumbramos um corte da taxa SELIC no final de outubro de mais 50 bps – resultando em 5,0%. Reiteramos que os dados de inflação estão vindo abaixo do esperado, como exemplo, a deflação de 0,04% em setembro de 2019 – menor taxa para o mês desde 1998 – o que auferiu uma inflação anualizada pouco menor que 3%.
Isto posto, avaliamos maior espaço para uma Selic inferior a 5%, convergindo, em um futuro de curto prazo, para nosso cenário base de 4,5%. Em cenários mais otimistas, eventualmente, a SELIC poderia chegar a 4%, caso a economia e, consequentemente, a inflação continuem com este comportamento.

Posted by Arthur Barbosa Magdaleno in Conjuntura Macro / Renda Fixa, 0 comments
Carta de Conjuntura Mensal Setembro 2019

Carta de Conjuntura Mensal Setembro 2019

Comentário Macroeconômico Mundial

O cenário global viu mais uma vez a escalada de tensões da guerra comercial na terceira semana de agosto. Dessa vez, a China anunciou novas tarifas de 5-10% sobre $75 bilhões em produtos americanos, com retaliação dos EUA no dia seguinte, que anunciou o aumento de 25% para 30% em $250 bilhões em produtos chineses. Contudo, buscando acalmar o cenário antes das próximas negociações entre os países em outubro, Trump adiou a imposição das tarifas anunciadas e, em resposta, a China isentou 16 categorias de produtos de tarifas extras. Observamos que, embora a atitude dos países demonstre uma posição mais flexível, continuamos não esperando uma solução para este problema em um curto horizonte de tempo.

As consequências negativas da guerra comercial na economia chinesa mostram-se ainda mais evidentes neste mês, com a queda de 0,8% do índice de preços ao produtor (PPI), o que contabilizou a pior contração ano a ano desde 2016. Esse dado fez a Fitch revisar a projeção de crescimento da China para 6,1% neste ano e 5,7% em 2020.

Somando-se a isso, um cenário conturbado a respeito do desenvolvimento da saída do Reino Unido da União Européia representa outro ponto de estresse para o crescimento da economia global. O primeiro ministro do RU, Boris Johnson, demonstra um forte viés para o acontecimento do Brexit, independente se este for feito sem acordo algum com a UE. Segundo Johnson, de um jeito ou de outro o RU vai sairá no dia 31 de outubro deste ano. Avaliamos que um “no-deal Brexit” seria prejudicial para a economia global, pois acarretaria no término do comércio livre da circulação de bens que os membros da UE gozam, havendo uma desvalorização da Libra. Esta queda na moeda do país causaria uma contração significativa em exportações de outros países para o RU, como os EUA, causando um impacto ainda maior na desaceleração global.

Outro ponto de destaque foi o maior grau de incertezas na conjuntura política da Argentina. O resultado das eleições primárias colocou em evidências um favoritismo pelo sucessor de Kirchner, Alberto Fernández, o que assustou investidores e acarretou uma venda massiva de ativos argentinos, desvalorizando a moeda do país em 30% em um único dia e aumentando o CDS do país para níveis não vistos desde agosto de 2016. Para tentar estabilizar o peso, o governo limitou o quanto de ativos em dólar os bancos podem ter em seu balanço. Tal medida estabilizou um pouco a situação. porém avaliamos como sendo algo provisório sem muita efetividade no longo prazo.

Em resposta a essa onda de complicações na Argentina no último mês, o FMI considerou atrasar o próximo pagamento de 5,4 bilhões dos 57 bilhões de dólares advindos do pacote de ajuda negociado com o país, até que sua situação política mostre-se mais estável. Entendemos que o pagamento por parte do FMI será postergado até os resultados eleitorais, que serão divulgados dia 27 de outubro deste ano.

Por fim, durante o mês de agosto, os dados referentes a economia global começaram a refletir todas as incertezas e o risco que observamos nos últimos meses. A zona do euro, em específico, cresceu apenas 0,2% no último trimestre, contra 0.4% do primeiro quarto deste ano. Essa desaceleração foi atribuída a queda do comércio e estagnação das exportações. Além disso, a Alemanha, que já demonstrava enfraquecimento da indústria, apresentou contração de 0,1% no PIB e pode entrar em recessão técnica no próximo trimestre. Como resposta, o BCE lançou uma nova onda de estímulos para a zona do euro, cortando as taxas de juros para -0.5% e o anunciando uma nova rodada de quantitative easing. Entendemos que esse cenário evidencia a aversão à riscos do mercado e que ele não deve ser revertido enquanto não forem encontradas soluções para o Brexit e a trade war.

Comentário Macroeconômico Brasileiro

A principal agenda de reforma do Brasil segue com tramitação dentro do legislativo, vide a aprovação da Reforma da Previdência na Câmara, a entrega do parecer da Reforma pelo relator Tasso Jereissati na CCJ do Senado e o andamento da PEC paralela para inclusão de estados e municípios, também nessa última Casa Legislativa. Mantemos a nossa expectativa de que o texto não sofrerá grandes desidratações no Senado, nem retornará à Câmara e que a promulgação pelo Congresso Nacional aconteça entre o final de setembro e início de outubro. Adicionalmente, entendemos que a aprovação da PEC paralela é um fator muito importante para a economia brasileira no longo prazo, visto a necessidade do Tesouro Nacional financiar as esferas municipais e estaduais.

Dentro do executivo, discussões acerca da Reforma Tributária continuam no Ministério da Economia, o qual busca alternativas para contornar a pequena discricionariedade dos recursos públicos e por consequência o estrangulamento das contas públicas. Durante o último mês (agosto), destacamos o resultado acima do esperado para o PIB do segundo trimestre (0,4% na comparação com o trimestre anterior frente a expectativa de 0,2%) o que fornece indícios de recuperação na economia. Também, destacamos o cenário perene na política monetária, com atividade econômica abaixo da expectativa observada no início do ano e inflação controlada, fatores que, aliados ao contexto de afrouxamento monetário no cenário internacional, contribuem para a manutenção da nossa expectativa de duas reduções de 50 bps na taxa Selic até o final do ano, com o primeiro corte na próxima reunião do Copom nos dias 17 e 18 de setembro.

Outro ponto que corrobora positivamente para o Brasil é a agenda de privatizações do governo, que aos poucos vem se desfazendo de alguns ativos – como exemplo a venda do controle da BR Distribuidora pela Petrobras no valor total de R$ 9,6 bilhões. Entendemos, também, que a saída de Marcos Cintra na Receita Federal alivia as tensões acerca de uma nova CPMF, o que, ao nosso ver, traria um problema – principalmente com desbancarização e aumento da informalidade – à economia brasileira para o longo prazo.

Conforme citado anteriormente, o PIB brasileiro no segundo trimestre de 2019 avançou 0,4% em relação ao trimestre anterior e 1,02% na comparação interanual, de acordo com dados do Sistema de Contas Nacionais Trimestrais divulgados pelo IBGE ao final do mês de agosto. Entendemos que, a despeito de uma expansão ainda lenta na atividade econômica em 2019, o crescimento entre o primeiro e o segundo trimestre do ano foi superior ao observado na taxa de variação do PIB no primeiro trimestre de 2019 e quarto trimestre de 2018, quando a economia brasileira permaneceu praticamente estagnada, com decréscimo de 0,12% e crescimento de 0,12%, respectivamente. Ao observar a variação do PIB pelos seus componentes de demanda, percebemos que a formação bruta de capital fixo (FBCF) apresentou oscilação significativa no segundo semestre de 2019, com crescimento de 5,27% na comparação interanual (variação do índice com ajuste sazonal) . Sendo a FBCF um dos componentes do Investimento, entendemos a variação como uma sinalização do aumento deste importante elemento do PIB.

Ademais, um fator que reforça nossa opinião é o indicador mensal de Formação Bruta de Capital Fixo calculado pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Segundo o Instituto, componentes da FBCF como o Consumo Aparente de Máquinas e Equipamentos e Construção Civil avançaram 8,46% e 2,26% no trimestre (variação do índice com ajuste sazonal) na comparação com o mesmo período em 2018.

O crescimento da economia brasileira no segundo semestre também foi acompanhado de ajustes nas expectativas de crescimento do PIB em 2019. As últimas estatísticas divulgadas no Relatório Focus mostraram maior otimismo do mercado, com a mediana das previsões passando de 0,82% no final de julho para 0,87% ao final de agosto e setembro.

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Carta de Conjuntura Mensal Agosto 2019

Carta de Conjuntura Mensal Agosto 2019

Conjuntura Internacional
No contexto da Guerra Comercial, o começo de agosto trouxe ainda mais incerteza ao mercado internacional. A escalada de tensões ocorreu em razão do anúncio por parte dos EUA, no dia primeiro, de que seriam impostas tarifas de 10% sobre outros $300 bilhões de produtos chineses, efetivamente taxando todas as mercadorias importadas. Tal movimento agitou o mercado, que esperava que a trégua anunciada por ambas as partes na reunião do G20 em junho contivesse o conflito e o levasse a um possível acordo. Consequentemente, esperamos que a disputa comercial não se resolva em um curto horizonte de tempo, podendo se estender até 2020, ano das eleições americanas.

Nos Estados Unidos, as empresas de tecnologia foram as mais afetadas pela guerra comercial, devido ao setor de produção de muitas dessas companhias estar fortemente atrelado ao mercado chinês. O segmento liderou as perdas dentro do índice S&P 500 com baixa de 1,25%. Impulsionado pelos resultados negativos do setor, o S&P fechou em queda de 0,46% na última semana.

Um outro lado desse conflito internacional que recebeu destaque no começo deste mês, foi a queda do Yuan chinês para os valores mais baixos desde a crise econômica de 2008. Esse movimento, muito atrelado às tensões do comércio global, fez com que o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos acusasse oficialmente a China de manipulação cambial. O motivo por trás dessa ação é que, mantendo a taxa de câmbio mais baixa, a potência asiática permanece competitiva mesmo com as novas tarifas anunciadas. Assim sendo, entendemos esse episódio como mais um catalisador de estresse na economia mundial.

Acerca da última reunião do Federal Reserve, nos dias 30 e 31 de julho, ocorreu um corte de 25 bps do Fed funds rate, menor que a expectativa média do mercado. Jerome Powell justificou o corte de juros como sendo um ajuste preventivo. Entendemos que as decisões subsequentes do Fed neste segundo semestre estarão atreladas fortemente a evolução da relação comercial entre os EUA e China.

Avaliamos, no entanto, que o Fed não possui muito espaço para cortar juros, com o intuito de “guardar munição” para uma situação econômica mais crítica, considerando principalmente o aumento da probabilidade de uma recessão. Além disso, a imprevisibilidade da trade war está trazendo incertezas para os mercados globais, aumentando a aversão ao risco do mercado. Com este cenário, houve uma fuga de capital para ativos notoriamente seguros, diminuindo, então, os juros em Treasury de 10 anos para 1,7% a.a, e os juros dos Bunds (títulos alemães) de 10 anos para -0.567% a.a. Isso elevou também o fluxo de capital para ativos com juros negativos, que atingiram o seu maior volume na história.

Identificamos também a possibilidade dos EUA desvalorizarem a sua moeda artificialmente, após falas do presidente Donald Trump sobre os benefícios que tal ação traria para o país. No entanto, para o curto prazo, pensamos que essa política parece improvável, visto que as reservas dos EUA necessárias não são significativas. Seria preciso uma mobilização política considerável para o governo conseguir apoio para movimentar um montante financeiro grande o suficiente que pudesse desvalorizar o dólar.

Na Europa, com a eleição de Boris Johnson, as discussões a respeito da saída do Reino Unido da União Europeia se intensificaram. O primeiro-ministro britânico adotou uma postura mais dura em relação ao Brexit, definindo uma data limite para o fim da relação. Não há um consenso entre os analistas do mercado sobre os impactos efetivos na economia do Reino Unido. Entretanto, no dia primeiro de agosto, o presidente do Banco da Inglaterra (BoE), Mark Carney, disse esperar uma separação “amigável” e, caso ocorra, os juros de mercado e a libra tenderiam a subir.

Comentário Macroeconômico Brasileiro

Durante o mês de julho e início de agosto, a tramitação da reforma da previdência no congresso superou nossas expectativas. Após aprovação do texto na câmara em segundo turno, a proposta seguiu para o Senado Federal com uma economia projetada para os próximos 10 anos de R$ 933 bilhões. Dentro do Senado, a reforma passará pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Casa e posteriormente será votada em dois turnos em plenário. Acreditamos que o texto não sofrerá grandes desidratações e que a emenda constitucional deva ser promulgada pelo Congresso Nacional entre o fim de setembro e início de outubro.

A redução do risco de insolvência fiscal do país e o alívio no endividamento governamental devem repercutir positivamente na economia brasileira e na percepção do risco soberano. Não obstante, entendemos que a reforma do sistema previdenciário é o primeiro passo, porém, não é suficiente para maior estabilidade econômica no longo prazo. No sentido de reformas estruturais, a MP nº 881 (apelidada de MP da Liberdade Econômica) e a reforma tributária visando a simplificação de impostos, pautadas pelo governo atual, devem contribuir para um ambiente favorável ao crescimento econômico.

Como ação de recuperação da atividade no curto prazo, ao final do mês de julho, o governo anunciou novas modalidades para saque do FGTS através da MP nº 889. Acreditamos que a medida será positiva para estimular o lado da demanda, com liberação de aproximadamente R$ 30 bilhões em 2019 e R$ 12 bilhões em 2020. Através da nova regra, dada a alta propensão marginal a consumir do brasileiro, acreditamos que o consumo terá um novo catalisador no segundo semestre de 2019.

Adicionalmente, ao final do mesmo mês, o Comitê de Política Monetária decidiu cortar a meta da taxa Selic em 50 basis-points, de 6,50% a.a. para 6,00% a.a.. Acreditamos que acontecerão mais dois cortes de 50 bps até o fim do ano, alterando a taxa de juros básica para 5,00% a.a. Haja vista o histórico de ciclos de corte de juros no país, como a partir de outubro de 2016, e a atividade ainda anêmica da economia brasileira, não descartamos o cenário da Selic abaixo de 5% a.a., dependendo da inflação observada no próximo semestre.

A partir do observado, no nosso entendimento a retomada significativa da economia ainda está por vir e vislumbramos alguns sinais de que alterações estão sendo feitas para destravar o crescimento. Nos últimos meses, principalmente em junho e julho, os índices de confiança do consumidor da construção e do varejo – elaborados pela FGV – mostraram sinais otimistas em relação ao crescimento. Posto isso, com o avanço dos importantes catalisadores citados, como retomada na confiança de consumidores e empresários e fechamento do grau de ociosidade da economia brasileira, esperamos uma mudança positiva no preço dos ativos brasileiros nos próximos meses.

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