Conjuntura Macro / Renda Fixa

CARTA DE CONJUNTURA TRIMESTRAL – 3T24 - No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do terceiro trimestre do ano de… Continue reading →
Carta de Conjuntura Trimestral – 2T24 - No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do segundo trimestre do ano de… Continue reading →
Carta de Conjuntura Trimestral – 1T24 - No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do primeiro trimestre do ano de… Continue reading →
Curva de Juros: Estimação, Modelos e Métodos de Otimização - A Estrutura a Termo da Taxa de Juros (ETTJ), também conhecida como Curva de Juros, expressa uma relação temporal entre… Continue reading →
Relatório Macro – Terceiro Trimestre - No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do terceiro trimestre do ano de… Continue reading →
Carta de Conjuntura Macro – Junho - O avanço da atividade econômica, a decisão de aumento de juros pelo Copom e a desaceleração da inflação ganham destaque… Continue reading →
Carta de Conjuntura Macro – Maio - A melhora nos resultados domésticos relativos à atividade econômica, com destaque para o mercado de trabalho, e a piora do… Continue reading →
Carta de Conjuntura Macro – Abril - A melhora nos resultados domésticos relativos à atividade econômica, a persistência inflacionária e o aumento das incertezas globais, com a… Continue reading →
Carta de Conjutura Macro – Março - Introdução O mês de março foi marcado, principalmente, pelas consequências inflacionárias causadas pelo conflito entre Rússia e Ucrânia, com destaque… Continue reading →
Carta de Conjuntura Macro – Fevereiro - O mês de fevereiro ficou marcado pelo início do conflito no Leste Europeu, com a invasão russa à Ucrânia, culminando… Continue reading →
CARTA DE CONJUNTURA TRIMESTRAL – 3T24

CARTA DE CONJUNTURA TRIMESTRAL – 3T24

No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do terceiro trimestre do ano de 2024, analisando os cenários econômicos nacional e internacionais.

Neste trimestre, destaca-se no cenário nacional o início do aperto monetário pelo Banco Central, em um contexto de mercado de trabalho aquecido e hiato do produto positivo. Além disso, as expectativas fiscais pioraram, e o IPCA se aproxima do teto da meta, pressionado por eventos climáticos.

No cenário internacional, as tensões no Oriente Médio e no Leste Europeu persistem. Destaca-se também o início do afrouxamento monetário pelo Federal Reserve para mitigar o risco de recessão, além das políticas de estímulo do governo chinês, que visam reviver a demanda e alcançar a meta de crescimento para 2024.

 

IPCA de 4,42% se aproxima do teto estabelecido pelo BACEN e ganha desafios com recentes eventos climáticos

 

A inflação de julho (+0,38%) teve um valor acima do esperado (+0,34%), impactado pelo aumento no preço das passagens aéreas (+19,39%), contribuindo com 0,11 p.p., impulsionado pelo aumento da demanda durante as férias escolares. Outro subitem que apresenta quase 6% de peso sobre o IPCA e que mostrou inflação de 3,15% (impacto de 0,16 p.p. sobre o Índice) foi a gasolina, dado ao ajuste de preços de 7,12% no preço de venda para a distribuidora, impactando o consumidor final em mais R$ 0,15 por litro. Além desses fatores, a energia elétrica residencial impactou o índice em 0,08 p.p., dado ao acionamento da bandeira amarela na tarifa de energia. Enquanto isso, o grupo de alimentação ajudou a conter a alta, registrando uma deflação de 0,22%. A maior queda foi no preço do tomate (-31,24%), devido ao aumento da oferta desse produto no mercado.

Para agosto, o IPCA apresentou uma deflação de 0,02%, ficando ligeiramente abaixo das expectativas do mercado de uma inflação de 0,01%. A deflação foi influenciada pela queda de preços no grupo de Alimentação e Bebidas (-0,44%), contribuindo com -0,09 p.p. no índice. No grupo, os itens que registraram as maiores quedas são tubérculos, raízes e legumes, com uma deflação de 16,31% na comparação mensal, justificada pela perda de qualidade da produção, consequência da falta de chuva e do calor intenso. Outro item que impactou o Índice foi a energia elétrica residencial (-2,77%), impactando com -0,11 p.p., e que foi influenciada pela volta da bandeira tarifária verde dado o volume de chuvas na região Sul do Brasil no mês. Por outro lado, o aumento no preço da gasolina (+0,67%) evitou que a deflação fosse ainda mais acentuada.

No mês de setembro o IPCA apresentou aceleração frente a agosto registrando alta de 0,44% frente às expectativas de 0,46% do mercado. Influenciada principalmente pela energia elétrica residencial com elevação de 5,36% no mês, impactando o índice em 0,21 p.p., que é justificado pelo acionamento da bandeira tarifária vermelha I, como consequência das secas que atingiram o país. Além disso, conforme anúncio da Aneel no dia 27/09, em Outubro foi acionado a bandeira vermelha patamar 2, indicando uma maior pressão no futuro próximo. O item de carnes também apresentou elevada pressão no índice com 0,07 p.p., dada inflação registrada de 2,97%, que por conta da estiagem e clima seco do período diminuem a qualidade da pastagem, que afeta o peso do gado e por fim impactando no preço da arroba. Além disso, o mês também foi impactado pelo aumento de preços do gás de botijão (2,40%), passagem aérea (4,64%) e plano de saúde (0,58%).

Fonte: IBGE e ANBIMA; Elaboração própria.

O índice de difusão, que mede a proporção de subitens do IPCA com alta de preços, foi de 47% em julho e subiu para 56% nos dois meses seguintes, influenciado por condições climáticas adversas e queimadas. O núcleo da inflação apresentou aceleração na passagem de julho (0,24%) para agosto (0,38%) e desaceleração no mês de setembro (0,21%), afetada por fatores semelhantes aos do índice de difusão. O IPCA acumulado no ano de 2024 se encontra em 3,31%, 0,19 p.p. inferior ao mesmo período de 2023, e, no acumulado de 12 meses, 4,42%, próximo ao teto da meta estabelecida pelo Banco Central de 4,50%, exigindo uma política monetária mais restritiva.

Fonte: IBGE e ANBIMA; Elaboração própria.

Taxa de desemprego em mínimas históricas evidencia desempenho robusto do mercado de trabalho


No mês de agosto, a taxa de desemprego alcançou o nível de 6,6%, o menor desde dezembro de 2014, representando uma redução de 1,2 p.p. em relação ao mesmo período do ano anterior e uma redução na margem de 0,3 p.p. Um dos fatores que explicam o desempenho é o crescimento do número de admissões nos meses de julho e agosto — juntos, somaram 423 mil novos empregados — 17% a mais que nos mesmos meses de 2023. Em agosto, o número de pessoas na força de trabalho alcançou 109,8 milhões, com 7,3 milhões de pessoas desocupadas e 3,1 milhões de desalentados, o menor número desde maio de 2016. 

Fonte: IBGE; Elaboração própria.

No período observado, a quantidade de pessoas ocupadas no setor industrial e no setor de comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas apresentou um aumento de 234 mil e 198 mil empregados, respectivamente. O número de empregadores apresentou um crescimento modesto de 1,7% na margem e uma queda de 0,02% em relação a junho. Outro ponto de destaque é a natureza do crescimento de empregos no setor privado, uma vez que se observou, no período de junho a agosto, um crescimento de 0,68% no número de empregos com carteira assinada e de 3,20% sem carteira assinada (+442 mil). No acumulado do ano até agosto, os serviços de administração pública, defesa, seguridade, educação, saúde humana e serviço social apresentam participação relevante no desempenho do mercado de trabalho, com o maior aumento no número de empregados, totalizando 592 mil (+3,28%).

O rendimento real médio de todos os trabalhos habituais mensais no mês de agosto foi de R$ 3.228, representando uma queda marginal de 0,09% em relação a junho e uma recuperação (+0,53%) em relação a julho, corroborando para um crescimento robusto na comparação anual, de 5,04%. No período, o salário real médio no setor privado informal apresentou um expressivo crescimento de 8,34%, assim como o setor industrial, alcançando o patamar de R$3.170 (+7,3% na comparação anual).

 

PIB do Brasil surpreende com alta de 1,4% no 2º Trimestre e projeção de crescimento para 2024 sobe para 3%

 

O trimestre também foi marcado pela divulgação do PIB do Brasil referente ao segundo trimestre de 2024. O produto interno bruto brasileiro cresceu 1,4% em relação ao trimestre anterior, com ajuste sazonal, superando tanto o resultado do trimestre passado quanto a mediana das projeções do mercado, que estimava um avanço de 0,9%. Na comparação anual, o PIB registrou um crescimento de 3,3%.

O setor de serviços apresentou uma alta de 1,0% na margem e 3,5% em termos anuais, sendo responsável por 2,0 pp da variação anual do PIB. Esse avanço foi generalizado, abrangendo áreas como comércio, atividades financeiras e transporte. O setor industrial também teve resultados positivos, com crescimento de 1,8% na margem e 3,9% interanual, contribuindo com 0,8 pp para o PIB. A indústria foi beneficiada pela recuperação dos investimentos e pela demanda interna robusta, especialmente nos segmentos de transformação e eletricidade.

Por outro lado, a agropecuária apresentou queda de 2,3% na margem e 2,9% na comparação anual. Essa retração foi atribuída principalmente às condições climáticas adversas, que prejudicaram a produção de culturas-chave como soja e milho.

Do lado da demanda, o consumo das famílias cresceu 1,3% na margem, mesmo percentual de aumento registrado no consumo do governo. Em termos anuais, o consumo das famílias avançou 4,9%, impulsionado por um mercado de trabalho aquecido e pelas políticas governamentais de elevação do salário mínimo e transferências de renda. Esse componente foi o maior contribuinte para o PIB, adicionando 3,1 pp à taxa de crescimento anual.

O PIB do segundo trimestre confirmou a melhora na sua composição, marcada por mais uma forte expansão da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), que cresceu 2,1% na margem e 5,7% em termos anuais. Esse aumento é atribuído ao crescimento da produção doméstica e da importação de bens de capital, além do bom desempenho nos setores de construção e desenvolvimento de sistemas de informática.

As exportações líquidas, no entanto, impactaram negativamente o crescimento, subtraindo 1,5 pp do PIB. Apesar do crescimento de 1,4% nas exportações, as importações aceleraram ainda mais, com alta de 7,6% na margem e 14,8% na comparação anual, reforçando a força da demanda interna.

Fonte: IBGE; Elaboração própria.

O Índice de Atividade Econômica (IBC-Br), que antecipa o desempenho do PIB, recuou 0,40% em julho, após uma alta expressiva de 1,40% no mês anterior. A expectativa era de uma queda de 0,9%, mas o recuo foi menor, marcando o primeiro declínio em quatro meses. Em agosto, o índice avançou 0,23% em relação ao mês anterior, superando as projeções de estabilidade. Na comparação anual, o IBC-Br registrou um aumento de 3,1%, enquanto no acumulado dos últimos 12 meses, o índice cresceu 2,5%.

A ocorrência de choques negativos, como a tragédia climática no Sul entre abril e maio, e a interrupção do ciclo de cortes na taxa Selic, decidida na reunião do Copom em junho, levou alguns analistas a revisar para baixo suas projeções para o PIB de 2024. No entanto, na divulgação mais recente, o carry-over subiu de 1,2% para 2,7%, indicando que, mesmo com estagnação nos próximos trimestres, o PIB já garantirá esse crescimento mínimo para o ano. Com isso, o Relatório Focus ajustou as expectativas para uma alta de 3%, refletindo um cenário mais otimista para 2024.

Na última ata do Copom, o Banco Central ressaltou que a atividade econômica tem mostrado um dinamismo superior ao previsto, levando à reavaliação do hiato do produto para o campo positivo. A combinação de um mercado de trabalho aquecido, política fiscal expansionista e o aumento das concessões de crédito às famílias continua a sustentar o consumo e a impulsionar a demanda agregada. Contudo, esse cenário de maior vigor econômico dificulta a convergência da inflação à meta, exigindo uma postura monetária mais contracionista para conter as pressões inflacionárias.

 

PMI Industrial e de Serviços flutuam em meio à demanda e pressões de custos no Brasil

 

Em julho de 2024, o PMI industrial atingiu 54,0 pontos, o maior nível em três meses, enquanto o PMI de serviços chegou a 56,4 pontos, o mais alto desde junho de 2022. Ambos os índices foram impulsionados pela forte demanda interna e externa. No entanto, os setores enfrentaram o impacto da desvalorização do real, que aumentou significativamente os custos dos insumos, forçando fabricantes e prestadores de serviços a reajustarem seus preços para proteger suas margens.

No mês seguinte, o cenário mudou, com o PMI industrial de agosto recuando para 50,4, indicando uma desaceleração da indústria, acompanhada por quedas na produção e nas vendas. Paralelamente, o PMI de serviços caiu para 54,2, o nível mais baixo desde abril, embora ainda se mantenha em território expansionista. Esse declínio foi impulsionado principalmente pela redução da demanda e pelas persistentes pressões inflacionárias, exacerbadas por problemas climáticos.

Já em setembro, o PMI industrial cresceu para 53,2, indicando uma melhora na produção, na criação de empregos e no aumento das vendas. No setor de serviços, o PMI subiu para 55,8, destacando-se pelo aumento expressivo dos novos pedidos, o maior registrado em 27 meses. Contudo, as pressões de custos permaneceram elevadas, especialmente em insumos como eletricidade e alimentos, resultando novamente no repasse desses encargos aos consumidores.

Fonte: Investing.com; Elaboração própria.

 

Déficit público exige que governo crie alternativas para elevar arrecadação e evitar o aumento da percepção de risco

 

O cenário fiscal do Brasil enfrenta desafios significativos devido ao aumento do déficit público e às incertezas nas contas públicas. Segundo o Ipea, os recentes ajustes de despesas visam alcançar um equilíbrio orçamentário, mas as previsões para o crescimento econômico permanecem moderadas.

O governo busca aumentar a arrecadação, e uma das medidas propostas é a “taxação das blusinhas”, que estabelece uma tarifa de 20% para compras internacionais abaixo de US$ 50. Essa nova imposição espera arrecadar cerca de R$ 700 milhões neste ano, conforme o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2025. No entanto, a implementação de reformas estruturais, como a tributária, ainda enfrenta desafios.

Além disso, o governo deve adotar uma estratégia de aumento da arrecadação para atingir a meta de resultado primário de zero déficit fiscal. Recentemente, houve uma piora nas expectativas para o resultado nominal de 2024 e 2025. As projeções passaram de -7,3% e -6,5% do PIB, segundo o relatório Focus de 26/07/2024, para -7,78% em 2024 e -7,3% em 2025, conforme o relatório Focus de 27/09/2024.

O contínuo déficit fiscal pode comprometer a confiança dos investidores e aumentar a percepção de risco, exigindo medidas fiscais mais rigorosas para estabilizar a economia e atrair investimentos estrangeiros.

 

Banco Central adota postura cautelosa frente a incertezas e instabilidades, com elevação das projeções

 

As expectativas de inflação, especialmente a do IPCA para o fim de 2024, apresentaram uma leve aceleração no último trimestre, passando de 4,1% para 4,37%. Essa variação reflete pressões ainda presentes nos preços de serviços e de alguns insumos alimentares.

Esse aumento sutil na inflação, combinado com a instabilidade do cenário interno e externo, foi influenciado por incertezas econômicas e crises geopolíticas, como a guerra na Ucrânia e a instabilidade no Oriente Médio, que contribuíram para uma mudança nas expectativas de juros.

Inicialmente em 10,5%, a taxa Selic foi elevada para 10,75%, marcando o início de um novo ciclo de alta. A expectativa é que o Banco Central adote uma postura cautelosa, buscando equilibrar o controle da inflação e a manutenção do crescimento econômico. A previsão é que a taxa básica atinja 11,75% até o final de 2024. Nesse contexto, a taxa de juros neutra da economia está projetada em 4,75% desde junho, segundo o Banco Central.

Fonte: Banco Central do Brasil; Elaboração própria.

 

Impactada pelo índice de moradia, inflação nos EUA surpreende gerando incertezas sobre futuro da da política monetária

 

Durante o terceiro trimestre de 2024, o índice de inflação ao consumidor (CPI) apresentou a mesma leitura para os meses de julho, agosto e setembro, com variação de 0,2%. Em julho, o número ficou em linha com a expectativa do mercado, destacando-se o aumento de 0,4% no índice de moradia (Shelter), responsável por 90% dos itens que registraram inflação no período. Em agosto, o índice também seguiu as previsões, sendo influenciado pela aceleração do Shelter (+0,5%) e pela queda nos preços de energia (-0,8%). Setembro, por sua vez, a leitura foi ligeiramente superior às expectativas, com uma queda robusta no preço da energia (-1,9%) e um aumento significativo nos preços dos alimentos (+0,4%), que, somados ao Shelter (+0,2%), contribuíram com 75% do aumento mensal dos itens.

Assim, o trimestre encerrou com um CPI acumulado de 12 meses de 2,4%, o menor nível desde fevereiro de 2021, mas ainda acima da meta estabelecida pelo FED, de 2%. O período foi influenciado pelos índices de moradia e alimentos, com altas de 4,9% e 2,3%, respectivamente, no acumulado. O item de energia apresentou uma expressiva queda de 6,8% nos preços, evitando uma inflação maior. Observando o core CPI, foram registradas leituras de 0,2% em julho e 0,3% em agosto e setembro, resultando em um acumulado de 3,3% nos últimos 12 meses, com uma aceleração marginal de 0,01 p.p. em relação ao acumulado de agosto. A elevação do núcleo da inflação ao fim do trimestre trouxe questionamentos ao mercado quanto à duração do ciclo de cortes nas taxas de juros adotado pelo banco central americano.

Fonte: U.S. Bureau of Labor Statistics; Elaboração própria.

 

Payroll – Iminência da recessão norte-americana surge com o trimestre e se dissipa ao decorrer do tempo

 

No terceiro trimestre de 2024, a economia americana observou um crescimento na taxa de desemprego (+0,02 p.p.) em julho, seguido de uma queda de 0,01 p.p. nos dois meses subsequentes, passando de 4,3% em julho para 4,1% em setembro.

O período foi marcado por surpresas, começando com a criação de empregos significativamente abaixo do esperado em julho (+114 mil empregos), além de um aumento expressivo no número de pessoas desempregadas (+352 mil), representando um crescimento de 21% em relação ao ano anterior. Somado a um aumento expressivo na força de trabalho (+420 mil), impulsionado pela imigração, esses dados geraram temores globais de uma recessão nos Estados Unidos. O aumento relevante da taxa de desemprego acendeu o alerta para a Sahm Rule, que indica uma recessão quando o desemprego aumenta mais de 0,5 p.p. na média móvel de três meses em relação ao valor mínimo da média móvel dos 12 meses anteriores.

Fonte: U.S. Bureau of Labor Statistics; Elaboração própria.

Em agosto, a criação de empregos novamente ficou abaixo das expectativas (+142 mil empregos), com 42 mil pessoas deixando o desemprego. Destacou-se a criação de 118 mil novos empregos no setor privado, e o aumento do rendimento médio por hora (+0,4% em relação a julho), alcançando US$35,21 por hora. O resultado do relatório de empregos (payroll) indicou que o mercado de trabalho estava desacelerando, mas sem sinais de colapso.

Por fim, em setembro, a criação de 254 mil novos empregos superou as expectativas do mercado. Essa recuperação, somada à queda na taxa de desemprego, gerou questionamentos sobre a eficácia da Sahm Rule e reduziu as preocupações de uma recessão na economia americana. O resultado foi impulsionado pela criação de empregos nos setores de educação e serviços de saúde (+81 mil), e lazer e hospitalidade (+78 mil), além de um novo aumento de 0,4% no rendimento médio por hora, que chegou a US$ 35,36.

 

Fed inicia afrouxamento monetário, mas permanece atento aos riscos inflacionários

 

Após o ciclo de alta na taxa de juros, implementado para controlar a inflação desenfreada em diversos países, observou-se o início do ciclo de queda de juros nos Estados Unidos. O Federal Reserve reduziu a taxa de juros de 5,5% para 5,0%, uma queda que superou as expectativas de alguns players do mercado, que previam uma redução para 5,25%, ou seja, uma diminuição de apenas 0,25 pp.

Fonte: U.S. Bureau of Labor Statistics; Elaboração própria.

 

Essa redução animou muitos participantes do mercado financeiro, que estavam receosos quanto a uma possível crise na principal economia do mundo. No entanto, o processo de diminuição da taxa de juros nos EUA deve ocorrer de forma gradual, uma vez que o banco central ainda considera os riscos inflacionários.

 

China passa a priorizar estímulos à demanda para atingir a meta de crescimento

 

No Plenário do Partido Comunista Chinês de julho, a ausência de novas iniciativas e estímulos gerou uma perspectiva econômica desalentadora, com a projeção de crescimento para 2024 reduzida para abaixo da meta governamental de 5,0%. A estagnação do setor imobiliário e do mercado acionário levou os investidores a buscar segurança em ativos de renda fixa e ouro, pressionando as taxas de juros para baixo. Além disso, a desaceleração na manufatura e nas exportações foi evidenciada pela queda do PMI industrial para 49,8 em julho e pelo crescimento de 7% nas exportações, abaixo do esperado.

A situação se agravou em agosto, quando a inflação anual alcançou apenas 0,6%, o menor aumento desde 1999. A inflação subjacente subiu apenas 0,3%, o nível mais baixo em três anos, o que pode adiar os gastos das famílias e o investimento empresarial. As vendas no varejo aumentaram apenas 2,1% em termos anuais, abaixo do esperado, mesmo durante o período de viagens de verão.

Em setembro, o CPI da China subiu apenas 0,4% em relação ao ano anterior, abaixo da expectativa de 0,6%. O índice de preços ao produtor (PPI) registrou uma queda de 2,8%, marcando o 24º mês consecutivo de deflação, resultado das flutuações nos preços das commodities e da demanda interna insuficiente. Para enfrentar esse cenário, o Banco Popular da China (PBoC) injetou 800 bilhões de yuans no sistema financeiro e considerou liberar mais 500 bilhões de yuans. O PBoC também reduziu a taxa de recompra reversa, a taxa de empréstimos de médio prazo e o coeficiente de reserva dos bancos, liberando 1 trilhão de yuans para aumentar o crédito. Outras medidas incluíram a diminuição da contribuição mínima para a compra de uma segunda residência e incentivos para que governos locais adquirissem imóveis não vendidos.

Fonte: Investing.com; Elaboração própria.

 

Apesar do anúncio, o mercado permanece cauteloso. As ações chinesas atingiram máximas de dois anos, aumentando 25% em poucos dias, e esse otimismo também foi sentido na bolsa brasileira, especialmente entre as exportadoras de commodities. No entanto, o mercado recuou à medida que o nervosismo aumentava devido à ausência de mais detalhes sobre os planos de gastos adicionais do governo. Essa incerteza levantou questões sobre a eficácia das medidas anunciadas, sugerindo que elas podem não ter sido suficientes para enfrentar os desafios estruturais da economia chinesa, e enfatizou a necessidade de políticas fiscais mais eficazes para combater a deflação e estimular a demanda de forma sustentável.

Nesse contexto, no dia 12 de outubro, o governo anunciou novas medidas fiscais, afirmando que ainda tem espaço para aumentar a dívida e o déficit fiscal, embora sem detalhar todas as iniciativas de estímulo. Entre as principais políticas estão a alocação de 400 bilhões de yuans para governos locais, o uso de 2,3 trilhões de yuans em bônus não utilizados e a ampliação do teto da dívida para reestruturar dívidas ocultas. Outras ações incluem a compra de terrenos ociosos e imóveis comerciais, priorizando habitações subsidiadas, além de considerar a abolição do imposto sobre valor agregado para edifícios residenciais e o aumento de subsídios para estudantes, em resposta ao recorde de desemprego juvenil em agosto. O ministro das Finanças também destacou a necessidade de reformas financeiras e tributárias para otimizar processos e estimular inovações.

 

Autores: João Pedro Melo Zimmermann, Diogo Rodrigues Machado e Vinícius Gallardo Ribeiro Rodrigues.

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Carta de Conjuntura Trimestral – 2T24

Carta de Conjuntura Trimestral – 2T24

No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do segundo trimestre do ano de 2024, analisando os cenários econômicos nacional e internacionais.

Neste trimestre, destaca-se uma conjuntura mais adversa no que se refere a economia nacional, gerando flutuações mais agressivas nas taxas de câmbio e fazendo com que o Banco Central interrompesse seu ciclo de corte nas taxas de juros.

Já no cenário internacional, os dados da economia norte-americana melhoraram ao longo dos últimos meses, dando abertura para que a autoridade monetária do país inicie um ciclo de corte de juros já no terceiro trimestre.

Atividade econômica

Durante o mês de abril observou-se uma expansão da indústria brasileira, baseada no otimismo e confiança dos empresários com relação ao número de vendas. No entanto, o mês de maio foi marcado pelas enchentes no Rio Grande do Sul, com os seus impactos negativos sobre a produção e logística, além do fechamento de empresas e a questão fiscal em torno da tragédia. Em junho o PMI Industrial voltou a expandir, mas de forma marginal devido à desvalorização do real. A desvalorização da moeda doméstica, cerca de 14,6% está entre as maiores do mundo em 2024 e exerce forte pressão sobre os custos das empresas, que repassam os valores e tornam-se menos competitivas internacionalmente. 

O setor de serviços ficou marcado pela resiliência, sendo que em maio atingiu o maior nível desde meados de 2022, motivado sobretudo pelo aumento da demanda. Em junho, o índice evidenciou um desaceleramento, instigado por mazelas decorrentes da tragédia no RS, bem como o aumento de custo em decorrência da questão cambial.

Atas do Copom

Na reunião de maio, o Banco Central destacou um ambiente mais adverso, em função da incerteza relacionada a política monetária dos Estados Unidos, que tem observado dados negativos que apontam para uma economia mais resiliente do que era inicialmente esperado. Por consequência, os discursos do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, têm sido rígidos ao apontar para uma política monetária contracionista por um maior período.

O adiamento do afrouxamento da política monetária na maior economia do mundo exige maior cautela das economias emergentes. No caso do Brasil, o cenário internacional adverso convergiu com momentos de incerteza fiscal e consequente desancoragem das expectativas de inflação, que contribuíram para um aumento dos prêmios de risco dos ativos financeiros.

Fonte: Ipea; Elaboração Própria.

A reunião de maio também ficou marcada pela discordância entre os membros do comitê, que divergiram sobre a magnitude do corte da taxa Selic, gerando incertezas e aumento em alguns vértices mais longos da curva de juros. Os membros que votaram pelo corte de 0,50 ponto percentual alegaram que o cenário prospectivo não divergiu o suficientemente do esperado para valer o custo reputacional do comitê de não seguir guidance, o que reduziria o poder das comunicações formais do comitê. Já os membros que votaram pelo corte de 0,25 ponto percentual, alegaram que mais importante do que o eventual custo reputacional de não seguir o guidance, é o risco de perda de credibilidade sobre o compromisso com o combate à inflação e com a ancoragem de expectativas.

Na reunião realizada em junho, o Banco Central novamente diagnosticou a mesma conjuntura internacional adversa e um cenário doméstico mais dinâmico do que o esperado, com dados surpreendendo em relação à formação bruta de capital fixo e consumo das famílias, sustentado por um mercado de trabalho resiliente, benefícios sociais e pagamento de precatórios.

Dado esses fatores, o comitê avaliou que o hiato do produto, que se encontrava levemente negativo, agora se encontra em torno da neutralidade. Vale ressaltar que ainda há incerteza dado os efeitos econômicos do Rio Grande do Sul, tanto em relação a intensidade da queda da atividade quanto a sua recuperação.

O comitê elevou a sua estimativa de taxa neutra de juros de 4,5% para 4,75%, destacando que a falta de disciplina fiscal, a diminuição no esforço para realização de reformas estruturais e o aumento do crédito direcionada tem o potencial de elevar a taxa de juros neutra. A elevação da estimativa da taxa neutra de juros era algo esperado, com economistas do mercado alegando que, em seus modelos, essa taxa já alcança patamares em torno de 6 pontos percentuais.

Na reunião também foi enfatizado a transmissão do ciclo de afrouxamento monetário para o mercado de crédito, em linha com o esperado. Apesar do endividamento alto das famílias, a demanda por crédito por pessoas físicas segue alta. No entanto, espera-se que a elevação nas taxas de juros de médio e longo prazo tragam menor dinamismo para o mercado de crédito.

Por fim, a reunião de junho resultou na decisão da manutenção da taxa de juros, em decisão unânime que demonstrou convergência dos membros do comitê, e foi vista pelo mercado como um fator positivo para a credibilidade dos novos membros em relação ao seu compromisso com o controle da inflação.

IBC-Br demonstra resiliência da atividade econômica

O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) se elevou cerca de 0,26% em abril, e 0,25% em maio, número abaixo das expectativas do mercado. Contudo, o índice mostra-se 1,30% maior do que o mesmo período em 2023, além de apresentar um crescimento acumulado em torno de 1,66% nos últimos 12 meses. Segundo o Banco Central, as vendas no varejo surpreenderam (1,2% de alta) enquanto que a indústria teve queda pelo segundo mês consecutivo.

O trimestre ainda foi marcado pela divulgação do PIB referente ao primeiro trimestre de 2024, com a expansão de 0.8% na economia, motivada sobretudo pelos serviços, além de que a indústria teve uma leve queda (-0,1%) e o setor agropecuário cresceu 11,3%. Apesar do crescimento significativo demonstrado pelo setor agro, a expansão foi menor do que a observada no mesmo período em outros anos, o que afeta a balança comercial devido a importância do segmento. Uma evidência positiva foi a ampliação da Formação Bruta de Capital Fixo pelo segundo trimestre consecutivo em decorrência do setor de construção civil, desenvolvimento de software bem como a importação de bens de capital. No entanto, quando comparada em termos relativos, houve uma queda da participação do investimento no PIB, visto que no primeiro trimestre de 2023, a categoria representava 17,1%, enquanto que no trimestre anterior se reduziu para 16,9%.

Fonte: Banco Central. Elaboração própria

IPCA – No 2º trimestre de 2024, os grupos de Saúde e cuidados pessoais e de Alimentação e bebidas ganham destaque.

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) apresentou um aumento de 0,38% em abril, ligeiramente acima da expectativa de 0,34%. Os principais fatores que contribuíram para o aumento foram os grupos de Saúde e cuidados pessoais (1,16%) e de Alimentação e bebidas (0,70%), que juntos responderam por 0,30 ponto percentual (pp) do índice. A alta nos preços dos produtos farmacêuticos, devido ao reajuste de até 4,50% autorizado pela CMED (Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos), e o aumento nos preços de alimentos como mamão (22,76%), cebola (15,63%), tomate (14,09%) e café moído (3,08%), afetados por fenômenos climáticos, foram determinantes para a aceleração da inflação no mês. No caso de Artigos de residência (-0,26%), destaque para a diminuição dos preços de computadores e televisores.

Em maio, a inflação brasileira foi de 0,46%, superando a projeção de 0,41%. O maior aumento foi observado no grupo de Saúde e cuidados pessoais, com uma variação de 0,69%, destacando-se pelos aumentos nos preços de planos de saúde (0,77%) e itens de higiene pessoal (1,04%), como perfumes (2,59%) e produtos para pele (2,26%), influenciados pelo aumento sazonal da demanda durante o Dia das Mães. Em segundo lugar, o grupo de Habitação registrou um aumento de 0,67%, com destaque para a energia elétrica residencial (0,94%), afetada por reajustes tarifários em diversas cidades. O grupo de Alimentação e bebidas também teve impacto significativo, com um aumento de 0,62%, sendo os tubérculos, raízes e legumes (6,33%) os principais responsáveis por essa elevação, com a batata-inglesa liderando com um aumento de 20,61%, devido a condições climáticas adversas e mudanças nas safras no Rio Grande do Sul. Outros alimentos como cebola (7,94%), leite longa vida (5,36%) e café moído (3,42%) também contribuíram para o aumento dos preços, devido a fatores sazonais e variações no mercado internacional.

Os efeitos do desastre climático no Rio Grande do Sul (RS) já impactaram os preços desde maio, com destaque para os alimentos. Na região metropolitana de Porto Alegre (POA), que compõe 8,6% do IPCA e foi severamente afetada, o índice de preços ao consumidor subiu 0,87%, em comparação com 0,42% nas demais áreas do índice e 0,46% na média nacional. As maiores discrepâncias foram observadas no gás de botijão, com um aumento de 7,39% em POA contra 0,36% nas demais regiões, e na alimentação no domicílio, com alta de 3,64% em POA frente a 0,34% nas outras áreas. Entre os alimentos, os preços de produtos in natura foram os mais afetados, embora se espere que esses aumentos se revertam rapidamente devido ao ciclo curto de produção. No entanto, o RS, que é um importante produtor de arroz e trigo (responsável por 70% e 40% da produção nacional desses produtos, respectivamente), viu os preços desses itens subirem em maio devido ao ciclo de produção mais longo.

Já em junho, a inflação foi de 0,21%, abaixo da expectativa de 0,29%. O grupo com maior variação foi Saúde e cuidados pessoais, que subiu 0,54%, impulsionado pelo aumento nos preços de perfumes (1,69%) e pelos reajustes nos planos de saúde (0,37%), autorizados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) com um reajuste de até 6,91%. Este aumento teve vigência a partir de maio de 2024 e impactou diretamente o IPCA de junho, incorporando os ajustes mensais relativos a maio e junho. O grupo de Alimentação e bebidas também teve impacto significativo, com alta de 0,44%, contribuindo com 0,10 pp para o índice. No grupo de Habitação, os preços subiram 0,25%, com aumentos significativos na taxa de água e esgoto, influenciados por reajustes tarifários em várias cidades.

O núcleo do IPCA teve variações de 0,27% em abril, 0,39% em maio e 0,23% em junho. Excluindo itens voláteis como alimentos e energia, essa medida oferece uma visão clara das tendências inflacionárias e auxilia na formulação de políticas econômicas e monetárias mais eficazes.

Fonte: ANBIMA; Elaboração própria.

O grupo Transportes, que possui o maior peso no índice de inflação com cerca de 21%, apresentou variações significativas nos preços ao longo dos meses. Em abril, houve um leve aumento de 0,14%, com a queda nas passagens aéreas (-12,09%) sendo contrabalançada pelos aumentos nos combustíveis, especialmente etanol (4,56%), gasolina (1,50%), e óleo diesel (0,32%), com a gasolina contribuindo com 0,08 pp no IPCA. Em maio, o grupo registrou uma alta de 0,44%, marcada pela primeira alta do ano nas passagens aéreas (5,91%) e aumentos contínuos nos combustíveis, etanol (0,53%), óleo diesel (0,51%), e gasolina (0,45%), além de aumentos no metrô (1,21%) e táxi (0,55%). Em junho, houve uma queda de 0,19%, devido principalmente à redução nos preços das passagens aéreas (-9,88%). Os combustíveis mostraram variações mistas, com aumentos na gasolina (0,64%) e etanol (0,34%), enquanto o óleo diesel (-0,64%) e o gás veicular (-0,61%) tiveram reduções.

Fonte: IBGE; Elaboração própria.

Paridade real/dólar apresenta elevada volatilidade

No início do ano de 2024, se esperava que o FED cortasse as taxas de juros dos Estados Unidos já no mês de março, porém os dados da economia americana demonstraram resiliência do mercado de trabalho e uma inflação persistente, fazendo com que as previsões dos cortes fossem redefinidas para final do ano. Por consequência, houve uma subida nos vértices da curva de juros norte-americana, direcionando a liquidez de outros países para os Estados Unidos e apreciando a moeda norte-americana em relação às demais.

No entanto, a taxa de câmbio real/dólar passou por uma desvalorização mais significativa do que a internacional no segundo trimestre de 2024, efeito que ocorre por múltiplos fatores como a recente mudança da meta de resultado primário pelo Governo Federal, que causou perda de credibilidade do governo perante o mercado, que se mantém cético em relação ao compromisso da atual gestão em relação ao cumprimento das metas fiscais.

Fonte: Ipea; Elaboração própria.

Na economia real, as taxas de câmbio efetivas reais têm permanecido em patamares abaixo da pandemia ocorrida 2020, quando houve uma forte desvalorização nominal. Quando se aplica o INPC como deflator da taxa de câmbio, as taxas ficam em níveis similares aos do fim de 2019, indicando uma menor variação em relação ao valor de produtos manufaturados. Já quando deflacionados pelo índice IPA, as taxas estão em valores consideravelmente menores que os praticados ao final de 2019, de forma que as taxas de câmbio ajustadas diminuíram para produtos básicos e bens intermediários.

Fonte: Ipea; Elaboração própria.

Mercado de trabalho – setor público impulsiona a redução da taxa de desocupação

No trimestre de abril a junho, a taxa de desocupação alcançou 6,9%, o menor índice em 10 anos, marcando uma redução de 1,0 pp em relação ao trimestre anterior e de 1,1 pp em comparação ao mesmo período do ano passado. O número de pessoas desocupadas foi de 7,5 milhões, em uma força de trabalho total de 109,4 milhões.

O setor público destacou-se com um crescimento significativo de 5,3% no número de empregados, especialmente na Administração Pública, Defesa, Seguridade Social, Educação, Saúde Humana e Serviços Sociais, que aumentou 4,8%, acrescentando 852 mil pessoas ao contingente de trabalhadores. Os empregadores também apresentaram um crescimento notável de 4,0%, refletindo um aumento no número de empresários. Em contraste, os empregados no setor privado sem carteira de trabalho assinada cresceram 3,1%, indicando um aumento na informalidade, enquanto os empregados com carteira assinada tiveram um crescimento mais modesto de 1,0%.

O número de pessoas desalentadas caiu para cerca de 3,2 milhões, uma redução de 9,6% em relação ao trimestre anterior e de 11,5% em comparação ao mesmo período do ano passado. O percentual de pessoas desalentadas em relação à força de trabalho foi de 2,9%, marcando uma queda de 0,3 ponto percentual em relação ao trimestre anterior e de 0,4 ponto percentual em comparação ao ano passado.

O rendimento médio mensal real habitualmente recebido pelas pessoas ocupadas foi de R$ 3.214, com um crescimento de 1,8% em relação ao trimestre anterior e de 5,8% em relação ao mesmo período do ano passado. O aumento foi notável na Administração Pública e nas categorias da Indústria, Comércio, Transporte, Alojamento e Alimentação. Em termos de posição na ocupação, os rendimentos aumentaram para empregados com e sem carteira assinada, no setor público e trabalhadores por conta própria. A massa de rendimento real totalizou R$ 322,6 bilhões, apresentando um aumento de 3,5% em relação ao trimestre anterior e de 9,2% em relação ao ano passado, refletindo um acréscimo significativo na remuneração global.

Esse desempenho robusto do mercado de trabalho é uma das principais surpresas positivas da economia nos últimos anos, embora também represente um desafio para a política monetária.

Fonte: IBGE. Elaboração própria.

EUA

O trimestre teve sentimentos mistos na economia americana, com uma queda da produção industrial em abril, mostrando uma certa estagnação, seguida de uma expansão de 0,9% no mês de maio, atingindo o maior nível em 22 meses. Já em junho, a economia cresceu aproximadamente 0,6%, acima das expectativas do mercado, que previa uma expansão de 0,3%. No varejo a economia demonstra estagnação, com pouquíssima mudança no indicador, apesar de superar as projeções de queda. O Índice de confiança do consumidor sofreu negativamente durante o período, com o registro de três quedas consecutivas. Entre os motivos destacam-se o enfraquecimento do mercado de trabalho e a estagnação da renda.

Payroll – Mercado de trabalho dos EUA mostra estabilidade geral com uma taxa de desemprego em torno de 4%.

Os dados ajustados do payroll indicam que, em abril, foram adicionados 108.000 novos empregos, em maio, 218.000 e em junho, 206.000. Os principais setores responsáveis por esses ganhos foram saúde, governo e assistência social. O setor de varejo apresentou um aumento de 20.000 empregos em abril e continuou a crescer em maio com 13.000 novos postos, embora tenha registrado uma diminuição de 9.000 empregos em junho. Destaca-se também o setor governamental, que adicionou 70.000 empregos em junho.

Os indicadores do mercado de trabalho dos EUA mostraram estabilidade geral. A taxa de desemprego manteve-se em torno de 4%, com uma leve elevação para 4,1% em junho, enquanto o número de pessoas desempregadas variou de 6,5 milhões a 6,8 milhões. A taxa de participação na força de trabalho permaneceu estável, com 62,7% em abril e 62,6% em junho, e a razão emprego-população não apresentou mudanças significativas, situando-se em 60,2% em abril e 60,1% em maio e junho. Comparado ao ano anterior, os índices são mais altos, com a taxa de desemprego subindo de 3,6% para 4,1% e o número de desempregados aumentando de 6,0 milhões para 6,8 milhões.

Em relação aos salários, o ganho médio por hora para todos os empregados no setor privado fora do setor agrícola aumentou 0,2% em abril, 0,4% em maio e 0,3% em junho, atingindo $35,00. Ao longo dos últimos 12 meses, o ganho médio por hora cresceu 3,9%. Em junho, o ganho médio por hora dos empregados do setor privado em produção e não supervisionados aumentou para $30,05.

Fonte: U.S. Bureau of Labor Statistics. Elaboração própria.

CPI – Inflação estadunidense cai pela primeira vez em quatro anos, enquanto o índice de habitação mostra desaceleração em junho.

Em abril, o CPI aumentou 0,3%, abaixo da expectativa de 0,4%, com subidas em habitação e gasolina, enquanto o índice de alimentos permaneceu estável. Em maio, o índice ficou inalterado, em contraste com a previsão de 0,1% de aumento, devido à queda nos preços da gasolina compensada pelo aumento em habitação e alimentos fora de casa. Em junho, o CPI caiu 0,1%, marcando o primeiro declínio mensal desde maio de 2020, e ficou abaixo da expectativa de alta de 0,1%. A queda acentuada nos preços da gasolina e da energia superou os aumentos em habitação e alimentos fora de casa. O núcleo da inflação, excluindo alimentos e energia, apresentou aumentos menores nos três meses, com variações de 0,3% em abril, 0,2% em maio e 0,1% em junho, evidenciando uma desaceleração no crescimento dos preços subjacentes. Nos últimos 12 meses, o índice geral subiu 3,0% antes do ajuste sazonal.

Em abril e maio de 2024, o CPI Shelter (índice de habitação) subiu 0,4% em cada mês. A elevação foi impulsionada por aumentos semelhantes nos índices de aluguel e aluguel equivalente dos proprietários, enquanto a hospedagem fora de casa registrou uma leve queda. No entanto, em junho, o índice de habitação subiu apenas 0,2%, com os índices de aluguel e aluguel equivalente dos proprietários aumentando 0,3% — os menores aumentos desde agosto de 2021. Apesar da desaceleração mensal, o índice de habitação subiu 5,2% no último ano, representando quase 70% do aumento total de 12 meses no índice geral excluindo alimentos e energia.

Fonte: U.S. Bureau of Labor Statistics. Elaboração própria.

China

A economia chinesa manifesta uma estagnação econômica, evidenciada pelos fracos resultados do PMI Industrial e de serviços durante o trimestre. O governo chinês segue sob forte pressão para encontrar uma maneira de acelerar a atividade econômica, já que as medidas de estímulo ao consumo ainda não geraram os fins objetivados. Nesse contexto, há uma batalha por reacender a confiança do consumidor, que apresenta uma trajetória decrescente neste ano, apesar de alguns picos.

Fonte: Thomson Reuters; Elaboração própria.

Argentina apresenta melhoras estruturais

Na Argentina, a inflação passou de 25% ao mês em dezembro de 2023 para 4.2% em maio, com a projeção de uma inflação acumulada de 140% em 2024 frente a 211% no ano anterior. A agenda de equilíbrio fiscal é um dos principais pontos defendidos pelo novo governo, com um brusco corte nos gastos públicos e o postergamento de pagamentos que geraram um superávit de 0.4% nos cinco primeiros meses do ano. A continuidade desse reajuste depende da aplicação da Lei de Bases (aprovada com dificuldade e restrições devido à falta de poder no parlamento). Entre as principais medidas estão: a permissão para privatizar algumas estatais como a petrolífera Enarsa; flexibilização de leis trabalhistas; desregulação do mercado de gás natural.

Em relação à acumulação de reservas internacionais houve um avanço significativo, auxiliado sobretudo pela exportação do setor petrolífero e do agropecuário (historicamente forte no primeiro semestre), mas que não deve se repetir no segundo semestre, o que dificulta o processo de recomposição de reservas.

Commodities

A amenização da escalada de conflitos geopolíticos, principalmente no Oriente Médio, aliviou o preço do petróleo, com a previsão de redução dos cortes da OPEP+ em meados de 2024, além da ampliação de produção por países de fora do bloco, como Canadá. Em relação ao gás natural, houve uma elevação de preços ocasionada pelo incremento da demanda vinda da Ásia, bem como problemas de produção em locais chave e preocupação sobre o relacionamento entre a Rússia e a Europa. Cabe destacar que a Europa apresenta estoques em um nível recorde, sendo que a Rússia se tornou, novamente, em maio o maior fornecedor de gás natural do continente europeu, com cerca de 15% do market share.

A soja teve uma expansão de preço em abril e junho, sobretudo devido à valorização do dólar e às preocupações com os estragos das enchentes no sul. Entretanto, em junho, mesmo com o fortalecimento do dólar, a desvalorização da commodity na Bolsa de Chicago gerou uma retração no preço interno (resultantes de um excesso de oferta em relação à demanda). A cultura de milho também apresenta uma estagnação e retração devido à oferta elevada, com uma safra brasileira mais avançada e em razão de excelentes produções na Argentina e nos Estados Unidos.

Políticas monetárias internacionais seguem linhas divergentes

Em junho, o Banco Central europeu reduziu a sua taxa de juros em 0,25 ponto percentual, atingindo o patamar de 4,25%. A decisão foi tomada a medida que a inflação se aproxima da meta de 2% anteriormente estipulada. Porém, a instituição monetária não deixou um guidance claro para a decisão da próxima reunião, reforçando sua atenção com os dados que serão recebidos ao longo do tempo, principalmente relacionado aos preços atrelados à energia e serviços, que têm sido os principais componentes da inflação europeia no período recente.

Em contraste com as medidas apresentadas pelo Banco Central europeu, o Banco Central do Japão encerrou sua histórica política de taxa de juros nominal negativa no final do primeiro trimestre de 2024, com declarações de seus representantes abrindo espaço para novos aumentos nas taxas de juros. Durante o segundo trimestre o país apresentou taxas crescentes de inflação, aumentando as expectativas do mercado em relação a um aumento ainda maior nas taxas de juros do país.

As movimentações do Banco Central japonês são relevantes, pois além do país ser a quarta maior economia do mundo, também é considerado um grande exportador de poupança, que provê liquidez para o mercado financeiro global. Caso haja um aumento contínuo na taxa de juros do país, poderá haver uma maior retenção de poupança no país, retirando liquidez dos demais países e causando uma performance positiva do iene em relação às principais moedas globais, dada a diminuição do diferencial das taxas de juros entre Japão e as outras principais economias mundiais.

Apesar da melhora dos dados em relação a inflação nos últimos meses, o presidente do Banco Central norte-americano, Jerome Powell, adotou uma postura mais rígida em seus discursos durante o segundo trimestre de 2023, reforçando a postura cautelosa da autoridade monetária e arrefecendo os mercados durante o período. A estratégia tem sido bem-sucedida e se espera que, caso os dados de inflação e desemprego sigam tendência recente, haja um corte na taxa de juros dos Estados Unidos ainda no terceiro trimestre.

 

Autores: Gustavo Minatto Martins; Marcos Vinicius Thibes Petussi; João Pedro Melo Zimmermann.

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Carta de Conjuntura Trimestral – 1T24

Carta de Conjuntura Trimestral – 1T24

No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do primeiro trimestre do ano de 2024, analisando os cenários econômicos nacional e internacionais.


Neste trimestre, no cenário nacional, se destacam as incertezas quanto às trajetórias da inflação e da dívida pública, assim como seus consequentes efeitos sobre a taxa de juros e a economia real.


Já no cenário internacional, se destacam as tensões no Oriente Médio e os recentes dados da economia estadunidense, que pode estar mais distante de um ciclo de corte na taxa de juros do que o esperado no final de 2023.


Evolução da inflação brasileira mostra sinais de incerteza e exige cautela por parte do Banco Central em suas próximas decisões.


No mês de janeiro a inflação teve um valor de 0,42%, acima do esperado, em razão principalmente dos preços dos alimentos, impactados pelas consequências do El Niño. Em fevereiro, o reajuste das mensalidades escolares fez com que o mês surpreendesse as expectativas, com um valor de 0,83%. Já em março, a inflação surpreendeu positivamente, tendo uma desaceleração maior do que o previsto, com 0,16% frente às projeções de mercado. Esse cenário mais benigno foi influenciado pela desaceleração do setor de alimentos e bebidas (embora ainda tenha tido a maior alta, impactado pelos fatores climáticos), além de uma deflação no segmento de combustíveis, influenciado pela queda da gasolina e das passagens aéreas.


No entanto, o alívio do setor de combustíveis pode ser passageiro, visto que, segundo dados do Centro Brasileiro de Infraestrutura (19/04/2024), os preços praticados pela Petrobras da gasolina e do diesel estão defasados em 27,09% e 5,41% respectivamente. A empresa brasileira realizou o último ajuste em dezembro de 2023 e provavelmente irá postergar ainda mais o reajuste, já que o presidente da corporação está com relações desgastadas com o atual governo e um eventual aumento dos preços arruinaria o relacionamento.

O índice de difusão (número de componentes que tiveram aumento de preços) caiu durante o período, tendo os valores 65%, 57% e 56% nos três primeiros meses. O número poderia ser ainda menor, mas em março houve um incremento no número de itens alimentícios com crescimento nos preços. O núcleo de serviços subjacentes (exclui os itens mais voláteis e costuma ser menos sensível à política monetária) está pressionado pelo mercado de trabalho e é observado com cautela, já que em janeiro surpreendeu com uma alta de 0,76%, apesar de abrandar para 0,45% nos dois meses seguintes.


Um dos fatores de atenção para a continuidade da menor pressão dos preços é a questão fiscal, que está cercada de incertezas. O consolidado do setor público superou as expectativas em janeiro e apresentou um superávit de R$102 bilhões, ao passo que em fevereiro teve um déficit de R$48 bilhões, além de um déficit de R$1,5 bilhão em março, totalizando um superávit acumulado de R$19,4 bilhões no primeiro trimestre, abaixo do resultado apresentado no mesmo período do ano passado. Cabe lembrar que o ano é marcado pelas eleições municipais e pelo histórico populismo econômico relacionado ao período. No entanto, existem expectativas de que as novas fontes de arrecadação (apostas esportivas, investimentos Offshore, fundos exclusivos) possam reduzir parcialmente o risco fiscal. Somente em janeiro, aproximadamente 29% dos tributos de Rendimentos de Capital tiveram como origem os fundos exclusivos.

Mercado de trabalho brasileiro segue aquecido. 

Apesar da sazonalidade de janeiro, o Brasil apresentou aceleração do emprego em fevereiro, com 306 mil vagas criadas, sobretudo no setor de serviços (63% do número). Ademais, nota-se um reaquecimento da mediana dos salários de admissão (para o primeiro trimestre de 2024, utilizou-se somente dados de janeiro e fevereiro), o que pode dificultar a desinflação de serviços. Com uma taxa de 7,8% de desemprego, número historicamente baixo, a questão do equilíbrio do mercado de trabalho pode dificultar o processo de desaceleração salarial. No último trimestre de 2023 houve um aumento da participação no mercado de trabalho e caso a tendência tenha continuidade, pode tornar o cenário mais benigno.


IBC-Br– Atividade econômica segue resiliente liderada pelo varejo. 

Segundo o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), a economia avançou 0,6% em janeiro e 0,4% em fevereiro de 2024, em ambos os meses se destacou o setor de varejo, que se beneficiou da inflação controlada e o aumento da massa salarial. O comércio varejista avançou 2,5% no conceito restrito (bens não-duráveis e semi-duráveis) e 2,4% no conceito ampliado (que engloba também bens duráveis, como veículos e materiais de construção), superando os tetos das projeções e indicando resiliência no setor. No mês de fevereiro, o varejo restrito cresceu 1%, novamente superando as expectativas, resultando em uma alta acumulada de 6,1% em relação aos dois primeiros meses de 2023. Já o varejo ampliado, avançou 1,2%, perto do teto das estimativas, acumulando uma alta de 8,2% em relação ao mesmo período no ano anterior.

No mês de janeiro houve crescimento de 0,7% no setor de serviços na comparação com dezembro de 2023, com alta em quatro das cinco categorias que compõem o índice, com exceção de serviços prestados às famílias, que devolveu a forte alta do último mês do ano de 2023. O destaque ficou com o segmento de serviços de informação e comunicação, que foi impulsionado pelo crescimento da receita das empresas que atuam na produção de conteúdo para TV e streaming. Já no mês de fevereiro, o setor de serviços retraiu em 0,9%. A retração vem em linha com a expectativa de acomodação do setor em 2024, com as atuais quedas compensando os meses de alta recentes. Das 5 categorias pesquisadas, apenas o segmento de serviços prestados às famílias apresentou uma leve alta (0,4%).

No mês de janeiro a produção industrial recuou em 1,6%, com destaques positivos para o setor de bens de capital que avançou em 9,3%, enquanto o setor de bens intermediários recuou 2,7%. Da mesma forma, no mês de fevereiro o setor industrial novamente recuou 0,3%, com destaques positivos para o setor de bens duráveis (3,6%) e negativos novamente para o setor de bens intermediários (contração de 1,2%). Apesar da contração geral no setor, há uma composição positiva nos resultados, com alta relevante na fabricação de veículos e insumos para construção civil, indicando aumento de investimentos. No entanto, setores relevantes impactaram negativamente os resultados gerais, como a leve retração na produção de alimentos e a estabilidade na produção de combustíveis. No mês de fevereiro, também houve forte retração no setor químico (3,5%) e de produtos farmacêuticos (6,0%). Por fim, o mês de março finalmente registrou uma alta de 1,1% para a indústria, puxada pelo setor de derivados de petróleo.


Concessões de crédito voltam a evoluir depois de período de incertezas.

No primeiro trimestre de 2024, o efeito das políticas de afrouxamento monetário e incentivo ao consumo começaram a ser sentidos no mercado de crédito. Houve uma notável diminuição da inadimplência para pessoas físicas, decorrente não só da redução da taxa básica de juros, mas também dos programas de renegociação de dívidas promovidos pelo governo federal no último ano, permitindo um crescimento de 14,7% na concessão de crédito livre para pessoas físicas entre jan/23 e jan/24. No entanto, é necessário observar a piora na composição da carteira de crédito contratado, com aumentos na modalidade de crédito de alto custo (cheque especial, crédito pessoal, cartão parcelado, entre outros) e diminuição nas de baixo custo (crédito consignado, financiamento de veículos, entre outros).

No entanto, a inadimplência ainda é crescente entre as empresas, que sofreram não apenas com aumento do custo de crédito nos últimos anos, como também com os impactos nos custos de seus insumos e na desaceleração do crescimento da demanda. No geral, houve uma queda na concessão de crédito no começo de 2023, quando a aversão ao risco aumentou com pedidos de recuperação judicial por parte de grandes empresas, impactando principalmente modalidades de recebíveis como a de risco-sacado. Contudo, o segundo semestre de 2023 deu início a uma retomada no apetite por crédito, que continuou no primeiro mês de 2024, que registrou um aumento de 8,7% em relação a janeiro de 2023.

Esses fenômenos podem ser explicados pela queda da taxa básica de juros e da curva longa da ETTJ, que tiveram como consequência uma queda no índice de custo de crédito brasileiro, que reduziu durante o ano de 2024. Com isso, tendências observadas no ano de 2023 começaram a ser revertidas no primeiro trimestre de 2024 e tendem a melhorar durante o resto do ano. Por exemplo, a formação bruta de capital fixo da economia brasileira que teve sucessivas quedas durante os últimos 3 trimestres do ano passado, voltou a variar positivamente no primeiro trimestre deste ano, uma notícia positiva para a produtividade do país e para o controle da inflação de longo prazo.


PMI de serviços e industrial reforçam perspectiva de resiliência da economia brasileira.

Mesmo diante do cenário de incertezas relativas à inflação e a economia internacional, a indústria brasileira tem demonstrado um crescente otimismo no último trimestre, com os dados do PMI industrial crescendo consideravelmente no primeiro trimestre de 2024. As boas perspectivas se devem principalmente à recuperação da demanda do setor, com o volume de novos pedidos aumentando pelo terceiro mês consecutivo em março, a taxa mais forte em dois anos e meio. Além disso, o setor teve um considerável aumento de produção em março, com a demanda interna sendo o principal vetor de impulso ao setor. No entanto, a demanda externa se apresentou como a maior vulnerabilidade do setor, apresentando queda pelo 25° mês seguido.

A queda da taxa de juros é um importante vetor para o crescimento da indústria nacional, com a desaceleração da inflação mais intensa do que as estimativas do mercado previam para março de 2023, reforçou-se uma perspectiva de continuidade no ritmo de corte da Selic por parte do Banco Central. No entanto, fatores externos têm impactado negativamente para que essas expectativas se concretizem, pondo em dúvida se haverá um novo fôlego substancial para a indústria, que em fevereiro aumentou seu estoque de insumos pela primeira vez em 6 meses, a fim de atender ao maior apetite dos clientes.

Já o crescimento do setor de serviços, tem se demonstrado resiliente, indicando bons sinais de otimismo que se mantiveram por boa parte do ano de 2023. Com exceção das categorias de imóveis e serviços comerciais, o setor de serviços registrou aumento no nível de atividade no primeiro trimestre, com as vendas subindo desde outubro de 2022 e o crescimento contínuo de novos negócios.


Atas do Copom.

Nas duas primeiras atas do Copom de 2024, é afirmado que os indicadores recentes de atividade econômica apontam para uma desaceleração da economia, conforme esperado pelo Comitê. No entanto, na publicação mais recente, observa-se uma moderação no crescimento econômico, porém, com maior dinamismo em alguns indicadores na margem. Isso sugere que a desaceleração pode estar ocorrendo a um ritmo mais lento do que o inicialmente previsto, e há áreas da economia que estão se expandindo de forma mais robusta. Por fim, o mercado de trabalho segue aquecido e com aceleração nos rendimentos reais.

Também é afirmado que a inflação ao consumidor está seguindo a trajetória esperada de desinflação. No entanto, os indicadores que agregam os componentes mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária se situam acima da meta para a inflação nas divulgações mais recentes, o que difere do que foi observado na primeira ata, onde os indicadores estavam mais próximos da meta. Apesar disso, as expectativas de inflação para 2024 e 2025 apuradas pela pesquisa Focus mantêm-se em torno de 3,8% e 3,5%, respectivamente. 

As projeções para a inflação de preços administrados, tanto os diretamente regulados pelo governo quanto aqueles com sensibilidade reduzida aos fatores de oferta e demanda, muitas vezes devido a contratos ou acordos prévios, aumentaram de 4,2% para 4,4% para 2024 e de 3,8% para 3,9% para 2025.

Cenário fiscal – Aumentam preocupações após possíveis mudanças no PLDO, enquanto medidas tributárias mostram impacto positivo na arrecadação, apesar do gasto público acompanhar o crescimento.

As possíveis mudanças no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) aumentaram as preocupações com o cenário fiscal no Brasil. Em entrevista recente, o atual ministro da economia afirmou que o governo pretende encaminhar ao Congresso uma proposta de alteração da meta do arcabouço fiscal para 2025, a qual seria inferior à meta de superávit de 0,5% do PIB. Vale ressaltar que o arcabouço fiscal foi aprovado pelo mesmo governo em agosto do ano passado. Essa perspectiva levanta questionamentos sobre a credibilidade do arcabouço fiscal do país.

Por outro lado, uma série de propostas legislativas aprovadas pelo Congresso Nacional no final de 2023 visa contribuir para a recomposição da arrecadação. Essas propostas incluem a tributação de offshores, trusts e fundos exclusivos, a taxação de apostas eletrônicas e mudanças no tratamento de subvenções concedidas pelos entes federativos. No entanto, a magnitude do impacto dessas medidas ainda é incerta e precisa ser observada ao longo do ano.

Em janeiro, as medidas de tributação tiveram um impacto positivo na arrecadação, com um aumento real de 6,9% em relação ao ano anterior. No entanto, as despesas do Governo Central também cresceram, principalmente devido aos aumentos no salário mínimo e nos salários dos servidores públicos, além da indexação dos gastos com saúde e educação. Apesar disso, o Governo Central registrou um superávit primário significativo de R$81 bilhões, impulsionado pela sazonalidade favorável. Com a contribuição dos governos subnacionais, o setor público consolidado alcançou um superávit de R$102 bilhões, semelhante ao observado em janeiro de 2023.


Banco Central – Incerteza na sucessão do presidente preocupa investidores.

Roberto Campos Neto, atual presidente do Banco Central, encerra seu mandato em 31 de dezembro deste ano. Ele é o primeiro líder da instituição desde que obteve sua autonomia. Inicialmente indicado pelo presidente em exercício na época, Campos Neto foi reconduzido após a aprovação da autonomia do BC, permanecendo até 2024. Durante sua gestão, enfrentou pressões políticas do atual chefe do executivo, que buscava uma redução mais acelerada das taxas de juros.

A escolha do novo presidente do Banco Central é prerrogativa do governo federal, que já iniciou as discussões sobre a sucessão. Entre os possíveis candidatos estão Gabriel Galípolo e Paulo Picchetti, indicados por Lula e com vínculos políticos próximos. Galípolo, que teve destaque na campanha eleitoral, foi braço-direito do ministro Fernando Haddad no início do governo, enquanto Picchetti atuou como diretor de Assuntos Internacionais e Gestão de Riscos Corporativos. A incerteza em torno da transição no comando do Banco Central tem dificultado a convergência das expectativas de inflação para a meta de 3% nos próximos três anos, o que tem gerado preocupações entre os investidores sobre uma possível alteração na política monetária. José Júlio Senna, do FGV Ibre, ressalta que o problema da transição não está diretamente ligado aos nomes dos possíveis sucessores, mas sim à incerteza que esse processo traz.

Copom – Redução da taxa de juros e cautela diante de incertezas.

O Copom decidiu reduzir a taxa básica de juros em 0,50 ponto percentual, para 10,75% ao ano, visando à convergência da inflação para a meta ao longo do horizonte relevante. Em um cenário internacional volátil, o Comitê reforça a necessidade de cautela na política monetária, destacando desafios como a desinflação em economias desenvolvidas e o impacto fiscal sobre a demanda agregada. No cenário doméstico, apesar da desaceleração econômica esperada, há sinais de consumo resiliente e transmissão do ciclo de afrouxamento monetário para o mercado de crédito. A incerteza quanto ao cenário inflacionário e as expectativas desancoradas exigem uma atuação firme da autoridade monetária. O Comitê reconhece riscos tanto de alta, como a persistência das pressões inflacionárias globais, quanto de baixa, como uma desaceleração econômica global mais acentuada, demandando cautela na condução da política monetária.

O Comitê avalia que as informações trazidas por atualizações dos conjuntos de dados analisados serão particularmente importantes para definir o ritmo e a taxa terminal de juros. Alguns membros argumentaram ainda que, se a incerteza prospectiva permanecer elevada no futuro, um ritmo mais lento de distensão monetária pode revelar-se apropriado, para qualquer taxa terminal que se deseje atingir. O Comitê manteve, unanimemente, que a taxa de juros e sua respectiva trajetória serão aquelas necessárias para a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante de política monetária.



CPI dos Estados Unidos surpreende e põe em cheque expectativas de corte na taxa de juros.

O trimestre foi marcado pelo impacto do índice Shelter (índice de moradia) na dificuldade de desinflação da economia americana. O CPI surpreendeu em janeiro com o valor de 0,3%, influenciado também pela alta nos alimentos, sobretudo na alimentação fora de domicílio. Já em fevereiro voltou a ficar dentro do esperado, apresentando uma leitura de 0,4%, com uma retomada da inflação associada à gasolina, ao passo que os alimentos apresentaram estabilidade. Em março, o CPI avançou 0,4%, acima do consenso dos especialistas, impactado pela continuidade do processo de aumento relacionado à gasolina, bem como a questão de moradia que afetou o trimestre inteiro.

O índice de moradia apresenta grande relevância no cálculo do CPI (cerca de 32% de peso), sendo assim o item de maior impacto. Os motivos especulados para essa persistência nos aluguéis são: a escassez de casas para equilibrar com a demanda, devido principalmente à redução da construção de moradias no período pós crise de 2008; aumento de custos de construção; defasagem do Shelter Index, representando um indicador atrasado da real expansão dos preços.


O núcleo do trimestre anualizado, que desconsidera itens voláteis como energia e alimentos, apresentou uma aceleração (4,2%) quando comparado ao último trimestre de 2023 (3,4%).


Payroll supera expectativas e reforma resiliência da economia estadunidense.

O índice de emprego urbano dos Estados Unidos surpreendeu durante o primeiro trimestre, superando as expectativas em todos os meses. Somente em março, foram criadas 303 mil vagas de emprego, enquanto que as projeções indicavam o valor de 212 mil. No entanto, apesar da força do mercado de trabalho, com exceção do mês de janeiro, o crescimento nominal dos salários esteve dentro do esperado. Um dos motivos para esse fenômeno, aparentemente inconsistente, está relacionado ao aumento da taxa de participação no mercado de trabalho, tendo como um dos principais fatores a imigração, que em 2023 atingiu 18,3% de participação. Estimativas do novo Payroll de equilíbrio ficam no intervalo de 160 a 265 mil, números bem superiores ao antigo equilíbrio estimado de 100 mil, de modo a explicar o elevado número de empregos sem pressionar os salários.


Por outro lado, um ponto de atenção refere-se à terceira queda seguida de novos empregos em tempo integral, o que está historicamente ligado a recessões. Isso ocorre quando as empresas estão receosas com o enfraquecimento da economia e acabam optando por contratações temporárias e de meio período como forma de flexibilização e redução de custos. Outra questão que se observa é o número de novos empregos gerados pelo governo, cerca de 23% do total, o que pode distorcer a real força do setor privado.

EUA – Fed adota postura restritiva, enquanto mercado enfrenta inversão na curva de juros.

Em seu mais recente pronunciamento, Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (banco central americano), adotou uma postura mais restritiva, destacando as incertezas geradas pelos dados recentes de inflação quanto aos possíveis cortes de juros. O Fed mantém as taxas na faixa entre 5,25% e 5,50% ao ano desde julho de 2023, o maior nível em 23 anos, resultado de 11 aumentos consecutivos iniciados em março de 2022.

Desde meados de 2022, o mercado tem observado uma inversão da curva de juros nos EUA, onde as taxas de curto prazo superam as de longo prazo. Embora historicamente seja um sinal de recessão iminente, a recente redução dessa inversão sugere um retorno à normalidade. Esse movimento reflete uma percepção de que os juros de curto prazo estão excessivamente altos, indicando uma expectativa de redução futura para estimular a economia.

A explicação para essa inversão reside no expressivo aumento das taxas de curto prazo pelo Fed e na crescente demanda por Treasuries de 10 anos por investidores receosos de uma recessão. Essa tendência tem impactos significativos nas políticas monetárias e pode causar depreciação do real frente ao dólar, pressionando a inflação devido ao encarecimento de produtos importados. Ademais, a busca por maior segurança nos EUA pode desencadear uma fuga de investidores, afetando a economia brasileira.

Câmbio – BC brasileiro responde avanço do dólar e yuan enfrenta desvalorização.

Durante todo o trimestre atual, o DXY registrou um avanço de 3,17%, com um aumento adicional de 0,38% apenas no mês de março. Esse índice é utilizado para medir o desempenho do dólar americano em relação a uma cesta ponderada de moedas estrangeiras, incluindo o euro, iene, libra esterlina, entre outras. Esse aumento gerou preocupações entre os investidores, especialmente diante da saúde fiscal do Brasil, das políticas do Federal Reserve e das tensões no Oriente Médio. Como resposta a essa valorização do dólar, o Banco Central brasileiro realizou sua primeira intervenção no câmbio em cerca de 16 meses em 2 de abril, leiloando US$1 bilhão em swap cambial. Apesar de uma queda inicial no valor do dólar após a intervenção, a moeda norte-americana fortaleceu-se durante a tarde, fechando praticamente estável.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, reiterou que a instituição só intercede no mercado cambial em caso de disfunções, mantendo o câmbio como um mecanismo flutuante. Ele ressaltou a robustez das reservas cambiais brasileiras e enfatizou que intervenções extraordinárias ocorrem apenas para assegurar o bom funcionamento do mercado. Campos Neto também destacou a importância de evitar interferências em mudanças estruturais, como a política monetária dos Estados Unidos, que exerce impacto global.


O yuan enfrentou uma fase de desvalorização em 2024, atingindo o seu nível mais fraco em relação ao dólar americano. A decisão do Banco do Povo da China de estabelecer uma taxa de referência diária mais baixa para o yuan onshore contribuiu para esse enfraquecimento, indicando uma possível política de desvalorização controlada da moeda. 

China – Crescimento econômico surpreende com foco em exportações.

A China cresceu 5,3% no primeiro trimestre de 2024 em relação ao mesmo período de 2023, resultado que superou as expectativas do mercado. Esse crescimento foi efeito de fortes investimentos governamentais no setor industrial mirando exportações, que até o momento foi capaz de reverter a crise imobiliária do país.

No entanto, a decisão da China de ampliar suas importações geraram preocupações globais por parte de outros países, que temem que suas indústrias tenham seus resultados afetados, causando demissões. Dessa forma, o ímpeto chinês pode ser eventualmente barrado por medidas protecionistas tomadas por outros países.

Os resultados do primeiro trimestre geram uma boa perspectiva para o alcance da meta do governo chinês de crescimento de 5% para 2024, meta que ganha solidez com a estabilidade de empregos e dos preços, aumento da demanda por produção e crescimento da confiança do mercado, que se reflete no crescimento do PMI industrial Chinês, que estavam em patamares de retração até fevereiro de 2024.

De acordo com o governo chinês, alguns dos riscos que podem ser atribuídos à evolução da economia nacional são as altas taxas de juros praticadas no exterior, que tiram dinheiro da China para financiar a dívida de países estrangeiros que pagam prêmios maiores pelos seus títulos.

Commodities – Cotações sujeitas a dinâmicas políticas e climáticas globais.

As tensões geopolíticas e os comunicados dos cortes voluntários da OPEP+ têm pressionado os preços do petróleo, gerando impactos sobre a inflação e incertezas quanto à trajetória da taxa de juros nos Estados Unidos. Ainda assim, a ampliação da oferta por países como Brasil, EUA e Canadá têm ajudado a aliviar os impactos da política de produção promovida pelos países da OPEP+. A dinâmica dos preços do petróleo está correlacionada a eventos incertos, como a escalada dos conflitos no Oriente Médio, a postura da OPEP+ quanto a sua produção, o ritmo de atividade na China e o crescimento da economia global, sendo que a expectativa do mercado é que a demanda por petróleo em 2024 cresça em linha com a tendência histórica.

As commodities metálicas vem sofrendo um considerável recuo no primeiro trimestre de 2024, impactadas pelo alto nível de estoques acumulados nos portos chineses e a fraca demanda do país para o setor de construção civil. Logo, a evolução dos preços de commodities como o minério de ferro dependeram das políticas adotadas pelo governo chinês.

Há uma expectativa de queda para as principais commodities agrícolas oferecidas pelo mercado brasileiro, dado as expectativas de amplos estoques de grãos dos principais produtores, o que causou o recuo da soja, milho e trigo no primeiro trimestre. Porém, com a quebra de safra esperada para o ano de 2024, o Brasil pode vir a sofrer impactos na evolução de seu PIB com essa combinação de queda na produção e pressão sobre os preços agrícolas.

Já na Ásia, os impactos climáticos como a seca na Tailândia causaram quedas na produção de arroz e açúcar, resultando em medidas protecionistas que, combinadas com as restrições para o comércio advindas da guerra da Ucrânia e das tensões do Oriente Médio, elevaram os preços das commodities agrícolas produzidas na região.

Autores: Gustavo Minatto Martins; Marcos Vinicius Thibes Petussi; João Pedro Melo Zimmermann.
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Curva de Juros: Estimação, Modelos e Métodos de Otimização

Curva de Juros: Estimação, Modelos e Métodos de Otimização

A Estrutura a Termo da Taxa de Juros (ETTJ), também conhecida como Curva de Juros, expressa uma relação temporal entre a taxa de juros e a maturidade do investimento. O juros expressa o valor do dinheiro no tempo, e é um instrumento fundamental para a atividade econômica, atuando como responsável por reger as escolhas intertemporais entre consumo e poupança dos agentes em níveis microeconômicos, e como principal ferramenta para condução da política monetária no ambiente macroeconômico. 

A Curva de juros é um conceito fundamental da teoria econômica e financeira, utilizada como base para precificação de ativos de renda fixa e como benchmark na determinação de taxas no mercado de dívida, além de ser um excelente mecanismo capaz de inferir acerca das expectativas do mercado e auxiliar nos processos de prescrição de políticas econômicas.

A curva de juros possui implicações importantes para a atividade econômica, uma vez que é um instrumento dinâmico, capaz de refletir, diariamente, as expectativas do mercado. A partir de sua observação, é possível inferir, por exemplo, sobre as percepções de risco fiscal pelo agentes e como estas surtem efeito sobre as expectativas futuras das variáveis macroeconômicas.

Historicamente, o processo de inversão da Curva de Juros antecede um período de recessão econômica. A inversão mais recente ocorrida no mercado doméstico foi em novembro de 2021, mediante o anúncio das políticas de estímulo fiscal que foram adotadas pelo governo e pela tramitação da PEC dos Precatórios, fatores estes que, somados a má comunicação do governo para com o mercado, tendo em vista os bons resultados da arrecadação pública, eclodiram numa maior percepção de risco fiscal pelo mercado. Este cenário, aliado com o forte ciclo de alta dos juros, visando retrair a escalada dos níveis de preço, culminaram na inversão da curva de juros, fenômeno este que se mantém até o presente momento, tendo em vista o cenário persistente de alta de juros e a piora conjuntural e do cenário prospectivo, com ênfase, sobretudo, ao âmbito fiscal.

Neste cenário, durante o mês de junho de 2022, a Curva de Juros doméstica adquiriu maior inclinação a partir de períodos de maturidade superiores a três anos, com ênfase na ponta longa da curva. O aumento dos gastos públicos impacta as expectativas de inflação do mercado, uma vez que geram estímulos à demanda agregada da economia, uma expectativa maior de inflação para o médio e longo prazo pressupõe a necessidade de uma política monetária contracionista, para redução do processo inflacionário, o que gera impactos, por sua vez, sobre a atividade.

Adicionalmente, também por meio da Curva de Juros, é possível extrair o cálculo da Inflação implícita, dado importante na calibração de modelos de precificação de ativos, a partir de uma relação econômica importante conhecida como Identidade de Fisher, que considera que a taxa de juros nominal é uma composição entre a taxa de juros real e a expectativa de inflação para o período.


Base de Dados

A ETTJ não é diretamente observável e precisa ser estimada a partir de cotações de mercado para títulos de renda fixa ou instrumentos derivativos, a partir das cotações é possível obter os vértices, que serão pares ordenados de taxa de juros e maturidade. A Curva de Juros é obtida a partir da cotação de títulos que não possuem o pagamento de cupons, ou a partir de taxas implícitas de instrumentos derivativos. A utilização de zero coupon bonds para modelagem da Estrutura a Termo ocorre pela necessidade, em caso da utilização de títulos com pagamento de cupons, de incorporar ao modelo a hipótese de que os cupons são reinvestidos à mesma taxa, fato que dificilmente ocorre. 

Desta forma, os instrumentos de Renda Fixa que não possuem pagamento de cupons são, em geral, inerentes a três tipos de riscos: risco de mercado, risco de crédito e risco de liquidez. Para a mensuração da ETTJ “livre de risco”, também denominada como Curva Base, utiliza-se dados de mercado de títulos considerados isentos de riscos de crédito e liquidez. Neste cenário, a literatura sugere o uso de cotações de mercado de títulos de renda fixa emitidos pelo governo, cujos quais são, teoricamente, os títulos com menor risco de crédito da economia.

Para mercados mais líquidos, a utilização de dados de títulos de renda fixa para a estimação da curva de juros é uma prática recorrente, fato este que não ocorre no cenário brasileiro, cujo qual apresenta escassez nos instrumentos de renda fixa prefixados e baixa liquidez no mercado secundário, fatores que dificultam o processo de extrapolação, que é a modelagem da curva para prazos mais longos. Desta forma, uma melhor modelagem da ETTJ para o mercado nacional pode ser obtida por meio das taxas implícitas de instrumentos derivativos.


Interpolação e Extrapolação

Os vértices constituem um conjunto discreto de dados, sendo que, para a concepção da curva em termos contínuos, utiliza-se duas técnicas: Interpolação, que consiste na estimação de uma curva entre dois vértices consecutivos, sendo capaz de obter taxas contínuas para prazos intermediários, produzindo o melhor ajuste aos dados, e Extrapolação, que é a modelagem da curva em pontos fora do conjunto de dados, para um horizonte longo de tempo, em função muitas vezes, da baixa liquidez para horizontes de longo prazo.

Existem alguns métodos diferentes para interpolação dos vértices, como o linear, que consiste na interligação de cada vértice consecutivo por uma reta e pode ser facilmente mensurado por meio da Equação da Reta; o Log-Linear, que utiliza a mesma função de interpolação linear, mas com a aplicação de logaritmos neperianos aos vértices; e a Interpolação Spline, que consiste em um conjunto de polinômios de baixo grau, unidos em nós (vértices) capazes de formar uma função contínua em um dado intervalo, ou seja, por meio dos vértices e de uma forma funcional com grau predefinido e sujeita a certas restrições, que garantam continuidade e diferenciação, é possível obter a estimação da curva.

A Interpolação Log-Linear possui um maior sentido econômico para a interpolação da Curva de Juros brasileira, já que o país utiliza do regime composto de capitalização. A metodologia Spline, apesar de ter vasta utilização no mercado, pode apresentar certas instabilidades, principalmente quando a distribuição dos vértices apresenta certa heterogeneidade.

O procedimento mais comum para a estimação da curva é impor, inicialmente, uma forma funcional com K parâmetros para a estrutura a termo, o próximo passo consiste na estimação destes parâmetros, por meio do método de Mínimos Quadrados Ordinários, que consiste na minimização da soma dos quadrados da diferença entre os dados estimados e observados, esta diferença é denominada como erro ou resíduo do modelo.

As formas funcionais estimadas podem ser polinômios, splines, funções exponenciais, ou uma combinação destas ou outras funções. Atualmente, os métodos mais proeminentes e amplamente utilizados pelo mercado e por diversos bancos centrais ao redor do mundo são os propostos por Nelson & Siegel (1987), Svensson (1994).


Modelo de Nelson-Siegel

Os modelos propostos por Nelson-Siegel e Svensson estabelecem formas funcionais que buscam aproximar a estrutura de taxas a termo por meio de uma soma de funções exponenciais, a diferença entre os modelos está na quantidade de parâmetros para a forma funcional. O modelo de Nelson-Siegel é capaz de gerar, de forma simples e efetiva, estruturas a termo com formatos muito próximos aos observados no mercado, por meio de uma forma funcional com quatro parâmetros. As taxas a termo deste modelo são dadas pela equação:

Texto Descrição gerada automaticamente

Os parâmetros β0β1 e β2 podem ser interpretados como fatores dinâmicos que exercem influência em horizontes de prazos distintos na curva de taxas a termo, sendo que, os termos que multiplicam esses fatores são denominados de cargas de fatores:

  • βס pode ser interpretado como um fator de longo prazo, a carga que multiplica este parâmetro é igual a um, uma constante, ou seja, não varia à medida que o horizonte de maturidade aumenta;
  • β1 pode ser visto como um fator de curto prazo, já que a carga que multiplica este fator é uma função que inicia em um e decai rápida e monotonicamente (a taxas constantes) a zero à medida que cresce o prazo de maturidade;
  • A carga que multiplica o fator β2 é uma função que inicia em zero, assume valores positivos no médio prazo, e decai a zero novamente à medida que o prazo de maturidade tende a infinito, β2 pode, portanto, ser interpretado como um fator de médio prazo.

É possível observar, com base nos valores assumidos pelos parâmetros que compõe o modelo, algumas importantes variações na estrutura funcional, por exemplo, quando β1 < 0, a curva é crescente no curto prazo, no entanto, caso β1 > 0 a curva torna-se decrescente neste mesmo horizonte de tempo. O fator β2, caracterizado como de médio prazo, quando positivo produz uma corcova para cima, trazendo certa concavidade para a estrutura, já quando negativo, a função assume uma corcova para baixo, assumindo um certo grau de convexidade. O parâmetro β2 é responsável, juntamente com o λ, pela transição entre as taxas de curto e longo prazo, sendo que, para haver sentido econômico, é necessário que λ seja maior que zero.

Os três parâmetros β0β1 e β2 podem ser interpretados como fatores de nível, inclinação e curvatura, respectivamente (Diebold & Li, 2006).

Gráfico Descrição gerada automaticamente com confiança média


Modelo de Svensson

O modelo de Svensson, como já mencionado, é uma expansão do modelo proposto por Nelson-Siegel, sendo capaz de apresentar estimações significativamente superiores, sobretudo em estruturas de curva de juros mais complexas. Amplamente utilizado por diversos bancos centrais, o modelo proposto por Svensson estende o modelo anterior por meio da adição de um novo termo exponencial à estrutura funcional da curva de taxas a termo, contendo dois parâmetros (β3 e λ2). Este novo termo é interpretado, juntamente com o β2, como um fator de longo prazo, permitindo a formação de uma segunda corcova na função da curva de juros.


Adicionalmente, o novo parâmetro pode ser interpretado também como um fator de curvatura, responsável pela dinâmica de médio prazo, bem como, pelo processo de transição entre as taxas de curto e longo prazo. Similarmente, o parâmetro λ2 adquire um papel próximo ao já desempenhado por λ1, como fatores de decaimento e de transição. Pode-se observar como os parâmetros interferem na estrutura em diferentes prazos de maturidade por meio da aplicação dos limites na expressão, obtendo:


O limite da expressão quando o prazo de maturidade tende a zero são os componentes de longo e de curto prazo da curva, já quando a função tende a infinito, a expressão tende somente ao parâmetro de longo prazo.


Objeto de Estimação

Após a definição da estrutura funcional, é necessário a estimação dos parâmetros. Como já mencionado, esta estimação é obtida através da minimização do somatório dos erros quadráticos. Inicialmente, para a estimação dos parâmetros do modelo, é necessário definir se o objeto de estimação é o preço do título, a taxa de juros à vista (spot) ou a taxa a termo (forward). Esta etapa é importante para o processo, já que dependendo do objeto de estimação, os resíduos podem apresentar heterocedasticidade.

A heterocedasticidade é um efeito estatístico que ocorre quando os erros do modelo apresentam variâncias distintas, ou seja, a dispersão dos dados em relação à curva estimada não é regular à medida que se altera o horizonte de maturidade. Caso os erros do modelo apresentem variâncias distintas (heterocedasticidade), os estimadores podem perder eficiência, ou seja, mesmo que não tendenciosos, podem estimar os parâmetros com uma variância maior, de forma menos precisa. Neste caso, a heterocedasticidade é causada pela natureza das variáveis, já que os preços dos instrumentos financeiros de curta maturidade são menos sensíveis a variações nas taxas de juros, ou seja, pequenas alterações nos preços dos títulos de curto prazo implicam em grandes alterações nas taxas de juros, o contrário acontece para títulos de longo prazo.

Quando o objeto de estimação for o preço do título, os resíduos serão homocedásticos nos preços e heterocedásticos nas taxas, já que o modelo apresentaria erros elevados para as taxas à vista de curto prazo, no entanto, caso o objeto de estimação seja a taxa de juros à vista (spot), os erros serão homocedásticos nas taxas e heterocedásticos nos preços, já que haveria erros elevados para os preços dos títulos de longo prazo. Uma abordagem possível para corrigir o problema de heterocedasticidade nas taxas à vista é ponderar o erro quadrático do preço de cada título pelo inverso da duration de Macaulay, dando mais relevância para os erros dos títulos de curto prazo, a utilização deste ponderador é bastante frequente para o mercado doméstico.

Na construção do intervalo indicativo, a otimização é realizada com base nos quatro parâmetros, pois os componentes de decaimento λ1 e λ2 são mantidos fixos. Em muitos casos, o processo de otimização da função objetivo torna-se bastante complexo, apresentando uma alta não linearidade no modelo. Nestes casos, a utilização de métodos de otimização tradicionais, como mínimos quadrados não lineares ou máxima verossimilhança, apresentam um alto risco de falsa convergência, uma vez que a alta não linearidade do modelo traz o risco de que a otimização não atinja o mínimo global, mas sim um mínimo local. Estes métodos tradicionais apresentam muita sensibilidade aos parâmetros inicialmente fornecidos (“chute inicial”), podendo apresentar resultados viesados, que levam à alta volatilidade das séries históricas dos parâmetros, à presença de valores estimados infactíveis e a uma grande frequência de alterações estruturais na curva.


Processo de Otimização

Neste contexto, foi desenvolvido um método de otimização de algoritmo genético para estimação dos parâmetros do modelo de Svensson. Atualmente, o método mais proeminente é a utilização de um método tradicional, capaz de refinar os parâmetros encontrados, aliado ao método de algoritmo genético, possibilitando uma varredura melhor do espaço e definindo com melhor exatidão a região inicial de otimização, já que o método de algoritmo genético possui certa dificuldade na realização de um ajuste fino local. Desta forma, torna-se possível obter resultados mais satisfatórias, eliminando os riscos de falsa convergência, e obtendo séries históricas menos voláteis e com melhor ajuste aos dados.

Um método tradicional de otimização não linear Quasi-Newton apresenta bons resultados no processo, já que, assim como o método iterativo de Newton, eles possuem alta eficiência na obtenção de um ótimo local. Em síntese, um problema genérico de otimização não linear consiste em encontrar um vetor que minimize uma dada função objetivo, sujeita a algumas restrições.

O método de algoritmos genéticos, introduzido nas áreas das ciências biológicas por John Holland (1975), consiste em algoritmos de buscas baseados em mecanismos de seleção natural e genética. A teoria dos algoritmos genéticos é inspirada na teoria Darwiniana de evolução das espécies, onde o princípio de seleção privilegia os indivíduos mais aptos com maior longevidade e, portanto, com maior probabilidade de reprodução, este processo garante que, à medida que o tempo passa, as gerações tornam-se melhores e mais adaptadas ao meio que as anteriores.

O algoritmo genético aplicado a solução do problema de otimização da Curva de Juros tomou como base o trabalho de Gimeno e Nave (2006), do Banco Central da Espanha, cuja ideia básica consiste em criar uma população de cromossomos que representem candidatos à solução do problema. Essa população evolui ao longo do tempo através de novas gerações, sendo que, a cada evolução, os melhores indivíduos (candidatos a ótimos do problema) são selecionados e submetidos a processos de recombinação (crossover) e mutação.

O escopo teórico da teoria Darwiniana fornece embasamento e fundamenta, de forma análoga, o processo computacional. Este processo ocorre até a população convergir para a solução ótima do problema, chamado de estágio estacionário, este ponto é utilizado como valor inicial do algoritmo Quasi-Newton, que será responsável por realizar o ajuste fino local e encontrar o ponto de mínimo global do modelo. Portanto, com a resolução do modelo por meio da estimação dos parâmetros, é possível obter a estrutura funcional estimada da Curva de Juros.



Referências bibliográficas

Svensson, L. E. O. (1994), ‘Estimating and interpreting forward interest rates: Sweden 1992-1994’, International Monetary Fund Working Paper.

Nelson, C. R. & Siegel, A. F. (1987), ‘Parsimonious modeling of yield curves’, The Journal of Business, University of Chicago.

Franklin Jr., Duarte, Neves e Melo (2012), ‘A Estrutura a termo de taxas de juros no Brasil: Modelos, Estimação e Testes.

Anbima (2010), “Estrutura a Termo das Taxas de Juros Estimada e Inflação Implícita Metodologia”.

SUSESP (2010), “Interpolação e Extrapolação das ETTJ no Brasil”.

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Relatório Macro – Terceiro Trimestre

Relatório Macro – Terceiro Trimestre

No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do terceiro trimestre do ano de 2022, analisando os cenários econômicos nacional e internacionais.

Neste trimestre, no cenário nacional, ganham destaque as leituras positivas para inflação, atividade econômica e cenário fiscal, enquanto o resultado das eleições aumenta ainda mais as incertezas em um contexto global conturbado.

Já no cenário internacional, ganham destaque o rápido governo de Liz Truss no Reino Unido, o aperto da política monetária pelo Fed e pelo BCE, e leituras de inflação nestas economias.


Brasil – Inflação e atividade econômica surpreendem positivamente, enquanto que cenário político continua incerto pós-eleição.

Os últimos três meses mostraram um arrefecimento da pressão inflacionária, tendo consecutivamente mostrado leituras mensais de inflação negativa, sendo estas quedas, de 0,68%, 0,36% e 0,29% para os meses de julho, agosto e setembro, respectivamente.

Os níveis de preço foram altamente afetados em decorrência da redução de impostos federais sobre combustíveis, aliado à redução do ICMS sobre energia, telecomunicação e combustíveis.

Fonte: Refinitiv. Elaboração Própria

A perspectiva para a inflação continua positiva, ao passo em que a economia global sofre de uma desaceleração conforme a política monetária mundial entra em ritmo de aperto, afetando diretamente na redução pelo lado da demanda, concomitante ao fato de que os incentivos de corte de impostos federais devem ser prolongados até 2023, construindo um cenário favorável à inflação brasileira.

Por outro lado, este cenário também se torna dependente de questões como o cenário fiscal e as decisões na política monetária. O Brasil apresentou um ótimo ano fiscal em 2022, com um superávit primário do setor público esperado em 1,3% do PIB e uma dívida bruta por volta de 76% do PIB, levemente dos 74% observados em 2019, porém, com um novo governo eleito e políticas adotadas pelo atual governo – como o adiamento de precatórios e políticas fiscais expansionistas que ultrapassam o teto de gastos, como o aumento do Auxílio Brasil -, a perspectiva do cenário fiscal é de deterioração nos próximos anos.

Quanto à política monetária, a última reunião do COPOM definiu que a manutenção da Selic em 13,75% a.a. Conforme a ata desta, há a indicação que os juros permanecerão elevados por um período longo, caso não ocorra nenhuma mudança significativa no cenário nacional e internacional. O Banco Central entende que as suas futuras decisões demandam cautela, pois ainda prestam atenção a como as variáveis macroeconômicas responderam à mudança brusca nos juros, que estavam no patamar de 2% somente dois anos atrás. Ademais, uma redução na taxa de juros em 2023 está precificada, com a curva apresentando uma inversão a patamares de 11,5%, como mostra o gráfico abaixo.


Fonte: Anbima. Elaboração própria


Mercado de trabalho segue aquecido enquanto atividade econômica continua a crescer

O mercado de trabalho brasileiro se demonstra fortemente aquecido, com a taxa de desemprego para o trimestre entre julho a setembro de 8,7%, o menor nível desde 2015. O número reflete os recentes resultados inflacionários, além de uma melhora no emprego do setor público, o qual teve recorde de crescimento na série histórica. O momento, no entanto, é de cautela, ao passo em que se observa indícios de retração na atividade econômica, tanto brasileira quanto mundial, e isso pode afetar fortemente o mercado de trabalho nacional.

Após ter demonstrado uma queda superior a 1% em agosto, o índice Ibc-br, considerado uma prévia do PIB, voltou a indicar crescimento para setembro, de apenas 0,05% – abaixo da expectativa do mercado de 0,2%. Apesar disso, a alta de 0,69%, registrada no segundo trimestre, passou a 1,36% no terceiro, indicando uma atividade forte, ao contrário do observado no cenário internacional.

No entanto, como mencionado anteriormente, ao passo em que as políticas monetárias globais começam a ter efeito, as previsões para 2023 voltam a ter uma incerteza maior, ditadas por uma futura demanda enfraquecida.


Lula é eleito pela sua terceira vez presidente do Brasil, porém oposição aumenta o seu número de cadeiras no congresso

As eleições nacionais de 2022 demonstraram uma grande divisão no cenário político. Por um lado, Bolsonaro perde as eleições presidenciais por uma margem muito pequena, com Lula, após 12 anos, voltando ao poder, e, ao mesmo tempo, o bolsonarismo terá a maior bancada no Senado e na Câmara em 2023, com o bloco político da “direita” e do “centrão” correspondendo a 74% da Câmara e 83% do Senado.

Portanto, o governo Lula deverá utilizar de muito diálogo para a aprovação de pautas, visto a forte oposição dentro – e fora – do planalto. Questões, como a decisão de ministros – muito criticada durante o período de eleição -, também devem refletir a divisão política, com a preferência por nomes imparciais do que aos preferidos pelo PT.


EUA – Mercado de trabalho se mostra aquecido, com dados recentes do payroll acima das expectativas enquanto a pressão inflacionária se mostra persistente

O mercado de trabalho americano se mostra bem aquecido nos últimos três meses, com a última leitura do non-farm payrolls surpreendendo os mercados, vindo acima das expectativas e abrindo precedente para um aperto monetário maior pelo lado do Federal Reserve.

E economia dos EUA viu um resultado da criação de 263 mil trabalhos para o mês de setembro de 2022, número que apresenta uma queda comparada aos resultados obtidos nos últimos 3 meses (537 mil em julho e 315 mil em agosto) e a menor criação desde abril de 2021, mas ainda assim, o indicador foi superior ao número esperado de 250 mil empregos.

Apesar da redução da demanda doméstica americana, a criação de postos de trabalho se demonstra apertada, com o desemprego americano estabelecido em 3,7% e contando com diversas vagas não preenchidas.

O resultado é uma forte pressão sobre os salários, resultando em um alto ritmo de reajuste destes, implicando em uma forte pressão inflacionária – combatida por medidas mais pesadas com relação à política monetária do Fed, que presta grande atenção no mercado de trabalho para embasar as suas decisões com relação a taxa de juros no país.


Fonte: Atlanta Federal Reserve. Elaboração própria

A pressão inflacionária nos Estados Unidos continua persistente e mostra-se bastante disseminada através das categorias que compõem o índice. Apesar do CPI (Consumers Price Index) ter dado uma arrefecida, quando comparado ao resultado para o mês de junho, onde o índice registrou uma alta anualizada de 9,1%, e em sua última leitura, em setembro, registrados 8,2% – o menor número nos últimos 7 meses -, este ainda foi maior que as expectativas do mercado (8,1%).

A continuidade do aumento de preços de commodities, principalmente as energéticas, continuam a pressionar o índice, ao passo em que os preços de gás natural e eletricidade aceleraram 2,9% e 0,4% no mês de setembro, respectivamente. Apesar disso, o custo com gasolina apresentou uma queda de 4,9% no mês, reduzindo levemente a pressão sobre o índice.


Fonte: Refinitiv. Elaboração própria

O núcleo do índice continua a apresentar problemas para o Fed, com ambos os resultados de setembro e agosto apresentando alta de 0,6% e acima das expectativas do mercado. A preocupação maior é com relação aos itens relacionados a aluguel e serviços, que não apresentam sinal de queda tão cedo. Por outro lado, a inflação relacionada a bens deve sofrer uma desaceleração nos próximos meses, devido a um dólar valorizado e uma demanda enfraquecida – apesar desses resultados não terem apresentado queda nas últimas leituras do índice.

Visto uma pressão inflacionária persistente, e um mercado de trabalho com resultados melhores que o antecipado, é esperado que o FOMC continue a responder de forma mais hawkish, com possivelmente uma alta de magnitude de 75 bps, como feito na última reunião.

O Fed deixou de ver a inflação como algo transitório a muito tempo, e agora está disposto a continuar em uma instância mais restritiva, buscando obter um nível de emprego ótimo e a estabilização de preços, segundo a minuta da reunião do comitê em setembro. Além disso, o comitê entrou em um consenso de que, aumentar as taxas mais rapidamente agora irá “prevenir uma futura dor econômica”, associada com o alto nível de preços, incluindo uma política monetária ainda mais apertada e mais restritiva na atividade econômica do que seria necessária para trazer a estabilidade de preços.


EUA – Mercado imobiliário demonstra sinais de retração, com taxas hipotecárias dobrando perante 2020

O mercado imobiliário americano começa a mostrar sinais de retração, ao passo em que o número de compradores reduziu fortemente devido a taxas hipotecárias dobrando em 2022, forçando os vendedores a baixarem o preço de seus ativos em compensação.

Entender a situação atual no mercado americano é muito importante, com os indicadores imobiliários ganhando grande destaque pós-crise de 2008. O cenário pandêmico, de baixas taxas e de alta liquidez, resultou em preços de moradias inflados em todo o país. Porém, no momento atual, com as incertezas pairando sobre a economia global, e uma atuação hawkish do Federal Reserve, o preço de casas no país começa a declinar fortemente.


Fonte: Refinitiv. Elaboração própria

O momento, no entanto, é diferente do observado no período de 2006 a 2012, e, de certa forma, se mostra mais positivo. A expectativa é que o preço de moradias continue a declinar, mas não a níveis observados na crise anterior, pois nela se observava uma pressão maior do lado vendedor, motivado por vendas a descoberto e encerramentos hipotecários. Além disso, o inventário de residências em 2008 era 4 vezes superior ao observado hoje, que continua ainda inferior a níveis pré-pandêmicos, atuando na manutenção do preço de moradias.


Zona do Euro – Continuação da guerra na Ucrânia e inflação persistente continuam a reduzir expectativas no velho continente.

O continente Europeu continua a sofrer com choques adversos em preços de commodities, principalmente energéticas, amplificados pelo confronto no Leste Europeu – o qual não mostra sinais de se encerrar, visto a chamada de reservistas pela parte Russa, e a falta de consenso entre as duas partes em um acordo para o encerramento da guerra.

O cenário inflacionário na União Europeia se mostra persistente, com a última leitura atingindo 10,7% nos últimos 12 meses, sendo a leitura anterior, de setembro, 9,9% anuais, e, aliada com as recentes leituras abaixo de 50 do PMI na Zona do Euro (demonstrando uma desaceleração na atividade econômica), indicam uma possível estagflação para o ano de 2023 no bloco, com um cenário já em 2022 de altos custos de produção e consequente limitação da produção, exercendo uma ainda maior pressão sobre o índice de preços.


Fonte: Refinitiv. Elaboração própria

No outro lado, o Banco Central Europeu, que começou o seu ciclo da alta de juros em julho deste ano, deve continuar a adotar uma postura hawkish nas suas decisões de política monetária, buscando trazer a inflação de volta à meta adotada de 2%.

Com a recente alta de 75 bps para a reunião de outubro, é esperado que a autoridade monetária continue o ciclo com uma próxima alta de 75 bps na reunião de dezembro, encerrando 2022 com uma taxa básica em torno de 2,75%.

Também é importante ressaltar que o desemprego no bloco chegou a uma mínima histórica de 6,6%, podendo fornecer espaço para aumentos mais robustos nos juros, como visto no caso americano.

Por fim, o governo Alemão ampliou recentemente seu plano fiscal que busca combater o choque energético, com um pacote de € 200 bi – adicional aos € 95 bi já gastos -, introduzindo “freios” no preço de eletricidade para residências e empresas, no preço do gás de forma temporária e também adota a taxa de solidariedade, além de reduzir impostos sobre gás e aquecimento urbano.


Reino Unido – Situação política fragilizada e medidas econômicas derrubam o governo de Liz Truss e depreciam ativos britânicos

O cenário econômico e político no Reino Unido passou por grande turbulência, após a renúncia de Boris Johnson como primeiro-ministro britânico. Liz Truss, candidata dentro do partido conservador para o lugar de premiê, assumiu o cargo no início de setembro e anunciou um pacote fiscal, que dentre os principais pontos, incluía uma quantia para compensar o alto preço da energia e um plano de crescimento baseado no corte de impostos.

O plano teve uma má recepção pelo mercado, causando uma alta desvalorização em ativos britânicos e deixando a libra em situação frágil, com paridade quase que de 1 para 1 com o dólar americano. O prêmio de títulos do governo subiu de 3,8% a 5%, desvalorizando-os e o mercado já precificava um aumento do ritmo de aperto monetário por parte do BoE.

O resultado, após um imbróglio no parlamento inglês, foi a saída de Liz Truss do cargo de primeira-ministra britânica, após ficar somente 50 dias no cargo, e o apontamento de Rishi Sunak como novo ministro, que deve levar a economia em uma direção de mais responsabilidade fiscal em um momento de alta inflação e indícios de recessão à vista no horizonte próximo.


China – Atividade econômica apresenta recuperação, mas crescimento para 2023 deve ser abaixo dos 5% desejados pelo governo chinês

A atividade econômica chinês vem demonstrando sinais de recuperação, principalmente na produção industrial, a qual sofreu de interrupções devido a política de covid zero implementada pelo governo chinês.

A evolução pode ser observada tanto pelo indicador da produção industrial, que até agosto registrava um crescimento de 3,8% em 12 meses, e, para setembro uma expansão de 4,2%, quanto pelo PMI industrial chinês, que registrou uma leitura de 50,1 após um grande período de retração no índice.

No entanto, observa-se uma forte retração em outros setores da economia, principalmente no setor imobiliário, onde o investimento imobiliário apresenta uma queda de 13,2% quando comparado ao mesmo período no ano anterior, com a redução na venda de residências e uma queda pela metade no total de novas obras também contribuindo negativamente para o cenário.

Por fim, pode observar-se que as medidas de controle ao coronavírus continuam afetando negativamente o setor de serviços, o que deve afetar profundamente o desempenho da economia no próximo ano.


Fonte: Refinitiv. Elaboração própria


Câmbio – Dólar se fortalece em um mercado repleto de incertezas e políticas frágeis

No Brasil, o câmbio continua apresentando alta volatilidade devido às incertezas nacionais e internacionais. No mês de julho a cotação do real chegou ao patamar de R$/US$5,50, mas voltando a negociar perto de R$/US$5,2 em outubro. As últimas falas de Powell, chairman do Fed, reforçam o comprometimento com estabelecer o nível de preços, sugerindo que os próximos meses devem ser de incertezas para o Real, visto que o país passa por um momento de transição política.

O Euro segue em constante decadência no segundo semestre de 2022, chegando a atingir uma mínima de 0,95 EUR/USD em setembro. Incertezas sobre a guerra entre Rússia e Ucrânia e o atraso na elevação dos juros por parte do BCE resultaram em uma preferência dos agentes pelo dólar.

Por fim, a Libra Esterlina apresentou alta volatilidade, dado às políticas adotadas por Liz Truss e o novo ministro das finanças, que anunciaram uma medida de corte de impostos para a elite britânica, assim como planos para seguir com cortes em outros setores durante o mandato. A ação de Truss foi recebida com surpresa pelos mercados, o que causou no dia 23 de setembro uma forte queda na Libra, além de uma pressão de venda dos títulos públicos do país, apresentando uma volatilidade em ativos considerados extremamente seguros.


Commodities – Volatilidade no mercado continua alta com confronto no leste europeu e paralisações na China

As cotações do petróleo no último trimestre vêm sofrendo alta volatilidade. Os dados de alta inflação no mundo, apertos monetários e a guerra entre Rússia e Ucrânia estão entre os grandes responsáveis pela volatilidade no preço do barril de Petróleo.

Após seguir uma tendência de queda entre julho e setembro, o Petróleo apresentou uma alta de 11,3% no mês de outubro, sendo negociado a U$94,83 no final do mês – um reflexo das decisões da OPEP+, que visa reduzir a oferta energética, e também das melhores expectativas a respeito da guerra.

Já o minério de ferro apresentou uma constante queda no último trimestre, dado as condições dos lockdown chineses, causando uma baixa produtividade do aço local. O panorama negativo do mercado imobiliário chinês é também motivo de incerteza no mercado de commodities, contribuindo para a tendência negativa que vem sendo apresentada desde o início do ano.

O Ferro estava sendo negociado a U$107,22 ao final de julho, fechando o mês de outubro no patamar de U$92,43, apresentando uma queda de 13,8% no trimestre.


Fonte: Refinitiv. Elaboração própria

Em suma, os próximos meses devem apresentar uma desaceleração na economia global, ao passo em que, com os aumentos prévios nos juros e com uma perspectiva da continuação do ciclo a patamares superiores aos previamente previstos, a demanda global começa a sofrer o impacto causado pela política monetária contracionista global.

No cenário nacional, as leituras de atividade, fiscal e de inflação se mostraram positivas, apesar de que o cenário político atual, pós eleição e em fase de transição, com posições e escolhas de ministros abertas, traz incertezas, sobretudo sobre o âmbito fiscal.


Autores: Luís Guilherme Uliana, Pedro Veiga, Wiliam Midon Pedroso

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Carta de Conjuntura Macro – Junho

Carta de Conjuntura Macro – Junho

O avanço da atividade econômica, a decisão de aumento de juros pelo Copom e a desaceleração da inflação ganham destaque no cenário nacional durante o mês de junho, enquanto o cenário fiscal apresenta grande incerteza com aprovação da PEC dos auxílios.

No âmbito internacional, a pressão inflacionária e os temores sobre uma possível recessão ganham destaque, ao passo em que a continuidade do conflito na Ucrânia e a política de covid zero chinesa impactam negativamente o balanço de riscos global.


Atividade Econômica – Cenário se mostra positivo no curto prazo, apesar de incertezas.

Após avanço de 1,0% no primeiro trimestre de 2022, indicadores de alta frequência reiteram um cenário prospectivo positivo para a atividade econômica durante o primeiro semestre de 2022, sugerindo expansão do PIB para o segundo trimestre acima do esperado anteriormente pelo mercado. Os setores da Indústria vêm demonstrando sinais de melhora, à medida que o comércio permanece em expansão, reforçando os bons resultados obtidos para este setor no primeiro trimestre.

Apesar da elevada incerteza para o atual cenário prospectivo, a atividade econômica vem obtendo resultados positivos e gerando revisões altistas para as expectativas de crescimento para 2022 e 2023, fator impulsionado por alguns fatores, como a expansão do mercado de trabalho, o aumento dos estímulos fiscais e o crescimento do setor de serviços, fortemente impactado pela retomada das atividades pós-pandemia.

De forma adicional, os dados do CAGED reiteram para um mercado de trabalho ainda aquecido, com novas leituras reforçando o cenário de recuperação apresentado pela PNAD no começo de junho. Para o mês de maio foram registrados 277.018 empregos formais, descontados os efeitos sazonais, com destaque para o setor de serviços (+120.294), comércio (+47.557) e indústria (+46.975), no acumulado do ano, já há um saldo positivo de 1.051.503 novos empregos. Adicionalmente, a taxa de desemprego está no patamar de 9,8%, a menor taxa desde maio de 2015 (8,3%), de acordo com os dados do IBGE. Estas novas leituras vêm acima das expectativas de mercado, cujo qual esperava uma taxa de desemprego próxima de 10,2%.

Para o cenário à frente, alguns fatores devem exercer importante impacto sobre os resultados econômicos, como a entrada de recursos provenientes do INSS e FGTS impactando de forma positiva e reforçando o atual cenário prospectivo, que já é de crescimento para o segundo trimestre. Em contrapartida, é esperado que os efeitos defasados da política monetária contracionista comecem a surtir maiores impactos sobre a atividade a partir do segundo semestre de 2022, visando desacelerar o atual cenário de escalada dos preços.

As expectativas trazidas pelo Boletim Focus, para 2023, apontam um crescimento modesto da atividade econômica, próximo de 0,5%, em decorrência, sobretudo, da absorção dos impactos da política monetária sobre as decisões de consumo e investimento dos agentes, retraindo a demanda agregada da economia, e do cenário de desaceleração mundial esperado.


Política Monetária e Inflação – Copom adia fim do ciclo de aperto monetário e resultados para a inflação vêm abaixo do esperado.

Em junho, a leitura do IPCA registrou um aumento de 0,67%, levemente abaixo das expectativas de 0,7%. No acumulado do ano, a alta registrada é de 5,49%, e de 11,89% nos últimos 12 meses. As últimas duas leituras do IPCA trouxeram significativa retração dos níveis de preços quando comparado aos primeiros meses do ano, no entanto, parte desta forte queda segue sendo puxada por segmentos voláteis ou administrados.

O cenário prospectivo ainda permanece desafiador e com elevado grau de incerteza, com novas leituras ainda indicando para pressões inflacionárias disseminadas e uma composição ainda desfavorável para o IPCA. A média dos núcleos permanece elevada, chegando em 10,5% no mês de junho. Como contraponto, o índice de difusão, que mede a proporção de bens e serviços que obtiveram aumento de preços no período em relação ao total de itens pesquisados pelo IBGE, desacelerou de 72,4% para 66,6% no mês de junho, entretanto, o valor ainda permanece em patamar elevado.

O cenário inflacionário é de forte incerteza, com fatores implicando em riscos altistas para o cenário à frente, como o atual cenário inflacionário desfavorável, os bons resultados para a atividade econômica e a possibilidade de novas medidas de auxílio fiscal, e, de outra forma, fatores que impactam as projeções de forma baixista, como a forte correção dos preços de commodities internacionais e o impacto das medidas fiscais aprovadas pelo governo, com redução de impostos sobre combustíveis, energia elétrica e serviços de comunicação, resultando em uma forte desaceleração da inflação para o curto prazo.

Apesar das sucessivas altas, o mercado espera uma deflação no mês de julho, por conta da PLP18/2022, que reduziu o ICMS em: combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte público. Além disso, o preço das commodities começou a ceder por causa do temor de uma recessão mundial, o que pode contribuir ainda mais para uma desaceleração da inflação nos próximos meses.

Na reunião de junho/2022, o Copom elevou a Selic em 50 bps para 13,25% a.a., e sinalizou mais um aumento de igual ou menor magnitude para a próxima reunião de agosto. Apesar do elevado grau de incerteza acerca do atual processo inflacionário, o comunicado trouxe uma abordagem mais dovish pelo comitê, tendo em vista as dificuldades de convergir a inflação à meta e o fato de os impactos contracionista ainda não terem surtido efeito sobre os níveis de preços. Com a piora do cenário conjuntural, o destaque do novo comunicado foi a mudança de tom na condução da política monetária adotada pelo comitê, que agora visa trazer a inflação para um valor ao redor da meta, reiterando para uma proximidade do fim do ciclo de aperto monetário. No entanto, com a expansão dos estímulos fiscais e novos fatores advindos pelo lado da demanda devem exercer maior impacto sobre os níveis de preços nos próximos períodos, criando um cenário mais dificultoso para o Banco Central, com expectativa de mais um aumento de 50 bps em agosto, e possibilidade de um novo aumento para setembro.

O dólar comercial encerrou o mês de junho no valor de R$ 5,24, um aumento de 10% em relação ao mês de maio. Os principais motivos por trás dessa alta estão relacionados ao aperto monetário realizado em grandes economias (como nos EUA), ao aumento da percepção de risco quanto às decisões tomadas na parte fiscal do Brasil e a possibilidade de recessão global.

O cenário atual permanece com uma alta aversão a risco, com fortes incertezas e elevada volatilidade para o cenário prospectivo. Destaca-se ainda que o momento atual requer cautela e o BC enfatiza que a política monetária pode ser ajustada para assegurar a convergência da inflação para suas metas de 2023-24, a depender da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação.


Política Fiscal – Apesar da forte arrecadação de tributos, a aprovação da PEC dos auxílios eleva o risco fiscal.

No cenário político nacional, foi aprovada a chamada “PEC dos Auxílios” ou “PEC Kamikaze”. Estima-se que o impacto nos cofres públicos será de R$ 41,25 bilhões, que serão contabilizados fora da regra do teto de gastos. Entre as medidas aprovadas, destacam-se:

  • Aumento do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600.
  • Auxílio-caminhoneiro de R$ 1.000.
  • Auxílio-gás de R$ 120.
  • Auxílio para taxistas e motoristas de aplicativos.
  • Transporte público gratuito para idosos.
  • Repasse de R$ 500 milhões para o programa “Alimenta Brasil”.

Além dessa medida, a redução do IPI para 35% acarretará em uma perda de arrecadação no valor de R$ 7,6 bilhões em 2022 e R$ 10,2 bilhões em 2023. E, ainda com a preocupação do Poder Legislativo e Executivo em reduzir o preço dos combustíveis na bomba para os consumidores, a Lei Complementar n° 134 zerou as alíquotas de PIS/Cofins e Cide incidentes sobre gasolina e etanol até 31 de dezembro de 2022, o que gerará uma perda de R$ 15,4 bilhões. Todas essas medidas causam um cenário de dúvida e de incerteza quanto à condução da política fiscal no Brasil, com um aumento da percepção de que o país pode ter um descontrole nas despesas primárias nos próximos anos, impactando severamente a sustentabilidade da dívida pública no longo prazo.

De acordo com os dados divulgados pela Receita Federal, a arrecadação federal com impostos chegou a R$ 165 bilhões somente em maio, uma alta de 4% em relação a maio de 2021. No acumulado, o valor arrecadado no ano de 2022 é de R$ 908 bilhões. A Receita informou que houve recolhimentos atípicos no montante de R$ 20 bilhões, ligados a empresas de commodities. Vale destacar ainda que esse desempenho é explicado pelos aumentos de 83,2% na arrecadação relativa à declaração de ajuste do IRPJ e da CSLL e ao acréscimo de 14,4 % na arrecadação da estimativa mensal. Trazendo a visão macroeconômica, percebe-se que todos esses valores recordes estão sendo impulsionados pela inflação, que apenas no ano de 2022 acumula alta de 5,49%.

Segundo os dados divulgados pelo Instituto Fiscal Independente, o resultado primário do governo central acumula superávit de R$ 39,2 bilhões no ano. Vale destacar que este valor é resultado de um forte aumento da arrecadação de tributos e de um controle da despesa primária. Todavia, os dados mais recentes sobre o mês de maio apontam um déficit primário do governo central de R$ 39,4 bilhões, R$ 18,4 bilhões maior que o déficit apurado no mesmo mês do ano passado.


Setor Externo – Atividade econômica fraca e pressão inflacionária elevam risco de recessão global.

O setor externo no último mês ficou marcado pela escalada no conflito no leste europeu, com commodities seguindo alta volatilidade e levando a conversações entre as partes sobre as exportações de cereais. Além disso, a continuidade da política de covid zero chinesa e o cenário inflacionário global também ganham destaque.

A persistência da guerra na Ucrânia levou a representantes dos países envolvidos no conflito a discutirem sobre as cargas de cereais paradas nos portos ucranianos, em busca de arrefecer as pressões sentidas sobre o preço de commodities. O conflito, no entanto, parece estar longe de ser solucionado, com intensificação dos ataques russos em cidades como Kiev sendo reportadas, além da ofensiva no leste do país.

A produção manufatureira na Zona do Euro continua a sofrer contra a escassez na cadeia de suprimentos, pressão inflacionária elevada e fraca demanda ao passo em que as incertezas só aumentam sobre o cenário econômico. O reflexo disso é visto no índice PMI da região, que registrou, para a manufatura, 52,1 pontos, levemente acima das expectativas (52). O índice composto registrou 52 pontos (51,9), à medida que o resultado do PMI voltado a serviços, de 53 (52,8), influenciou positivamente o resultado, apesar do setor ter performado o pior número desde janeiro, devido à fraca recuperação pós-restrições.

Em direção positiva, o desemprego para o mês de maio no bloco caiu a 6,6%, número superior às expectativas (6,8%) e comparado ao mês anterior (6,7%). O desemprego continua a decrescer, desde o início de 2021, seguindo as condições favoráveis com a diminuição de restrições. No entanto, na contravia, a pressão inflacionária continua a surpreender negativamente, atingindo um número recorde de 8,6% ao ano para o mês de junho – de acordo com as expectativas -, comparado a 8,1% em maio e 1,9% no mesmo período do ano interior. A continuidade da pressão exercida pelos itens de energia e comida, álcool e tabaco são os principais responsáveis pelo resultado, sendo o primeiro 41,9% maior comparado ao mesmo período do ano interior.

O sentimento negativo é refletido sobre o índice de sentimento econômico ZEW, o qual teve a leitura de -53,8 pontos para julho de 2022, inferior aos -28 relatados em junho, e registrando o pior número desde dezembro de 2011, ao passo em que o panorama econômico é esperado a piorar, com preocupações latentes sobre a crise energética europeia, um possível movimento hawkish do Banco Central Europeu – o qual começará seu ciclo de aumento de juros ainda em julho -, e novas restrições chinesas.


Fonte: Refinitiv. Elaboração Própria


Já nos Estados Unidos, o PMI composto foi revisado a 52,3 para junho, de um dado preliminar de 51,2, ainda sendo uma queda quando comparado a maio (53,6). A desaceleração no crescimento teve comportamento generalizado, com ambos serviços e manufatura vendo incrementos menores no final do segundo semestre.

O non-farm payroll, indicador que demonstra o aumento na força de trabalho contratada excluindo trabalhos agrícolas, demonstrou um crescimento de 372 mil empregos para o mês de junho, número muito melhor que o antecipado pelo mercado (268 mil), e levemente abaixo do resultado revisado para maio (384 mil). Os números vieram em linha com a média mensal de 383 mil nos últimos 3 meses, apontando ainda para um mercado de trabalho “apertado”.

Indo na contramão da positividade no mercado de trabalho, a inflação anual americana acelerou a 9,1% em junho de 2022 – a maior taxa desde novembro de 1981 -, acima das expectativas (8,8%) e ante maio (8,6%). O aumento de 1,3% mensal, o maior desde setembro de 2005, foi motivado principalmente pelo aumento na gasolina (11,2%), abrigo (0,6%) e alimentos (1%), sendo estes os maiores contribuidores. A piora no cenário inflacionário é uma das principais causas para a piora das expectativas do consumidor, medido pela Universidade de Michigan. O índice registrou leitura de 47,3 pontos, que, apesar de ser superior às expectativas preliminares de 47 pontos, é a menor leitura desde maio de 1980.

Simultaneamente, o PIB americano apresentou um decrescimento de 1,6% para o primeiro trimestre de 2022, ante expectativas de queda de 1,5% e crescimento de 6,9% no último trimestre de 2021. A continuidade da pressão inflacionária e piora no cenário econômico, com crescentes expectativas de recessão em um futuro próximo, pressionam ainda mais o Fed e suas decisões de política monetária. A reunião que está por vir tem como previsão uma alta de mesma magnitude anterior, de 75 bps, mas alguns agentes do mercado já precificam uma alta de 100 bps, ao passo em que esperam uma atitude mais hawkish da autoridade monetária americana.


Fonte: Refinitiv. Elaboração própria


Como reação, os títulos americanos com maturidade em 10 anos vêm sofrendo volatilidade em momentos próximos a leitura de resultados importantes. A recente queda, quando comparado ao início do mês de junho, demonstra a preocupação dos agentes de mercado com a possibilidade de recessão na economia americana.

Contribuindo para a piora das expectativas, a economia chinesa afundou 2,6% no segundo trimestre do ano, comparado às estimativas de queda de 1,5% e crescimento revisado de 1,4% no trimestre anterior. A contração é a primeira desde o primeiro trimestre de 2020, quando os casos de covid em Wuhan foram classificados como uma epidemia. O resultado vem de acordo com a política de lockdowns impostas pelo governo chinês, prejudicando a cadeia produtiva em escala global.

Em suma, o cenário macroeconômico global continua a se mostrar desafiador, com temores de recessão à medida em que a guerra no Leste Europeu continua a pressionar o preço de commodities e as paralisações e restrições chinesas impactam negativamente a cadeia produtiva global.

Como resultado, os principais bancos centrais mundiais são pressionados a tomar atitudes hawkish, aumentando a magnitude dos incrementos nos juros, ao passo em que tentam combater a pressão inflacionária persistente.

No âmbito nacional, a atividade econômica continua a apresentar crescimento, apesar dos problemas de sentidos pela indústria, relacionados aos obstáculos sentidos na cadeia de produção e de insumos. Já o cenário fiscal apresenta deterioração e aumento de incertezas, devido a aprovação da PEC dos auxílios, apesar da forte arrecadação de tributos, deteriorando a perspectiva fiscal de curto e médio prazo.



Autores: Luís Guilherme Uliana, Mateus Melo Galdino e William Pedroso.

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Carta de Conjuntura Macro – Maio

Carta de Conjuntura Macro – Maio

A melhora nos resultados domésticos relativos à atividade econômica, com destaque para o mercado de trabalho, e a piora do quadro inflacionário doméstico foram os principais destaques para o mercado doméstico durante o mês de maio, enquanto no âmbito internacional as incertezas continuam a gerar uma maior percepção de risco para o cenário prospectivo.

Os resultados referentes ao 1T22 para a economia doméstica vieram em linha com as expectativas, reiterando um cenário de melhora para a atividade econômica. Em paralelo, o cenário inflacionário permanece desafiador, apesar de uma leitura mais branda para o índice no mês de maio, os indicadores apontam para pressões disseminadas sobre os componentes.

No âmbito internacional, as decisões de política monetária foram destaque, ao passo em que as pressões sobre os níveis de preços continuam persistentes, com alguns fatores, como a manutenção do conflito no leste europeu, gerando impactos adicionais nas percepções de risco, fatores que têm dificultado o processo de ancoragem das expectativas pelo mercado.


Atividade econômica – Resultados recentes reiteram melhora no cenário econômico, com destaque para o mercado de trabalho

No início do mês de junho, o IBGE divulgou os resultados referentes ao Sistema de Contas Nacionais Trimestrais para o primeiro trimestre de 2022. As expectativas para a atividade econômica, frente ao ambiente observado no mês anterior, se mantiveram alinhadas com as expectativas, tendo em vista os recentes dados de alta frequência e indicadores de confiança, já reforçando uma tendência de melhoria. Os resultados para o primeiro trimestre do ano vieram em linha, com mercado de trabalho ainda aquecido e as projeções e expectativas para o cenário à frente mantidas, com expectativa de crescimento modesto para 2023.

O PIB (Produto Interno Bruto) registrou alta pelo terceiro trimestre consecutivo, com crescimento de 1,7% no trimestre, na comparação com o mesmo período do ano anterior. Pela ótica da oferta, o destaque foi para o Setor de Serviços, cujo qual obteve uma expressiva expansão de 3,7% no período, em contrapartida, para os demais setores que compõem o PIB pela ótica da produção, os resultados foram negativos, com os setores da Indústria e da Agropecuária recuando 1,5% e 8,0%, respectivamente. A forte queda para o segmento Agropecuário adveio, majoritariamente, dos impactos negativos das condições climáticas adversas sobre algumas culturas, sobretudo da soja.

Pela ótica da demanda, os destaques foram o consumo das famílias e os gastos do governo, com expansão de 2,2% e 3,3%, respectivamente. Em contrapartida, a formação bruta de capital fixo registrou forte recuo de 7,2% na comparação anual, sendo esta a primeira queda após cinco trimestres consecutivos de crescimento. Por fim, no setor externo, as exportações de bens e serviços cresceram 8,1% enquanto as importações de bens e serviços recuaram 11,0%.

Na comparação com o trimestre imediatamente anterior, o 1T22 avançou 1,0% na série com ajuste sazonal, com destaque novamente para o setor de Serviços, que obteve alta de 1,0%, fortemente beneficiado com a retomada das atividades, mediante a melhora do ambiente pandêmico. Adicionalmente, a indústria manteve-se estável, com crescimento tímido de 0,1% no período, enquanto o setor Agropecuário, por sua vez, incorporando os impactos negativos das condições climáticas, retraiu em 0,9%.

Os resultados demonstram uma Indústria ainda com dificuldades, ainda não recuperada dos descasamentos provocados pela pandemia e dos elevados gargalos produtivos. O elevado preço das matérias primas e a falta de insumos permanecem como gargalos para o setor, fatores estes que, somados a uma maior demanda por serviços, têm dificultado a recuperação do setor. Para o setor de serviços, os segmentos de Transportes e Serviços prestados à família obtiveram altas significativas, refletindo a melhora do quadro econômico e pandêmico.

Tabela Descrição gerada automaticamente

Fonte: IBGE. Elaboração: Clube de Finanças

Após os resultados positivos de março, os dados divulgados pelo IBGE, na PNAD, demonstraram que o mercado de trabalho continua aquecido, registrando forte geração de empregos e expansão da massa salarial. Como destaque, ressalta-se a queda observada na taxa de desemprego, que atingiu 10,5% da força de trabalho no trimestre encerrado em abril, valor bem abaixo do observado no mesmo período do ano anterior, de 14,8%. Este resultado situa-se ainda, em patamares inferiores aos meses pré-pandêmicos.

Adicionalmente, os números do Banco Central, considerando sua metodologia própria, também apresentam resultados positivos para o mercado de trabalho, com a taxa de desemprego mensal em 9,6%, ao mesmo tempo em que a taxa de participação e a população ocupada vêm crescendo.

A melhora observada na taxa de desemprego se deve ao aumento no número de contratações, com crescimento da população ocupada, cujo contingente atingiu 96,5 milhões, uma expansão de 10,3% na comparação anual, superando o avanço na força de trabalho de 5,1% – que contempla a população que está à procura de emprego e a população ocupada. É esperado um quadro contínuo de melhoria para o mercado de trabalho ainda durante o primeiro semestre, quadro este que deve pouco a pouco perder dinamismo a partir da segunda metade do ano, onde é esperado uma redução da atividade, com a absorção pelo mercado dos impactos defasados da política monetária.

As projeções e expectativas de crescimento para 2023 se mantém em linhas com as leituras anteriores, com um avanço modesto da atividade próximo a 0,5%, tendo em vista o atual cenário de desaceleração econômica mundial e o impacto defasado da alta dos juros, que deve surtir maior efeito sobre a atividade a partir do segundo semestre de 2022. Em paralelo, apesar do crescimento tímido com um balanço de riscos negativo, outros fatores podem trazer melhorias ao atual cenário, como o impacto positivo das políticas monetárias contracionista, reduzindo a pressão sobre os índices de preços, e a recuperação do mercado de trabalho, que conjuntamente devem exercer impacto positivo sobre a demanda agregada. Adicionalmente, a melhora do ambiente fiscal vislumbrada nos últimos meses garante maior fôlego para o setor público, que pode recorrer a novos estímulos fiscais e, desta forma, gerar novos estímulos à demanda agregada da economia.


Inflação e Política Monetária – Cenário inflacionário se deteriora, com pressões sobre os níveis de preços disseminadas, e ciclo de alta permanece, mas em novo ritmo

A inflação ao consumidor, medida pelo IPCA, avançou 0,47% no mês de maio, valor abaixo das expectativas do mercado e das leituras anteriores. No acumulado dos últimos doze meses, o IPCA acumula alta de 11,73%, redução de 0,28 p.p. na comparação com o acumulado observado nos 12 meses imediatamente anteriores à maio. O resultado apresentou forte retração na comparação com o índice de preços de abril, de 1,06%, no entanto, o bom resultado não trouxe melhorias efetivas para o cenário inflacionário, já que a desaceleração foi puxada, sobretudo, por leituras mais baixas em segmentos voláteis, como alimentação e preços administrados. O elevado índice de difusão (72,4%), que segue nos níveis mais altos observados desde 2002-2003, e o avanço da média dos núcleos, que vem registrando as maiores leituras desde o início da pandemia, tem demonstrado que as pressões inflacionárias têm ganhado maior disseminação.

Nesta nova leitura, oito grupos dos nove pesquisados obtiveram alta. O maior impacto no índice cheio foi do grupo de Transportes, com alta mensal para o mês de maio de 1,34%, impactando em 0,30 p.p. o índice cheio. Apesar do avanço, a alta nos preços dos combustíveis foi menor do que o observado em leituras anteriores, com o fim dos repasses para o consumidor das altas nos preços das refinarias ocorridas em março. O grupo Habitação foi o único a registrar queda nos níveis de preços, com variação negativa de -1,70% no mês, refletindo a melhora dos preços da energia elétrica.

A redução do IPCA para o mês de maio foi puxada, sobretudo, pela queda nos preços administrados, cujos quais respondem por aproximadamente 25% do IPCA total. A variação conjunta dos preços administrados em maio foi de -0,51%, forte recuo na comparação com abril, onde o grupo obteve alta mensal de 0,55%. Para os preços livres, o mês de maio registrou alta de 0,83%, valor que representa uma desaceleração frente a abril (1,25%).

O grau de incerteza acerca do cenário à frente segue elevado. Além do atual cenário inflacionário de curto prazo, a expansão da atividade e os bons resultados para o mercado de trabalho têm acrescido o risco de pressões inflacionárias persistentes advindas pelo lado da demanda. A maior pressão em maio dentre os preços livres foi do setor de serviços, com variação de 0,85% no mês, resultado que já demonstra uma maior pressão inflacionária ocasionada pelo crescimento da demanda, com a melhora da atividade e dos indicadores de confiança. Adicionalmente, a persistência do conflito no Leste Europeu mantém para o atual cenário um risco altista sobre os níveis de preços, com um eventual embargo europeu ao petróleo russo impactando sobre os preços dos combustíveis praticados pela Petrobras.

Por outro lado, outros fatores corroboram para o aumento do grau de incerteza, mas gerando perspectivas de impactos baixistas sobre os níveis de preço. Ao longo do mês de maio, a inflação voltou a entrar na pauta do Congresso e do governo, visando introduzir medidas que mitiguem a alta nos preços. Diversas propostas foram levantadas visando impactar os preços dos combustíveis, energia elétrica e serviços de telecomunicações, como o PLP 18/22, limitando as alíquotas de ICMS, e a PEC 16, que propõe financiar por meio de repasses da União o corte por 6 meses do ICMS sobre o GLP, diesel e etanol.

No âmbito da Política Monetária, dentro do esperado pelo mercado e em congruência com o precificado na curva de juros, o Copom elevou a taxa Selic em 50 bps na reunião de junho. Segundo o comunicado, o fim do ciclo permanece em aberto, com continuidade do ajuste para a reunião de agosto de igual ou menor magnitude à de junho.

Neste novo comunicado, o comitê trouxe uma comunicação mais dovish, informando nova redução do ritmo de ajuste, mesmo admitindo uma piora conjuntural, com aumento das incertezas desde a última reunião. O Copom trouxe sinalizações de que a convergência para a meta não ocorrerá em 2023, uma vez que seria necessário um aperto monetário mais incisivo.

Na Ata, o comitê trouxe sinalizações que indicam para um fim de ciclo, reiterando as dificuldades para trazer a inflação junto à meta para 2023 e as defasagens da política monetária, não sendo possível observar, até então, grande parte dos impactos das políticas contracionistas sobre a atividade e, consequentemente, sobre os níveis de preços.

O anúncio das medidas propostas pelo governo refletiu sobre a curva de juros, já sendo precificados pelo mercado, com ganho de inclinação na curva a partir de prazos superiores a três anos. Conjuntamente, a ponta longa da curva deslocou-se para cima, adquirindo também maior inclinação, incorporando consigo uma maior percepção de risco fiscal pelos agentes.

Fonte: Anbima. Elaboração: Clube de Finanças


Política Fiscal – Dados reiteram cenário positivo, com destaque para a arrecadação, mas risco de novas medidas fiscais trazem incerteza ao atual cenário

No âmbito fiscal, as perspectivas para o cenário presente continuam positivas, com melhora nas projeções de resultado, em contraponto, o cenário adquire certo grau de incerteza, com a tramitação de eventuais novas medidas fiscais por parte do governo para controle inflacionário.

Como já mencionado nos meses anteriores, o cenário fiscal permanece positivo no que tange às arrecadações do governo. Os fatores que contribuíram para o bom resultado primário em 2021 permanecem, como a inflação elevada, a alta nos preços do petróleo e a depreciação no câmbio. Adicionalmente, outros fatores, como a melhora na atividade econômica em 2022, têm corroborado para o cenário prospectivo atual.

Segundo dados do Instituto Fiscal Independente, a Receita Primária do governo central deve ter crescido 10,8%, em termos reais, no acumulado dos primeiros cinco meses de 2022, enquanto o governo central deve ter obtido um superávit primário de R$ 38,9 bilhões para o mesmo período, valor que supera em R$ 19,0 bilhões o resultado obtido nos primeiros cinco meses de 2021.

Apesar dos resultados positivos vislumbrados até então, a possibilidade de inserção de novas medidas visando conter a pressão nos níveis de preços tem trazido maior incerteza para o cenário fiscal atual, com uma leve piora nas perspectivas de curto e médio prazo.


Setor Externo – Inflação persistente e acima do esperado alerta as principais autoridades monetárias, ao passo em que a continuação da guerra na Ucrânia e lockdowns na China levam a piora no balanço de riscos

O último mês ficou marcado pelo aperto monetário por parte dos principais bancos centrais ao redor do globo, ao passo em que temores de uma recessão e piora no balanço de riscos exigiram uma atitude mais assertiva das autoridades monetárias.

No leste europeu, o conflito entre Ucrânia e Rússia continua a se prolongar, sem demonstrar um sinal de interrupção. A continuidade da guerra ainda pressiona o preço de commodities, principalmente milho, trigo, petróleo e gás natural, dado o cenário desfavorável e as sanções impostas pelos principais países ocidentais ao Kremlin.

Na China, cidades como Pequim e Shanghai passaram por um processo de reabertura recentemente, mas lockdowns em escalas menores continuam a ser implementados pelo governo chinês. A política de zero tolerância ao COVID na China se mostra persistente, de forma que esta reflete negativamente sobre o crescimento potencial  da economia do país asiático para 2022 e sobre as cadeias produtivas globais, resultando em mais gargalos e interrupções na produção.

Na Zona do Euro, a leitura para a inflação no mês de maio veio de acordo com as expectativas, em 0,8%, ante 0,6% em abril. As maiores altas registradas vieram do custo de energia (1,9%) e comida, álcool e tabaco (1,3%). O índice anualizado apresenta alta de 8,1%, muito acima da meta de 2% do ECB (European Central Bank), o que levou ao comunicado do banco central de que começará a elevar os juros a partir do mês de julho.

Já o PMI composto (54,8) na região veio abaixo das estimativas (54,9) e apresentou redução ante abril (55,8). A desaceleração se deu exclusivamente como um resultado de uma expansão menor do setor de serviços em meio a sinais que demonstram enfraquecimento da recuperação pós-lockdown. O desemprego, de outra forma, continuou estável a 6,8% para o mês de abril de 2022, significando uma queda de 96 mil de desempregados e uma  taxa de desemprego de jovens caindo de 14% a 13,9%.

Os títulos públicos com prazo em 10 anos da Zona do Euro responderam com um aumento na taxa contratada, ao passo em que o mercado já precifica um aumento da taxa de juros básica do bloco em julho, conforme o comunicado do BCE.

Gráfico, Histograma Descrição gerada automaticamente

Fonte: BCE. Elaboração: Clube de Finanças

Nos EUA, a leitura mais recente do payroll mostrou criação de 390 mil empregos no país – acima das expectativas de 325 mil -, sendo este o menor valor nos últimos 12 meses, mas, ainda sim, superior à média dos 12 meses anteriores à pandemia (198 mil).

A inflação, medida pelo CPI, atingiu o pico de 8,6% ao ano no mês de maio – maior nível desde dezembro de 1981 -, bem acima das expectativas de 8,3%. A inflação acelerou 1% para o mês, acima das expectativas de 0,7%, em meio a um aumento geral de custos, com os índices de abrigo (0,6%), gasolina (4,1%) e comida (1,2%) exercendo a maior contribuição para o resultado.

O número não foi bem-visto pelo mercado, e nem pelo comitê de política monetária americana, o FOMC. Jerome Powell, chairman do comitê, dava como certo um aumento de 50 bps na reunião de junho. No entanto, a alta inesperada da inflação e a reação negativa dos agentes, aliado à preocupação de uma futura recessão econômica requereu uma alta de maior magnitude, com o Fed optando, de forma quase unânime, por uma alta de 75 bps na taxa de juros americana. Dessa forma, a taxa básica de juros americana está estabelecida na faixa entre 1,5% e 1,75% ao ano – a mais elevada desde março de 2020.

O PMI composto para o mês de maio (53,6), de forma similar à Zona do Euro, apresentou uma queda ante o resultado do mês de abril (56), refletindo o aumento de preços e a disrupção da cadeia de suprimentos.

Já os títulos com maturação em 10 anos americanos continuam em movimento de alta, com um pico recente, devido a maior magnitude do aumento feito pelo Fed, enquanto a autoridade monetária procura controlar a pressão inflacionária no país.

Gráfico, Gráfico de linhas Descrição gerada automaticamente

Fonte: Refinitiv. Elaboração: Clube de Finanças

Já na China, a inflação continuou inalterada, a 2,1% ao ano, inferior às expectativas de 2,2%. Os alimentos apresentaram o maior aumento no índice pelo segundo mês seguido – 2,3% em maio e 1,9% em abril -, ao passo em que o consumo voltou a ganhar força com a redução de restrições em Shanghai e Pequim.

De forma parecida, o PMI de manufatura chinesa apresentou melhora ante o mês anterior, de 46 para 48 pontos, dado o afrouxamento da política de lockdowns. No entanto, o setor de serviços continua sendo prejudicado pela política, de forma que o PMI composto para o mês de maio registrou 42,2.

Em suma, o cenário macroeconômico global ainda se mostra desafiador, com a persistência do conflito no Leste Europeu continuando a pressionar o preço de commodities e a política de lockdowns na China impactando negativamente a cadeia produtiva em escala global.

Ainda no cenário internacional, os apertos monetários mais incisivo pelos principais bancos centrais, com aumentos de maior magnitude nos juros, visam convergir a inflação para patamares próximos à meta até 2023 e 2024.

Já em âmbito nacional, a atividade econômica apresentou crescimento pelo terceiro trimestre consecutivo, puxado principalmente pelo bom desempenho do setor de serviços, ao passo em que a indústria ainda sofre com problemas nas cadeias de produção e de insumos. O cenário fiscal se mantém com perspectivas positivas, apesar das novas medidas discutidas na Câmara e no Senado, que ao buscar conter a pressão nos níveis de preços, trazem maior incerteza ao cenário prospectivo de curto e médio prazo.

Autores: Mateus Melo Galdino, Luís Guilherme Uliana e William Pedroso
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Carta de Conjuntura Macro – Abril

Carta de Conjuntura Macro – Abril

A melhora nos resultados domésticos relativos à atividade econômica, a persistência inflacionária e o aumento das incertezas globais, com a continuidade da guerra na Ucrânia, foram os principais destaques para o mês de abril.

A manutenção do conflito no leste europeu tem aumentado as incertezas quanto aos impactos sobre a atividade no continente europeu. Em paralelo, o cenário de inflação na Europa, mais brando que nos Estados Unidos, sugere um aumento de juros mais gradual pelo Banco Central Europeu (BCE) do que pelo FED, que por sua vez, tem encontrado um ambiente conjuntural mais desafiador. Neste cenário, há o risco de que seja necessário aumentar a taxa de juros acima do que está precificado pelo mercado neste momento, que é uma taxa de juros do FED funds de 3,3% para meados de 2023.

Adicionalmente, o risco de uma forte desaceleração na China, com as fortes restrições adotadas pelo governo, acentua o quadro de incertezas no âmbito internacional. Em contraste, dados domésticos surpreenderam positivamente, com o mercado de trabalho aquecido e uma melhora marginal nos níveis de confiança, resultando em revisões altistas para o PIB em 2022.


Atividade econômica – Melhora nos indicadores e mercado de trabalho aquecido reforçam melhora da atividade econômica para 2022

Apesar do aperto monetário, os dados relativos à atividade econômica vêm apresentando melhora, mediante a expansão do mercado de trabalho, ao impacto positivo dos estímulos fiscais e a melhoria do quadro pandêmico, com redução mais acentuada das medidas restritivas. Dados de alta frequência e indicadores recentes de confiança reforçam a tendência de melhoria, a confiança do consumidor para o mês de abril teve alta expressiva, principalmente para os consumidores de mais baixa renda, adicionalmente, o setor industrial e de serviços também apresentaram aumentos significativos nos índices de confiança.

O mercado de trabalho continua apresentando números positivos, com crescimento do número de empregos e da massa salarial real, demonstrando melhora e sugerindo um mercado de trabalho aquecido. Os dados do CAGED apresentaram forte geração de empregos no setor formal, fechando o primeiro trimestre com 615 mil empregos gerados. Adicionalmente, o resultado da PNAD também reforçou esta tendência positiva, com aumento de aproximadamente 1,6 milhão de trabalhadores no mês de março.

As projeções para a atividade econômica obtiveram leve melhora para o ano de 2022, com projeção de avanço do PIB de 1,0%, segundo o Instituto Fiscal Independente. Resultado este que reflete a resiliência da atividade econômica no curto prazo e os estímulos fiscais adotados pelo governo. As melhoras nas expectativas e nas projeções do mercado advém da surpresa obtida com o resultado positivo do último trimestre de 2021 e a melhora dos indicadores econômicos durante o início do ano de 2022.

Adicionalmente, é esperado um forte incentivo sobre a atividade doméstica com o ingresso dos recursos dos saques do FGTS na massa de rendimentos, a liberação de cerca de R$ 30 bilhões entre abril e junho deve surtir efeitos positivos sobre a demanda agregada e estimular a atividade no curto prazo.

Entretanto, mesmo com alguns indicadores apresentando melhorias, o cenário ainda permanece desafiador, as perspectivas econômicas carregam certo grau de volatilidade e incerteza acima do usual, mediante o prolongamento do conflito militar no leste europeu e o cenário inflacionário, cujo qual tem gerado um aperto monetário nas economias.

No âmbito internacional, o FMI reduziu a expectativa de crescimento do PIB mundial para 2022 e 2023, de 4,4% para 3,6% e de 3,8% para 3,6%, respectivamente, culminando em reduções de 0,8 e 0,2 p.p. na comparação com as projeções de janeiro. As revisões baixistas sobre a atividade econômica global advêm, em grande medida, pelos impactos diretos da guerra nas economias da Rússia e da Ucrânia e pelos efeitos indiretos nas demais economias, sobretudo, do bloco Europeu.

Fonte: FMI. Elaboração: Clube de Finanças

WEO: World Economic Outlook


Inflação e Política Monetária – Revisões altistas para inflação em 2022 e continuidade do aperto monetário

A inflação ao consumidor em abril, medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), registrou alta mensal de 1,06%, o maior resultado registrado para o mês desde 1996. No acumulado dos últimos doze meses, a inflação registra alta de 12,1%, acima dos 11,3% observados nos doze meses imediatamente anteriores.

A pressão sob os níveis de preços segue disseminadas entre os componentes, com oito dos nove grupos de produtos e serviços observados apresentando alta no mês de abril. Os maiores impactos sobre os índices de preços vieram dos alimentos e dos combustíveis, sendo o grupo de alimentação e bebidas responsável pela maior variação no mês e maior impacto no índice cheio (alta de 2,06% e 0,43 p.p. de impacto). Adicionalmente, o grupo transportes obteve a segunda maior alta, sendo fortemente impactado pelo aumento dos preços dos combustíveis. Conjuntamente, os dois grupos contribuíram com aproximadamente 80% da taxa de variação do IPCA em abril.

No cenário base, as projeções apontam para uma alta no IPCA próxima a 8,0% em 2022, refletindo os persistentes choques nas cadeias de suprimentos globais, intensificados pelo prolongamento do conflito militar no leste europeu e pelas medidas restritivas adotadas na China para conter o avanço das novas ondas da Covid-19.

Apesar de algumas medidas contribuírem para reduzir os impactos inflacionários no curto prazo, como a redução das alíquotas do IPI, o atual cenário de forte pressão sobre os níveis de preços tende a permanecer, prevalecendo riscos altistas. Neste cenário, de inflação corrente em nível elevado, é esperado uma inércia inflacionária ainda maior para o ano de 2023.

Neste cenário e em linha com as expectativas do mercado, o COPOM decidiu aumentar em 1 p.p. a taxa básica de juros, para 12,75%. O Comitê sinalizou ainda, para mais uma alta na próxima reunião, contudo, de menor magnitude, caso os cenários projetados pelo BACEN se confirmem.

A ata do COPOM manteve os principais pontos elencados na comunicação anterior, sem novidades significativas, adicionando, no entanto, uma abordagem mais cautelosa mediante a deterioração da dinâmica inflacionária e o impacto desta sobre as projeções de longo prazo, fato este que vem ocorrendo de forma bem mais intensa do que o esperado inicialmente, e que contribui para que o comitê deixe em aberto a decisão para a próxima reunião.

Ao que sinaliza a ata do COPOM, bem como as expectativas do mercado, é esperado que haja apenas mais uma alta, com o fim do ciclo de aperto em junho. No parágrafo 13, o Comitê destaca que “o ciclo de aperto monetário corrente foi bastante intenso e tempestivo” e, mediante as defasagens dos efeitos da política monetária sobre a atividade, os efeitos contracionistas ainda não surtiram total efeito sobre a economia.


Política Fiscal – Resultados fiscais continuam surpreendendo positivamente e mantém expectativa de novo superávit

Em linha com o mês anterior, os resultados fiscais vêm apresentando melhorias, com o PIB nominal e inflação mais elevados traduzindo em expectativas maiores de arrecadação, adicionalmente, a persistência do conflito no leste europeu e a consequente manutenção dos preços de commodities em patamares elevados, sinalizam para um crescimento adicional nas receitas do governo.

Apesar das medidas de incentivo fiscal, como a redução no IPI, que deve retrair em cerca de R$ 5 bilhões a arrecadação no ano, e o aumento de gastos, as projeções apontam para um novo superávit em 2022. Em paralelo, as expectativas para os anos seguintes são de resultados primários próximos a zero, culminando em uma dívida bruta e líquida ainda crescente ao longo dos próximos anos.

Apesar da melhora nos resultados fiscais, as percepções de risco ainda se mantém de certa forma inalteradas, os bons resultados fiscais obtidos ainda não se transformaram em uma redução dos prêmios da curva de juros, tendo em vista a persistência nas percepções de risco, com a mudança no teto de gastos e a não descartável possibilidade de novas alterações na lei que regula este instrumento para os próximos anos. O teto de gastos é uma importante âncora fiscal para o país, responsável por ancorar as expectativas de inflação.

Fonte: Anbima. Elaboração: Clube de Finanças


Setor Externo – Continuidade do confronto na Ucrânia e surto de COVID-19 na China aumentam os riscos no curto prazo

O mês de abril ficou marcado pelo aperto na política monetária americana, incertezas com relação à atividade econômica chinesa, ao passo em que a política de covid zero continua em andamento, e a escalada do confronto no leste europeu entre Rússia e Ucrânia.

O confronto no leste europeu se mostra persistente, com ambas as partes não chegando a um acordo para encerrar o conflito entre os países. Como resultado, Finlândia e Suécia, países próximos ao kremlin, optaram por ir contrário ao seu costume de neutralidade, e abriram processo para aderir à OTAN, movimento mal-visto pelo governo russo, que teme uma expansão da infraestrutura militar.

A manutenção do conflito continua a provocar um choque negativo persistente sobre as commodities, principalmente sobre as energéticas e as agrícolas, como o trigo e o milho, que continuam em tendência altista após um breve período de estabilização a níveis de preços altos.

Fonte: Yahoo Finance. Elaboração: Clube de Finanças

Na Zona do Euro, a produção industrial para o mês de março retraiu em 0,8%, número melhor que o esperado (-1%) e inferior ao crescimento apresentado em fevereiro (1,7%). O índice foi afetado principalmente pelas quedas de 4% em produção energética e 2,7% de bens de capital. As altas de 2,8% de bens de consumo não-duráveis e 6,6% de bens de consumo não foram suficientes para deixar o índice em patamar positivo.

Já a inflação no bloco continua no seu maior patamar para o mês de abril, estabelecida em 7,4% anualizados. As maiores contribuições para a inflação anualizada da Zona do Euro vêm de energia – responsável por 3,7 p.p. do índice -, seguido por serviços (1,38 p.p.), alimentos, álcool e tabaco (1,35 p.p.) e bens industriais não-energéticos (1,02 p.p.). A taxa de inflação está muito acima da meta de 2%, estabelecida pelo ECB, e não deve voltar a patamares reduzidos tão cedo. A crise energética, exacerbada pela invasão russa à Ucrânia, e os persistentes gargalos na cadeia de suprimentos ao redor do globo continuam pressionando a inflação global, deteriorando o balanço de riscos e exigindo medidas mais assertivas por parte dos principais bancos centrais.

Demonstrando o “pessimismo” no bloco, o índice de confiança do consumidor na Zona do Euro registrou -22 pontos no mês de abril, a pior marca desde abril de 2020. O índice no mês de março já havia chegado a -21,6 – a piora no indicador demonstra a reação do consumidor à continuidade do conflito no leste europeu, que afeta o abastecimento de diversas commodities e provoca uma elevação generalizada de preços.

Por fim, o PMI composto no bloco atingiu a marca de 55,8 no mês de abril, ante 54,9 do mês de março e de acordo com as expectativas do mercado. A leitura do índice apontou para o maior crescimento na atividade do setor privado nos últimos sete meses, ao passo em que o setor de serviços (55,7) se recupera com menores restrições atreladas a COVID-19, ajudando a ofuscar a diminuição em manufatura (55,5), a menor nos últimos 15 meses. O desemprego no bloco decresceu para 6,8% para o mês de março, levemente acima das expectativas de 6,7%. As principais quedas registradas foram na Alemanha (2,9% ante 3%) e Itália (8,3% ante 8,5%), enquanto a França firmou-se em 7,4%.

Nos EUA, o Fed decidiu por aumentar a taxa de juros básica em 50 bps, o maior aumento em mais de duas décadas. A elevação, apesar de esperada, demonstra que o Federal Reserve está disposto a aumentar o ritmo nos incrementos de alta de juros, botando na mesa um debate para um próximo aumento na casa de 75 bps – no momento, grande maioria do comitê é contrária a um aumento de tamanha magnitude. Vale ressaltar, no entanto, que o comitê também era em sua grande parte contrário a um aumento na casa de 50 bps, mas as condições adversas no balanço de riscos fizeram com que o Fed adotasse tal medida.

A inflação no país registrou 0,3% para o mês de abril – 8,3% anualizados ante 8,5% em março. O número veio acima das expectativas de 8,1% ao ano. Apesar da queda de 6,1% no preço da gasolina, o aumento em gás natural (3,1%) e eletricidade (0,7%), aliados ao aumento em alimentos (0,9%) e abrigo (0,5%) foram os principais contribuintes para o resultado.

Já a taxa de desemprego continuou estável em 3,6% para o mês de abril, a menor taxa desde fevereiro de 2020, e levemente acima das expectativas de 3,5%. O PMI composto para abril foi revisado a 56 pontos, ante 57,7 registrados em março. A expansão na manufatura (59,2 ante 58,8) foi contrabalanceada por um crescimento menor de serviços (55,6 ante 58). Ainda, apesar de as empresas terem reportado um crescimento de empregos, a falta de trabalhadores persiste e, como resultado, atrasos de trabalho cresceram a um ritmo acentuado.

A economia americana contraiu 1,4% – em fatores anuais – no primeiro trimestre de 2022, bem abaixo das expectativas do mercado de expansão de 1,1%, seguindo um crescimento de 6,9% no quarto trimestre de 2021. Enquanto as exportações caíram 5,9%, as importações aumentaram em 17,7%, ao passo em que o investimento privado doméstico decaiu significativamente (2,3% ante 36,7%). Além disso, os gastos do governo também registram queda ante o período anterior (-2,7% ante -2,6%), e, na contramão, o consumo (2,7%) e investimento fixo (7,3%) contribuíram positivamente ao PIB.

Por fim, a confiança do consumidor, mensurada pela Universidade de Michigan, registrou o menor patamar desde agosto de 2011, caindo a 59,1 em maio, ante 65,2 em abril, e inferior às expectativas (64). A pressão inflacionária continua a pesar negativamente para o consumidor, restringindo o consumo de bens duráveis, que caíram ao menor nível registrado desde 1978.

Por fim, a China enfrenta um surto de COVID-19 em diversas províncias, com cidades – como Shanghai – em protocolo de lockdown. Este fator tem impacto em magnitude global, visto que o método de combate ao vírus compromete a cadeia de suprimentos, causando atrasos e aumento nos preços de bens ao redor do globo, além de prejudicar a atividade econômica chinesa e consequentemente mundial, e já pode ser observado no registro do PMI de abril, que desabou para 36,2, ante 42 em março, indicando uma retração.

O país, no entanto, apresentou um crescimento ajustado de 1,3% em seu PIB para o primeiro trimestre do ano, ultrapassando as estimativas do mercado de 0,6%, muito motivado pelos estímulos fornecidos pelo governo chinês, que busca reduzir o impacto causado pela sua política de Covid Zero.


Mercado financeiro – Ibovespa fechou no negativo pela primeira vez no mês de abril em 2022 e Criptomoedas seguem em forte desvalorização

O índice Ibovespa fechou o mês de abril com uma desvalorização de aproximadamente 10%, o primeiro mês negativo do ano de 2022. Entre os motivos que explicam a queda, os lockdowns realizados na China provocaram temores de uma possível redução na demanda global por commodities, impactando as ações ligadas a esse setor no Brasil, que possui o maior peso na composição da bolsa brasileira. Adicionalmente, o aperto monetário provocado pelo FED, com a alta dos juros nos Estados Unidos, aumentou a aversão ao risco dos investidores, ocasionando uma retirada de investimentos dos mercados emergentes, como é o caso do Brasil. De acordo com a B3, os investidores internacionais retiraram R$ 7,67 bilhões no mês de abril da Bolsa.

Em linha, o Bitcoin também tem apresentado forte desvalorização, consolidando uma perda de quase 60% desde o ATH (all time high) em novembro de 2021, quando chegou próximo da marca de U$ 68 mil. A segunda maior criptomoeda em valor de mercado, Ethereum, também apresenta uma queda de, aproximadamente, 60% desde novembro de 2021. Entre os fatores que explicam este cenário, o principal deles é o aumento da taxa de juros americana em 50 bps, número já esperado pelo mercado, mas ainda assim, suficiente para muitos agentes migrarem seus investimentos para ativos menos arriscados.


Síntese mensal

A continuidade do conflito no Leste Europeu continua a afetar negativamente o balanço de riscos em nível global. Novas revisões nas projeções apontam para um menor crescimento para as principais economias mundiais, além de uma pressão inflacionária persistente, sinalizando que o atual cenário, de aperto monetário pelos principais bancos centrais, deverá ser mantido para os próximos períodos, através de altas de maior magnitude nas taxas de juros e encerramento de programas de compra de ativos.

No cenário nacional, os dados positivos apontam para uma melhora do ambiente econômico, com crescimento da atividade e indicadores sinalizando para um mercado de trabalho aquecido. No entanto, o atual cenário, de atividade aquecida para o curto prazo, contrasta com as projeções de desaceleração para o segundo semestre de 2022, com a pressão inflacionária e a alta taxa de juros pesando negativamente sobre as projeções, tendo em vista os impactos negativos dos efeitos da política monetária contracionista sobre a atividade, surtindo maiores impactos sobre a demanda a partir dos próximos meses.

Em síntese, o cenário é de maior cautela e de piora nas percepções de risco, com uma maior clareza dos impactos causados pelo conflito no leste europeu sobre a atividade econômica, sobretudo, das economias europeias, reduzindo as projeções de crescimento global para 2022 e 2023. Neste cenário, onde não há previsão de alívio para o quadro inflacionário no curto prazo, é esperado uma continuidade do aperto monetário por parte das principais autoridades monetárias, desestimulando ainda mais a atividade econômica, mas objetivando conter a escalada dos níveis de preços.


Autores: Luís Guilherme Uliana, Mateus Melo e Wiliam Midon Pedroso.

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Carta de Conjutura Macro – Março

Carta de Conjutura Macro – Março

Introdução

O mês de março foi marcado, principalmente, pelas consequências inflacionárias causadas pelo conflito entre Rússia e Ucrânia, com destaque para as commodities energéticas. Concomitantemente, as economias continuam apresentando dificuldades em lidar com as pressões sobre os índices de preço advindas do descompasso das cadeias produtivas mundiais, fortemente impactadas pela pandemia.

No Brasil, dados econômicos apontam um baixo crescimento esperado para os próximos trimestres, com o Governo Federal adotando algumas medidas que visam estimular a atividade econômica do país.


Atividade econômica – Dados setoriais reforçam cenário de baixo crescimento, enquanto mercado de trabalho apresenta melhora na geração de empregos

Dados recentes da atividade econômica reforçam cenário de baixo crescimento para a economia no primeiro trimestre de 2022, com os principais indicadores econômicos de fevereiro e março sinalizando leve melhora na comparação com os dados relativos ao mês de janeiro.

O índice IBC-Br, que mede a atividade econômica mensal e serve como uma prévia do PIB, apresentou queda de 1% para o mês de janeiro deste ano. Apesar do início negativo, medidas recentes podem apresentar uma melhora no cenário econômico. Recentemente, o governo reduziu impostos sobre produtos industrializados (IPI), ampliou linhas de crédito consignado e liberou o saque extraordinário, de até mil reais por trabalhador, do FGTS.

As medidas de estímulo fiscal adotadas pelo governo federal durante o mês de março têm gerado estímulos à atividade econômica e devem continuar surtindo efeito sobre a economia nos próximos meses. Ao todo, estas medidas somam mais de R$ 100 bilhões, o que representa mais de 1% do PIB. Adicionalmente, com a melhora do ambiente pandêmico, e a consequente redução das medidas de isolamento, dados de alta frequência e da confiança dos agentes econômicos para o mês de março reiteram para uma leve recuperação da atividade.

A indústria continua a sofrer com gargalos na cadeia de suprimentos e preços de matérias primas inflacionados, refletindo na queda acumulada de 5,8% a.a na produção industrial para o primeiro trimestre de 2022, sendo os bens duráveis os mais afetados. Já os serviços mostram resiliência ao se manterem estáveis no início do ano, com destaque para o setor de transportes. Para os próximos meses, é esperado pelo mercado que o setor de serviços apresente viés altista, sobretudo com serviços prestados às famílias e transporte aéreo se beneficiando do forte arrefecimento da pandemia.

Para 2022 e 2023, as projeções são de leve crescimento para a economia. As medidas fiscais, a redução do superávit dos estados e municípios pelo aumento das despesas e o arrefecimento da pandemia devem fornecer estímulos à demanda agregada e impulsionar a atividade econômica.

Dados do CAGED apresentaram forte avanço no mês de fevereiro, com geração de 328 mil empregos no setor formal, com projeções do mercado para geração de 220 mil empregos. Já no setor informal, a PNAD estima a geração de, aproximadamente, 1,1 milhão de empregos. A taxa de desemprego, portanto, é de 11,2%, 0,6 p.p. inferior ao desemprego apresentado em fevereiro de 2020, período pré-pandemia. A tendência é que o desemprego continue a diminuir nos próximos meses, mas, para o segundo semestre do ano, os efeitos defasados do aumento na taxa de juros devem ser melhor incorporados, causando uma desaceleração na geração de empregos.


Inflação e Política Monetária – Cenário inflacionário segue desafiador, com novas leituras acima das expectativas

Ao longo do mês de março, os indicadores de inflação vieram novamente acima das expectativas e continuam indicando uma composição desfavorável, com os núcleos de inflação se mantendo em níveis elevados e as pressões inflacionárias ainda disseminadas.

O IPCA, principal indicador da inflação, teve alta de 1,62% no mês de março – superior aos 1,33% esperados e 0,61 p.p maior ante fevereiro. Essa é a maior variação para o índice em um mês de março desde 1994. As commodities energéticas continuam impactando o índice, sendo que o maior destaque para a alta foi do segmento de transportes, que variou 3,02% e foi responsável por 0,65 p.p. do índice. Em seguida, aparecem Alimentação e bebidas, variando 2,42% e impactando 0,51 p.p. A combinação entre os dois foi responsável por 72% do resultado do IPCA. As últimas leituras do índice e as perspectivas de risco no cenário global não perfilam de forma positiva, ao passo em que é muito provável que ao término do ano de 2022 a inflação acumule alta acima da meta de 3,50%, estabelecida pelo banco central, novamente. O acumulado anual do índice é de 11,30%.

As leituras para serviços e bens industriais duráveis desaceleraram, mas ainda não está claro se este novo cenário representa um viés claro quanto à mudança de tendência no mercado ou possui caráter transitório.

Adicionalmente, um fator que deve arrefecer os efeitos inflacionários no curto prazo é a apreciação do real perante ao dólar. O mercado de câmbio registrou entrada líquida de US$9,4 bilhões no ano até o dia 18 de março, o maior patamar para o período em 10 anos, muito motivado por uma maior demanda global por ativos de países emergentes, que se tornam mais atraentes, redirecionamento de investimento previamente russos para outros emergentes e movimento expressivo no aumento de preço de commodities. Em linhas gerais, os índices de preços não apresentaram uma sinalização clara de viés para os próximos períodos durante o mês de março.

Por fim, em sua ata pós-copom, o Banco Central afirmou que visa combater os impactos secundários do choque de oferta, advindos do conflito na Europa, e que o momento exige serenidade. De acordo com a sua avaliação, o encerramento do ciclo em 12,75% seria suficiente para a convergência da inflação no horizonte relevante. A próxima alta deve ser de 100 bps, acontecendo na reunião de maio, e, caso o cenário tenha uma piora significativa, pode se esperar um aumento adicional, de magnitude inferior, no mês de junho.

Adicionalmente, o Banco Central reconhece que não conseguirá cumprir a meta de inflação definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para o ano de 2022 (3,5%). O Bacen, no momento, trabalha com um cenário base de 7,1% de inflação para o ano vigente. Entre os fatores que explicam o não cumprimento da meta, a principal delas é o conflito entre Rússia e Ucrânia, que intensificou as pressões inflacionárias sobre as commodities, principalmente as energéticas. Ademais, as cadeias de produção globais seguem em descompasso, ainda impactadas pela pandemia, gerando descasamentos entre oferta e demanda.


Política Fiscal – Melhora do cenário fiscal mediante aumento das projeções de arrecadação 

No cenário fiscal, houve uma leve melhora do ambiente projetado para 2022 durante o mês de março, movimento puxado por uma revisão nas projeções para o resultado primário do governo central. A melhora no quadro fiscal advém de uma expectativa de crescimento na arrecadação no curto prazo, que se sustenta pela manutenção dos preços das commodities em patamares elevados, e pelos índices de preço acima do esperado para o primeiro trimestre de 2022. A revisão altista nas expectativas de variação de preços impacta o cenário fiscal em duas frentes. Em primeiro lugar, uma inflação maior infla a base tributária, aumentando a arrecadação. Adicionalmente, um deflator do PIB mais elevado também contribui para reduzir a razão dívida/PIB.

Adicionalmente, uma expectativa de um câmbio mais apreciado também contribuiu para reduzir as projeções de dívida para o fim do ano de 2022, com a redução do valor em reais da dívida bruta externa do setor público. No mês de março, o dólar teve uma queda de 7,66% frente ao real – já no consolidado do primeiro trimestre de 2022, o dólar acumula uma desvalorização de 14,55%, a maior desde 2009.

Apesar das medidas de incentivos fiscais e aumento dos gastos públicos por parte do Governo Federal, o efeito da inflação e das commodities sobre a arrecadação de tributos no curto prazo deverá compensar de forma positiva o orçamento público, havendo uma possibilidade do governo consolidado registrar um novo superávit primário em 2022.

No ano de 2021, a carga tributária subiu para 33,9% do PIB, o maior nível de impostos pagos pelo contribuinte brasileiro desde 2010. De acordo com o Boletim de Estimativa da Carga Tributária Bruta do Governo Geral, este recorde é justificado pelo fim dos incentivos fiscais implementados na pandemia e durante a recuperação econômica de 2021. No âmbito federal, houve um aumento de 0,27 p.p do PIB na arrecadação do IOF. Já na parte estadual, ocorreu um crescimento de 0,59 p.p do PIB do ICMS. O aumento foi impulsionado principalmente pela alta dos preços dos combustíveis em 2021, no qual o ICMS é cobrado sobre o valor final.

Na composição da carga tributária, pode-se avaliar que os impostos que mais pesam ao contribuinte brasileiro são os que estão alocados na categoria de “bens e serviços”, que correspondem a 14,76% do total de 33,9%.


Setor Externo – Conflito na Ucrânia persiste e inflação acelera ao redor do globo

A guerra no Leste Europeu, envolvendo Rússia e Ucrânia, ganhou força nas últimas semanas, apesar da estagnação no início do mês de abril. A incapacidade das forças russas de invadir Kiev levou a uma concentração do exército do Kremlin na região separatista de Donbas. A continuidade do conflito, aliada às negociações sem avanço, demonstram que a guerra terá continuidade no futuro próximo, aumentando o risco com relação ao preço de commodities e estreitando ainda mais a diplomacia entre os países envolvidos no confronto.

O PMI composto da Zona do Euro, índice que mede o nível de atividade dos gerentes de compra, para o mês de março, veio levemente acima das expectativas do mercado, em 54,9 (54,5), número  inferior ao apresentado pelo mês anterior (55,5). A reabertura da economia europeia, em meio à redução em casos de Covid, mostrou ser importante para o resultado positivo. No entanto, muitos fatores advindos do conflito ucraniano ainda não foram incorporados no índice, demonstrando que este deve ser “testado” ainda nos próximos meses.

O fator reabertura pode ser observado ainda no desemprego do bloco econômico, que caiu levemente de 6,9% em janeiro para 6,8% em fevereiro, acima das projeções de 6,7%, com número total de 11,155 milhões de desempregados. De forma semelhante, o número não incorpora totalmente os choques relacionados à invasão russa, que podem afetar negativamente o índice nos próximos meses.

Já a inflação na Zona do Euro mostra sinais do impacto negativo causado pela guerra, com o índice anualizado acelerando a 7,5% para o mês de março, muito acima das projeções, que ficaram em torno de 6,6%. Alimentada pelo aumento nos preços de commodities energéticas – petróleo, gás natural e energia elétrica – o índice fica ainda mais distante da meta de 2% imposta pelo ECB (European Central Bank).

Ainda sobre o ECB, o banco central europeu decidiu por deixar a sua taxa de juros de curto prazo inalterada em 0% a.a., ao mesmo passo em que comunicou a sua decisão de encerrar a compra de títulos no terceiro trimestre de 2022. Ao passo em que o ECB terminará sua aquisição de ativos, é esperado que as taxas de juros comecem a subir, seguindo o caminho do BoE (Banco da Inglaterra) e do Fed. Além disso, a presidente do ECB, Christine Lagarde, reforçou a importância do conflito no leste europeu, as sanções aplicadas e medidas futuras como fatores determinante sobre o crescimento do bloco, citando que as políticas futuras do banco central dependerão de dados econômicos a serem recebidos e “avaliação em torno de suas perspectivas”.

Gráfico Descrição gerada automaticamente

Adjacente ao anúncio do ECB, as taxas de juros em títulos de maturidade de 10 anos continuam subindo desde o início de 2022, ao passo em que os agentes esperam por um aumento na taxa de juros.

Já nos EUA, o PMI composto, que inclui os setores industriais e de serviços, atingiu 58,5 no mês de março, acima das expectativas (57) e crescimento quando comparado ao mês de fevereiro (55,9). No entanto, o setor industrial sofreu com uma redução de 1,5 – queda de 58,6 a 57,1 -, mostrando que o setor ainda sofre com as restrições na cadeia de suprimentos.

O mercado de trabalho americano também se mostra aquecido, atingindo a menor taxa de desemprego desde o início da pandemia, de 3,6%. Apesar do ganho de empregos ter sido inferior ao esperado pelo mercado, ainda representa um bom primeiro trimestre para a economia americana.

Por outro lado, a inflação continua a se mostrar um desafio para o Fed. O índice de preços ao consumidor americano acelerou em março e teve alta de 1,2% ante fevereiro, de acordo com as expectativas. O índice anualizado é de 8,5%, maior número desde dezembro de 1981 e levemente acima das projeções (8,4%). Os destaques na alta do índice se deram pela alta em commodities energéticas, como o aumento de 18,3% na gasolina – que representou mais da metade do aumento mensal de todos os itens -, 1% em alimentação e 1,5% para a alimentação em casa.

A alta inflação, e a perspectiva negativa no balanço de riscos, impactou a percepção do Fed sobre o ciclo da alta de juros nos EUA, com membros do comitê apoiando uma alta de 50 bps – superior à alta de 25 bps da última reunião – e com objetivo de chegar em uma taxa neutra, ao menos, como forma de combate aos efeitos vistos no cenário econômico. O comitê também discutiu sobre o ajuste no balanço do Fed, com redução mensal de cerca de US$ 60 bi (Treasuries/T-bills) e US$ 35 bi (Hipotecas), sendo o valor, portanto, de US$ 95 bi por mês.

Gráfico, Histograma Descrição gerada automaticamente

O título americano de maturação em 10 anos mostra movimento semelhante ao europeu, ao passo em que, guiados pelas decisões e comunicações do Fed, os agentes econômicos precificam um aperto no ciclo de aumento da taxa de juros americana.

Por fim, a China continua passando por um surto de Covid-19 em algumas de suas províncias, com destaque para Shanghai. No início de abril foram registradas mais de 20 mil novas infecções, o maior número já registrado em território chinês desde o início da pandemia. Adicionalmente, mais de 25 milhões de pessoas se encontram em lockdown na cidade. O motivo da China estar atuando dessa maneira reflete a sua política de “Covid zero”, focada em conter totalmente a doença, através de testagem em massa e quarentenas. No momento, não há previsões sobre o fim destas restrições.

A forma em como o governo chinês responde a casos de coronavírus refletiu em PMIs do país, assim como no índice de inflação, que, na direção contrária do mundo, continua baixo, a 1,5% na variação anual – apesar de ter vindo acima das projeções de 1,2%.


Conclusão

A continuidade do conflito no Leste Europeu continua a afetar negativamente o balanço de riscos em nível global. Novas revisões sobre projeções apontam para um menor crescimento esperado para as principais economias mundiais, além  de uma pressão inflacionária persistente, sinalizando que os principais bancos centrais deverão apertar a política monetária, através de altas de maior magnitude nas taxas de juros e encerramento de programas de compra de ativos.

No cenário nacional, espera-se um crescimento inferior a 1% da atividade econômica em 2022, com fatores como a pressão inflacionária e a alta taxa de juros pesando negativamente sobre as projeções. De forma adjacente, por ser um ano eleitoral, o governo tenta implementar políticas públicas – como reajuste de salários e aumento de auxílios sociais -, colocando incertezas sobre o atual cenário fiscal, que, até o momento, se mostrou sólido.




Autores: Luís Guilherme Uliana, Mateus Melo e William Pedroso.

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Carta de Conjuntura Macro – Fevereiro

Carta de Conjuntura Macro – Fevereiro

O mês de fevereiro ficou marcado pelo início do conflito no Leste Europeu, com a invasão russa à Ucrânia, culminando numa piora do cenário macroeconômico global, com aumento das percepções de risco pelos agentes econômicos e uma maior volatilidade nos mercados.

Os impactos da guerra sobre a inflação devem ser a principal consequência econômica do conflito, fato que ocorre num cenário já de elevada pressão nos níveis de preço e de alta inércia inflacionária, tendo em vista os acentuados choques de oferta e descasamentos nas cadeias mundiais de insumo. Neste cenário, as projeções são de um aperto monetário mais intenso, com revisões baixistas para a atividade econômica, sobretudo na Europa. No Brasil, dados relativos à atividade econômica vieram acima do esperado, enquanto inflação continua persistente e com tendência altista.


Atividade Econômica – Resultados do 4T21 surpreendem positivamente, apesar do cenário incerto

O Produto Interno Bruto (PIB) para o 4º trimestre de 2021 avançou 0,5% na comparação com o trimestre anterior, acima das expectativas do mercado (0,1%), e 1,6% ante mesmo período em 2020.

No ano, o PIB avançou 4,6% em 2021, ante recuo de 3,9% em 2020, resultado próximo às expectativas do mercado no início do ano, de 4,5%. Com este resultado, o PIB quebra a sequência de dois trimestres consecutivos de recuo, retornando ao patamar positivo e deixando um carrego estatístico de 0,3% para 2022.

Pela Ótica da Produção, o destaque positivo se deu ao setor agropecuário, que registrou um crescimento de 5,8%, refletindo o bom desempenho de lavouras com peso relevante na produção agrícola, como a soja (11%), trigo (25,8%) e o arroz (5,2%).

Apesar da desaceleração, o setor de serviços ainda registrou alta de 0,5%, ante 1,2% registrado no período anterior, e segue refletindo os efeitos positivos do processo de normalização da mobilidade urbana, devido à redução das medidas restritivas. Os destaques positivos foram os Serviços de Informação e Comunicação, que obtiveram avanço de 3,4% no período.

Já o setor industrial apresentou o terceiro recuo consecutivo, de 1,2%. Com exceção do setor de Construção, que avançou 1,5%, todos os demais apresentaram queda na atividade.  Em dados mais recentes, a produção industrial de janeiro apresentou queda de 2,4%, demonstrando que a indústria ainda segue sofrendo as consequências da alta dos custos com energia elétrica e dos graves problemas na cadeia mundial de insumos, intensificados com a recente piora no abastecimento de semicondutores, impactando consequentemente, a produção de bens duráveis.

Pela Ótica da Despesa, o destaque foi o consumo das famílias, apresentando alta de 0,7% no trimestre e acumulando alta de 3,6% no ano de 2021. O crescimento observado reflete a melhora dos indicadores de mercado de trabalho e os efeitos positivos gerados pelos programas de transferência de renda por parte do governo, apesar das vendas do comércio varejista e do faturamento do setor de serviços perderem fôlego no período. Os gastos do governo também contribuíram positivamente, com avanço de 0,8% no trimestre.

A Formação Bruta de Capital Físico avançou 0,4% no período, e 3,4% na comparação com o 4T20. Os destaques são atribuídos a demanda por máquinas e equipamentos, que apresentou alta de 3,7% no trimestre e de 23,6% no consolidado do ano – resultado influenciado pelo crescimento das importações -, e a construção civil, com crescimento de 0,7%.  Além disso, a taxa de investimento em preços correntes cresceu 0,6 p.p. no quarto trimestre de 2021, quando comparado com o mesmo período do ano anterior, subindo de 18,4% para 19%. A taxa de poupança reduziu durante o mesmo período, de 12,1% para 11,3%, gerando uma poupança externa positiva.

Por fim, as exportações líquidas contribuíram de forma ligeiramente negativa para o resultado do PIB na comparação com o último trimestre de 2020, enquanto as exportações avançaram 3,3% no quarto trimestre, as importações tiveram alta de 3,7%.

No mercado de trabalho, a taxa de desemprego – medida pela PNAD – foi de 11,1% para o trimestre encerrado em dezembro, levemente abaixo das expectativas do mercado (11,2%). A redução no desemprego se deu devido ao crescimento dos empregos formais e informais. No entanto, a média real dos salários decresceu de forma mais intensa do que o crescimento de empregos, o que afeta o consumo das famílias e retrai a massa salarial real.

Adicionalmente, o indicador de confiança do consumidor, divulgado pela FGV, também obteve melhora durante o mês de fevereiro, subindo 3,8 pontos no mês, para 77,9, o maior nível desde agosto de 2021 (81,8). O destaque se deu pelo aumento da intenção de compras de bens duráveis, que estava em queda há cinco meses consecutivos.


Política Monetária – Redução do ritmo com previsão de ciclo mais longo

A inflação de fevereiro, medida pelo IPCA, apresentou alta mensal de 1,01%, acima do esperado pelo mercado (0,94%), uma aceleração relevante ante o mês de janeiro, onde o índice apresentou alta de 0,54%. A inflação acumulada em 12 meses fechou em alta de 10,54%.

Os destaques do índice se dão pela alta no segmento de Educação, que avançou 5,61% no mês devido aos reajustes anuais das mensalidades escolares, sendo responsável pelo avanço de 0,31 p.p. do índice. Ademais, Artigo de Residência (1,76%), Alimentos e Bebidas (1,28%) e Saúde e Cuidados Especiais (0,47%) também tiveram relevância sobre a alta.

Os combustíveis devem exercer pressão relevante sobre o índice em março, tendo em vista o reajuste no preço dos combustíveis nas distribuidoras promovido pela Petrobras, com elevação de 18,7% para a gasolina e 24,9% para o diesel.

Adicionalmente, outros fatores podem provocar novas revisões nas expectativas e no cenário inflacionário no curto prazo, como o cenário climático adverso e a manutenção dos preços das commodities em patamares elevados, impactados pelas preocupações com as possíveis restrições de oferta em torno da atual crise geopolítica. Em contraponto, a aprovação da PLP 11/20 deverá exercer um impacto baixista sobre o preço dos combustíveis e, consequentemente, sobre os níveis de preço.

Em linha com as expectativas do mercado, o Copom elevou a taxa Selic, em decisão unânime do comitê, em 100 pontos-base, para 11,75% a.a. na reunião de março. No comunicado que acompanhou a decisão, o Copom já adiantou que deve realizar uma alta de mesma magnitude na próxima reunião, com data para os dias 3 e 4 de maio. Na ata da primeira reunião de decisão de política monetária de 2022, no mês de fevereiro, o Copom demonstrou que está disposto a continuar o ciclo de aumento na taxa de juros, mas com ritmo mais lento. Entre os principais pontos citados, o comitê alertou sobre os riscos de incerteza da política fiscal e de preços de ativos e commodities, sendo os últimos amplificados com o recente conflito no leste europeu.

Complementarmente, o comitê registrou durante o mês que alguns indicadores mostraram evolução ligeiramente superior à esperada na virada do ano, com melhora no mercado de trabalho. No quadro atual, com a taxa de juros já em campo contracionista, a redução do ritmo em março permite o comitê discernir com maior precisão os reais efeitos do novo choque. Em síntese, os efeitos do conflito no Leste Europeu devem ser menos severos para os países da América Latina, mas o efeito adverso das commodities sobre os níveis de preço devem impactar a inflação doméstica, neste cenário, já partindo de um exercício de desinflação desafiador, é esperado um ciclo de aperto mais longo, como já precificado pelo mercado.


Política Fiscal e Cenário Político – Melhora do cenário fiscal com perspectiva de aumento da arrecadação para o ano 

No cenário fiscal, a arrecadação pública deve seguir superior à média pré-pandemia, como ocorrera no ano passado, estimulada, dentre outros fatores, pela normalização dos programas de redução e diferimento de impostos lançados para o combate da pandemia, pelo impacto positivo da inflação na base de arrecadação e, sobretudo, pelo boom das commodities.

Em paralelo, a alta das commodities tem elevado a pressão por políticas de controle de preços, como a PLP 11/20, já sancionada. O cenário, no entanto, permanece positivo, com algumas projeções de mercado não descartando a possibilidade de novo superávit para o setor público em 2022. Segundo estimativas do Banco BTG Pactual, a arrecadação do governo central com commodities em 2022 deve atingir patamar próximo a R$ 270 bilhões.


Projeção: BTG Pactual. Valores em R$ bilhões.


No ambiente político, o mês de fevereiro foi marcado pela volta das atividades legislativas e pela intensificação das movimentações visando o ano eleitoral. O ambiente político vislumbrado em meados de 2021, de instabilidade e forte escalada da desarmonia entre os poderes, perdeu espaço, mediante a concentração de esforços para o processo eleitoral que, de forma mais acentuada, começa-se a estruturar.

O mês de fevereiro foi marcado pela discussão de possíveis medidas legislativas para conter a pressão inflacionária sobre o preço dos combustíveis. Após a tramitação de algumas propostas no legislativo, foi sancionado a PLP 11/20, que prevê a isenção de Pis/Cofins para o diesel, gás e querosene de aviação até o final de 2022, com um impacto estimado de R$ 16,1 bilhões (0,17% do PIB) para o governo federal. O projeto também modificou a regra de cálculo do ICMS sobre o diesel até o final de 2022, que passa a considerar a média do preço dos últimos 5 anos. O impacto estimado desta medida é de R$ 9,0 bilhões (0,09% do PIB) no ano para os Estados. A aprovação da medida, associada à melhora recente nos preços internacionais do petróleo, retirou da pauta a possibilidade de novas iniciativas por parte do Planalto para controle dos níveis de preço dos combustíveis a curto prazo.


Setor Externo – Apreciação do real com aumento da demanda por ativos brasileiros e guerra no Leste Europeu

O forte fluxo de dólares para o país, decorrente em grande parte, do crescimento da demanda global por ativos de países emergentes exportadores de commodities, fez com que a entrada líquida de dólares nos dois primeiros meses do ano atingisse o maior patamar desde 2012, com um ingresso líquido de divisas de US$ 9,0 bilhões no período.

Com a redução dos estímulos no mercado americano e a consequente saída de investimentos no mercado acionário, os investimentos estrangeiros em ações no Brasil atingiram patamares elevados, cerca de R$ 70 bilhões até o dia 7 de março, segundo a B3. Neste cenário, o dólar obteve queda de 2,71% no mês, sendo cotado a R$5,15 no fechamento e já acumulando uma queda próxima a 8% no ano, adicionalmente, o índice Ibovespa fechou o mês em 113.142 pontos, uma alta mensal de 0,89%.

No âmbito geopolítico, o mês de fevereiro foi marcado pelo início do conflito entre Rússia e Ucrânia, gerando impactos sobre a atividade econômica, tendo em vista as várias sanções impostas por diversos países membros da OTAN, como forma de retaliação à invasão russa.

A primeira rodada de sanções foi direcionada a bancos e patrimônios de oligarcas, mas, com a intensificação do conflito, medidas mais firmes foram impostas, como a retirada da Rússia do Swift – um sistema de transferências que fornece informações a bancos do mundo inteiro – e congelamento de reservas internacionais. Adicionalmente, diversas empresas privadas suspenderam suas operações em território russo. 

O conflito, além de gerar perdas humanitárias, pressionou o preço de commodities da região. Produtos como o alumínio, gás natural, fertilizantes, milho, petróleo e trigo apresentaram alta volatilidade, e devem seguir apresentando tendências altistas no curto prazo. Neste cenário, é difícil mensurar os impactos causados pelo conflito na atividade doméstica, apesar da baixa participação da Rússia na corrente de comércio brasileira. Respondendo por apenas 0,7% das exportações do Brasil, e por 2,7% das importações no total acumulado dos últimos doze meses em fevereiro, a Rússia é a principal fornecedora de adubos e fertilizantes para o Brasil, com participação de cerca de 23% do total importado pelo país.

No cenário econômico, os destaques se dão por dados da atividade econômica, inflação, desemprego e política monetária na Europa e pelo desemprego e inflação nos EUA. Adicionalmente, na China, a implementação de novas medidas restritivas ganha força e resultados vêm acima das expectativas.

O desemprego para o mês de janeiro na Zona do Euro foi de 6,8%, abaixo do esperado pelo mercado (6,9%). O número representa uma queda ante dezembro (7,0%), com o afrouxamento de restrições melhorando a perspectiva no mercado de trabalho.

A inflação registrada para o período de janeiro de 2022 veio de acordo com as expectativas, representando um aumento de 0,3% ante dezembro e atingindo a máxima histórica do bloco, uma inflação anual de 5,1%. O ECB (European Central Bank) já havia optado por deixar a taxa de juros inalterada no início deste mês, no patamar de 0%, mas, devido à pressão inflacionária e os conflitos na Ucrânia, pode ser que o ECB siga o caminho do BoE (Bank of England) e adiante o hike sobre as taxas de juros.

Por fim, a atividade de manufatura da Zona do Euro em fevereiro subiu a 58,2, após ter registrado em janeiro o maior número dos últimos cinco meses. O alívio nos gargalos pelo lado da oferta resultou em melhores condições para a indústria, apesar de que a melhora não foi distribuída entre os membros do bloco e fábricas ainda enfrentam altas pressões inflacionárias.

Na China, na tentativa de conter o avanço de novos casos da variante Ômicron, o governo chinês decretou novo lockdown na cidade de Shenzhen e na província de Jilian, colocando 17,5 milhões de moradores em confinamento. Em paralelo, os dados da produção para os meses de janeiro e fevereiro vieram acima das projeções do mercado, com alta de 7,5% na comparação anual, contra alta esperada de 3,5%, conjuntamente, as vendas no varejo cresceram 6,7% durante o mesmo período, também acima dos 4,3% esperados pelo mercado. 

Já nos EUA, o PMI de manufatura para o mês de fevereiro registrou 57,3, número levemente abaixo do esperado (57,5), e alta comparado aos 55,5 anteriores. O resultado vem de acordo com a redução das restrições impostas à cadeia de suprimentos, estimulando a atividade industrial no país.

Também surpreendendo, o número de criação de trabalhos nos EUA para o mês de fevereiro foi de 678 mil, muito acima do esperado (400 mil) por economistas. O resultado se deu pelo aumento de empregos nos segmentos de hospitalidade, educação e saúde. Além disso, a taxa de desemprego ficou em 3,8%, número inferior aos 3,9% projetados pelo mercado e menor número após o início da pandemia. 

A inflação americana para o mês de fevereiro acelerou a 7,9% anualizados, de acordo com as expectativas do mercado. O número é o maior registrado nos últimos 40 anos, motivado pelas pressões inflacionárias causadas pelo preço de alimentos e commodities energéticas.

Por fim, pela primeira vez desde 2018, o Fed anunciou uma alta  na taxa de juros americana, de 0,25 p.p., estabelecendo-a em 0,50% ao ano. A decisão não foi unânime, com um diretor optando por uma alta de 50 bps. O chairman do Fed, Jerome Powell, comentou logo em seguida que as próximas 7 reuniões do comitê terão altas, e que a taxa de juros americana deve terminar o ano em patamar entre 1,75% e 2%. Ainda, Powell citou o balanço do Fed, com perspectiva de começar a reduzi-lo já a partir da próxima reunião.

A decisão vem em linha com o esperado pelo mercado, que vê positivamente a medida tomada pelo Fed em momento de pressão inflacionária e robustez no mercado de trabalho americano.

Em síntese, o quadro para a atividade econômica permanece desafiador para os próximos meses, principalmente por conta das pressões inflacionárias, advindas dos descompassos entre oferta e demanda, aumento dos custos produtivos, e pelas recentes incertezas das consequências do conflito no Leste Europeu. O cenário é de maior cautela e de piora nas percepções de risco, com tentativas por parte do mercado de mensuração dos eventuais impactos causados pelo conflito sobre a atividade econômica. Por fim, as projeções são de piora do quadro inflacionário no curto prazo e tendência de maior contracionismo monetário por parte das principais autoridades monetárias, desestimulando ainda mais a atividade econômica.

Autores: Mateus Melo, Luís Uliana e William Pedroso
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