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Relatório Macro – Terceiro Trimestre

Relatório Macro – Terceiro Trimestre

No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do terceiro trimestre do ano de 2022, analisando os cenários econômicos nacional e internacionais.

Neste trimestre, no cenário nacional, ganham destaque as leituras positivas para inflação, atividade econômica e cenário fiscal, enquanto o resultado das eleições aumenta ainda mais as incertezas em um contexto global conturbado.

Já no cenário internacional, ganham destaque o rápido governo de Liz Truss no Reino Unido, o aperto da política monetária pelo Fed e pelo BCE, e leituras de inflação nestas economias.


Brasil – Inflação e atividade econômica surpreendem positivamente, enquanto que cenário político continua incerto pós-eleição.

Os últimos três meses mostraram um arrefecimento da pressão inflacionária, tendo consecutivamente mostrado leituras mensais de inflação negativa, sendo estas quedas, de 0,68%, 0,36% e 0,29% para os meses de julho, agosto e setembro, respectivamente.

Os níveis de preço foram altamente afetados em decorrência da redução de impostos federais sobre combustíveis, aliado à redução do ICMS sobre energia, telecomunicação e combustíveis.

Fonte: Refinitiv. Elaboração Própria

A perspectiva para a inflação continua positiva, ao passo em que a economia global sofre de uma desaceleração conforme a política monetária mundial entra em ritmo de aperto, afetando diretamente na redução pelo lado da demanda, concomitante ao fato de que os incentivos de corte de impostos federais devem ser prolongados até 2023, construindo um cenário favorável à inflação brasileira.

Por outro lado, este cenário também se torna dependente de questões como o cenário fiscal e as decisões na política monetária. O Brasil apresentou um ótimo ano fiscal em 2022, com um superávit primário do setor público esperado em 1,3% do PIB e uma dívida bruta por volta de 76% do PIB, levemente dos 74% observados em 2019, porém, com um novo governo eleito e políticas adotadas pelo atual governo – como o adiamento de precatórios e políticas fiscais expansionistas que ultrapassam o teto de gastos, como o aumento do Auxílio Brasil -, a perspectiva do cenário fiscal é de deterioração nos próximos anos.

Quanto à política monetária, a última reunião do COPOM definiu que a manutenção da Selic em 13,75% a.a. Conforme a ata desta, há a indicação que os juros permanecerão elevados por um período longo, caso não ocorra nenhuma mudança significativa no cenário nacional e internacional. O Banco Central entende que as suas futuras decisões demandam cautela, pois ainda prestam atenção a como as variáveis macroeconômicas responderam à mudança brusca nos juros, que estavam no patamar de 2% somente dois anos atrás. Ademais, uma redução na taxa de juros em 2023 está precificada, com a curva apresentando uma inversão a patamares de 11,5%, como mostra o gráfico abaixo.


Fonte: Anbima. Elaboração própria


Mercado de trabalho segue aquecido enquanto atividade econômica continua a crescer

O mercado de trabalho brasileiro se demonstra fortemente aquecido, com a taxa de desemprego para o trimestre entre julho a setembro de 8,7%, o menor nível desde 2015. O número reflete os recentes resultados inflacionários, além de uma melhora no emprego do setor público, o qual teve recorde de crescimento na série histórica. O momento, no entanto, é de cautela, ao passo em que se observa indícios de retração na atividade econômica, tanto brasileira quanto mundial, e isso pode afetar fortemente o mercado de trabalho nacional.

Após ter demonstrado uma queda superior a 1% em agosto, o índice Ibc-br, considerado uma prévia do PIB, voltou a indicar crescimento para setembro, de apenas 0,05% – abaixo da expectativa do mercado de 0,2%. Apesar disso, a alta de 0,69%, registrada no segundo trimestre, passou a 1,36% no terceiro, indicando uma atividade forte, ao contrário do observado no cenário internacional.

No entanto, como mencionado anteriormente, ao passo em que as políticas monetárias globais começam a ter efeito, as previsões para 2023 voltam a ter uma incerteza maior, ditadas por uma futura demanda enfraquecida.


Lula é eleito pela sua terceira vez presidente do Brasil, porém oposição aumenta o seu número de cadeiras no congresso

As eleições nacionais de 2022 demonstraram uma grande divisão no cenário político. Por um lado, Bolsonaro perde as eleições presidenciais por uma margem muito pequena, com Lula, após 12 anos, voltando ao poder, e, ao mesmo tempo, o bolsonarismo terá a maior bancada no Senado e na Câmara em 2023, com o bloco político da “direita” e do “centrão” correspondendo a 74% da Câmara e 83% do Senado.

Portanto, o governo Lula deverá utilizar de muito diálogo para a aprovação de pautas, visto a forte oposição dentro – e fora – do planalto. Questões, como a decisão de ministros – muito criticada durante o período de eleição -, também devem refletir a divisão política, com a preferência por nomes imparciais do que aos preferidos pelo PT.


EUA – Mercado de trabalho se mostra aquecido, com dados recentes do payroll acima das expectativas enquanto a pressão inflacionária se mostra persistente

O mercado de trabalho americano se mostra bem aquecido nos últimos três meses, com a última leitura do non-farm payrolls surpreendendo os mercados, vindo acima das expectativas e abrindo precedente para um aperto monetário maior pelo lado do Federal Reserve.

E economia dos EUA viu um resultado da criação de 263 mil trabalhos para o mês de setembro de 2022, número que apresenta uma queda comparada aos resultados obtidos nos últimos 3 meses (537 mil em julho e 315 mil em agosto) e a menor criação desde abril de 2021, mas ainda assim, o indicador foi superior ao número esperado de 250 mil empregos.

Apesar da redução da demanda doméstica americana, a criação de postos de trabalho se demonstra apertada, com o desemprego americano estabelecido em 3,7% e contando com diversas vagas não preenchidas.

O resultado é uma forte pressão sobre os salários, resultando em um alto ritmo de reajuste destes, implicando em uma forte pressão inflacionária – combatida por medidas mais pesadas com relação à política monetária do Fed, que presta grande atenção no mercado de trabalho para embasar as suas decisões com relação a taxa de juros no país.


Fonte: Atlanta Federal Reserve. Elaboração própria

A pressão inflacionária nos Estados Unidos continua persistente e mostra-se bastante disseminada através das categorias que compõem o índice. Apesar do CPI (Consumers Price Index) ter dado uma arrefecida, quando comparado ao resultado para o mês de junho, onde o índice registrou uma alta anualizada de 9,1%, e em sua última leitura, em setembro, registrados 8,2% – o menor número nos últimos 7 meses -, este ainda foi maior que as expectativas do mercado (8,1%).

A continuidade do aumento de preços de commodities, principalmente as energéticas, continuam a pressionar o índice, ao passo em que os preços de gás natural e eletricidade aceleraram 2,9% e 0,4% no mês de setembro, respectivamente. Apesar disso, o custo com gasolina apresentou uma queda de 4,9% no mês, reduzindo levemente a pressão sobre o índice.


Fonte: Refinitiv. Elaboração própria

O núcleo do índice continua a apresentar problemas para o Fed, com ambos os resultados de setembro e agosto apresentando alta de 0,6% e acima das expectativas do mercado. A preocupação maior é com relação aos itens relacionados a aluguel e serviços, que não apresentam sinal de queda tão cedo. Por outro lado, a inflação relacionada a bens deve sofrer uma desaceleração nos próximos meses, devido a um dólar valorizado e uma demanda enfraquecida – apesar desses resultados não terem apresentado queda nas últimas leituras do índice.

Visto uma pressão inflacionária persistente, e um mercado de trabalho com resultados melhores que o antecipado, é esperado que o FOMC continue a responder de forma mais hawkish, com possivelmente uma alta de magnitude de 75 bps, como feito na última reunião.

O Fed deixou de ver a inflação como algo transitório a muito tempo, e agora está disposto a continuar em uma instância mais restritiva, buscando obter um nível de emprego ótimo e a estabilização de preços, segundo a minuta da reunião do comitê em setembro. Além disso, o comitê entrou em um consenso de que, aumentar as taxas mais rapidamente agora irá “prevenir uma futura dor econômica”, associada com o alto nível de preços, incluindo uma política monetária ainda mais apertada e mais restritiva na atividade econômica do que seria necessária para trazer a estabilidade de preços.


EUA – Mercado imobiliário demonstra sinais de retração, com taxas hipotecárias dobrando perante 2020

O mercado imobiliário americano começa a mostrar sinais de retração, ao passo em que o número de compradores reduziu fortemente devido a taxas hipotecárias dobrando em 2022, forçando os vendedores a baixarem o preço de seus ativos em compensação.

Entender a situação atual no mercado americano é muito importante, com os indicadores imobiliários ganhando grande destaque pós-crise de 2008. O cenário pandêmico, de baixas taxas e de alta liquidez, resultou em preços de moradias inflados em todo o país. Porém, no momento atual, com as incertezas pairando sobre a economia global, e uma atuação hawkish do Federal Reserve, o preço de casas no país começa a declinar fortemente.


Fonte: Refinitiv. Elaboração própria

O momento, no entanto, é diferente do observado no período de 2006 a 2012, e, de certa forma, se mostra mais positivo. A expectativa é que o preço de moradias continue a declinar, mas não a níveis observados na crise anterior, pois nela se observava uma pressão maior do lado vendedor, motivado por vendas a descoberto e encerramentos hipotecários. Além disso, o inventário de residências em 2008 era 4 vezes superior ao observado hoje, que continua ainda inferior a níveis pré-pandêmicos, atuando na manutenção do preço de moradias.


Zona do Euro – Continuação da guerra na Ucrânia e inflação persistente continuam a reduzir expectativas no velho continente.

O continente Europeu continua a sofrer com choques adversos em preços de commodities, principalmente energéticas, amplificados pelo confronto no Leste Europeu – o qual não mostra sinais de se encerrar, visto a chamada de reservistas pela parte Russa, e a falta de consenso entre as duas partes em um acordo para o encerramento da guerra.

O cenário inflacionário na União Europeia se mostra persistente, com a última leitura atingindo 10,7% nos últimos 12 meses, sendo a leitura anterior, de setembro, 9,9% anuais, e, aliada com as recentes leituras abaixo de 50 do PMI na Zona do Euro (demonstrando uma desaceleração na atividade econômica), indicam uma possível estagflação para o ano de 2023 no bloco, com um cenário já em 2022 de altos custos de produção e consequente limitação da produção, exercendo uma ainda maior pressão sobre o índice de preços.


Fonte: Refinitiv. Elaboração própria

No outro lado, o Banco Central Europeu, que começou o seu ciclo da alta de juros em julho deste ano, deve continuar a adotar uma postura hawkish nas suas decisões de política monetária, buscando trazer a inflação de volta à meta adotada de 2%.

Com a recente alta de 75 bps para a reunião de outubro, é esperado que a autoridade monetária continue o ciclo com uma próxima alta de 75 bps na reunião de dezembro, encerrando 2022 com uma taxa básica em torno de 2,75%.

Também é importante ressaltar que o desemprego no bloco chegou a uma mínima histórica de 6,6%, podendo fornecer espaço para aumentos mais robustos nos juros, como visto no caso americano.

Por fim, o governo Alemão ampliou recentemente seu plano fiscal que busca combater o choque energético, com um pacote de € 200 bi – adicional aos € 95 bi já gastos -, introduzindo “freios” no preço de eletricidade para residências e empresas, no preço do gás de forma temporária e também adota a taxa de solidariedade, além de reduzir impostos sobre gás e aquecimento urbano.


Reino Unido – Situação política fragilizada e medidas econômicas derrubam o governo de Liz Truss e depreciam ativos britânicos

O cenário econômico e político no Reino Unido passou por grande turbulência, após a renúncia de Boris Johnson como primeiro-ministro britânico. Liz Truss, candidata dentro do partido conservador para o lugar de premiê, assumiu o cargo no início de setembro e anunciou um pacote fiscal, que dentre os principais pontos, incluía uma quantia para compensar o alto preço da energia e um plano de crescimento baseado no corte de impostos.

O plano teve uma má recepção pelo mercado, causando uma alta desvalorização em ativos britânicos e deixando a libra em situação frágil, com paridade quase que de 1 para 1 com o dólar americano. O prêmio de títulos do governo subiu de 3,8% a 5%, desvalorizando-os e o mercado já precificava um aumento do ritmo de aperto monetário por parte do BoE.

O resultado, após um imbróglio no parlamento inglês, foi a saída de Liz Truss do cargo de primeira-ministra britânica, após ficar somente 50 dias no cargo, e o apontamento de Rishi Sunak como novo ministro, que deve levar a economia em uma direção de mais responsabilidade fiscal em um momento de alta inflação e indícios de recessão à vista no horizonte próximo.


China – Atividade econômica apresenta recuperação, mas crescimento para 2023 deve ser abaixo dos 5% desejados pelo governo chinês

A atividade econômica chinês vem demonstrando sinais de recuperação, principalmente na produção industrial, a qual sofreu de interrupções devido a política de covid zero implementada pelo governo chinês.

A evolução pode ser observada tanto pelo indicador da produção industrial, que até agosto registrava um crescimento de 3,8% em 12 meses, e, para setembro uma expansão de 4,2%, quanto pelo PMI industrial chinês, que registrou uma leitura de 50,1 após um grande período de retração no índice.

No entanto, observa-se uma forte retração em outros setores da economia, principalmente no setor imobiliário, onde o investimento imobiliário apresenta uma queda de 13,2% quando comparado ao mesmo período no ano anterior, com a redução na venda de residências e uma queda pela metade no total de novas obras também contribuindo negativamente para o cenário.

Por fim, pode observar-se que as medidas de controle ao coronavírus continuam afetando negativamente o setor de serviços, o que deve afetar profundamente o desempenho da economia no próximo ano.


Fonte: Refinitiv. Elaboração própria


Câmbio – Dólar se fortalece em um mercado repleto de incertezas e políticas frágeis

No Brasil, o câmbio continua apresentando alta volatilidade devido às incertezas nacionais e internacionais. No mês de julho a cotação do real chegou ao patamar de R$/US$5,50, mas voltando a negociar perto de R$/US$5,2 em outubro. As últimas falas de Powell, chairman do Fed, reforçam o comprometimento com estabelecer o nível de preços, sugerindo que os próximos meses devem ser de incertezas para o Real, visto que o país passa por um momento de transição política.

O Euro segue em constante decadência no segundo semestre de 2022, chegando a atingir uma mínima de 0,95 EUR/USD em setembro. Incertezas sobre a guerra entre Rússia e Ucrânia e o atraso na elevação dos juros por parte do BCE resultaram em uma preferência dos agentes pelo dólar.

Por fim, a Libra Esterlina apresentou alta volatilidade, dado às políticas adotadas por Liz Truss e o novo ministro das finanças, que anunciaram uma medida de corte de impostos para a elite britânica, assim como planos para seguir com cortes em outros setores durante o mandato. A ação de Truss foi recebida com surpresa pelos mercados, o que causou no dia 23 de setembro uma forte queda na Libra, além de uma pressão de venda dos títulos públicos do país, apresentando uma volatilidade em ativos considerados extremamente seguros.


Commodities – Volatilidade no mercado continua alta com confronto no leste europeu e paralisações na China

As cotações do petróleo no último trimestre vêm sofrendo alta volatilidade. Os dados de alta inflação no mundo, apertos monetários e a guerra entre Rússia e Ucrânia estão entre os grandes responsáveis pela volatilidade no preço do barril de Petróleo.

Após seguir uma tendência de queda entre julho e setembro, o Petróleo apresentou uma alta de 11,3% no mês de outubro, sendo negociado a U$94,83 no final do mês – um reflexo das decisões da OPEP+, que visa reduzir a oferta energética, e também das melhores expectativas a respeito da guerra.

Já o minério de ferro apresentou uma constante queda no último trimestre, dado as condições dos lockdown chineses, causando uma baixa produtividade do aço local. O panorama negativo do mercado imobiliário chinês é também motivo de incerteza no mercado de commodities, contribuindo para a tendência negativa que vem sendo apresentada desde o início do ano.

O Ferro estava sendo negociado a U$107,22 ao final de julho, fechando o mês de outubro no patamar de U$92,43, apresentando uma queda de 13,8% no trimestre.


Fonte: Refinitiv. Elaboração própria

Em suma, os próximos meses devem apresentar uma desaceleração na economia global, ao passo em que, com os aumentos prévios nos juros e com uma perspectiva da continuação do ciclo a patamares superiores aos previamente previstos, a demanda global começa a sofrer o impacto causado pela política monetária contracionista global.

No cenário nacional, as leituras de atividade, fiscal e de inflação se mostraram positivas, apesar de que o cenário político atual, pós eleição e em fase de transição, com posições e escolhas de ministros abertas, traz incertezas, sobretudo sobre o âmbito fiscal.


Autores: Luís Guilherme Uliana, Pedro Veiga, Wiliam Midon Pedroso

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A autonomia do Banco Central do Brasil

A autonomia do Banco Central do Brasil

Objetivos, atribuições e estrutura do Banco Central do Brasil 

Entrou em discussão no Brasil a aprovação do projeto de lei PLP 19/2019, que visa dar maior autonomia ao Banco Central do Brasil. Em um cenário de incertezas em muitos aspectos, mais do que nunca faz-se necessário o trabalho conjunto do Conselho Monetário Nacional (CMN), do Banco Central do Brasil (Bacen) e do Comitê de Política Monetária (Copom) no Brasil.

Em nosso Sistema Financeiro Nacional, o órgão normativo máximo é o CMN, que dita diretrizes e normas de forma a orientar as políticas monetárias e cambiais. Assim, uma parte importante de seu trabalho é o estabelecimento de metas para a inflação, mantendo-a baixa, estável e previsível.

A incerteza em um país acarreta em vários problemas, e um deles é a volatilidade e elevação da inflação. Este problema, por sua vez, aumenta os riscos de investimentos, reduz o potencial de crescimento da economia, diminui o poder de compra, afeta a geração de empregos, e diminui a confiança do mercado.

Consequentemente, o trabalho do Bacen ganha um direcionamento: como principal órgão executor do que é normatizado pelo CMN, ele possui a missão de manter um sistema financeiro sólido e eficiente, atuando no cenário macro e microeconômico. 

Para garantir a estabilidade do poder de compra da moeda nacional e promover a eficiência e o desenvolvimento do Brasil, o Bacen regula o volume de dinheiro e de crédito no país, possuindo o monopólio de emissão da moeda. 

Também atua como Superintendente do Sistema Financeiro, fiscalizando, regulando, e controlando o sistema bancário e financeiro do país, e é chamado de “Banco dos Bancos” por possuir funções bancárias (como recolher valores e conceder empréstimos), porém, tendo como clientes os próprios bancos ao redor do país. 

O Bacen também executa a política monetária, que envolve ferramentas como o Open Market, o Depósito Compulsório e o Redesconto. Por fim, ele também é considerado o banqueiro do governo, pois é o executor da política cambial e administra as reservas de moedas internacionais, bem como regula a movimentação orçamentária do governo. 

A estrutura organizacional do Bacen é comandada por uma diretoria colegiada composta por nove membros, sendo um presidente e oito diretores, que são também responsáveis por sua respectiva diretoria, conforme segue: Administrativo (DIRAD), de Assuntos Internacionais e Gestão de Riscos (DIREX), de Fiscalização (DIFIS), de Organização do Sistema Financeiro e Crédito Rural (DIORF), de Política Econômica (DIPEC), de Política Monetária (DIPOM), de Regulação (DINOR), e de Relacionamento Institucional e Cidadania (DIREC).

Formado pelo Presidente, Diretores e Chefes de Departamento do Banco Central, o Copom é o órgão que discute e analisa a economia brasileira, definindo a cada 45 dias a taxa de juros referencial para as projeções da inflação e convergência para a meta anteriormente definida pelo CMN. A cada três meses é divulgado o relatório de inflação e as Atas do Copom, sempre após 6 dias de cada reunião.

História do Banco Central do Brasil

O Banco Central do Brasil foi criado em 31 de dezembro de 1964, a partir da lei nº 4.595, que dispõe não apenas de amparos legais para a criação de um Banco Central, como apresenta todas as diretrizes sobre a Política e as Instituições Monetárias, Bancárias e Creditícias. De forma sucinta, a lei muda as diretrizes do sistema financeiro brasileiro, de forma a torná-lo mais padronizado e organizado, assim como de outros pares globais que já possuíam um Banco Central.

Porém, anteriormente à criação do Banco Central, as suas funções eram realizadas por duas principais instituições. Uma delas era a Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC), que deixou de existir, e o Banco do Brasil.

A SUMOC foi criada em 1945 por Getúlio Vargas, sendo o intuito de sua  criação o de “preparar o terreno” para a criação de um Banco Central, além de organizar o sistema financeiro brasileiro após a segunda grande guerra. A entidade possuía um Conselho, que tomaria as decisões de caráter organizacional e sobre as políticas monetárias, e um grupo executivo, que iria operacionalizar os trabalhos da instituição e o que fosse decidido pelo Conselho. Faziam parte de suas atribuições regulamentar e fiscalizar o sistema bancário, supervisionando a atuação dos bancos comerciais no país, orientar a política de câmbio (moeda estrangeira), promover a criação de estudos econômicos no país, para se ter um arcabouço maior de dados econômicos e assim ser mais assertivo nas decisões, e outras atribuições menos relevantes que viriam a ser do BC. 

Já o Banco do Brasil, além de possuir atribuições de um banco estatal, possuía a atribuição de banco do governo e de “Banco dos Bancos”, onde recolhia os depósitos compulsórios, controlava as operações de comércio exterior e operações de câmbio. Outro ponto importante é que com o advento da lei nº 4.595, as contas do Tesouro Nacional e do Banco do Brasil foram separadas, o que fez com que o TN não fosse mais o responsável pela impressão do papel-moeda, mas sim a Casa da Moeda, ficando vedado também ao TN ser o administrador da dívida pública. 

Um dos idealizadores do projeto da criação do Banco Central, o economista Roberto Campos, em seu livro “A Lanterna na Popa”, dedica um capítulo inteiro para comentar como foi a criação do BC. É interessante observar que a lei nº 4.595 possuía dispositivos que faziam o Bacen gozar de certa autonomia, como exemplo, o presidente e os diretores do Bacen possuírem mandatos fixos. Porém, como o próprio autor afirma, “no Brasil há leis que pegam e leis que não pegam, a que criou o BC, não pegou” e, posteriormente, o Bacen acabou se envolvendo em questões de fomento ao crédito e financiamento do TN, saindo do posto de guardião da moeda e se tornando o devasso emissor.

PLP 19/2019 

O PLP 19/2019 é o projeto de lei complementar que visa dar autonomia ao Banco Central do Brasil. Como já foi aprovado pelo Senado e sancionado pelo presidente, se tornou de fato uma lei, tendo sido publicada no Diário Oficial da União. Os principais tópicos desta lei são: 

  • O Banco Central tem por objetivo assegurar a estabilidade dos preços, sem prejuízo ao seu objetivo fundamental agora também tem objetivos de zelar pela estabilidade e pela eficiência do sistema financeiro, suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego;

  • Acaba o vínculo com o Ministério da Economia que o Bacen possuía, se torna uma autarquia de natureza especial caracterizada pela ausência da vinculação ao ministério de tutela ou subordinação hierárquica, assim como as Agências Reguladoras e os Tribunais de Contas;

  • O cargo de Ministro de Estado Presidente do Banco Central do Brasil fica transformado no cargo de Natureza Especial de Presidente do Banco Central do Brasil.

O Presidente e os Diretores do BCB serão indicados pelo Presidente da República e por ele nomeados, após aprovação de seus nomes pelo Senado Federal. 

  • O mandato do Presidente do BCB terá duração de 4  anos, com início no dia 1º de janeiro do terceiro ano de mandato do Presidente da República;

  • Dois diretores terão mandatos com início no dia 1º de março do primeiro ano de mandato do PR;

  • Dois diretores terão mandatos com início no dia 1º de janeiro do segundo ano de mandato do PR;

  • Dois diretores terão mandatos com início no dia 1º de janeiro do terceiro ano de mandato do PR;

  • Dois diretores terão mandatos com início no dia 1º de janeiro do quarto ano de mandato do PR.

O presidente do Bacen, assim como seus diretores (participantes do COPOM), podem deixar o cargo em algumas situações:

  • Escolha própria;

  • Motivos de saúde;

  • Condenação em decisão transitada em julgado,  proferida por órgão colegiado por improbidade administrativa ou qualquer crime que não se possa mais exercer cargos públicos;

  • Caso comprovado e recorrente de desempenho insuficiente para alcance do objetivo do Banco Central. Nesse caso o desempenho insuficiente é apontado pelo CMN onde posteriormente vai para votação de maioria absoluta no Senado.

Por fim, no PLP 19/2019 também fica restrito ao Bacen compra de títulos públicos que não sejam para fim de execução de política monetária e compra de dólar spot e derivativos de dólar que não sejam para fim de execução de política cambial.

Objetivo com a autonomia do BC

Com maior autonomia no Banco Central, há menor interferência política. Com uma política monetária, econômica e cambial que sofre menos impacto com mudanças no governo, espera-se uma maior estabilidade na economia, e uma consequente atração de investidores.

Além disso, atualmente diversos Bancos Centrais internacionais possuem um nível de autonomia maior que no Brasil, portanto, o alinhamento do Bacen com diretrizes que estão sendo seguidas em outros países é importante, pois traz mais credibilidade ao BC e mais confiança por parte dos agentes econômicos.

A autonomia, por fim, também busca manter na diretoria pessoas com maior conhecimento técnico, evitando nomeações, destituições ou renúncias por afinidades políticas, e mantendo o foco das decisões do Bacen no desenvolvimento do país, independente de quem estiver no poder.

Ex- Presidente Dilma Rousseff e a interferência política

Para ilustrar o impacto que a interferência política pode gerar e a importância de um Banco Central autônomo, será usado como exemplo o caso dos cortes na Taxa Selic no Governo Dilma.

Como forma de contextualização, em 2011 o Bacen possuía um vínculo com o então Ministério da Fazenda, que fazia com que a política monetária não fosse definida e aprovada somente pelo Banco Central. Consequentemente, ela não seria isenta de influência política.

Outro ponto importante do contexto é a crise de 2008, que chegou ao Brasil com maior força em 2011. No início desse ano, diversos economistas – entre eles o conhecido Bresser-Pereira – tinham expectativas positivas para o país, que acabaram não se concretizando. No final de 2011, a inflação foi a mais alta em 7 anos, atingindo a marca de 6,5%.

O governo Dilma buscava a reeleição, e para isso precisava fortalecer a economia. Assim, a condução da política monetária por este governo buscou diminuir a Taxa Selic, fazendo sucessivos cortes a partir de Setembro de 2011, chegando à histórica marca de 7,25% em Outubro de 2012. Além disso, para maquiar a inflação real, o governo se utilizava da prática de atrasar o repasse de preços internacionais aos combustíveis no mercado interno. Isso mantinha os índices de inflação mais baixos do que a realidade, pois o aumento de preços não chegava imediatamente aos produtos que dependem diretamente do transporte rodoviário e de insumos derivados do petróleo.

Sobre este caso, é possível ver que os sucessivos cortes na taxa de juros não condizem com a alta inflação daquele período, e que houve uma demora na atuação do Banco Central para aumentar as taxas de juros na tentativa de controlar a inflação. Cabe a reflexão de se o Banco Central, como um órgão autônomo, tomaria as mesmas decisões.

Além disso, a manutenção dos baixos preços da gasolina fez com que a Petrobras tivesse grandes prejuízos, e foi um dos fatores para que a inflação atingisse 10,6% em 2015 (a maior desde 2002), quando os preços se normalizaram após sucessivos reajustes.

Apesar da inconsistência, é difícil comprovar a interferência política, já que as decisões foram tomadas por órgãos responsáveis pela condução da política monetária, de forma conjunta pelo Banco Central e pelo Ministério. Comprovadamente pode-se dizer somente que foi uma má condução desta política.

Órgãos Autônomos brasileiros e o confronto entre a teoria e a prática

Com o intuito de se entender melhor o funcionamento da autonomia do Banco Central na prática, será analisado o exemplo das Agências Reguladoras, atualmente autônomas.

Para as Agências Reguladoras, a autonomia engloba, inclusive, a questão financeira, fazendo com que seu financiamento não seja afetado por cortes, acordos ou decisões políticas. Além disso, não há subordinação hierárquica em relação ao chefe do poder executivo ao qual elas estão vinculadas, seja ele federal ou municipal. Por fim, os mandatos dos dirigentes são fixos em 4 anos e não coincidentes entre si, e o regime de nomeação dos dirigentes é o mesmo dos diretores e presidente do Banco Central, pelo Poder Executivo.

As Agências Reguladoras precisam ser órgãos autônomos porque muitas de suas funções envolvem fiscalizar e regular a administração pública. Assim, a pauta principal das agências deve ser o que atende e beneficia mais a população, e não o governo ou quem está no poder. Também é sua responsabilidade fiscalizar e regular o setor privado, colocando os interesses do consumidor em primeiro plano, e garantindo o acesso universal aos serviços prestados.

Uma pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas analisou 18 Agências Reguladoras entre 1990 e 2018, e algumas das conclusões estão apresentadas a seguir.

Descobriu-se que apenas 58% dos dirigentes das Agências tinham uma trajetória profissional relacionada com a função de atuação. Isso indicaria que a nomeação dos dirigentes não possui o embasamento técnico devido, valendo-se por exemplo de indicações com viés político.

Também verificou-se que um entre cada cinco mandatos não são cumpridos até o fim. De acordo com os autores, foi concluído que pelo menos metade das saídas antecipadas tinham relação com trocas de governo, coincidindo com cenários de mudança política.

Com a saída dos dirigentes, é gerado um período de vacância para aquele cargo, e nesse tempo é tomada a decisão de quem será o próximo a ser nomeado. De acordo com o estudo, o período médio para a decisão ser efetivada é de 188 dias (por volta de 6 meses), mas casos como o da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) em que a vacância perdurou por um ano e meio em 2013. Ainda, quando a renúncia dos dirigentes ocorre em períodos próximos, o Poder Executivo passa a ter a possibilidade de realizar indicações em bloco, de forma que os dirigentes passam a ter mandatos praticamente coincidentes. Novamente a ANEEL é citada, pois desde os anos 2000, os mandatos dos cinco dirigentes são quase coincidentes.

A importância de trazer este estudo se dá justamente na reflexão do que pode vir a ocorrer com o Bacen. Assim como o Banco Central, as Agências Reguladoras possuem leis que garantem a sua autonomia, mas, como mostra a pesquisa, isso não necessariamente se reflete na prática. 

Apesar de não blindar completamente o Bacen de interferências políticas, o projeto de lei PLP 19/2019 abre caminho para se buscar cada vez mais autonomia. Essa mudança de comportamento é bem vista por outros países, e traz mais confiança, estabilidade e investimentos externos.

Estudos sobre Autonomia do BCB

Os estudos utilizados como base para este artigo têm como objetivo mensurar e ranquear a autonomia dos Bancos Centrais de diversos países, com ênfase nos efeitos observados nos indicadores macroeconômicos, em especial o nível de inflação, crescimento do PIB, taxa de juros e taxa de desemprego. Para fazer essa avaliação de autonomia, os pesquisadores levaram em consideração várias características apresentadas pelos Bancos Centrais, e esses fatores foram divididos entre autonomia de Jure, aquela prevista pela legislação, e a autonomia de Facto, que diz respeito à autonomia que os Bancos Centrais possuem na prática de suas funções.

O primeiro estudo utilizado como base é o “Central Bank Independence and Macroeconomic Performance: Some Comparative Evidence” de Alberto Alesina e Lawrence Summers. Com essa pesquisa eles concluíram que a autonomia do Banco Central é favorável à economia dos países, pois a formulação e operacionalização da política monetária é delegada a uma instituição com maior aversão a altos níveis de inflação. Isso possibilita que no longo prazo essa taxa mantenha-se equilibrada e em patamares baixos, já que as ações dessa autoridade se tornam mais previsíveis.

Segundo os pesquisadores, um Banco Central autônomo também fica livre de pressões por parte dos eleitores, o “median voter”, que pressionam as autoridades monetárias para que sejam menos conservadores com a inflação e façam uso de uma política monetária mais expansionista no curto prazo em detrimento de uma taxa de inflação menor do longo prazo, o que os autores chamam de erro de inconsistência de tempo. Enquanto deveriam fazer o contrário. Outro ponto positivo apresentado no estudo é o isolamento da política monetária de pressões políticas, evitando a nomeação de banqueiros centrais enviesados e menos avessos à inflação.

Esse isolamento das autoridades monetárias favorece o equilíbrio da inflação no longo prazo, trazendo maior previsibilidade às decisões do Banco Central, gerando consequências positivas como: redução do prêmio de risco do país e, principalmente, isola as decisões de política monetária do ciclo eleitoral, onde medidas inflacionárias e de viés populista podem ser tomadas. Caso que, supostamente, ocorreu no final do primeiro governo da ex-presidente Dilma Rousseff conforme mencionado anteriormente.

A partir disso, os autores se concentraram em mensurar o nível de autonomia dos Bancos Centrais, e para isso utilizaram como base dois índices, o GMT (Grilli, Masciandaro & Tabellini, 1991) e o índice BP (Bade & Parkin, 1988). O primeiro leva em consideração a autonomia política e econômica do Banco Central, onde foi analisado se havia possibilidade de interferência do Governo nas escolhas dos objetivos e mandatos das instituições. Qual era o formato desses mandatos, assim como, se houve interferência na política monetária e financiamento do déficit governamental. Com foco tanto na autonomia de Jure como na de Facto.

Já o índice BP utilizou 12 países de economias industrializadas como amostra e avaliou a autonomia política dos Bancos Centrais. Foi analisado a relação entre as autoridades monetárias e o poder executivo, como era o processo de indicação e demissão de membros do conselho e presidente, atuação do Governo no conselho como: interferências nas decisões de política monetária e poder de voto, assim como, a frequência de contato entre os Bancos Centrais e o poder executivo. Portanto, esse índice possui um foco maior na autonomia de Jure.

A autonomia política analisa como é feita a indicação do presidente dos Bancos Centrais e se o período de mandato é superior a 5 anos; se há ou não indicações governamentais para a mesa do conselho, se essa representação é obrigatória e se está diretamente ligado a algum nível de tomada de decisões; quem aprova a formulação da política monetária; se a estabilidade de preços é um objetivo previsto em legislação ou estatuto; e, principalmente, se há algum tipo de dispositivo que protege os Bancos Centrais dos interesses da legislatura vigente.

Por outro lado, a autonomia econômica leva em consideração qual é a facilidade que o governo tem para obter crédito perante o Banco Central, se esse crédito é obtido de forma automática, os juros cobrados correspondem com aqueles exercidos no mercado, se esse empréstimo é temporário e qual o limite de dinheiro que pode ser emprestado. Avalia também, a participação do Banco Central na dívida do Governo, quem define a taxa de redesconto e quem é o responsável pela supervisão do sistema financeiro.

Fonte: Grilli, Masciandaro & Tabellini, 1991; Bade & Parkin, 1988

A partir da análise de todos esses fatores Alesina e Summers fizeram o seu próprio índice, através da média aritmética dos índices de BP e GMT aplicados a uma amostra de 16 países industrializados, como demonstrado na tabela acima.  Mediram o desempenho dessas economias de 1955 até 1988, para que fosse possível comparar o índice de autonomia com os indicadores macroeconômicos. Sendo assim, eles encontraram uma correlação negativa, quase perfeita, entre o nível de autonomia dos Bancos Centrais e a taxa média de inflação encontrada no período analisado.

Fonte: Alesina, Alberto; Summers, Lawrence H. (1993).

Em países onde a autonomia do Banco Central é mais alta, foram encontradas taxas médias de inflação menores, do que aquelas em países com Bancos Centrais menos autônomos. Entretanto, na comparação com os demais indicadores macroeconômicos, como crescimento do PIB e desemprego  não foi encontrado nenhum tipo de correlação com a autonomia dos Bancos Centrais. Sendo assim, os autores chamaram essa descoberta de “Free Lunch”, pois a autonomia do Banco Central traz benefícios como taxas de inflação menores e mais estáveis, e não possui nenhum custo sob os demais fatores econômicos.

Fonte: Alesina, Alberto; Summers, Lawrence H. (1993).

O segundo estudo refere-se à autonomia dos Bancos Centrais, o qual foi retirado de um dos artigos do Banco Central Europeu, “The case for central bank independence” de Rodolfo Dall’Orto Mas e Benjamin Vonessen, que mostra a evolução dos Bancos Centrais ao redor do mundo nos períodos pré e pós recessão econômica em 2008.

A partir de 1980 houve um enorme avanço em relação aos números de Bancos Centrais autônomos ao redor do mundo, sendo notório ao longo de todo esse período. Diante disso, percebeu-se, cada vez mais, legislações que buscaram maiores independências de jure desses Bancos, tanto na parte política, quanto na econômica. Diante disso, foram realizados diversos estudos sobre esse assunto e criado índices de autonomia para os Bancos Centrais. Recentes estudos como de Bodea e Hicks (2018) e de Garriga (2016),  permitiram uma revisão dos índices já criados em outras pesquisas e, após essas análises, os valores desses índices foram atualizados tanto para os Bancos Centrais já estudados como também aos demais. Ademais, em virtude dessas atualizações, proporcionou a comparação entre a evolução desses valores com a crise do subprime.

Bodea e Hicks (2018)

Uma das análises notou que durante a crise global, instaurada em 2008, os Bancos Centrais tentaram estimular a economia, com o intuito de reverter a recessão por meio de cortes agressivos na taxa de juros e instaurando novas ferramentas monetárias (Quantitative Easing e Forward Guidance). Com base nesses dados, percebeu-se que os Bancos não estavam focados apenas na estabilidade da moeda, mas também em uma nova conformação que visasse outros objetivos como, por exemplo, a diminuição do desemprego. No entanto, ainda existem contrapontos em relação às atitudes tomadas pelos Bancos Centrais, os quais podem estar desvirtuando seu foco de controle em relação a moeda, e, dessa forma, levando a um descontrole da inflação. No PLP do Bacen comentado anteriormente, adicionou-se também uma nova atribuição aos objetivos do órgão, sendo este o pleno emprego, o que acaba levantando uma discussão importante sobre aberturas para novas interferências políticas.

Fonte: Bodea & Hicks (2015)
Fonte: Bodea & Hicks (2015)

Sendo assim, conforme a tabela acima, a qual mostra os índices de autonomia dos Bancos Centrais dos países do G20 entre 2005 e 2014, permite analisar que não houve uma deterioração de autonomia de jure após a crise econômica em 2008. Além disso, dados da tabela juntamente com outras análises feitas, revelam que houve uma diminuição na correlação negativa entre a inflação e a autonomia dos Bancos centrais de países desenvolvidos nos anos de 2005 a 2014. Dessa forma, infere-se que a relação entre o aumento da autonomia dos Bancos Centrais e a inflação diminuíram após o período do subprime. Já em relação aos índices de autonomia se mantiveram constantes, enquanto que a inflação teve uma queda expressiva em praticamente todos os países (sobretudo nos Bancos Centrais com menor autonomia).

Além do mais, em relação aos países emergentes, houve uma drástica mudança da correlação entre os índices analisados, uma vez que em 2000 os bancos com maiores autonomias possuíam os menores índices de inflação. Em contrapartida, no ano de 2010, os valores obtidos foram o contrário do que se esperava. Isso se deve, principalmente, pelo ocorrido na Argentina, onde houve uma inflação de dois dígitos. 

Fonte: Vonessen, Benjamin; Arnold, Katrin; Mas, Rodolfo Dall’Orto; Fehlker, Christian (2020)

Ademais, outro ponto a ser abordado é a relação entre a autonomia de Jure e a autonomia de Facto, sendo que este último não se consegue ter uma análise assertiva em relação ao índice de autonomia dos Bancos Centrais. Além disso, a análise feita por Strikingly, em relação ao estudo de Binder em 2018, observou que 10% dos Bancos Centrais reportaram pressões políticas em aproximadamente um ano, o que possibilitou um alívio na política monetária destes países. Sendo assim, essas intervenções predispuseram aos Bancos Centrais maiores intimidações, as quais estão associadas com aumento e persistência da inflação, refletindo uma menor credibilidade da política monetária.

Outros Bancos Centrais ao redor do mundo

De forma concisa, os principais pontos para se analisar a autonomia de um Banco Central estão contidas na tabela abaixo, fazendo assim um comparativo entre alguns países emergentes.

1- estabilidade dos preços (*se for a principal); 2- estabilidade da moeda; 3- estabilidade do sistema financeiro; 4- fomentar o pleno emprego.

Assim, podemos observar que o Brasil está cada vez mais alinhado com os demais países emergentes no que tange amparos legais para a autonomia do Banco Central. Como nada no Brasil é simples, precisa-se ver ao longo do tempo, se essa autonomia de Jure irá se convergir para uma autonomia de Facto, autonomia essa que acabou por se deteriorar na Argentina que vivencia severa crise econômica com inflação de dois dígitos consistente ao longo do tempo. Por fim, uma frase do célebre economista Gustavo Franco que evidencia ainda mais a importância de se ter uma inflação baixa e previsível: “País que já teve hiperinflação é que nem alcoólatra, qualquer pingo de álcool é perigoso”. 


Referências:

Alesina, Alberto; Summers, Lawrence H. (1993). Central Bank independence and macroeconomic performance: some comparative evidence. Journal of Money, Credit and Banking, Vol. 25, No. 2, Maio, páginas 151-162.

Bade, Robin; Parkin, Michael (1988). Central Bank laws and monetary policy. Department of Economics University of Western Ontario, Canada.

Brasil. Projeto de lei complementar nº 19, de 2019. 

Campos, Roberto. (1994). A Lanterna na Popa. Rio de Janeiro

Corazza, Gentil. (2006). O Banco Central do Brasil: evolução histórica e institucional. Perspectiva Econômica, vol. 2, nº 1

Grilli, Vittorio; Masciandaro, Donato; Tabellini, Guido (1991). Political and monetary institutions and public financial policies in the industrial countries. Economic Policy, Vol. 6, No. 13, Outubro, páginas 342-392.

Salama, Bruno Meyerhof; Barrionuevo Filho, Arthur; Palma, Juliana Bonacorsi de; Dutra, Pedro (2017). Processo de nomeação de dirigentes de agências reguladoras: uma análise descritiva. Disponível em: <https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/themes/Mirage2/pages/pdfjs/web/viewer.html?file=https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/24882/02_sumario_executivo_grp_-_pep_01.pdf?sequence=1&isAllowed=y> Acesso em: 20 de Fevereiro de 2021.

Vonessen, Benjamin; Arnold, Katrin; Mas, Rodolfo Dall’Orto; Fehlker, Christian (2020). The case for central bank independence. Occasional Paper Series, European Central Bank.

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Autores: Artur Roman, Carolina Melo, Ricardo Pering, Vinícius Cadorin

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