Carta de conjuntura

CARTA DE CONJUNTURA TRIMESTRAL – 3T24

CARTA DE CONJUNTURA TRIMESTRAL – 3T24

No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do terceiro trimestre do ano de 2024, analisando os cenários econômicos nacional e internacionais.

Neste trimestre, destaca-se no cenário nacional o início do aperto monetário pelo Banco Central, em um contexto de mercado de trabalho aquecido e hiato do produto positivo. Além disso, as expectativas fiscais pioraram, e o IPCA se aproxima do teto da meta, pressionado por eventos climáticos.

No cenário internacional, as tensões no Oriente Médio e no Leste Europeu persistem. Destaca-se também o início do afrouxamento monetário pelo Federal Reserve para mitigar o risco de recessão, além das políticas de estímulo do governo chinês, que visam reviver a demanda e alcançar a meta de crescimento para 2024.

 

IPCA de 4,42% se aproxima do teto estabelecido pelo BACEN e ganha desafios com recentes eventos climáticos

 

A inflação de julho (+0,38%) teve um valor acima do esperado (+0,34%), impactado pelo aumento no preço das passagens aéreas (+19,39%), contribuindo com 0,11 p.p., impulsionado pelo aumento da demanda durante as férias escolares. Outro subitem que apresenta quase 6% de peso sobre o IPCA e que mostrou inflação de 3,15% (impacto de 0,16 p.p. sobre o Índice) foi a gasolina, dado ao ajuste de preços de 7,12% no preço de venda para a distribuidora, impactando o consumidor final em mais R$ 0,15 por litro. Além desses fatores, a energia elétrica residencial impactou o índice em 0,08 p.p., dado ao acionamento da bandeira amarela na tarifa de energia. Enquanto isso, o grupo de alimentação ajudou a conter a alta, registrando uma deflação de 0,22%. A maior queda foi no preço do tomate (-31,24%), devido ao aumento da oferta desse produto no mercado.

Para agosto, o IPCA apresentou uma deflação de 0,02%, ficando ligeiramente abaixo das expectativas do mercado de uma inflação de 0,01%. A deflação foi influenciada pela queda de preços no grupo de Alimentação e Bebidas (-0,44%), contribuindo com -0,09 p.p. no índice. No grupo, os itens que registraram as maiores quedas são tubérculos, raízes e legumes, com uma deflação de 16,31% na comparação mensal, justificada pela perda de qualidade da produção, consequência da falta de chuva e do calor intenso. Outro item que impactou o Índice foi a energia elétrica residencial (-2,77%), impactando com -0,11 p.p., e que foi influenciada pela volta da bandeira tarifária verde dado o volume de chuvas na região Sul do Brasil no mês. Por outro lado, o aumento no preço da gasolina (+0,67%) evitou que a deflação fosse ainda mais acentuada.

No mês de setembro o IPCA apresentou aceleração frente a agosto registrando alta de 0,44% frente às expectativas de 0,46% do mercado. Influenciada principalmente pela energia elétrica residencial com elevação de 5,36% no mês, impactando o índice em 0,21 p.p., que é justificado pelo acionamento da bandeira tarifária vermelha I, como consequência das secas que atingiram o país. Além disso, conforme anúncio da Aneel no dia 27/09, em Outubro foi acionado a bandeira vermelha patamar 2, indicando uma maior pressão no futuro próximo. O item de carnes também apresentou elevada pressão no índice com 0,07 p.p., dada inflação registrada de 2,97%, que por conta da estiagem e clima seco do período diminuem a qualidade da pastagem, que afeta o peso do gado e por fim impactando no preço da arroba. Além disso, o mês também foi impactado pelo aumento de preços do gás de botijão (2,40%), passagem aérea (4,64%) e plano de saúde (0,58%).

Fonte: IBGE e ANBIMA; Elaboração própria.

O índice de difusão, que mede a proporção de subitens do IPCA com alta de preços, foi de 47% em julho e subiu para 56% nos dois meses seguintes, influenciado por condições climáticas adversas e queimadas. O núcleo da inflação apresentou aceleração na passagem de julho (0,24%) para agosto (0,38%) e desaceleração no mês de setembro (0,21%), afetada por fatores semelhantes aos do índice de difusão. O IPCA acumulado no ano de 2024 se encontra em 3,31%, 0,19 p.p. inferior ao mesmo período de 2023, e, no acumulado de 12 meses, 4,42%, próximo ao teto da meta estabelecida pelo Banco Central de 4,50%, exigindo uma política monetária mais restritiva.

Fonte: IBGE e ANBIMA; Elaboração própria.

Taxa de desemprego em mínimas históricas evidencia desempenho robusto do mercado de trabalho


No mês de agosto, a taxa de desemprego alcançou o nível de 6,6%, o menor desde dezembro de 2014, representando uma redução de 1,2 p.p. em relação ao mesmo período do ano anterior e uma redução na margem de 0,3 p.p. Um dos fatores que explicam o desempenho é o crescimento do número de admissões nos meses de julho e agosto — juntos, somaram 423 mil novos empregados — 17% a mais que nos mesmos meses de 2023. Em agosto, o número de pessoas na força de trabalho alcançou 109,8 milhões, com 7,3 milhões de pessoas desocupadas e 3,1 milhões de desalentados, o menor número desde maio de 2016. 

Fonte: IBGE; Elaboração própria.

No período observado, a quantidade de pessoas ocupadas no setor industrial e no setor de comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas apresentou um aumento de 234 mil e 198 mil empregados, respectivamente. O número de empregadores apresentou um crescimento modesto de 1,7% na margem e uma queda de 0,02% em relação a junho. Outro ponto de destaque é a natureza do crescimento de empregos no setor privado, uma vez que se observou, no período de junho a agosto, um crescimento de 0,68% no número de empregos com carteira assinada e de 3,20% sem carteira assinada (+442 mil). No acumulado do ano até agosto, os serviços de administração pública, defesa, seguridade, educação, saúde humana e serviço social apresentam participação relevante no desempenho do mercado de trabalho, com o maior aumento no número de empregados, totalizando 592 mil (+3,28%).

O rendimento real médio de todos os trabalhos habituais mensais no mês de agosto foi de R$ 3.228, representando uma queda marginal de 0,09% em relação a junho e uma recuperação (+0,53%) em relação a julho, corroborando para um crescimento robusto na comparação anual, de 5,04%. No período, o salário real médio no setor privado informal apresentou um expressivo crescimento de 8,34%, assim como o setor industrial, alcançando o patamar de R$3.170 (+7,3% na comparação anual).

 

PIB do Brasil surpreende com alta de 1,4% no 2º Trimestre e projeção de crescimento para 2024 sobe para 3%

 

O trimestre também foi marcado pela divulgação do PIB do Brasil referente ao segundo trimestre de 2024. O produto interno bruto brasileiro cresceu 1,4% em relação ao trimestre anterior, com ajuste sazonal, superando tanto o resultado do trimestre passado quanto a mediana das projeções do mercado, que estimava um avanço de 0,9%. Na comparação anual, o PIB registrou um crescimento de 3,3%.

O setor de serviços apresentou uma alta de 1,0% na margem e 3,5% em termos anuais, sendo responsável por 2,0 pp da variação anual do PIB. Esse avanço foi generalizado, abrangendo áreas como comércio, atividades financeiras e transporte. O setor industrial também teve resultados positivos, com crescimento de 1,8% na margem e 3,9% interanual, contribuindo com 0,8 pp para o PIB. A indústria foi beneficiada pela recuperação dos investimentos e pela demanda interna robusta, especialmente nos segmentos de transformação e eletricidade.

Por outro lado, a agropecuária apresentou queda de 2,3% na margem e 2,9% na comparação anual. Essa retração foi atribuída principalmente às condições climáticas adversas, que prejudicaram a produção de culturas-chave como soja e milho.

Do lado da demanda, o consumo das famílias cresceu 1,3% na margem, mesmo percentual de aumento registrado no consumo do governo. Em termos anuais, o consumo das famílias avançou 4,9%, impulsionado por um mercado de trabalho aquecido e pelas políticas governamentais de elevação do salário mínimo e transferências de renda. Esse componente foi o maior contribuinte para o PIB, adicionando 3,1 pp à taxa de crescimento anual.

O PIB do segundo trimestre confirmou a melhora na sua composição, marcada por mais uma forte expansão da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), que cresceu 2,1% na margem e 5,7% em termos anuais. Esse aumento é atribuído ao crescimento da produção doméstica e da importação de bens de capital, além do bom desempenho nos setores de construção e desenvolvimento de sistemas de informática.

As exportações líquidas, no entanto, impactaram negativamente o crescimento, subtraindo 1,5 pp do PIB. Apesar do crescimento de 1,4% nas exportações, as importações aceleraram ainda mais, com alta de 7,6% na margem e 14,8% na comparação anual, reforçando a força da demanda interna.

Fonte: IBGE; Elaboração própria.

O Índice de Atividade Econômica (IBC-Br), que antecipa o desempenho do PIB, recuou 0,40% em julho, após uma alta expressiva de 1,40% no mês anterior. A expectativa era de uma queda de 0,9%, mas o recuo foi menor, marcando o primeiro declínio em quatro meses. Em agosto, o índice avançou 0,23% em relação ao mês anterior, superando as projeções de estabilidade. Na comparação anual, o IBC-Br registrou um aumento de 3,1%, enquanto no acumulado dos últimos 12 meses, o índice cresceu 2,5%.

A ocorrência de choques negativos, como a tragédia climática no Sul entre abril e maio, e a interrupção do ciclo de cortes na taxa Selic, decidida na reunião do Copom em junho, levou alguns analistas a revisar para baixo suas projeções para o PIB de 2024. No entanto, na divulgação mais recente, o carry-over subiu de 1,2% para 2,7%, indicando que, mesmo com estagnação nos próximos trimestres, o PIB já garantirá esse crescimento mínimo para o ano. Com isso, o Relatório Focus ajustou as expectativas para uma alta de 3%, refletindo um cenário mais otimista para 2024.

Na última ata do Copom, o Banco Central ressaltou que a atividade econômica tem mostrado um dinamismo superior ao previsto, levando à reavaliação do hiato do produto para o campo positivo. A combinação de um mercado de trabalho aquecido, política fiscal expansionista e o aumento das concessões de crédito às famílias continua a sustentar o consumo e a impulsionar a demanda agregada. Contudo, esse cenário de maior vigor econômico dificulta a convergência da inflação à meta, exigindo uma postura monetária mais contracionista para conter as pressões inflacionárias.

 

PMI Industrial e de Serviços flutuam em meio à demanda e pressões de custos no Brasil

 

Em julho de 2024, o PMI industrial atingiu 54,0 pontos, o maior nível em três meses, enquanto o PMI de serviços chegou a 56,4 pontos, o mais alto desde junho de 2022. Ambos os índices foram impulsionados pela forte demanda interna e externa. No entanto, os setores enfrentaram o impacto da desvalorização do real, que aumentou significativamente os custos dos insumos, forçando fabricantes e prestadores de serviços a reajustarem seus preços para proteger suas margens.

No mês seguinte, o cenário mudou, com o PMI industrial de agosto recuando para 50,4, indicando uma desaceleração da indústria, acompanhada por quedas na produção e nas vendas. Paralelamente, o PMI de serviços caiu para 54,2, o nível mais baixo desde abril, embora ainda se mantenha em território expansionista. Esse declínio foi impulsionado principalmente pela redução da demanda e pelas persistentes pressões inflacionárias, exacerbadas por problemas climáticos.

Já em setembro, o PMI industrial cresceu para 53,2, indicando uma melhora na produção, na criação de empregos e no aumento das vendas. No setor de serviços, o PMI subiu para 55,8, destacando-se pelo aumento expressivo dos novos pedidos, o maior registrado em 27 meses. Contudo, as pressões de custos permaneceram elevadas, especialmente em insumos como eletricidade e alimentos, resultando novamente no repasse desses encargos aos consumidores.

Fonte: Investing.com; Elaboração própria.

 

Déficit público exige que governo crie alternativas para elevar arrecadação e evitar o aumento da percepção de risco

 

O cenário fiscal do Brasil enfrenta desafios significativos devido ao aumento do déficit público e às incertezas nas contas públicas. Segundo o Ipea, os recentes ajustes de despesas visam alcançar um equilíbrio orçamentário, mas as previsões para o crescimento econômico permanecem moderadas.

O governo busca aumentar a arrecadação, e uma das medidas propostas é a “taxação das blusinhas”, que estabelece uma tarifa de 20% para compras internacionais abaixo de US$ 50. Essa nova imposição espera arrecadar cerca de R$ 700 milhões neste ano, conforme o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2025. No entanto, a implementação de reformas estruturais, como a tributária, ainda enfrenta desafios.

Além disso, o governo deve adotar uma estratégia de aumento da arrecadação para atingir a meta de resultado primário de zero déficit fiscal. Recentemente, houve uma piora nas expectativas para o resultado nominal de 2024 e 2025. As projeções passaram de -7,3% e -6,5% do PIB, segundo o relatório Focus de 26/07/2024, para -7,78% em 2024 e -7,3% em 2025, conforme o relatório Focus de 27/09/2024.

O contínuo déficit fiscal pode comprometer a confiança dos investidores e aumentar a percepção de risco, exigindo medidas fiscais mais rigorosas para estabilizar a economia e atrair investimentos estrangeiros.

 

Banco Central adota postura cautelosa frente a incertezas e instabilidades, com elevação das projeções

 

As expectativas de inflação, especialmente a do IPCA para o fim de 2024, apresentaram uma leve aceleração no último trimestre, passando de 4,1% para 4,37%. Essa variação reflete pressões ainda presentes nos preços de serviços e de alguns insumos alimentares.

Esse aumento sutil na inflação, combinado com a instabilidade do cenário interno e externo, foi influenciado por incertezas econômicas e crises geopolíticas, como a guerra na Ucrânia e a instabilidade no Oriente Médio, que contribuíram para uma mudança nas expectativas de juros.

Inicialmente em 10,5%, a taxa Selic foi elevada para 10,75%, marcando o início de um novo ciclo de alta. A expectativa é que o Banco Central adote uma postura cautelosa, buscando equilibrar o controle da inflação e a manutenção do crescimento econômico. A previsão é que a taxa básica atinja 11,75% até o final de 2024. Nesse contexto, a taxa de juros neutra da economia está projetada em 4,75% desde junho, segundo o Banco Central.

Fonte: Banco Central do Brasil; Elaboração própria.

 

Impactada pelo índice de moradia, inflação nos EUA surpreende gerando incertezas sobre futuro da da política monetária

 

Durante o terceiro trimestre de 2024, o índice de inflação ao consumidor (CPI) apresentou a mesma leitura para os meses de julho, agosto e setembro, com variação de 0,2%. Em julho, o número ficou em linha com a expectativa do mercado, destacando-se o aumento de 0,4% no índice de moradia (Shelter), responsável por 90% dos itens que registraram inflação no período. Em agosto, o índice também seguiu as previsões, sendo influenciado pela aceleração do Shelter (+0,5%) e pela queda nos preços de energia (-0,8%). Setembro, por sua vez, a leitura foi ligeiramente superior às expectativas, com uma queda robusta no preço da energia (-1,9%) e um aumento significativo nos preços dos alimentos (+0,4%), que, somados ao Shelter (+0,2%), contribuíram com 75% do aumento mensal dos itens.

Assim, o trimestre encerrou com um CPI acumulado de 12 meses de 2,4%, o menor nível desde fevereiro de 2021, mas ainda acima da meta estabelecida pelo FED, de 2%. O período foi influenciado pelos índices de moradia e alimentos, com altas de 4,9% e 2,3%, respectivamente, no acumulado. O item de energia apresentou uma expressiva queda de 6,8% nos preços, evitando uma inflação maior. Observando o core CPI, foram registradas leituras de 0,2% em julho e 0,3% em agosto e setembro, resultando em um acumulado de 3,3% nos últimos 12 meses, com uma aceleração marginal de 0,01 p.p. em relação ao acumulado de agosto. A elevação do núcleo da inflação ao fim do trimestre trouxe questionamentos ao mercado quanto à duração do ciclo de cortes nas taxas de juros adotado pelo banco central americano.

Fonte: U.S. Bureau of Labor Statistics; Elaboração própria.

 

Payroll – Iminência da recessão norte-americana surge com o trimestre e se dissipa ao decorrer do tempo

 

No terceiro trimestre de 2024, a economia americana observou um crescimento na taxa de desemprego (+0,02 p.p.) em julho, seguido de uma queda de 0,01 p.p. nos dois meses subsequentes, passando de 4,3% em julho para 4,1% em setembro.

O período foi marcado por surpresas, começando com a criação de empregos significativamente abaixo do esperado em julho (+114 mil empregos), além de um aumento expressivo no número de pessoas desempregadas (+352 mil), representando um crescimento de 21% em relação ao ano anterior. Somado a um aumento expressivo na força de trabalho (+420 mil), impulsionado pela imigração, esses dados geraram temores globais de uma recessão nos Estados Unidos. O aumento relevante da taxa de desemprego acendeu o alerta para a Sahm Rule, que indica uma recessão quando o desemprego aumenta mais de 0,5 p.p. na média móvel de três meses em relação ao valor mínimo da média móvel dos 12 meses anteriores.

Fonte: U.S. Bureau of Labor Statistics; Elaboração própria.

Em agosto, a criação de empregos novamente ficou abaixo das expectativas (+142 mil empregos), com 42 mil pessoas deixando o desemprego. Destacou-se a criação de 118 mil novos empregos no setor privado, e o aumento do rendimento médio por hora (+0,4% em relação a julho), alcançando US$35,21 por hora. O resultado do relatório de empregos (payroll) indicou que o mercado de trabalho estava desacelerando, mas sem sinais de colapso.

Por fim, em setembro, a criação de 254 mil novos empregos superou as expectativas do mercado. Essa recuperação, somada à queda na taxa de desemprego, gerou questionamentos sobre a eficácia da Sahm Rule e reduziu as preocupações de uma recessão na economia americana. O resultado foi impulsionado pela criação de empregos nos setores de educação e serviços de saúde (+81 mil), e lazer e hospitalidade (+78 mil), além de um novo aumento de 0,4% no rendimento médio por hora, que chegou a US$ 35,36.

 

Fed inicia afrouxamento monetário, mas permanece atento aos riscos inflacionários

 

Após o ciclo de alta na taxa de juros, implementado para controlar a inflação desenfreada em diversos países, observou-se o início do ciclo de queda de juros nos Estados Unidos. O Federal Reserve reduziu a taxa de juros de 5,5% para 5,0%, uma queda que superou as expectativas de alguns players do mercado, que previam uma redução para 5,25%, ou seja, uma diminuição de apenas 0,25 pp.

Fonte: U.S. Bureau of Labor Statistics; Elaboração própria.

 

Essa redução animou muitos participantes do mercado financeiro, que estavam receosos quanto a uma possível crise na principal economia do mundo. No entanto, o processo de diminuição da taxa de juros nos EUA deve ocorrer de forma gradual, uma vez que o banco central ainda considera os riscos inflacionários.

 

China passa a priorizar estímulos à demanda para atingir a meta de crescimento

 

No Plenário do Partido Comunista Chinês de julho, a ausência de novas iniciativas e estímulos gerou uma perspectiva econômica desalentadora, com a projeção de crescimento para 2024 reduzida para abaixo da meta governamental de 5,0%. A estagnação do setor imobiliário e do mercado acionário levou os investidores a buscar segurança em ativos de renda fixa e ouro, pressionando as taxas de juros para baixo. Além disso, a desaceleração na manufatura e nas exportações foi evidenciada pela queda do PMI industrial para 49,8 em julho e pelo crescimento de 7% nas exportações, abaixo do esperado.

A situação se agravou em agosto, quando a inflação anual alcançou apenas 0,6%, o menor aumento desde 1999. A inflação subjacente subiu apenas 0,3%, o nível mais baixo em três anos, o que pode adiar os gastos das famílias e o investimento empresarial. As vendas no varejo aumentaram apenas 2,1% em termos anuais, abaixo do esperado, mesmo durante o período de viagens de verão.

Em setembro, o CPI da China subiu apenas 0,4% em relação ao ano anterior, abaixo da expectativa de 0,6%. O índice de preços ao produtor (PPI) registrou uma queda de 2,8%, marcando o 24º mês consecutivo de deflação, resultado das flutuações nos preços das commodities e da demanda interna insuficiente. Para enfrentar esse cenário, o Banco Popular da China (PBoC) injetou 800 bilhões de yuans no sistema financeiro e considerou liberar mais 500 bilhões de yuans. O PBoC também reduziu a taxa de recompra reversa, a taxa de empréstimos de médio prazo e o coeficiente de reserva dos bancos, liberando 1 trilhão de yuans para aumentar o crédito. Outras medidas incluíram a diminuição da contribuição mínima para a compra de uma segunda residência e incentivos para que governos locais adquirissem imóveis não vendidos.

Fonte: Investing.com; Elaboração própria.

 

Apesar do anúncio, o mercado permanece cauteloso. As ações chinesas atingiram máximas de dois anos, aumentando 25% em poucos dias, e esse otimismo também foi sentido na bolsa brasileira, especialmente entre as exportadoras de commodities. No entanto, o mercado recuou à medida que o nervosismo aumentava devido à ausência de mais detalhes sobre os planos de gastos adicionais do governo. Essa incerteza levantou questões sobre a eficácia das medidas anunciadas, sugerindo que elas podem não ter sido suficientes para enfrentar os desafios estruturais da economia chinesa, e enfatizou a necessidade de políticas fiscais mais eficazes para combater a deflação e estimular a demanda de forma sustentável.

Nesse contexto, no dia 12 de outubro, o governo anunciou novas medidas fiscais, afirmando que ainda tem espaço para aumentar a dívida e o déficit fiscal, embora sem detalhar todas as iniciativas de estímulo. Entre as principais políticas estão a alocação de 400 bilhões de yuans para governos locais, o uso de 2,3 trilhões de yuans em bônus não utilizados e a ampliação do teto da dívida para reestruturar dívidas ocultas. Outras ações incluem a compra de terrenos ociosos e imóveis comerciais, priorizando habitações subsidiadas, além de considerar a abolição do imposto sobre valor agregado para edifícios residenciais e o aumento de subsídios para estudantes, em resposta ao recorde de desemprego juvenil em agosto. O ministro das Finanças também destacou a necessidade de reformas financeiras e tributárias para otimizar processos e estimular inovações.

 

Autores: João Pedro Melo Zimmermann, Diogo Rodrigues Machado e Vinícius Gallardo Ribeiro Rodrigues.

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Carta de Conjuntura Trimestral – 1T24

Carta de Conjuntura Trimestral – 1T24

No relatório macro, o núcleo de macro e renda fixa aborda os principais acontecimentos do primeiro trimestre do ano de 2024, analisando os cenários econômicos nacional e internacionais.


Neste trimestre, no cenário nacional, se destacam as incertezas quanto às trajetórias da inflação e da dívida pública, assim como seus consequentes efeitos sobre a taxa de juros e a economia real.


Já no cenário internacional, se destacam as tensões no Oriente Médio e os recentes dados da economia estadunidense, que pode estar mais distante de um ciclo de corte na taxa de juros do que o esperado no final de 2023.


Evolução da inflação brasileira mostra sinais de incerteza e exige cautela por parte do Banco Central em suas próximas decisões.


No mês de janeiro a inflação teve um valor de 0,42%, acima do esperado, em razão principalmente dos preços dos alimentos, impactados pelas consequências do El Niño. Em fevereiro, o reajuste das mensalidades escolares fez com que o mês surpreendesse as expectativas, com um valor de 0,83%. Já em março, a inflação surpreendeu positivamente, tendo uma desaceleração maior do que o previsto, com 0,16% frente às projeções de mercado. Esse cenário mais benigno foi influenciado pela desaceleração do setor de alimentos e bebidas (embora ainda tenha tido a maior alta, impactado pelos fatores climáticos), além de uma deflação no segmento de combustíveis, influenciado pela queda da gasolina e das passagens aéreas.


No entanto, o alívio do setor de combustíveis pode ser passageiro, visto que, segundo dados do Centro Brasileiro de Infraestrutura (19/04/2024), os preços praticados pela Petrobras da gasolina e do diesel estão defasados em 27,09% e 5,41% respectivamente. A empresa brasileira realizou o último ajuste em dezembro de 2023 e provavelmente irá postergar ainda mais o reajuste, já que o presidente da corporação está com relações desgastadas com o atual governo e um eventual aumento dos preços arruinaria o relacionamento.

O índice de difusão (número de componentes que tiveram aumento de preços) caiu durante o período, tendo os valores 65%, 57% e 56% nos três primeiros meses. O número poderia ser ainda menor, mas em março houve um incremento no número de itens alimentícios com crescimento nos preços. O núcleo de serviços subjacentes (exclui os itens mais voláteis e costuma ser menos sensível à política monetária) está pressionado pelo mercado de trabalho e é observado com cautela, já que em janeiro surpreendeu com uma alta de 0,76%, apesar de abrandar para 0,45% nos dois meses seguintes.


Um dos fatores de atenção para a continuidade da menor pressão dos preços é a questão fiscal, que está cercada de incertezas. O consolidado do setor público superou as expectativas em janeiro e apresentou um superávit de R$102 bilhões, ao passo que em fevereiro teve um déficit de R$48 bilhões, além de um déficit de R$1,5 bilhão em março, totalizando um superávit acumulado de R$19,4 bilhões no primeiro trimestre, abaixo do resultado apresentado no mesmo período do ano passado. Cabe lembrar que o ano é marcado pelas eleições municipais e pelo histórico populismo econômico relacionado ao período. No entanto, existem expectativas de que as novas fontes de arrecadação (apostas esportivas, investimentos Offshore, fundos exclusivos) possam reduzir parcialmente o risco fiscal. Somente em janeiro, aproximadamente 29% dos tributos de Rendimentos de Capital tiveram como origem os fundos exclusivos.

Mercado de trabalho brasileiro segue aquecido. 

Apesar da sazonalidade de janeiro, o Brasil apresentou aceleração do emprego em fevereiro, com 306 mil vagas criadas, sobretudo no setor de serviços (63% do número). Ademais, nota-se um reaquecimento da mediana dos salários de admissão (para o primeiro trimestre de 2024, utilizou-se somente dados de janeiro e fevereiro), o que pode dificultar a desinflação de serviços. Com uma taxa de 7,8% de desemprego, número historicamente baixo, a questão do equilíbrio do mercado de trabalho pode dificultar o processo de desaceleração salarial. No último trimestre de 2023 houve um aumento da participação no mercado de trabalho e caso a tendência tenha continuidade, pode tornar o cenário mais benigno.


IBC-Br– Atividade econômica segue resiliente liderada pelo varejo. 

Segundo o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), a economia avançou 0,6% em janeiro e 0,4% em fevereiro de 2024, em ambos os meses se destacou o setor de varejo, que se beneficiou da inflação controlada e o aumento da massa salarial. O comércio varejista avançou 2,5% no conceito restrito (bens não-duráveis e semi-duráveis) e 2,4% no conceito ampliado (que engloba também bens duráveis, como veículos e materiais de construção), superando os tetos das projeções e indicando resiliência no setor. No mês de fevereiro, o varejo restrito cresceu 1%, novamente superando as expectativas, resultando em uma alta acumulada de 6,1% em relação aos dois primeiros meses de 2023. Já o varejo ampliado, avançou 1,2%, perto do teto das estimativas, acumulando uma alta de 8,2% em relação ao mesmo período no ano anterior.

No mês de janeiro houve crescimento de 0,7% no setor de serviços na comparação com dezembro de 2023, com alta em quatro das cinco categorias que compõem o índice, com exceção de serviços prestados às famílias, que devolveu a forte alta do último mês do ano de 2023. O destaque ficou com o segmento de serviços de informação e comunicação, que foi impulsionado pelo crescimento da receita das empresas que atuam na produção de conteúdo para TV e streaming. Já no mês de fevereiro, o setor de serviços retraiu em 0,9%. A retração vem em linha com a expectativa de acomodação do setor em 2024, com as atuais quedas compensando os meses de alta recentes. Das 5 categorias pesquisadas, apenas o segmento de serviços prestados às famílias apresentou uma leve alta (0,4%).

No mês de janeiro a produção industrial recuou em 1,6%, com destaques positivos para o setor de bens de capital que avançou em 9,3%, enquanto o setor de bens intermediários recuou 2,7%. Da mesma forma, no mês de fevereiro o setor industrial novamente recuou 0,3%, com destaques positivos para o setor de bens duráveis (3,6%) e negativos novamente para o setor de bens intermediários (contração de 1,2%). Apesar da contração geral no setor, há uma composição positiva nos resultados, com alta relevante na fabricação de veículos e insumos para construção civil, indicando aumento de investimentos. No entanto, setores relevantes impactaram negativamente os resultados gerais, como a leve retração na produção de alimentos e a estabilidade na produção de combustíveis. No mês de fevereiro, também houve forte retração no setor químico (3,5%) e de produtos farmacêuticos (6,0%). Por fim, o mês de março finalmente registrou uma alta de 1,1% para a indústria, puxada pelo setor de derivados de petróleo.


Concessões de crédito voltam a evoluir depois de período de incertezas.

No primeiro trimestre de 2024, o efeito das políticas de afrouxamento monetário e incentivo ao consumo começaram a ser sentidos no mercado de crédito. Houve uma notável diminuição da inadimplência para pessoas físicas, decorrente não só da redução da taxa básica de juros, mas também dos programas de renegociação de dívidas promovidos pelo governo federal no último ano, permitindo um crescimento de 14,7% na concessão de crédito livre para pessoas físicas entre jan/23 e jan/24. No entanto, é necessário observar a piora na composição da carteira de crédito contratado, com aumentos na modalidade de crédito de alto custo (cheque especial, crédito pessoal, cartão parcelado, entre outros) e diminuição nas de baixo custo (crédito consignado, financiamento de veículos, entre outros).

No entanto, a inadimplência ainda é crescente entre as empresas, que sofreram não apenas com aumento do custo de crédito nos últimos anos, como também com os impactos nos custos de seus insumos e na desaceleração do crescimento da demanda. No geral, houve uma queda na concessão de crédito no começo de 2023, quando a aversão ao risco aumentou com pedidos de recuperação judicial por parte de grandes empresas, impactando principalmente modalidades de recebíveis como a de risco-sacado. Contudo, o segundo semestre de 2023 deu início a uma retomada no apetite por crédito, que continuou no primeiro mês de 2024, que registrou um aumento de 8,7% em relação a janeiro de 2023.

Esses fenômenos podem ser explicados pela queda da taxa básica de juros e da curva longa da ETTJ, que tiveram como consequência uma queda no índice de custo de crédito brasileiro, que reduziu durante o ano de 2024. Com isso, tendências observadas no ano de 2023 começaram a ser revertidas no primeiro trimestre de 2024 e tendem a melhorar durante o resto do ano. Por exemplo, a formação bruta de capital fixo da economia brasileira que teve sucessivas quedas durante os últimos 3 trimestres do ano passado, voltou a variar positivamente no primeiro trimestre deste ano, uma notícia positiva para a produtividade do país e para o controle da inflação de longo prazo.


PMI de serviços e industrial reforçam perspectiva de resiliência da economia brasileira.

Mesmo diante do cenário de incertezas relativas à inflação e a economia internacional, a indústria brasileira tem demonstrado um crescente otimismo no último trimestre, com os dados do PMI industrial crescendo consideravelmente no primeiro trimestre de 2024. As boas perspectivas se devem principalmente à recuperação da demanda do setor, com o volume de novos pedidos aumentando pelo terceiro mês consecutivo em março, a taxa mais forte em dois anos e meio. Além disso, o setor teve um considerável aumento de produção em março, com a demanda interna sendo o principal vetor de impulso ao setor. No entanto, a demanda externa se apresentou como a maior vulnerabilidade do setor, apresentando queda pelo 25° mês seguido.

A queda da taxa de juros é um importante vetor para o crescimento da indústria nacional, com a desaceleração da inflação mais intensa do que as estimativas do mercado previam para março de 2023, reforçou-se uma perspectiva de continuidade no ritmo de corte da Selic por parte do Banco Central. No entanto, fatores externos têm impactado negativamente para que essas expectativas se concretizem, pondo em dúvida se haverá um novo fôlego substancial para a indústria, que em fevereiro aumentou seu estoque de insumos pela primeira vez em 6 meses, a fim de atender ao maior apetite dos clientes.

Já o crescimento do setor de serviços, tem se demonstrado resiliente, indicando bons sinais de otimismo que se mantiveram por boa parte do ano de 2023. Com exceção das categorias de imóveis e serviços comerciais, o setor de serviços registrou aumento no nível de atividade no primeiro trimestre, com as vendas subindo desde outubro de 2022 e o crescimento contínuo de novos negócios.


Atas do Copom.

Nas duas primeiras atas do Copom de 2024, é afirmado que os indicadores recentes de atividade econômica apontam para uma desaceleração da economia, conforme esperado pelo Comitê. No entanto, na publicação mais recente, observa-se uma moderação no crescimento econômico, porém, com maior dinamismo em alguns indicadores na margem. Isso sugere que a desaceleração pode estar ocorrendo a um ritmo mais lento do que o inicialmente previsto, e há áreas da economia que estão se expandindo de forma mais robusta. Por fim, o mercado de trabalho segue aquecido e com aceleração nos rendimentos reais.

Também é afirmado que a inflação ao consumidor está seguindo a trajetória esperada de desinflação. No entanto, os indicadores que agregam os componentes mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária se situam acima da meta para a inflação nas divulgações mais recentes, o que difere do que foi observado na primeira ata, onde os indicadores estavam mais próximos da meta. Apesar disso, as expectativas de inflação para 2024 e 2025 apuradas pela pesquisa Focus mantêm-se em torno de 3,8% e 3,5%, respectivamente. 

As projeções para a inflação de preços administrados, tanto os diretamente regulados pelo governo quanto aqueles com sensibilidade reduzida aos fatores de oferta e demanda, muitas vezes devido a contratos ou acordos prévios, aumentaram de 4,2% para 4,4% para 2024 e de 3,8% para 3,9% para 2025.

Cenário fiscal – Aumentam preocupações após possíveis mudanças no PLDO, enquanto medidas tributárias mostram impacto positivo na arrecadação, apesar do gasto público acompanhar o crescimento.

As possíveis mudanças no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) aumentaram as preocupações com o cenário fiscal no Brasil. Em entrevista recente, o atual ministro da economia afirmou que o governo pretende encaminhar ao Congresso uma proposta de alteração da meta do arcabouço fiscal para 2025, a qual seria inferior à meta de superávit de 0,5% do PIB. Vale ressaltar que o arcabouço fiscal foi aprovado pelo mesmo governo em agosto do ano passado. Essa perspectiva levanta questionamentos sobre a credibilidade do arcabouço fiscal do país.

Por outro lado, uma série de propostas legislativas aprovadas pelo Congresso Nacional no final de 2023 visa contribuir para a recomposição da arrecadação. Essas propostas incluem a tributação de offshores, trusts e fundos exclusivos, a taxação de apostas eletrônicas e mudanças no tratamento de subvenções concedidas pelos entes federativos. No entanto, a magnitude do impacto dessas medidas ainda é incerta e precisa ser observada ao longo do ano.

Em janeiro, as medidas de tributação tiveram um impacto positivo na arrecadação, com um aumento real de 6,9% em relação ao ano anterior. No entanto, as despesas do Governo Central também cresceram, principalmente devido aos aumentos no salário mínimo e nos salários dos servidores públicos, além da indexação dos gastos com saúde e educação. Apesar disso, o Governo Central registrou um superávit primário significativo de R$81 bilhões, impulsionado pela sazonalidade favorável. Com a contribuição dos governos subnacionais, o setor público consolidado alcançou um superávit de R$102 bilhões, semelhante ao observado em janeiro de 2023.


Banco Central – Incerteza na sucessão do presidente preocupa investidores.

Roberto Campos Neto, atual presidente do Banco Central, encerra seu mandato em 31 de dezembro deste ano. Ele é o primeiro líder da instituição desde que obteve sua autonomia. Inicialmente indicado pelo presidente em exercício na época, Campos Neto foi reconduzido após a aprovação da autonomia do BC, permanecendo até 2024. Durante sua gestão, enfrentou pressões políticas do atual chefe do executivo, que buscava uma redução mais acelerada das taxas de juros.

A escolha do novo presidente do Banco Central é prerrogativa do governo federal, que já iniciou as discussões sobre a sucessão. Entre os possíveis candidatos estão Gabriel Galípolo e Paulo Picchetti, indicados por Lula e com vínculos políticos próximos. Galípolo, que teve destaque na campanha eleitoral, foi braço-direito do ministro Fernando Haddad no início do governo, enquanto Picchetti atuou como diretor de Assuntos Internacionais e Gestão de Riscos Corporativos. A incerteza em torno da transição no comando do Banco Central tem dificultado a convergência das expectativas de inflação para a meta de 3% nos próximos três anos, o que tem gerado preocupações entre os investidores sobre uma possível alteração na política monetária. José Júlio Senna, do FGV Ibre, ressalta que o problema da transição não está diretamente ligado aos nomes dos possíveis sucessores, mas sim à incerteza que esse processo traz.

Copom – Redução da taxa de juros e cautela diante de incertezas.

O Copom decidiu reduzir a taxa básica de juros em 0,50 ponto percentual, para 10,75% ao ano, visando à convergência da inflação para a meta ao longo do horizonte relevante. Em um cenário internacional volátil, o Comitê reforça a necessidade de cautela na política monetária, destacando desafios como a desinflação em economias desenvolvidas e o impacto fiscal sobre a demanda agregada. No cenário doméstico, apesar da desaceleração econômica esperada, há sinais de consumo resiliente e transmissão do ciclo de afrouxamento monetário para o mercado de crédito. A incerteza quanto ao cenário inflacionário e as expectativas desancoradas exigem uma atuação firme da autoridade monetária. O Comitê reconhece riscos tanto de alta, como a persistência das pressões inflacionárias globais, quanto de baixa, como uma desaceleração econômica global mais acentuada, demandando cautela na condução da política monetária.

O Comitê avalia que as informações trazidas por atualizações dos conjuntos de dados analisados serão particularmente importantes para definir o ritmo e a taxa terminal de juros. Alguns membros argumentaram ainda que, se a incerteza prospectiva permanecer elevada no futuro, um ritmo mais lento de distensão monetária pode revelar-se apropriado, para qualquer taxa terminal que se deseje atingir. O Comitê manteve, unanimemente, que a taxa de juros e sua respectiva trajetória serão aquelas necessárias para a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante de política monetária.



CPI dos Estados Unidos surpreende e põe em cheque expectativas de corte na taxa de juros.

O trimestre foi marcado pelo impacto do índice Shelter (índice de moradia) na dificuldade de desinflação da economia americana. O CPI surpreendeu em janeiro com o valor de 0,3%, influenciado também pela alta nos alimentos, sobretudo na alimentação fora de domicílio. Já em fevereiro voltou a ficar dentro do esperado, apresentando uma leitura de 0,4%, com uma retomada da inflação associada à gasolina, ao passo que os alimentos apresentaram estabilidade. Em março, o CPI avançou 0,4%, acima do consenso dos especialistas, impactado pela continuidade do processo de aumento relacionado à gasolina, bem como a questão de moradia que afetou o trimestre inteiro.

O índice de moradia apresenta grande relevância no cálculo do CPI (cerca de 32% de peso), sendo assim o item de maior impacto. Os motivos especulados para essa persistência nos aluguéis são: a escassez de casas para equilibrar com a demanda, devido principalmente à redução da construção de moradias no período pós crise de 2008; aumento de custos de construção; defasagem do Shelter Index, representando um indicador atrasado da real expansão dos preços.


O núcleo do trimestre anualizado, que desconsidera itens voláteis como energia e alimentos, apresentou uma aceleração (4,2%) quando comparado ao último trimestre de 2023 (3,4%).


Payroll supera expectativas e reforma resiliência da economia estadunidense.

O índice de emprego urbano dos Estados Unidos surpreendeu durante o primeiro trimestre, superando as expectativas em todos os meses. Somente em março, foram criadas 303 mil vagas de emprego, enquanto que as projeções indicavam o valor de 212 mil. No entanto, apesar da força do mercado de trabalho, com exceção do mês de janeiro, o crescimento nominal dos salários esteve dentro do esperado. Um dos motivos para esse fenômeno, aparentemente inconsistente, está relacionado ao aumento da taxa de participação no mercado de trabalho, tendo como um dos principais fatores a imigração, que em 2023 atingiu 18,3% de participação. Estimativas do novo Payroll de equilíbrio ficam no intervalo de 160 a 265 mil, números bem superiores ao antigo equilíbrio estimado de 100 mil, de modo a explicar o elevado número de empregos sem pressionar os salários.


Por outro lado, um ponto de atenção refere-se à terceira queda seguida de novos empregos em tempo integral, o que está historicamente ligado a recessões. Isso ocorre quando as empresas estão receosas com o enfraquecimento da economia e acabam optando por contratações temporárias e de meio período como forma de flexibilização e redução de custos. Outra questão que se observa é o número de novos empregos gerados pelo governo, cerca de 23% do total, o que pode distorcer a real força do setor privado.

EUA – Fed adota postura restritiva, enquanto mercado enfrenta inversão na curva de juros.

Em seu mais recente pronunciamento, Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (banco central americano), adotou uma postura mais restritiva, destacando as incertezas geradas pelos dados recentes de inflação quanto aos possíveis cortes de juros. O Fed mantém as taxas na faixa entre 5,25% e 5,50% ao ano desde julho de 2023, o maior nível em 23 anos, resultado de 11 aumentos consecutivos iniciados em março de 2022.

Desde meados de 2022, o mercado tem observado uma inversão da curva de juros nos EUA, onde as taxas de curto prazo superam as de longo prazo. Embora historicamente seja um sinal de recessão iminente, a recente redução dessa inversão sugere um retorno à normalidade. Esse movimento reflete uma percepção de que os juros de curto prazo estão excessivamente altos, indicando uma expectativa de redução futura para estimular a economia.

A explicação para essa inversão reside no expressivo aumento das taxas de curto prazo pelo Fed e na crescente demanda por Treasuries de 10 anos por investidores receosos de uma recessão. Essa tendência tem impactos significativos nas políticas monetárias e pode causar depreciação do real frente ao dólar, pressionando a inflação devido ao encarecimento de produtos importados. Ademais, a busca por maior segurança nos EUA pode desencadear uma fuga de investidores, afetando a economia brasileira.

Câmbio – BC brasileiro responde avanço do dólar e yuan enfrenta desvalorização.

Durante todo o trimestre atual, o DXY registrou um avanço de 3,17%, com um aumento adicional de 0,38% apenas no mês de março. Esse índice é utilizado para medir o desempenho do dólar americano em relação a uma cesta ponderada de moedas estrangeiras, incluindo o euro, iene, libra esterlina, entre outras. Esse aumento gerou preocupações entre os investidores, especialmente diante da saúde fiscal do Brasil, das políticas do Federal Reserve e das tensões no Oriente Médio. Como resposta a essa valorização do dólar, o Banco Central brasileiro realizou sua primeira intervenção no câmbio em cerca de 16 meses em 2 de abril, leiloando US$1 bilhão em swap cambial. Apesar de uma queda inicial no valor do dólar após a intervenção, a moeda norte-americana fortaleceu-se durante a tarde, fechando praticamente estável.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, reiterou que a instituição só intercede no mercado cambial em caso de disfunções, mantendo o câmbio como um mecanismo flutuante. Ele ressaltou a robustez das reservas cambiais brasileiras e enfatizou que intervenções extraordinárias ocorrem apenas para assegurar o bom funcionamento do mercado. Campos Neto também destacou a importância de evitar interferências em mudanças estruturais, como a política monetária dos Estados Unidos, que exerce impacto global.


O yuan enfrentou uma fase de desvalorização em 2024, atingindo o seu nível mais fraco em relação ao dólar americano. A decisão do Banco do Povo da China de estabelecer uma taxa de referência diária mais baixa para o yuan onshore contribuiu para esse enfraquecimento, indicando uma possível política de desvalorização controlada da moeda. 

China – Crescimento econômico surpreende com foco em exportações.

A China cresceu 5,3% no primeiro trimestre de 2024 em relação ao mesmo período de 2023, resultado que superou as expectativas do mercado. Esse crescimento foi efeito de fortes investimentos governamentais no setor industrial mirando exportações, que até o momento foi capaz de reverter a crise imobiliária do país.

No entanto, a decisão da China de ampliar suas importações geraram preocupações globais por parte de outros países, que temem que suas indústrias tenham seus resultados afetados, causando demissões. Dessa forma, o ímpeto chinês pode ser eventualmente barrado por medidas protecionistas tomadas por outros países.

Os resultados do primeiro trimestre geram uma boa perspectiva para o alcance da meta do governo chinês de crescimento de 5% para 2024, meta que ganha solidez com a estabilidade de empregos e dos preços, aumento da demanda por produção e crescimento da confiança do mercado, que se reflete no crescimento do PMI industrial Chinês, que estavam em patamares de retração até fevereiro de 2024.

De acordo com o governo chinês, alguns dos riscos que podem ser atribuídos à evolução da economia nacional são as altas taxas de juros praticadas no exterior, que tiram dinheiro da China para financiar a dívida de países estrangeiros que pagam prêmios maiores pelos seus títulos.

Commodities – Cotações sujeitas a dinâmicas políticas e climáticas globais.

As tensões geopolíticas e os comunicados dos cortes voluntários da OPEP+ têm pressionado os preços do petróleo, gerando impactos sobre a inflação e incertezas quanto à trajetória da taxa de juros nos Estados Unidos. Ainda assim, a ampliação da oferta por países como Brasil, EUA e Canadá têm ajudado a aliviar os impactos da política de produção promovida pelos países da OPEP+. A dinâmica dos preços do petróleo está correlacionada a eventos incertos, como a escalada dos conflitos no Oriente Médio, a postura da OPEP+ quanto a sua produção, o ritmo de atividade na China e o crescimento da economia global, sendo que a expectativa do mercado é que a demanda por petróleo em 2024 cresça em linha com a tendência histórica.

As commodities metálicas vem sofrendo um considerável recuo no primeiro trimestre de 2024, impactadas pelo alto nível de estoques acumulados nos portos chineses e a fraca demanda do país para o setor de construção civil. Logo, a evolução dos preços de commodities como o minério de ferro dependeram das políticas adotadas pelo governo chinês.

Há uma expectativa de queda para as principais commodities agrícolas oferecidas pelo mercado brasileiro, dado as expectativas de amplos estoques de grãos dos principais produtores, o que causou o recuo da soja, milho e trigo no primeiro trimestre. Porém, com a quebra de safra esperada para o ano de 2024, o Brasil pode vir a sofrer impactos na evolução de seu PIB com essa combinação de queda na produção e pressão sobre os preços agrícolas.

Já na Ásia, os impactos climáticos como a seca na Tailândia causaram quedas na produção de arroz e açúcar, resultando em medidas protecionistas que, combinadas com as restrições para o comércio advindas da guerra da Ucrânia e das tensões do Oriente Médio, elevaram os preços das commodities agrícolas produzidas na região.

Autores: Gustavo Minatto Martins; Marcos Vinicius Thibes Petussi; João Pedro Melo Zimmermann.
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Carta de Conjuntura Macro – Junho

Carta de Conjuntura Macro – Junho

O avanço da atividade econômica, a decisão de aumento de juros pelo Copom e a desaceleração da inflação ganham destaque no cenário nacional durante o mês de junho, enquanto o cenário fiscal apresenta grande incerteza com aprovação da PEC dos auxílios.

No âmbito internacional, a pressão inflacionária e os temores sobre uma possível recessão ganham destaque, ao passo em que a continuidade do conflito na Ucrânia e a política de covid zero chinesa impactam negativamente o balanço de riscos global.


Atividade Econômica – Cenário se mostra positivo no curto prazo, apesar de incertezas.

Após avanço de 1,0% no primeiro trimestre de 2022, indicadores de alta frequência reiteram um cenário prospectivo positivo para a atividade econômica durante o primeiro semestre de 2022, sugerindo expansão do PIB para o segundo trimestre acima do esperado anteriormente pelo mercado. Os setores da Indústria vêm demonstrando sinais de melhora, à medida que o comércio permanece em expansão, reforçando os bons resultados obtidos para este setor no primeiro trimestre.

Apesar da elevada incerteza para o atual cenário prospectivo, a atividade econômica vem obtendo resultados positivos e gerando revisões altistas para as expectativas de crescimento para 2022 e 2023, fator impulsionado por alguns fatores, como a expansão do mercado de trabalho, o aumento dos estímulos fiscais e o crescimento do setor de serviços, fortemente impactado pela retomada das atividades pós-pandemia.

De forma adicional, os dados do CAGED reiteram para um mercado de trabalho ainda aquecido, com novas leituras reforçando o cenário de recuperação apresentado pela PNAD no começo de junho. Para o mês de maio foram registrados 277.018 empregos formais, descontados os efeitos sazonais, com destaque para o setor de serviços (+120.294), comércio (+47.557) e indústria (+46.975), no acumulado do ano, já há um saldo positivo de 1.051.503 novos empregos. Adicionalmente, a taxa de desemprego está no patamar de 9,8%, a menor taxa desde maio de 2015 (8,3%), de acordo com os dados do IBGE. Estas novas leituras vêm acima das expectativas de mercado, cujo qual esperava uma taxa de desemprego próxima de 10,2%.

Para o cenário à frente, alguns fatores devem exercer importante impacto sobre os resultados econômicos, como a entrada de recursos provenientes do INSS e FGTS impactando de forma positiva e reforçando o atual cenário prospectivo, que já é de crescimento para o segundo trimestre. Em contrapartida, é esperado que os efeitos defasados da política monetária contracionista comecem a surtir maiores impactos sobre a atividade a partir do segundo semestre de 2022, visando desacelerar o atual cenário de escalada dos preços.

As expectativas trazidas pelo Boletim Focus, para 2023, apontam um crescimento modesto da atividade econômica, próximo de 0,5%, em decorrência, sobretudo, da absorção dos impactos da política monetária sobre as decisões de consumo e investimento dos agentes, retraindo a demanda agregada da economia, e do cenário de desaceleração mundial esperado.


Política Monetária e Inflação – Copom adia fim do ciclo de aperto monetário e resultados para a inflação vêm abaixo do esperado.

Em junho, a leitura do IPCA registrou um aumento de 0,67%, levemente abaixo das expectativas de 0,7%. No acumulado do ano, a alta registrada é de 5,49%, e de 11,89% nos últimos 12 meses. As últimas duas leituras do IPCA trouxeram significativa retração dos níveis de preços quando comparado aos primeiros meses do ano, no entanto, parte desta forte queda segue sendo puxada por segmentos voláteis ou administrados.

O cenário prospectivo ainda permanece desafiador e com elevado grau de incerteza, com novas leituras ainda indicando para pressões inflacionárias disseminadas e uma composição ainda desfavorável para o IPCA. A média dos núcleos permanece elevada, chegando em 10,5% no mês de junho. Como contraponto, o índice de difusão, que mede a proporção de bens e serviços que obtiveram aumento de preços no período em relação ao total de itens pesquisados pelo IBGE, desacelerou de 72,4% para 66,6% no mês de junho, entretanto, o valor ainda permanece em patamar elevado.

O cenário inflacionário é de forte incerteza, com fatores implicando em riscos altistas para o cenário à frente, como o atual cenário inflacionário desfavorável, os bons resultados para a atividade econômica e a possibilidade de novas medidas de auxílio fiscal, e, de outra forma, fatores que impactam as projeções de forma baixista, como a forte correção dos preços de commodities internacionais e o impacto das medidas fiscais aprovadas pelo governo, com redução de impostos sobre combustíveis, energia elétrica e serviços de comunicação, resultando em uma forte desaceleração da inflação para o curto prazo.

Apesar das sucessivas altas, o mercado espera uma deflação no mês de julho, por conta da PLP18/2022, que reduziu o ICMS em: combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte público. Além disso, o preço das commodities começou a ceder por causa do temor de uma recessão mundial, o que pode contribuir ainda mais para uma desaceleração da inflação nos próximos meses.

Na reunião de junho/2022, o Copom elevou a Selic em 50 bps para 13,25% a.a., e sinalizou mais um aumento de igual ou menor magnitude para a próxima reunião de agosto. Apesar do elevado grau de incerteza acerca do atual processo inflacionário, o comunicado trouxe uma abordagem mais dovish pelo comitê, tendo em vista as dificuldades de convergir a inflação à meta e o fato de os impactos contracionista ainda não terem surtido efeito sobre os níveis de preços. Com a piora do cenário conjuntural, o destaque do novo comunicado foi a mudança de tom na condução da política monetária adotada pelo comitê, que agora visa trazer a inflação para um valor ao redor da meta, reiterando para uma proximidade do fim do ciclo de aperto monetário. No entanto, com a expansão dos estímulos fiscais e novos fatores advindos pelo lado da demanda devem exercer maior impacto sobre os níveis de preços nos próximos períodos, criando um cenário mais dificultoso para o Banco Central, com expectativa de mais um aumento de 50 bps em agosto, e possibilidade de um novo aumento para setembro.

O dólar comercial encerrou o mês de junho no valor de R$ 5,24, um aumento de 10% em relação ao mês de maio. Os principais motivos por trás dessa alta estão relacionados ao aperto monetário realizado em grandes economias (como nos EUA), ao aumento da percepção de risco quanto às decisões tomadas na parte fiscal do Brasil e a possibilidade de recessão global.

O cenário atual permanece com uma alta aversão a risco, com fortes incertezas e elevada volatilidade para o cenário prospectivo. Destaca-se ainda que o momento atual requer cautela e o BC enfatiza que a política monetária pode ser ajustada para assegurar a convergência da inflação para suas metas de 2023-24, a depender da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação.


Política Fiscal – Apesar da forte arrecadação de tributos, a aprovação da PEC dos auxílios eleva o risco fiscal.

No cenário político nacional, foi aprovada a chamada “PEC dos Auxílios” ou “PEC Kamikaze”. Estima-se que o impacto nos cofres públicos será de R$ 41,25 bilhões, que serão contabilizados fora da regra do teto de gastos. Entre as medidas aprovadas, destacam-se:

  • Aumento do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600.
  • Auxílio-caminhoneiro de R$ 1.000.
  • Auxílio-gás de R$ 120.
  • Auxílio para taxistas e motoristas de aplicativos.
  • Transporte público gratuito para idosos.
  • Repasse de R$ 500 milhões para o programa “Alimenta Brasil”.

Além dessa medida, a redução do IPI para 35% acarretará em uma perda de arrecadação no valor de R$ 7,6 bilhões em 2022 e R$ 10,2 bilhões em 2023. E, ainda com a preocupação do Poder Legislativo e Executivo em reduzir o preço dos combustíveis na bomba para os consumidores, a Lei Complementar n° 134 zerou as alíquotas de PIS/Cofins e Cide incidentes sobre gasolina e etanol até 31 de dezembro de 2022, o que gerará uma perda de R$ 15,4 bilhões. Todas essas medidas causam um cenário de dúvida e de incerteza quanto à condução da política fiscal no Brasil, com um aumento da percepção de que o país pode ter um descontrole nas despesas primárias nos próximos anos, impactando severamente a sustentabilidade da dívida pública no longo prazo.

De acordo com os dados divulgados pela Receita Federal, a arrecadação federal com impostos chegou a R$ 165 bilhões somente em maio, uma alta de 4% em relação a maio de 2021. No acumulado, o valor arrecadado no ano de 2022 é de R$ 908 bilhões. A Receita informou que houve recolhimentos atípicos no montante de R$ 20 bilhões, ligados a empresas de commodities. Vale destacar ainda que esse desempenho é explicado pelos aumentos de 83,2% na arrecadação relativa à declaração de ajuste do IRPJ e da CSLL e ao acréscimo de 14,4 % na arrecadação da estimativa mensal. Trazendo a visão macroeconômica, percebe-se que todos esses valores recordes estão sendo impulsionados pela inflação, que apenas no ano de 2022 acumula alta de 5,49%.

Segundo os dados divulgados pelo Instituto Fiscal Independente, o resultado primário do governo central acumula superávit de R$ 39,2 bilhões no ano. Vale destacar que este valor é resultado de um forte aumento da arrecadação de tributos e de um controle da despesa primária. Todavia, os dados mais recentes sobre o mês de maio apontam um déficit primário do governo central de R$ 39,4 bilhões, R$ 18,4 bilhões maior que o déficit apurado no mesmo mês do ano passado.


Setor Externo – Atividade econômica fraca e pressão inflacionária elevam risco de recessão global.

O setor externo no último mês ficou marcado pela escalada no conflito no leste europeu, com commodities seguindo alta volatilidade e levando a conversações entre as partes sobre as exportações de cereais. Além disso, a continuidade da política de covid zero chinesa e o cenário inflacionário global também ganham destaque.

A persistência da guerra na Ucrânia levou a representantes dos países envolvidos no conflito a discutirem sobre as cargas de cereais paradas nos portos ucranianos, em busca de arrefecer as pressões sentidas sobre o preço de commodities. O conflito, no entanto, parece estar longe de ser solucionado, com intensificação dos ataques russos em cidades como Kiev sendo reportadas, além da ofensiva no leste do país.

A produção manufatureira na Zona do Euro continua a sofrer contra a escassez na cadeia de suprimentos, pressão inflacionária elevada e fraca demanda ao passo em que as incertezas só aumentam sobre o cenário econômico. O reflexo disso é visto no índice PMI da região, que registrou, para a manufatura, 52,1 pontos, levemente acima das expectativas (52). O índice composto registrou 52 pontos (51,9), à medida que o resultado do PMI voltado a serviços, de 53 (52,8), influenciou positivamente o resultado, apesar do setor ter performado o pior número desde janeiro, devido à fraca recuperação pós-restrições.

Em direção positiva, o desemprego para o mês de maio no bloco caiu a 6,6%, número superior às expectativas (6,8%) e comparado ao mês anterior (6,7%). O desemprego continua a decrescer, desde o início de 2021, seguindo as condições favoráveis com a diminuição de restrições. No entanto, na contravia, a pressão inflacionária continua a surpreender negativamente, atingindo um número recorde de 8,6% ao ano para o mês de junho – de acordo com as expectativas -, comparado a 8,1% em maio e 1,9% no mesmo período do ano interior. A continuidade da pressão exercida pelos itens de energia e comida, álcool e tabaco são os principais responsáveis pelo resultado, sendo o primeiro 41,9% maior comparado ao mesmo período do ano interior.

O sentimento negativo é refletido sobre o índice de sentimento econômico ZEW, o qual teve a leitura de -53,8 pontos para julho de 2022, inferior aos -28 relatados em junho, e registrando o pior número desde dezembro de 2011, ao passo em que o panorama econômico é esperado a piorar, com preocupações latentes sobre a crise energética europeia, um possível movimento hawkish do Banco Central Europeu – o qual começará seu ciclo de aumento de juros ainda em julho -, e novas restrições chinesas.


Fonte: Refinitiv. Elaboração Própria


Já nos Estados Unidos, o PMI composto foi revisado a 52,3 para junho, de um dado preliminar de 51,2, ainda sendo uma queda quando comparado a maio (53,6). A desaceleração no crescimento teve comportamento generalizado, com ambos serviços e manufatura vendo incrementos menores no final do segundo semestre.

O non-farm payroll, indicador que demonstra o aumento na força de trabalho contratada excluindo trabalhos agrícolas, demonstrou um crescimento de 372 mil empregos para o mês de junho, número muito melhor que o antecipado pelo mercado (268 mil), e levemente abaixo do resultado revisado para maio (384 mil). Os números vieram em linha com a média mensal de 383 mil nos últimos 3 meses, apontando ainda para um mercado de trabalho “apertado”.

Indo na contramão da positividade no mercado de trabalho, a inflação anual americana acelerou a 9,1% em junho de 2022 – a maior taxa desde novembro de 1981 -, acima das expectativas (8,8%) e ante maio (8,6%). O aumento de 1,3% mensal, o maior desde setembro de 2005, foi motivado principalmente pelo aumento na gasolina (11,2%), abrigo (0,6%) e alimentos (1%), sendo estes os maiores contribuidores. A piora no cenário inflacionário é uma das principais causas para a piora das expectativas do consumidor, medido pela Universidade de Michigan. O índice registrou leitura de 47,3 pontos, que, apesar de ser superior às expectativas preliminares de 47 pontos, é a menor leitura desde maio de 1980.

Simultaneamente, o PIB americano apresentou um decrescimento de 1,6% para o primeiro trimestre de 2022, ante expectativas de queda de 1,5% e crescimento de 6,9% no último trimestre de 2021. A continuidade da pressão inflacionária e piora no cenário econômico, com crescentes expectativas de recessão em um futuro próximo, pressionam ainda mais o Fed e suas decisões de política monetária. A reunião que está por vir tem como previsão uma alta de mesma magnitude anterior, de 75 bps, mas alguns agentes do mercado já precificam uma alta de 100 bps, ao passo em que esperam uma atitude mais hawkish da autoridade monetária americana.


Fonte: Refinitiv. Elaboração própria


Como reação, os títulos americanos com maturidade em 10 anos vêm sofrendo volatilidade em momentos próximos a leitura de resultados importantes. A recente queda, quando comparado ao início do mês de junho, demonstra a preocupação dos agentes de mercado com a possibilidade de recessão na economia americana.

Contribuindo para a piora das expectativas, a economia chinesa afundou 2,6% no segundo trimestre do ano, comparado às estimativas de queda de 1,5% e crescimento revisado de 1,4% no trimestre anterior. A contração é a primeira desde o primeiro trimestre de 2020, quando os casos de covid em Wuhan foram classificados como uma epidemia. O resultado vem de acordo com a política de lockdowns impostas pelo governo chinês, prejudicando a cadeia produtiva em escala global.

Em suma, o cenário macroeconômico global continua a se mostrar desafiador, com temores de recessão à medida em que a guerra no Leste Europeu continua a pressionar o preço de commodities e as paralisações e restrições chinesas impactam negativamente a cadeia produtiva global.

Como resultado, os principais bancos centrais mundiais são pressionados a tomar atitudes hawkish, aumentando a magnitude dos incrementos nos juros, ao passo em que tentam combater a pressão inflacionária persistente.

No âmbito nacional, a atividade econômica continua a apresentar crescimento, apesar dos problemas de sentidos pela indústria, relacionados aos obstáculos sentidos na cadeia de produção e de insumos. Já o cenário fiscal apresenta deterioração e aumento de incertezas, devido a aprovação da PEC dos auxílios, apesar da forte arrecadação de tributos, deteriorando a perspectiva fiscal de curto e médio prazo.



Autores: Luís Guilherme Uliana, Mateus Melo Galdino e William Pedroso.

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Carta de Conjuntura Macro – Maio

Carta de Conjuntura Macro – Maio

A melhora nos resultados domésticos relativos à atividade econômica, com destaque para o mercado de trabalho, e a piora do quadro inflacionário doméstico foram os principais destaques para o mercado doméstico durante o mês de maio, enquanto no âmbito internacional as incertezas continuam a gerar uma maior percepção de risco para o cenário prospectivo.

Os resultados referentes ao 1T22 para a economia doméstica vieram em linha com as expectativas, reiterando um cenário de melhora para a atividade econômica. Em paralelo, o cenário inflacionário permanece desafiador, apesar de uma leitura mais branda para o índice no mês de maio, os indicadores apontam para pressões disseminadas sobre os componentes.

No âmbito internacional, as decisões de política monetária foram destaque, ao passo em que as pressões sobre os níveis de preços continuam persistentes, com alguns fatores, como a manutenção do conflito no leste europeu, gerando impactos adicionais nas percepções de risco, fatores que têm dificultado o processo de ancoragem das expectativas pelo mercado.


Atividade econômica – Resultados recentes reiteram melhora no cenário econômico, com destaque para o mercado de trabalho

No início do mês de junho, o IBGE divulgou os resultados referentes ao Sistema de Contas Nacionais Trimestrais para o primeiro trimestre de 2022. As expectativas para a atividade econômica, frente ao ambiente observado no mês anterior, se mantiveram alinhadas com as expectativas, tendo em vista os recentes dados de alta frequência e indicadores de confiança, já reforçando uma tendência de melhoria. Os resultados para o primeiro trimestre do ano vieram em linha, com mercado de trabalho ainda aquecido e as projeções e expectativas para o cenário à frente mantidas, com expectativa de crescimento modesto para 2023.

O PIB (Produto Interno Bruto) registrou alta pelo terceiro trimestre consecutivo, com crescimento de 1,7% no trimestre, na comparação com o mesmo período do ano anterior. Pela ótica da oferta, o destaque foi para o Setor de Serviços, cujo qual obteve uma expressiva expansão de 3,7% no período, em contrapartida, para os demais setores que compõem o PIB pela ótica da produção, os resultados foram negativos, com os setores da Indústria e da Agropecuária recuando 1,5% e 8,0%, respectivamente. A forte queda para o segmento Agropecuário adveio, majoritariamente, dos impactos negativos das condições climáticas adversas sobre algumas culturas, sobretudo da soja.

Pela ótica da demanda, os destaques foram o consumo das famílias e os gastos do governo, com expansão de 2,2% e 3,3%, respectivamente. Em contrapartida, a formação bruta de capital fixo registrou forte recuo de 7,2% na comparação anual, sendo esta a primeira queda após cinco trimestres consecutivos de crescimento. Por fim, no setor externo, as exportações de bens e serviços cresceram 8,1% enquanto as importações de bens e serviços recuaram 11,0%.

Na comparação com o trimestre imediatamente anterior, o 1T22 avançou 1,0% na série com ajuste sazonal, com destaque novamente para o setor de Serviços, que obteve alta de 1,0%, fortemente beneficiado com a retomada das atividades, mediante a melhora do ambiente pandêmico. Adicionalmente, a indústria manteve-se estável, com crescimento tímido de 0,1% no período, enquanto o setor Agropecuário, por sua vez, incorporando os impactos negativos das condições climáticas, retraiu em 0,9%.

Os resultados demonstram uma Indústria ainda com dificuldades, ainda não recuperada dos descasamentos provocados pela pandemia e dos elevados gargalos produtivos. O elevado preço das matérias primas e a falta de insumos permanecem como gargalos para o setor, fatores estes que, somados a uma maior demanda por serviços, têm dificultado a recuperação do setor. Para o setor de serviços, os segmentos de Transportes e Serviços prestados à família obtiveram altas significativas, refletindo a melhora do quadro econômico e pandêmico.

Tabela Descrição gerada automaticamente

Fonte: IBGE. Elaboração: Clube de Finanças

Após os resultados positivos de março, os dados divulgados pelo IBGE, na PNAD, demonstraram que o mercado de trabalho continua aquecido, registrando forte geração de empregos e expansão da massa salarial. Como destaque, ressalta-se a queda observada na taxa de desemprego, que atingiu 10,5% da força de trabalho no trimestre encerrado em abril, valor bem abaixo do observado no mesmo período do ano anterior, de 14,8%. Este resultado situa-se ainda, em patamares inferiores aos meses pré-pandêmicos.

Adicionalmente, os números do Banco Central, considerando sua metodologia própria, também apresentam resultados positivos para o mercado de trabalho, com a taxa de desemprego mensal em 9,6%, ao mesmo tempo em que a taxa de participação e a população ocupada vêm crescendo.

A melhora observada na taxa de desemprego se deve ao aumento no número de contratações, com crescimento da população ocupada, cujo contingente atingiu 96,5 milhões, uma expansão de 10,3% na comparação anual, superando o avanço na força de trabalho de 5,1% – que contempla a população que está à procura de emprego e a população ocupada. É esperado um quadro contínuo de melhoria para o mercado de trabalho ainda durante o primeiro semestre, quadro este que deve pouco a pouco perder dinamismo a partir da segunda metade do ano, onde é esperado uma redução da atividade, com a absorção pelo mercado dos impactos defasados da política monetária.

As projeções e expectativas de crescimento para 2023 se mantém em linhas com as leituras anteriores, com um avanço modesto da atividade próximo a 0,5%, tendo em vista o atual cenário de desaceleração econômica mundial e o impacto defasado da alta dos juros, que deve surtir maior efeito sobre a atividade a partir do segundo semestre de 2022. Em paralelo, apesar do crescimento tímido com um balanço de riscos negativo, outros fatores podem trazer melhorias ao atual cenário, como o impacto positivo das políticas monetárias contracionista, reduzindo a pressão sobre os índices de preços, e a recuperação do mercado de trabalho, que conjuntamente devem exercer impacto positivo sobre a demanda agregada. Adicionalmente, a melhora do ambiente fiscal vislumbrada nos últimos meses garante maior fôlego para o setor público, que pode recorrer a novos estímulos fiscais e, desta forma, gerar novos estímulos à demanda agregada da economia.


Inflação e Política Monetária – Cenário inflacionário se deteriora, com pressões sobre os níveis de preços disseminadas, e ciclo de alta permanece, mas em novo ritmo

A inflação ao consumidor, medida pelo IPCA, avançou 0,47% no mês de maio, valor abaixo das expectativas do mercado e das leituras anteriores. No acumulado dos últimos doze meses, o IPCA acumula alta de 11,73%, redução de 0,28 p.p. na comparação com o acumulado observado nos 12 meses imediatamente anteriores à maio. O resultado apresentou forte retração na comparação com o índice de preços de abril, de 1,06%, no entanto, o bom resultado não trouxe melhorias efetivas para o cenário inflacionário, já que a desaceleração foi puxada, sobretudo, por leituras mais baixas em segmentos voláteis, como alimentação e preços administrados. O elevado índice de difusão (72,4%), que segue nos níveis mais altos observados desde 2002-2003, e o avanço da média dos núcleos, que vem registrando as maiores leituras desde o início da pandemia, tem demonstrado que as pressões inflacionárias têm ganhado maior disseminação.

Nesta nova leitura, oito grupos dos nove pesquisados obtiveram alta. O maior impacto no índice cheio foi do grupo de Transportes, com alta mensal para o mês de maio de 1,34%, impactando em 0,30 p.p. o índice cheio. Apesar do avanço, a alta nos preços dos combustíveis foi menor do que o observado em leituras anteriores, com o fim dos repasses para o consumidor das altas nos preços das refinarias ocorridas em março. O grupo Habitação foi o único a registrar queda nos níveis de preços, com variação negativa de -1,70% no mês, refletindo a melhora dos preços da energia elétrica.

A redução do IPCA para o mês de maio foi puxada, sobretudo, pela queda nos preços administrados, cujos quais respondem por aproximadamente 25% do IPCA total. A variação conjunta dos preços administrados em maio foi de -0,51%, forte recuo na comparação com abril, onde o grupo obteve alta mensal de 0,55%. Para os preços livres, o mês de maio registrou alta de 0,83%, valor que representa uma desaceleração frente a abril (1,25%).

O grau de incerteza acerca do cenário à frente segue elevado. Além do atual cenário inflacionário de curto prazo, a expansão da atividade e os bons resultados para o mercado de trabalho têm acrescido o risco de pressões inflacionárias persistentes advindas pelo lado da demanda. A maior pressão em maio dentre os preços livres foi do setor de serviços, com variação de 0,85% no mês, resultado que já demonstra uma maior pressão inflacionária ocasionada pelo crescimento da demanda, com a melhora da atividade e dos indicadores de confiança. Adicionalmente, a persistência do conflito no Leste Europeu mantém para o atual cenário um risco altista sobre os níveis de preços, com um eventual embargo europeu ao petróleo russo impactando sobre os preços dos combustíveis praticados pela Petrobras.

Por outro lado, outros fatores corroboram para o aumento do grau de incerteza, mas gerando perspectivas de impactos baixistas sobre os níveis de preço. Ao longo do mês de maio, a inflação voltou a entrar na pauta do Congresso e do governo, visando introduzir medidas que mitiguem a alta nos preços. Diversas propostas foram levantadas visando impactar os preços dos combustíveis, energia elétrica e serviços de telecomunicações, como o PLP 18/22, limitando as alíquotas de ICMS, e a PEC 16, que propõe financiar por meio de repasses da União o corte por 6 meses do ICMS sobre o GLP, diesel e etanol.

No âmbito da Política Monetária, dentro do esperado pelo mercado e em congruência com o precificado na curva de juros, o Copom elevou a taxa Selic em 50 bps na reunião de junho. Segundo o comunicado, o fim do ciclo permanece em aberto, com continuidade do ajuste para a reunião de agosto de igual ou menor magnitude à de junho.

Neste novo comunicado, o comitê trouxe uma comunicação mais dovish, informando nova redução do ritmo de ajuste, mesmo admitindo uma piora conjuntural, com aumento das incertezas desde a última reunião. O Copom trouxe sinalizações de que a convergência para a meta não ocorrerá em 2023, uma vez que seria necessário um aperto monetário mais incisivo.

Na Ata, o comitê trouxe sinalizações que indicam para um fim de ciclo, reiterando as dificuldades para trazer a inflação junto à meta para 2023 e as defasagens da política monetária, não sendo possível observar, até então, grande parte dos impactos das políticas contracionistas sobre a atividade e, consequentemente, sobre os níveis de preços.

O anúncio das medidas propostas pelo governo refletiu sobre a curva de juros, já sendo precificados pelo mercado, com ganho de inclinação na curva a partir de prazos superiores a três anos. Conjuntamente, a ponta longa da curva deslocou-se para cima, adquirindo também maior inclinação, incorporando consigo uma maior percepção de risco fiscal pelos agentes.

Fonte: Anbima. Elaboração: Clube de Finanças


Política Fiscal – Dados reiteram cenário positivo, com destaque para a arrecadação, mas risco de novas medidas fiscais trazem incerteza ao atual cenário

No âmbito fiscal, as perspectivas para o cenário presente continuam positivas, com melhora nas projeções de resultado, em contraponto, o cenário adquire certo grau de incerteza, com a tramitação de eventuais novas medidas fiscais por parte do governo para controle inflacionário.

Como já mencionado nos meses anteriores, o cenário fiscal permanece positivo no que tange às arrecadações do governo. Os fatores que contribuíram para o bom resultado primário em 2021 permanecem, como a inflação elevada, a alta nos preços do petróleo e a depreciação no câmbio. Adicionalmente, outros fatores, como a melhora na atividade econômica em 2022, têm corroborado para o cenário prospectivo atual.

Segundo dados do Instituto Fiscal Independente, a Receita Primária do governo central deve ter crescido 10,8%, em termos reais, no acumulado dos primeiros cinco meses de 2022, enquanto o governo central deve ter obtido um superávit primário de R$ 38,9 bilhões para o mesmo período, valor que supera em R$ 19,0 bilhões o resultado obtido nos primeiros cinco meses de 2021.

Apesar dos resultados positivos vislumbrados até então, a possibilidade de inserção de novas medidas visando conter a pressão nos níveis de preços tem trazido maior incerteza para o cenário fiscal atual, com uma leve piora nas perspectivas de curto e médio prazo.


Setor Externo – Inflação persistente e acima do esperado alerta as principais autoridades monetárias, ao passo em que a continuação da guerra na Ucrânia e lockdowns na China levam a piora no balanço de riscos

O último mês ficou marcado pelo aperto monetário por parte dos principais bancos centrais ao redor do globo, ao passo em que temores de uma recessão e piora no balanço de riscos exigiram uma atitude mais assertiva das autoridades monetárias.

No leste europeu, o conflito entre Ucrânia e Rússia continua a se prolongar, sem demonstrar um sinal de interrupção. A continuidade da guerra ainda pressiona o preço de commodities, principalmente milho, trigo, petróleo e gás natural, dado o cenário desfavorável e as sanções impostas pelos principais países ocidentais ao Kremlin.

Na China, cidades como Pequim e Shanghai passaram por um processo de reabertura recentemente, mas lockdowns em escalas menores continuam a ser implementados pelo governo chinês. A política de zero tolerância ao COVID na China se mostra persistente, de forma que esta reflete negativamente sobre o crescimento potencial  da economia do país asiático para 2022 e sobre as cadeias produtivas globais, resultando em mais gargalos e interrupções na produção.

Na Zona do Euro, a leitura para a inflação no mês de maio veio de acordo com as expectativas, em 0,8%, ante 0,6% em abril. As maiores altas registradas vieram do custo de energia (1,9%) e comida, álcool e tabaco (1,3%). O índice anualizado apresenta alta de 8,1%, muito acima da meta de 2% do ECB (European Central Bank), o que levou ao comunicado do banco central de que começará a elevar os juros a partir do mês de julho.

Já o PMI composto (54,8) na região veio abaixo das estimativas (54,9) e apresentou redução ante abril (55,8). A desaceleração se deu exclusivamente como um resultado de uma expansão menor do setor de serviços em meio a sinais que demonstram enfraquecimento da recuperação pós-lockdown. O desemprego, de outra forma, continuou estável a 6,8% para o mês de abril de 2022, significando uma queda de 96 mil de desempregados e uma  taxa de desemprego de jovens caindo de 14% a 13,9%.

Os títulos públicos com prazo em 10 anos da Zona do Euro responderam com um aumento na taxa contratada, ao passo em que o mercado já precifica um aumento da taxa de juros básica do bloco em julho, conforme o comunicado do BCE.

Gráfico, Histograma Descrição gerada automaticamente

Fonte: BCE. Elaboração: Clube de Finanças

Nos EUA, a leitura mais recente do payroll mostrou criação de 390 mil empregos no país – acima das expectativas de 325 mil -, sendo este o menor valor nos últimos 12 meses, mas, ainda sim, superior à média dos 12 meses anteriores à pandemia (198 mil).

A inflação, medida pelo CPI, atingiu o pico de 8,6% ao ano no mês de maio – maior nível desde dezembro de 1981 -, bem acima das expectativas de 8,3%. A inflação acelerou 1% para o mês, acima das expectativas de 0,7%, em meio a um aumento geral de custos, com os índices de abrigo (0,6%), gasolina (4,1%) e comida (1,2%) exercendo a maior contribuição para o resultado.

O número não foi bem-visto pelo mercado, e nem pelo comitê de política monetária americana, o FOMC. Jerome Powell, chairman do comitê, dava como certo um aumento de 50 bps na reunião de junho. No entanto, a alta inesperada da inflação e a reação negativa dos agentes, aliado à preocupação de uma futura recessão econômica requereu uma alta de maior magnitude, com o Fed optando, de forma quase unânime, por uma alta de 75 bps na taxa de juros americana. Dessa forma, a taxa básica de juros americana está estabelecida na faixa entre 1,5% e 1,75% ao ano – a mais elevada desde março de 2020.

O PMI composto para o mês de maio (53,6), de forma similar à Zona do Euro, apresentou uma queda ante o resultado do mês de abril (56), refletindo o aumento de preços e a disrupção da cadeia de suprimentos.

Já os títulos com maturação em 10 anos americanos continuam em movimento de alta, com um pico recente, devido a maior magnitude do aumento feito pelo Fed, enquanto a autoridade monetária procura controlar a pressão inflacionária no país.

Gráfico, Gráfico de linhas Descrição gerada automaticamente

Fonte: Refinitiv. Elaboração: Clube de Finanças

Já na China, a inflação continuou inalterada, a 2,1% ao ano, inferior às expectativas de 2,2%. Os alimentos apresentaram o maior aumento no índice pelo segundo mês seguido – 2,3% em maio e 1,9% em abril -, ao passo em que o consumo voltou a ganhar força com a redução de restrições em Shanghai e Pequim.

De forma parecida, o PMI de manufatura chinesa apresentou melhora ante o mês anterior, de 46 para 48 pontos, dado o afrouxamento da política de lockdowns. No entanto, o setor de serviços continua sendo prejudicado pela política, de forma que o PMI composto para o mês de maio registrou 42,2.

Em suma, o cenário macroeconômico global ainda se mostra desafiador, com a persistência do conflito no Leste Europeu continuando a pressionar o preço de commodities e a política de lockdowns na China impactando negativamente a cadeia produtiva em escala global.

Ainda no cenário internacional, os apertos monetários mais incisivo pelos principais bancos centrais, com aumentos de maior magnitude nos juros, visam convergir a inflação para patamares próximos à meta até 2023 e 2024.

Já em âmbito nacional, a atividade econômica apresentou crescimento pelo terceiro trimestre consecutivo, puxado principalmente pelo bom desempenho do setor de serviços, ao passo em que a indústria ainda sofre com problemas nas cadeias de produção e de insumos. O cenário fiscal se mantém com perspectivas positivas, apesar das novas medidas discutidas na Câmara e no Senado, que ao buscar conter a pressão nos níveis de preços, trazem maior incerteza ao cenário prospectivo de curto e médio prazo.

Autores: Mateus Melo Galdino, Luís Guilherme Uliana e William Pedroso
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Carta de Conjuntura Macro – Abril

Carta de Conjuntura Macro – Abril

A melhora nos resultados domésticos relativos à atividade econômica, a persistência inflacionária e o aumento das incertezas globais, com a continuidade da guerra na Ucrânia, foram os principais destaques para o mês de abril.

A manutenção do conflito no leste europeu tem aumentado as incertezas quanto aos impactos sobre a atividade no continente europeu. Em paralelo, o cenário de inflação na Europa, mais brando que nos Estados Unidos, sugere um aumento de juros mais gradual pelo Banco Central Europeu (BCE) do que pelo FED, que por sua vez, tem encontrado um ambiente conjuntural mais desafiador. Neste cenário, há o risco de que seja necessário aumentar a taxa de juros acima do que está precificado pelo mercado neste momento, que é uma taxa de juros do FED funds de 3,3% para meados de 2023.

Adicionalmente, o risco de uma forte desaceleração na China, com as fortes restrições adotadas pelo governo, acentua o quadro de incertezas no âmbito internacional. Em contraste, dados domésticos surpreenderam positivamente, com o mercado de trabalho aquecido e uma melhora marginal nos níveis de confiança, resultando em revisões altistas para o PIB em 2022.


Atividade econômica – Melhora nos indicadores e mercado de trabalho aquecido reforçam melhora da atividade econômica para 2022

Apesar do aperto monetário, os dados relativos à atividade econômica vêm apresentando melhora, mediante a expansão do mercado de trabalho, ao impacto positivo dos estímulos fiscais e a melhoria do quadro pandêmico, com redução mais acentuada das medidas restritivas. Dados de alta frequência e indicadores recentes de confiança reforçam a tendência de melhoria, a confiança do consumidor para o mês de abril teve alta expressiva, principalmente para os consumidores de mais baixa renda, adicionalmente, o setor industrial e de serviços também apresentaram aumentos significativos nos índices de confiança.

O mercado de trabalho continua apresentando números positivos, com crescimento do número de empregos e da massa salarial real, demonstrando melhora e sugerindo um mercado de trabalho aquecido. Os dados do CAGED apresentaram forte geração de empregos no setor formal, fechando o primeiro trimestre com 615 mil empregos gerados. Adicionalmente, o resultado da PNAD também reforçou esta tendência positiva, com aumento de aproximadamente 1,6 milhão de trabalhadores no mês de março.

As projeções para a atividade econômica obtiveram leve melhora para o ano de 2022, com projeção de avanço do PIB de 1,0%, segundo o Instituto Fiscal Independente. Resultado este que reflete a resiliência da atividade econômica no curto prazo e os estímulos fiscais adotados pelo governo. As melhoras nas expectativas e nas projeções do mercado advém da surpresa obtida com o resultado positivo do último trimestre de 2021 e a melhora dos indicadores econômicos durante o início do ano de 2022.

Adicionalmente, é esperado um forte incentivo sobre a atividade doméstica com o ingresso dos recursos dos saques do FGTS na massa de rendimentos, a liberação de cerca de R$ 30 bilhões entre abril e junho deve surtir efeitos positivos sobre a demanda agregada e estimular a atividade no curto prazo.

Entretanto, mesmo com alguns indicadores apresentando melhorias, o cenário ainda permanece desafiador, as perspectivas econômicas carregam certo grau de volatilidade e incerteza acima do usual, mediante o prolongamento do conflito militar no leste europeu e o cenário inflacionário, cujo qual tem gerado um aperto monetário nas economias.

No âmbito internacional, o FMI reduziu a expectativa de crescimento do PIB mundial para 2022 e 2023, de 4,4% para 3,6% e de 3,8% para 3,6%, respectivamente, culminando em reduções de 0,8 e 0,2 p.p. na comparação com as projeções de janeiro. As revisões baixistas sobre a atividade econômica global advêm, em grande medida, pelos impactos diretos da guerra nas economias da Rússia e da Ucrânia e pelos efeitos indiretos nas demais economias, sobretudo, do bloco Europeu.

Fonte: FMI. Elaboração: Clube de Finanças

WEO: World Economic Outlook


Inflação e Política Monetária – Revisões altistas para inflação em 2022 e continuidade do aperto monetário

A inflação ao consumidor em abril, medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), registrou alta mensal de 1,06%, o maior resultado registrado para o mês desde 1996. No acumulado dos últimos doze meses, a inflação registra alta de 12,1%, acima dos 11,3% observados nos doze meses imediatamente anteriores.

A pressão sob os níveis de preços segue disseminadas entre os componentes, com oito dos nove grupos de produtos e serviços observados apresentando alta no mês de abril. Os maiores impactos sobre os índices de preços vieram dos alimentos e dos combustíveis, sendo o grupo de alimentação e bebidas responsável pela maior variação no mês e maior impacto no índice cheio (alta de 2,06% e 0,43 p.p. de impacto). Adicionalmente, o grupo transportes obteve a segunda maior alta, sendo fortemente impactado pelo aumento dos preços dos combustíveis. Conjuntamente, os dois grupos contribuíram com aproximadamente 80% da taxa de variação do IPCA em abril.

No cenário base, as projeções apontam para uma alta no IPCA próxima a 8,0% em 2022, refletindo os persistentes choques nas cadeias de suprimentos globais, intensificados pelo prolongamento do conflito militar no leste europeu e pelas medidas restritivas adotadas na China para conter o avanço das novas ondas da Covid-19.

Apesar de algumas medidas contribuírem para reduzir os impactos inflacionários no curto prazo, como a redução das alíquotas do IPI, o atual cenário de forte pressão sobre os níveis de preços tende a permanecer, prevalecendo riscos altistas. Neste cenário, de inflação corrente em nível elevado, é esperado uma inércia inflacionária ainda maior para o ano de 2023.

Neste cenário e em linha com as expectativas do mercado, o COPOM decidiu aumentar em 1 p.p. a taxa básica de juros, para 12,75%. O Comitê sinalizou ainda, para mais uma alta na próxima reunião, contudo, de menor magnitude, caso os cenários projetados pelo BACEN se confirmem.

A ata do COPOM manteve os principais pontos elencados na comunicação anterior, sem novidades significativas, adicionando, no entanto, uma abordagem mais cautelosa mediante a deterioração da dinâmica inflacionária e o impacto desta sobre as projeções de longo prazo, fato este que vem ocorrendo de forma bem mais intensa do que o esperado inicialmente, e que contribui para que o comitê deixe em aberto a decisão para a próxima reunião.

Ao que sinaliza a ata do COPOM, bem como as expectativas do mercado, é esperado que haja apenas mais uma alta, com o fim do ciclo de aperto em junho. No parágrafo 13, o Comitê destaca que “o ciclo de aperto monetário corrente foi bastante intenso e tempestivo” e, mediante as defasagens dos efeitos da política monetária sobre a atividade, os efeitos contracionistas ainda não surtiram total efeito sobre a economia.


Política Fiscal – Resultados fiscais continuam surpreendendo positivamente e mantém expectativa de novo superávit

Em linha com o mês anterior, os resultados fiscais vêm apresentando melhorias, com o PIB nominal e inflação mais elevados traduzindo em expectativas maiores de arrecadação, adicionalmente, a persistência do conflito no leste europeu e a consequente manutenção dos preços de commodities em patamares elevados, sinalizam para um crescimento adicional nas receitas do governo.

Apesar das medidas de incentivo fiscal, como a redução no IPI, que deve retrair em cerca de R$ 5 bilhões a arrecadação no ano, e o aumento de gastos, as projeções apontam para um novo superávit em 2022. Em paralelo, as expectativas para os anos seguintes são de resultados primários próximos a zero, culminando em uma dívida bruta e líquida ainda crescente ao longo dos próximos anos.

Apesar da melhora nos resultados fiscais, as percepções de risco ainda se mantém de certa forma inalteradas, os bons resultados fiscais obtidos ainda não se transformaram em uma redução dos prêmios da curva de juros, tendo em vista a persistência nas percepções de risco, com a mudança no teto de gastos e a não descartável possibilidade de novas alterações na lei que regula este instrumento para os próximos anos. O teto de gastos é uma importante âncora fiscal para o país, responsável por ancorar as expectativas de inflação.

Fonte: Anbima. Elaboração: Clube de Finanças


Setor Externo – Continuidade do confronto na Ucrânia e surto de COVID-19 na China aumentam os riscos no curto prazo

O mês de abril ficou marcado pelo aperto na política monetária americana, incertezas com relação à atividade econômica chinesa, ao passo em que a política de covid zero continua em andamento, e a escalada do confronto no leste europeu entre Rússia e Ucrânia.

O confronto no leste europeu se mostra persistente, com ambas as partes não chegando a um acordo para encerrar o conflito entre os países. Como resultado, Finlândia e Suécia, países próximos ao kremlin, optaram por ir contrário ao seu costume de neutralidade, e abriram processo para aderir à OTAN, movimento mal-visto pelo governo russo, que teme uma expansão da infraestrutura militar.

A manutenção do conflito continua a provocar um choque negativo persistente sobre as commodities, principalmente sobre as energéticas e as agrícolas, como o trigo e o milho, que continuam em tendência altista após um breve período de estabilização a níveis de preços altos.

Fonte: Yahoo Finance. Elaboração: Clube de Finanças

Na Zona do Euro, a produção industrial para o mês de março retraiu em 0,8%, número melhor que o esperado (-1%) e inferior ao crescimento apresentado em fevereiro (1,7%). O índice foi afetado principalmente pelas quedas de 4% em produção energética e 2,7% de bens de capital. As altas de 2,8% de bens de consumo não-duráveis e 6,6% de bens de consumo não foram suficientes para deixar o índice em patamar positivo.

Já a inflação no bloco continua no seu maior patamar para o mês de abril, estabelecida em 7,4% anualizados. As maiores contribuições para a inflação anualizada da Zona do Euro vêm de energia – responsável por 3,7 p.p. do índice -, seguido por serviços (1,38 p.p.), alimentos, álcool e tabaco (1,35 p.p.) e bens industriais não-energéticos (1,02 p.p.). A taxa de inflação está muito acima da meta de 2%, estabelecida pelo ECB, e não deve voltar a patamares reduzidos tão cedo. A crise energética, exacerbada pela invasão russa à Ucrânia, e os persistentes gargalos na cadeia de suprimentos ao redor do globo continuam pressionando a inflação global, deteriorando o balanço de riscos e exigindo medidas mais assertivas por parte dos principais bancos centrais.

Demonstrando o “pessimismo” no bloco, o índice de confiança do consumidor na Zona do Euro registrou -22 pontos no mês de abril, a pior marca desde abril de 2020. O índice no mês de março já havia chegado a -21,6 – a piora no indicador demonstra a reação do consumidor à continuidade do conflito no leste europeu, que afeta o abastecimento de diversas commodities e provoca uma elevação generalizada de preços.

Por fim, o PMI composto no bloco atingiu a marca de 55,8 no mês de abril, ante 54,9 do mês de março e de acordo com as expectativas do mercado. A leitura do índice apontou para o maior crescimento na atividade do setor privado nos últimos sete meses, ao passo em que o setor de serviços (55,7) se recupera com menores restrições atreladas a COVID-19, ajudando a ofuscar a diminuição em manufatura (55,5), a menor nos últimos 15 meses. O desemprego no bloco decresceu para 6,8% para o mês de março, levemente acima das expectativas de 6,7%. As principais quedas registradas foram na Alemanha (2,9% ante 3%) e Itália (8,3% ante 8,5%), enquanto a França firmou-se em 7,4%.

Nos EUA, o Fed decidiu por aumentar a taxa de juros básica em 50 bps, o maior aumento em mais de duas décadas. A elevação, apesar de esperada, demonstra que o Federal Reserve está disposto a aumentar o ritmo nos incrementos de alta de juros, botando na mesa um debate para um próximo aumento na casa de 75 bps – no momento, grande maioria do comitê é contrária a um aumento de tamanha magnitude. Vale ressaltar, no entanto, que o comitê também era em sua grande parte contrário a um aumento na casa de 50 bps, mas as condições adversas no balanço de riscos fizeram com que o Fed adotasse tal medida.

A inflação no país registrou 0,3% para o mês de abril – 8,3% anualizados ante 8,5% em março. O número veio acima das expectativas de 8,1% ao ano. Apesar da queda de 6,1% no preço da gasolina, o aumento em gás natural (3,1%) e eletricidade (0,7%), aliados ao aumento em alimentos (0,9%) e abrigo (0,5%) foram os principais contribuintes para o resultado.

Já a taxa de desemprego continuou estável em 3,6% para o mês de abril, a menor taxa desde fevereiro de 2020, e levemente acima das expectativas de 3,5%. O PMI composto para abril foi revisado a 56 pontos, ante 57,7 registrados em março. A expansão na manufatura (59,2 ante 58,8) foi contrabalanceada por um crescimento menor de serviços (55,6 ante 58). Ainda, apesar de as empresas terem reportado um crescimento de empregos, a falta de trabalhadores persiste e, como resultado, atrasos de trabalho cresceram a um ritmo acentuado.

A economia americana contraiu 1,4% – em fatores anuais – no primeiro trimestre de 2022, bem abaixo das expectativas do mercado de expansão de 1,1%, seguindo um crescimento de 6,9% no quarto trimestre de 2021. Enquanto as exportações caíram 5,9%, as importações aumentaram em 17,7%, ao passo em que o investimento privado doméstico decaiu significativamente (2,3% ante 36,7%). Além disso, os gastos do governo também registram queda ante o período anterior (-2,7% ante -2,6%), e, na contramão, o consumo (2,7%) e investimento fixo (7,3%) contribuíram positivamente ao PIB.

Por fim, a confiança do consumidor, mensurada pela Universidade de Michigan, registrou o menor patamar desde agosto de 2011, caindo a 59,1 em maio, ante 65,2 em abril, e inferior às expectativas (64). A pressão inflacionária continua a pesar negativamente para o consumidor, restringindo o consumo de bens duráveis, que caíram ao menor nível registrado desde 1978.

Por fim, a China enfrenta um surto de COVID-19 em diversas províncias, com cidades – como Shanghai – em protocolo de lockdown. Este fator tem impacto em magnitude global, visto que o método de combate ao vírus compromete a cadeia de suprimentos, causando atrasos e aumento nos preços de bens ao redor do globo, além de prejudicar a atividade econômica chinesa e consequentemente mundial, e já pode ser observado no registro do PMI de abril, que desabou para 36,2, ante 42 em março, indicando uma retração.

O país, no entanto, apresentou um crescimento ajustado de 1,3% em seu PIB para o primeiro trimestre do ano, ultrapassando as estimativas do mercado de 0,6%, muito motivado pelos estímulos fornecidos pelo governo chinês, que busca reduzir o impacto causado pela sua política de Covid Zero.


Mercado financeiro – Ibovespa fechou no negativo pela primeira vez no mês de abril em 2022 e Criptomoedas seguem em forte desvalorização

O índice Ibovespa fechou o mês de abril com uma desvalorização de aproximadamente 10%, o primeiro mês negativo do ano de 2022. Entre os motivos que explicam a queda, os lockdowns realizados na China provocaram temores de uma possível redução na demanda global por commodities, impactando as ações ligadas a esse setor no Brasil, que possui o maior peso na composição da bolsa brasileira. Adicionalmente, o aperto monetário provocado pelo FED, com a alta dos juros nos Estados Unidos, aumentou a aversão ao risco dos investidores, ocasionando uma retirada de investimentos dos mercados emergentes, como é o caso do Brasil. De acordo com a B3, os investidores internacionais retiraram R$ 7,67 bilhões no mês de abril da Bolsa.

Em linha, o Bitcoin também tem apresentado forte desvalorização, consolidando uma perda de quase 60% desde o ATH (all time high) em novembro de 2021, quando chegou próximo da marca de U$ 68 mil. A segunda maior criptomoeda em valor de mercado, Ethereum, também apresenta uma queda de, aproximadamente, 60% desde novembro de 2021. Entre os fatores que explicam este cenário, o principal deles é o aumento da taxa de juros americana em 50 bps, número já esperado pelo mercado, mas ainda assim, suficiente para muitos agentes migrarem seus investimentos para ativos menos arriscados.


Síntese mensal

A continuidade do conflito no Leste Europeu continua a afetar negativamente o balanço de riscos em nível global. Novas revisões nas projeções apontam para um menor crescimento para as principais economias mundiais, além de uma pressão inflacionária persistente, sinalizando que o atual cenário, de aperto monetário pelos principais bancos centrais, deverá ser mantido para os próximos períodos, através de altas de maior magnitude nas taxas de juros e encerramento de programas de compra de ativos.

No cenário nacional, os dados positivos apontam para uma melhora do ambiente econômico, com crescimento da atividade e indicadores sinalizando para um mercado de trabalho aquecido. No entanto, o atual cenário, de atividade aquecida para o curto prazo, contrasta com as projeções de desaceleração para o segundo semestre de 2022, com a pressão inflacionária e a alta taxa de juros pesando negativamente sobre as projeções, tendo em vista os impactos negativos dos efeitos da política monetária contracionista sobre a atividade, surtindo maiores impactos sobre a demanda a partir dos próximos meses.

Em síntese, o cenário é de maior cautela e de piora nas percepções de risco, com uma maior clareza dos impactos causados pelo conflito no leste europeu sobre a atividade econômica, sobretudo, das economias europeias, reduzindo as projeções de crescimento global para 2022 e 2023. Neste cenário, onde não há previsão de alívio para o quadro inflacionário no curto prazo, é esperado uma continuidade do aperto monetário por parte das principais autoridades monetárias, desestimulando ainda mais a atividade econômica, mas objetivando conter a escalada dos níveis de preços.


Autores: Luís Guilherme Uliana, Mateus Melo e Wiliam Midon Pedroso.

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Carta de Conjutura Macro – Março

Carta de Conjutura Macro – Março

Introdução

O mês de março foi marcado, principalmente, pelas consequências inflacionárias causadas pelo conflito entre Rússia e Ucrânia, com destaque para as commodities energéticas. Concomitantemente, as economias continuam apresentando dificuldades em lidar com as pressões sobre os índices de preço advindas do descompasso das cadeias produtivas mundiais, fortemente impactadas pela pandemia.

No Brasil, dados econômicos apontam um baixo crescimento esperado para os próximos trimestres, com o Governo Federal adotando algumas medidas que visam estimular a atividade econômica do país.


Atividade econômica – Dados setoriais reforçam cenário de baixo crescimento, enquanto mercado de trabalho apresenta melhora na geração de empregos

Dados recentes da atividade econômica reforçam cenário de baixo crescimento para a economia no primeiro trimestre de 2022, com os principais indicadores econômicos de fevereiro e março sinalizando leve melhora na comparação com os dados relativos ao mês de janeiro.

O índice IBC-Br, que mede a atividade econômica mensal e serve como uma prévia do PIB, apresentou queda de 1% para o mês de janeiro deste ano. Apesar do início negativo, medidas recentes podem apresentar uma melhora no cenário econômico. Recentemente, o governo reduziu impostos sobre produtos industrializados (IPI), ampliou linhas de crédito consignado e liberou o saque extraordinário, de até mil reais por trabalhador, do FGTS.

As medidas de estímulo fiscal adotadas pelo governo federal durante o mês de março têm gerado estímulos à atividade econômica e devem continuar surtindo efeito sobre a economia nos próximos meses. Ao todo, estas medidas somam mais de R$ 100 bilhões, o que representa mais de 1% do PIB. Adicionalmente, com a melhora do ambiente pandêmico, e a consequente redução das medidas de isolamento, dados de alta frequência e da confiança dos agentes econômicos para o mês de março reiteram para uma leve recuperação da atividade.

A indústria continua a sofrer com gargalos na cadeia de suprimentos e preços de matérias primas inflacionados, refletindo na queda acumulada de 5,8% a.a na produção industrial para o primeiro trimestre de 2022, sendo os bens duráveis os mais afetados. Já os serviços mostram resiliência ao se manterem estáveis no início do ano, com destaque para o setor de transportes. Para os próximos meses, é esperado pelo mercado que o setor de serviços apresente viés altista, sobretudo com serviços prestados às famílias e transporte aéreo se beneficiando do forte arrefecimento da pandemia.

Para 2022 e 2023, as projeções são de leve crescimento para a economia. As medidas fiscais, a redução do superávit dos estados e municípios pelo aumento das despesas e o arrefecimento da pandemia devem fornecer estímulos à demanda agregada e impulsionar a atividade econômica.

Dados do CAGED apresentaram forte avanço no mês de fevereiro, com geração de 328 mil empregos no setor formal, com projeções do mercado para geração de 220 mil empregos. Já no setor informal, a PNAD estima a geração de, aproximadamente, 1,1 milhão de empregos. A taxa de desemprego, portanto, é de 11,2%, 0,6 p.p. inferior ao desemprego apresentado em fevereiro de 2020, período pré-pandemia. A tendência é que o desemprego continue a diminuir nos próximos meses, mas, para o segundo semestre do ano, os efeitos defasados do aumento na taxa de juros devem ser melhor incorporados, causando uma desaceleração na geração de empregos.


Inflação e Política Monetária – Cenário inflacionário segue desafiador, com novas leituras acima das expectativas

Ao longo do mês de março, os indicadores de inflação vieram novamente acima das expectativas e continuam indicando uma composição desfavorável, com os núcleos de inflação se mantendo em níveis elevados e as pressões inflacionárias ainda disseminadas.

O IPCA, principal indicador da inflação, teve alta de 1,62% no mês de março – superior aos 1,33% esperados e 0,61 p.p maior ante fevereiro. Essa é a maior variação para o índice em um mês de março desde 1994. As commodities energéticas continuam impactando o índice, sendo que o maior destaque para a alta foi do segmento de transportes, que variou 3,02% e foi responsável por 0,65 p.p. do índice. Em seguida, aparecem Alimentação e bebidas, variando 2,42% e impactando 0,51 p.p. A combinação entre os dois foi responsável por 72% do resultado do IPCA. As últimas leituras do índice e as perspectivas de risco no cenário global não perfilam de forma positiva, ao passo em que é muito provável que ao término do ano de 2022 a inflação acumule alta acima da meta de 3,50%, estabelecida pelo banco central, novamente. O acumulado anual do índice é de 11,30%.

As leituras para serviços e bens industriais duráveis desaceleraram, mas ainda não está claro se este novo cenário representa um viés claro quanto à mudança de tendência no mercado ou possui caráter transitório.

Adicionalmente, um fator que deve arrefecer os efeitos inflacionários no curto prazo é a apreciação do real perante ao dólar. O mercado de câmbio registrou entrada líquida de US$9,4 bilhões no ano até o dia 18 de março, o maior patamar para o período em 10 anos, muito motivado por uma maior demanda global por ativos de países emergentes, que se tornam mais atraentes, redirecionamento de investimento previamente russos para outros emergentes e movimento expressivo no aumento de preço de commodities. Em linhas gerais, os índices de preços não apresentaram uma sinalização clara de viés para os próximos períodos durante o mês de março.

Por fim, em sua ata pós-copom, o Banco Central afirmou que visa combater os impactos secundários do choque de oferta, advindos do conflito na Europa, e que o momento exige serenidade. De acordo com a sua avaliação, o encerramento do ciclo em 12,75% seria suficiente para a convergência da inflação no horizonte relevante. A próxima alta deve ser de 100 bps, acontecendo na reunião de maio, e, caso o cenário tenha uma piora significativa, pode se esperar um aumento adicional, de magnitude inferior, no mês de junho.

Adicionalmente, o Banco Central reconhece que não conseguirá cumprir a meta de inflação definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para o ano de 2022 (3,5%). O Bacen, no momento, trabalha com um cenário base de 7,1% de inflação para o ano vigente. Entre os fatores que explicam o não cumprimento da meta, a principal delas é o conflito entre Rússia e Ucrânia, que intensificou as pressões inflacionárias sobre as commodities, principalmente as energéticas. Ademais, as cadeias de produção globais seguem em descompasso, ainda impactadas pela pandemia, gerando descasamentos entre oferta e demanda.


Política Fiscal – Melhora do cenário fiscal mediante aumento das projeções de arrecadação 

No cenário fiscal, houve uma leve melhora do ambiente projetado para 2022 durante o mês de março, movimento puxado por uma revisão nas projeções para o resultado primário do governo central. A melhora no quadro fiscal advém de uma expectativa de crescimento na arrecadação no curto prazo, que se sustenta pela manutenção dos preços das commodities em patamares elevados, e pelos índices de preço acima do esperado para o primeiro trimestre de 2022. A revisão altista nas expectativas de variação de preços impacta o cenário fiscal em duas frentes. Em primeiro lugar, uma inflação maior infla a base tributária, aumentando a arrecadação. Adicionalmente, um deflator do PIB mais elevado também contribui para reduzir a razão dívida/PIB.

Adicionalmente, uma expectativa de um câmbio mais apreciado também contribuiu para reduzir as projeções de dívida para o fim do ano de 2022, com a redução do valor em reais da dívida bruta externa do setor público. No mês de março, o dólar teve uma queda de 7,66% frente ao real – já no consolidado do primeiro trimestre de 2022, o dólar acumula uma desvalorização de 14,55%, a maior desde 2009.

Apesar das medidas de incentivos fiscais e aumento dos gastos públicos por parte do Governo Federal, o efeito da inflação e das commodities sobre a arrecadação de tributos no curto prazo deverá compensar de forma positiva o orçamento público, havendo uma possibilidade do governo consolidado registrar um novo superávit primário em 2022.

No ano de 2021, a carga tributária subiu para 33,9% do PIB, o maior nível de impostos pagos pelo contribuinte brasileiro desde 2010. De acordo com o Boletim de Estimativa da Carga Tributária Bruta do Governo Geral, este recorde é justificado pelo fim dos incentivos fiscais implementados na pandemia e durante a recuperação econômica de 2021. No âmbito federal, houve um aumento de 0,27 p.p do PIB na arrecadação do IOF. Já na parte estadual, ocorreu um crescimento de 0,59 p.p do PIB do ICMS. O aumento foi impulsionado principalmente pela alta dos preços dos combustíveis em 2021, no qual o ICMS é cobrado sobre o valor final.

Na composição da carga tributária, pode-se avaliar que os impostos que mais pesam ao contribuinte brasileiro são os que estão alocados na categoria de “bens e serviços”, que correspondem a 14,76% do total de 33,9%.


Setor Externo – Conflito na Ucrânia persiste e inflação acelera ao redor do globo

A guerra no Leste Europeu, envolvendo Rússia e Ucrânia, ganhou força nas últimas semanas, apesar da estagnação no início do mês de abril. A incapacidade das forças russas de invadir Kiev levou a uma concentração do exército do Kremlin na região separatista de Donbas. A continuidade do conflito, aliada às negociações sem avanço, demonstram que a guerra terá continuidade no futuro próximo, aumentando o risco com relação ao preço de commodities e estreitando ainda mais a diplomacia entre os países envolvidos no confronto.

O PMI composto da Zona do Euro, índice que mede o nível de atividade dos gerentes de compra, para o mês de março, veio levemente acima das expectativas do mercado, em 54,9 (54,5), número  inferior ao apresentado pelo mês anterior (55,5). A reabertura da economia europeia, em meio à redução em casos de Covid, mostrou ser importante para o resultado positivo. No entanto, muitos fatores advindos do conflito ucraniano ainda não foram incorporados no índice, demonstrando que este deve ser “testado” ainda nos próximos meses.

O fator reabertura pode ser observado ainda no desemprego do bloco econômico, que caiu levemente de 6,9% em janeiro para 6,8% em fevereiro, acima das projeções de 6,7%, com número total de 11,155 milhões de desempregados. De forma semelhante, o número não incorpora totalmente os choques relacionados à invasão russa, que podem afetar negativamente o índice nos próximos meses.

Já a inflação na Zona do Euro mostra sinais do impacto negativo causado pela guerra, com o índice anualizado acelerando a 7,5% para o mês de março, muito acima das projeções, que ficaram em torno de 6,6%. Alimentada pelo aumento nos preços de commodities energéticas – petróleo, gás natural e energia elétrica – o índice fica ainda mais distante da meta de 2% imposta pelo ECB (European Central Bank).

Ainda sobre o ECB, o banco central europeu decidiu por deixar a sua taxa de juros de curto prazo inalterada em 0% a.a., ao mesmo passo em que comunicou a sua decisão de encerrar a compra de títulos no terceiro trimestre de 2022. Ao passo em que o ECB terminará sua aquisição de ativos, é esperado que as taxas de juros comecem a subir, seguindo o caminho do BoE (Banco da Inglaterra) e do Fed. Além disso, a presidente do ECB, Christine Lagarde, reforçou a importância do conflito no leste europeu, as sanções aplicadas e medidas futuras como fatores determinante sobre o crescimento do bloco, citando que as políticas futuras do banco central dependerão de dados econômicos a serem recebidos e “avaliação em torno de suas perspectivas”.

Gráfico Descrição gerada automaticamente

Adjacente ao anúncio do ECB, as taxas de juros em títulos de maturidade de 10 anos continuam subindo desde o início de 2022, ao passo em que os agentes esperam por um aumento na taxa de juros.

Já nos EUA, o PMI composto, que inclui os setores industriais e de serviços, atingiu 58,5 no mês de março, acima das expectativas (57) e crescimento quando comparado ao mês de fevereiro (55,9). No entanto, o setor industrial sofreu com uma redução de 1,5 – queda de 58,6 a 57,1 -, mostrando que o setor ainda sofre com as restrições na cadeia de suprimentos.

O mercado de trabalho americano também se mostra aquecido, atingindo a menor taxa de desemprego desde o início da pandemia, de 3,6%. Apesar do ganho de empregos ter sido inferior ao esperado pelo mercado, ainda representa um bom primeiro trimestre para a economia americana.

Por outro lado, a inflação continua a se mostrar um desafio para o Fed. O índice de preços ao consumidor americano acelerou em março e teve alta de 1,2% ante fevereiro, de acordo com as expectativas. O índice anualizado é de 8,5%, maior número desde dezembro de 1981 e levemente acima das projeções (8,4%). Os destaques na alta do índice se deram pela alta em commodities energéticas, como o aumento de 18,3% na gasolina – que representou mais da metade do aumento mensal de todos os itens -, 1% em alimentação e 1,5% para a alimentação em casa.

A alta inflação, e a perspectiva negativa no balanço de riscos, impactou a percepção do Fed sobre o ciclo da alta de juros nos EUA, com membros do comitê apoiando uma alta de 50 bps – superior à alta de 25 bps da última reunião – e com objetivo de chegar em uma taxa neutra, ao menos, como forma de combate aos efeitos vistos no cenário econômico. O comitê também discutiu sobre o ajuste no balanço do Fed, com redução mensal de cerca de US$ 60 bi (Treasuries/T-bills) e US$ 35 bi (Hipotecas), sendo o valor, portanto, de US$ 95 bi por mês.

Gráfico, Histograma Descrição gerada automaticamente

O título americano de maturação em 10 anos mostra movimento semelhante ao europeu, ao passo em que, guiados pelas decisões e comunicações do Fed, os agentes econômicos precificam um aperto no ciclo de aumento da taxa de juros americana.

Por fim, a China continua passando por um surto de Covid-19 em algumas de suas províncias, com destaque para Shanghai. No início de abril foram registradas mais de 20 mil novas infecções, o maior número já registrado em território chinês desde o início da pandemia. Adicionalmente, mais de 25 milhões de pessoas se encontram em lockdown na cidade. O motivo da China estar atuando dessa maneira reflete a sua política de “Covid zero”, focada em conter totalmente a doença, através de testagem em massa e quarentenas. No momento, não há previsões sobre o fim destas restrições.

A forma em como o governo chinês responde a casos de coronavírus refletiu em PMIs do país, assim como no índice de inflação, que, na direção contrária do mundo, continua baixo, a 1,5% na variação anual – apesar de ter vindo acima das projeções de 1,2%.


Conclusão

A continuidade do conflito no Leste Europeu continua a afetar negativamente o balanço de riscos em nível global. Novas revisões sobre projeções apontam para um menor crescimento esperado para as principais economias mundiais, além  de uma pressão inflacionária persistente, sinalizando que os principais bancos centrais deverão apertar a política monetária, através de altas de maior magnitude nas taxas de juros e encerramento de programas de compra de ativos.

No cenário nacional, espera-se um crescimento inferior a 1% da atividade econômica em 2022, com fatores como a pressão inflacionária e a alta taxa de juros pesando negativamente sobre as projeções. De forma adjacente, por ser um ano eleitoral, o governo tenta implementar políticas públicas – como reajuste de salários e aumento de auxílios sociais -, colocando incertezas sobre o atual cenário fiscal, que, até o momento, se mostrou sólido.




Autores: Luís Guilherme Uliana, Mateus Melo e William Pedroso.

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Carta de Conjuntura Macro – Fevereiro

Carta de Conjuntura Macro – Fevereiro

O mês de fevereiro ficou marcado pelo início do conflito no Leste Europeu, com a invasão russa à Ucrânia, culminando numa piora do cenário macroeconômico global, com aumento das percepções de risco pelos agentes econômicos e uma maior volatilidade nos mercados.

Os impactos da guerra sobre a inflação devem ser a principal consequência econômica do conflito, fato que ocorre num cenário já de elevada pressão nos níveis de preço e de alta inércia inflacionária, tendo em vista os acentuados choques de oferta e descasamentos nas cadeias mundiais de insumo. Neste cenário, as projeções são de um aperto monetário mais intenso, com revisões baixistas para a atividade econômica, sobretudo na Europa. No Brasil, dados relativos à atividade econômica vieram acima do esperado, enquanto inflação continua persistente e com tendência altista.


Atividade Econômica – Resultados do 4T21 surpreendem positivamente, apesar do cenário incerto

O Produto Interno Bruto (PIB) para o 4º trimestre de 2021 avançou 0,5% na comparação com o trimestre anterior, acima das expectativas do mercado (0,1%), e 1,6% ante mesmo período em 2020.

No ano, o PIB avançou 4,6% em 2021, ante recuo de 3,9% em 2020, resultado próximo às expectativas do mercado no início do ano, de 4,5%. Com este resultado, o PIB quebra a sequência de dois trimestres consecutivos de recuo, retornando ao patamar positivo e deixando um carrego estatístico de 0,3% para 2022.

Pela Ótica da Produção, o destaque positivo se deu ao setor agropecuário, que registrou um crescimento de 5,8%, refletindo o bom desempenho de lavouras com peso relevante na produção agrícola, como a soja (11%), trigo (25,8%) e o arroz (5,2%).

Apesar da desaceleração, o setor de serviços ainda registrou alta de 0,5%, ante 1,2% registrado no período anterior, e segue refletindo os efeitos positivos do processo de normalização da mobilidade urbana, devido à redução das medidas restritivas. Os destaques positivos foram os Serviços de Informação e Comunicação, que obtiveram avanço de 3,4% no período.

Já o setor industrial apresentou o terceiro recuo consecutivo, de 1,2%. Com exceção do setor de Construção, que avançou 1,5%, todos os demais apresentaram queda na atividade.  Em dados mais recentes, a produção industrial de janeiro apresentou queda de 2,4%, demonstrando que a indústria ainda segue sofrendo as consequências da alta dos custos com energia elétrica e dos graves problemas na cadeia mundial de insumos, intensificados com a recente piora no abastecimento de semicondutores, impactando consequentemente, a produção de bens duráveis.

Pela Ótica da Despesa, o destaque foi o consumo das famílias, apresentando alta de 0,7% no trimestre e acumulando alta de 3,6% no ano de 2021. O crescimento observado reflete a melhora dos indicadores de mercado de trabalho e os efeitos positivos gerados pelos programas de transferência de renda por parte do governo, apesar das vendas do comércio varejista e do faturamento do setor de serviços perderem fôlego no período. Os gastos do governo também contribuíram positivamente, com avanço de 0,8% no trimestre.

A Formação Bruta de Capital Físico avançou 0,4% no período, e 3,4% na comparação com o 4T20. Os destaques são atribuídos a demanda por máquinas e equipamentos, que apresentou alta de 3,7% no trimestre e de 23,6% no consolidado do ano – resultado influenciado pelo crescimento das importações -, e a construção civil, com crescimento de 0,7%.  Além disso, a taxa de investimento em preços correntes cresceu 0,6 p.p. no quarto trimestre de 2021, quando comparado com o mesmo período do ano anterior, subindo de 18,4% para 19%. A taxa de poupança reduziu durante o mesmo período, de 12,1% para 11,3%, gerando uma poupança externa positiva.

Por fim, as exportações líquidas contribuíram de forma ligeiramente negativa para o resultado do PIB na comparação com o último trimestre de 2020, enquanto as exportações avançaram 3,3% no quarto trimestre, as importações tiveram alta de 3,7%.

No mercado de trabalho, a taxa de desemprego – medida pela PNAD – foi de 11,1% para o trimestre encerrado em dezembro, levemente abaixo das expectativas do mercado (11,2%). A redução no desemprego se deu devido ao crescimento dos empregos formais e informais. No entanto, a média real dos salários decresceu de forma mais intensa do que o crescimento de empregos, o que afeta o consumo das famílias e retrai a massa salarial real.

Adicionalmente, o indicador de confiança do consumidor, divulgado pela FGV, também obteve melhora durante o mês de fevereiro, subindo 3,8 pontos no mês, para 77,9, o maior nível desde agosto de 2021 (81,8). O destaque se deu pelo aumento da intenção de compras de bens duráveis, que estava em queda há cinco meses consecutivos.


Política Monetária – Redução do ritmo com previsão de ciclo mais longo

A inflação de fevereiro, medida pelo IPCA, apresentou alta mensal de 1,01%, acima do esperado pelo mercado (0,94%), uma aceleração relevante ante o mês de janeiro, onde o índice apresentou alta de 0,54%. A inflação acumulada em 12 meses fechou em alta de 10,54%.

Os destaques do índice se dão pela alta no segmento de Educação, que avançou 5,61% no mês devido aos reajustes anuais das mensalidades escolares, sendo responsável pelo avanço de 0,31 p.p. do índice. Ademais, Artigo de Residência (1,76%), Alimentos e Bebidas (1,28%) e Saúde e Cuidados Especiais (0,47%) também tiveram relevância sobre a alta.

Os combustíveis devem exercer pressão relevante sobre o índice em março, tendo em vista o reajuste no preço dos combustíveis nas distribuidoras promovido pela Petrobras, com elevação de 18,7% para a gasolina e 24,9% para o diesel.

Adicionalmente, outros fatores podem provocar novas revisões nas expectativas e no cenário inflacionário no curto prazo, como o cenário climático adverso e a manutenção dos preços das commodities em patamares elevados, impactados pelas preocupações com as possíveis restrições de oferta em torno da atual crise geopolítica. Em contraponto, a aprovação da PLP 11/20 deverá exercer um impacto baixista sobre o preço dos combustíveis e, consequentemente, sobre os níveis de preço.

Em linha com as expectativas do mercado, o Copom elevou a taxa Selic, em decisão unânime do comitê, em 100 pontos-base, para 11,75% a.a. na reunião de março. No comunicado que acompanhou a decisão, o Copom já adiantou que deve realizar uma alta de mesma magnitude na próxima reunião, com data para os dias 3 e 4 de maio. Na ata da primeira reunião de decisão de política monetária de 2022, no mês de fevereiro, o Copom demonstrou que está disposto a continuar o ciclo de aumento na taxa de juros, mas com ritmo mais lento. Entre os principais pontos citados, o comitê alertou sobre os riscos de incerteza da política fiscal e de preços de ativos e commodities, sendo os últimos amplificados com o recente conflito no leste europeu.

Complementarmente, o comitê registrou durante o mês que alguns indicadores mostraram evolução ligeiramente superior à esperada na virada do ano, com melhora no mercado de trabalho. No quadro atual, com a taxa de juros já em campo contracionista, a redução do ritmo em março permite o comitê discernir com maior precisão os reais efeitos do novo choque. Em síntese, os efeitos do conflito no Leste Europeu devem ser menos severos para os países da América Latina, mas o efeito adverso das commodities sobre os níveis de preço devem impactar a inflação doméstica, neste cenário, já partindo de um exercício de desinflação desafiador, é esperado um ciclo de aperto mais longo, como já precificado pelo mercado.


Política Fiscal e Cenário Político – Melhora do cenário fiscal com perspectiva de aumento da arrecadação para o ano 

No cenário fiscal, a arrecadação pública deve seguir superior à média pré-pandemia, como ocorrera no ano passado, estimulada, dentre outros fatores, pela normalização dos programas de redução e diferimento de impostos lançados para o combate da pandemia, pelo impacto positivo da inflação na base de arrecadação e, sobretudo, pelo boom das commodities.

Em paralelo, a alta das commodities tem elevado a pressão por políticas de controle de preços, como a PLP 11/20, já sancionada. O cenário, no entanto, permanece positivo, com algumas projeções de mercado não descartando a possibilidade de novo superávit para o setor público em 2022. Segundo estimativas do Banco BTG Pactual, a arrecadação do governo central com commodities em 2022 deve atingir patamar próximo a R$ 270 bilhões.


Projeção: BTG Pactual. Valores em R$ bilhões.


No ambiente político, o mês de fevereiro foi marcado pela volta das atividades legislativas e pela intensificação das movimentações visando o ano eleitoral. O ambiente político vislumbrado em meados de 2021, de instabilidade e forte escalada da desarmonia entre os poderes, perdeu espaço, mediante a concentração de esforços para o processo eleitoral que, de forma mais acentuada, começa-se a estruturar.

O mês de fevereiro foi marcado pela discussão de possíveis medidas legislativas para conter a pressão inflacionária sobre o preço dos combustíveis. Após a tramitação de algumas propostas no legislativo, foi sancionado a PLP 11/20, que prevê a isenção de Pis/Cofins para o diesel, gás e querosene de aviação até o final de 2022, com um impacto estimado de R$ 16,1 bilhões (0,17% do PIB) para o governo federal. O projeto também modificou a regra de cálculo do ICMS sobre o diesel até o final de 2022, que passa a considerar a média do preço dos últimos 5 anos. O impacto estimado desta medida é de R$ 9,0 bilhões (0,09% do PIB) no ano para os Estados. A aprovação da medida, associada à melhora recente nos preços internacionais do petróleo, retirou da pauta a possibilidade de novas iniciativas por parte do Planalto para controle dos níveis de preço dos combustíveis a curto prazo.


Setor Externo – Apreciação do real com aumento da demanda por ativos brasileiros e guerra no Leste Europeu

O forte fluxo de dólares para o país, decorrente em grande parte, do crescimento da demanda global por ativos de países emergentes exportadores de commodities, fez com que a entrada líquida de dólares nos dois primeiros meses do ano atingisse o maior patamar desde 2012, com um ingresso líquido de divisas de US$ 9,0 bilhões no período.

Com a redução dos estímulos no mercado americano e a consequente saída de investimentos no mercado acionário, os investimentos estrangeiros em ações no Brasil atingiram patamares elevados, cerca de R$ 70 bilhões até o dia 7 de março, segundo a B3. Neste cenário, o dólar obteve queda de 2,71% no mês, sendo cotado a R$5,15 no fechamento e já acumulando uma queda próxima a 8% no ano, adicionalmente, o índice Ibovespa fechou o mês em 113.142 pontos, uma alta mensal de 0,89%.

No âmbito geopolítico, o mês de fevereiro foi marcado pelo início do conflito entre Rússia e Ucrânia, gerando impactos sobre a atividade econômica, tendo em vista as várias sanções impostas por diversos países membros da OTAN, como forma de retaliação à invasão russa.

A primeira rodada de sanções foi direcionada a bancos e patrimônios de oligarcas, mas, com a intensificação do conflito, medidas mais firmes foram impostas, como a retirada da Rússia do Swift – um sistema de transferências que fornece informações a bancos do mundo inteiro – e congelamento de reservas internacionais. Adicionalmente, diversas empresas privadas suspenderam suas operações em território russo. 

O conflito, além de gerar perdas humanitárias, pressionou o preço de commodities da região. Produtos como o alumínio, gás natural, fertilizantes, milho, petróleo e trigo apresentaram alta volatilidade, e devem seguir apresentando tendências altistas no curto prazo. Neste cenário, é difícil mensurar os impactos causados pelo conflito na atividade doméstica, apesar da baixa participação da Rússia na corrente de comércio brasileira. Respondendo por apenas 0,7% das exportações do Brasil, e por 2,7% das importações no total acumulado dos últimos doze meses em fevereiro, a Rússia é a principal fornecedora de adubos e fertilizantes para o Brasil, com participação de cerca de 23% do total importado pelo país.

No cenário econômico, os destaques se dão por dados da atividade econômica, inflação, desemprego e política monetária na Europa e pelo desemprego e inflação nos EUA. Adicionalmente, na China, a implementação de novas medidas restritivas ganha força e resultados vêm acima das expectativas.

O desemprego para o mês de janeiro na Zona do Euro foi de 6,8%, abaixo do esperado pelo mercado (6,9%). O número representa uma queda ante dezembro (7,0%), com o afrouxamento de restrições melhorando a perspectiva no mercado de trabalho.

A inflação registrada para o período de janeiro de 2022 veio de acordo com as expectativas, representando um aumento de 0,3% ante dezembro e atingindo a máxima histórica do bloco, uma inflação anual de 5,1%. O ECB (European Central Bank) já havia optado por deixar a taxa de juros inalterada no início deste mês, no patamar de 0%, mas, devido à pressão inflacionária e os conflitos na Ucrânia, pode ser que o ECB siga o caminho do BoE (Bank of England) e adiante o hike sobre as taxas de juros.

Por fim, a atividade de manufatura da Zona do Euro em fevereiro subiu a 58,2, após ter registrado em janeiro o maior número dos últimos cinco meses. O alívio nos gargalos pelo lado da oferta resultou em melhores condições para a indústria, apesar de que a melhora não foi distribuída entre os membros do bloco e fábricas ainda enfrentam altas pressões inflacionárias.

Na China, na tentativa de conter o avanço de novos casos da variante Ômicron, o governo chinês decretou novo lockdown na cidade de Shenzhen e na província de Jilian, colocando 17,5 milhões de moradores em confinamento. Em paralelo, os dados da produção para os meses de janeiro e fevereiro vieram acima das projeções do mercado, com alta de 7,5% na comparação anual, contra alta esperada de 3,5%, conjuntamente, as vendas no varejo cresceram 6,7% durante o mesmo período, também acima dos 4,3% esperados pelo mercado. 

Já nos EUA, o PMI de manufatura para o mês de fevereiro registrou 57,3, número levemente abaixo do esperado (57,5), e alta comparado aos 55,5 anteriores. O resultado vem de acordo com a redução das restrições impostas à cadeia de suprimentos, estimulando a atividade industrial no país.

Também surpreendendo, o número de criação de trabalhos nos EUA para o mês de fevereiro foi de 678 mil, muito acima do esperado (400 mil) por economistas. O resultado se deu pelo aumento de empregos nos segmentos de hospitalidade, educação e saúde. Além disso, a taxa de desemprego ficou em 3,8%, número inferior aos 3,9% projetados pelo mercado e menor número após o início da pandemia. 

A inflação americana para o mês de fevereiro acelerou a 7,9% anualizados, de acordo com as expectativas do mercado. O número é o maior registrado nos últimos 40 anos, motivado pelas pressões inflacionárias causadas pelo preço de alimentos e commodities energéticas.

Por fim, pela primeira vez desde 2018, o Fed anunciou uma alta  na taxa de juros americana, de 0,25 p.p., estabelecendo-a em 0,50% ao ano. A decisão não foi unânime, com um diretor optando por uma alta de 50 bps. O chairman do Fed, Jerome Powell, comentou logo em seguida que as próximas 7 reuniões do comitê terão altas, e que a taxa de juros americana deve terminar o ano em patamar entre 1,75% e 2%. Ainda, Powell citou o balanço do Fed, com perspectiva de começar a reduzi-lo já a partir da próxima reunião.

A decisão vem em linha com o esperado pelo mercado, que vê positivamente a medida tomada pelo Fed em momento de pressão inflacionária e robustez no mercado de trabalho americano.

Em síntese, o quadro para a atividade econômica permanece desafiador para os próximos meses, principalmente por conta das pressões inflacionárias, advindas dos descompassos entre oferta e demanda, aumento dos custos produtivos, e pelas recentes incertezas das consequências do conflito no Leste Europeu. O cenário é de maior cautela e de piora nas percepções de risco, com tentativas por parte do mercado de mensuração dos eventuais impactos causados pelo conflito sobre a atividade econômica. Por fim, as projeções são de piora do quadro inflacionário no curto prazo e tendência de maior contracionismo monetário por parte das principais autoridades monetárias, desestimulando ainda mais a atividade econômica.

Autores: Mateus Melo, Luís Uliana e William Pedroso
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Carta de conjuntura Macro – março

Carta de conjuntura Macro – março

Overview Internacional

No início do mês de março, foi difícil não ouvir falar da sigla NFT (non fungible token), após a venda histórica da obra de arte “Everydays: The First 5000 Days”, do artista digital Beeple, pelo valor total de US$ 69 milhões e que a tornou uma das mais valiosas obras de arte já leiloadas. 

Os NFTs são registros baseados no blockchain Ethereum que representam objetos físicos ou pedaços de mídia digital (sejam textos, vídeos, imagens, áudios, etc.). Sua principal característica é a não fungibilidade, que faz com que o NFT funcione como um certificado de unicidade, estando protegido de duplicações. Além disso, são indivisíveis, indestrutíveis, irrepetíveis, verificáveis e programáveis. No entanto, na prática, a representação adquirida pode ser alterada mesmo após a venda, trazendo incerteza ao valor final.

O mercado das NFTs, que movimentava dezenas de milhões de dólares anualmente, cresceu para mais de US$ 300 milhões apenas no mês de Fevereiro de 2021. A alta liquidez, as redes sociais e o fenômeno FoMO (fear of missing out) podem estar relacionados com este boom. Assim como aconteceu com a Bitcoin, existem diversas expectativas para as NFTs, porém é difícil prever como será a demanda no futuro.

Fazendo agora um overview do cenário internacional, no mês de março ocorreu a destituição do chefe do Banco Central da Turquia, Naci Agbal, pelo Presidente do país, Recep Tayyip Erdogan. 

Naci ocupava o cargo somente desde novembro de 2020, e a decisão de sua destituição foi tomada após o BC definir o aumento da taxa de juros de 17% para 19% ao ano, como parte de uma estratégia para conter a alta taxa de inflação, que atingiu 15,61% no mês de fevereiro. Desde o início de sua gestão, ele deu continuidade a aumentos consecutivos na taxa de juros, que se encontrava à 10,25%.

Apesar de a medida ter sido bem recepcionada pelo mercado, e a lira turca ter tido valorização de 15% frente ao dólar desde a entrada de Naci no cargo, o Presidente Erdogan se opôs à medida, por acreditar que as altas taxas de juros não estavam surtindo o efeito desejado, já que a inflação se mantinha crescente e muito acima da meta oficial de 5%.

Seu sucessor será Sahap Kavcioglu, o quarto Presidente do Banco Central Turco desde 2019, e já anunciou que não haverá cortes prematuros na taxa de juros. Para ler mais sobre a importância da autonomia nos Bancos Centrais, acesse o artigo do Clube de Finanças.

Outro país importante a ser mencionado é a Argentina, que enfrenta altíssima inflação, tendo fechado sua taxa de inflação no mês de fevereiro em 40,70%.

Em março de 2020, em meio ao início da pandemia da Covid-19, o atual Presidente Alberto Fernandez se utilizou do programa já existente “Precios Cuidados” para instituir o plano “Precios Maximos”. O primeiro foi criado em 2013, durante o mandato da ex-Presidente Cristina Kirchner, como forma de garantir preços acessíveis e disponibilidade para uma listagem de produtos de primeira necessidade. Tratava-se de um programa voluntário, com preços definidos a partir de negociações entre o governo e as fabricantes. Já o novo programa congelou os preços de mais de 2.300 itens considerados de primeira necessidade e a participação por parte das empresas está sendo obrigatória, além de terem sido realizados somente dois reajustes abaixo da inflação, em julho e outubro de 2020.

A mudança conseguiu disfarçar a inflação do ano de 2020, já que o Indec (Instituto Nacional de Estatística e Censos da Argentina) utiliza os preços mais baixos dos produtos para cálculo do índice. Porém, a arbitrariedade do “Precios Maximos” e as consequências negativas para as indústrias envolvidas, fez com que o governo fosse pressionado a retirar produtos da lista do programa a partir de 2021. Isso explicaria os novos aumentos no índice de inflação do país, que tende a continuar crescente conforme o plano vá perdendo força.

Ainda em relação ao cenário global, vale destacar os acontecimentos ocorridos nos EUA por conta de sua alta expansão de liquidez.

Como era de se esperar, a agenda do mais novo presidente americano, Joe Biden, é mais desenvolvimentista e de forte atuação do Estado acerca da economia americana, o que já ficava claro durante seus pronunciamentos na corrida presidencial, e se confirmou com a nomeação de Janet Yellen para a Secretaria do Tesouro americano.

Em linha com seu posicionamento, no começo de março deste ano foi aprovado um pacote de estímulos fiscais para o combate à crise econômica gerada pela pandemia da Covid-19. Havia quase um consenso da necessidade do estímulo para a economia americana, mas o que surpreendeu foi o tamanho do estímulo fiscal, já que foi aprovado em US$1.9 trilhões. Se compararmos com o PIB brasileiro de 2020, usando a cotação média de 2020, o PIB foi de US$1.4 trilhões, ou seja, cerca de 135% do PIB brasileiro foram aprovados em estímulos fiscais. Para entender onde estes estímulos serão dados e qual magnitude para cada setor, ler a matéria do NY Times.

Os atuais estímulos fiscais, alinhados com os estímulos monetários, proporcionam uma injeção de liquidez jamais vista.  Na crise de 2008, que até então fora o momento de maior expansão de liquidez, a maioria dos estímulos foi de natureza monetária, para manter o mercado financeiro funcional e reestruturar o balanço dos bancos americanos, que estavam muito fragilizados por conta da crise do Subprime. Isso fez com que a expansão da base monetária americana (M0) não afetasse outros agregados monetários (M2), como podemos ver a seguir:

 




                                      (Fonte: FRED Louisiana)

 Esse é talvez o principal motivo das rodadas trilionárias de Quantitative Easing de 2008 não terem efeitos inflacionários, pois toda a expansão da base monetária acabou por não fluir para a economia real, o dinheiro não foi parar na mão das famílias. Porém, desta vez é diferente, pois as rodadas de Quantitative Easing não ficaram “represadas” em balanços, dos bancos, pois os mesmos estavam com balanços sólidos. Em vez disso, o QE aumentou substancialmente a liquidez do mercado, alinhado com estímulos fiscais jamais vistos anteriormente, isso se reflete na base monetária (M0) e agora em outros agregados monetários, como podemos ver abaixo. 


                                                 (Fonte: FRED Louisiana)

E podemos ver que a MP3 (política fiscal agressiva + políticas monetárias não convencionais) vem surtindo efeitos. O primeiro a ser observado é a retomada da atividade econômica, que vem se recuperando trimestre a trimestre por quase todo o globo (muito por conta dos estímulos fiscais e monetários). Porém, a retomada da plena capacidade de funcionamento das atividades e da cadeia de suprimentos global ainda não ocorreu (por conta da pandemia), ocasionando uma elevação abrupta nos preços das commodities, podendo ser verificado no gráfico abaixo, que contém um índice composto por todas as commodities negociadas em bolsa de valores.



                                 (Fonte: Fred Louisiana)

Com todos esses estímulos fiscais e monetários, é de se esperar que o dólar Americano se desvalorize, o que já vem acontecendo. Porém, com uma desvalorização do dólar, commodities se apreciando fortemente, juros nas mínimas históricas e como já comentado, política fiscal e monetária extremamente agressiva, torna um ambiente muito propício para a retomada da inflação nos EUA. O gráfico abaixo traz a desvalorização da moeda americana, frente a uma cesta de moedas de países desenvolvidos, junto com a inflação implícita dos títulos de 5 anos do governo americano, medida que busca uma estimativa da inflação anual para um dado período de tempo no futuro. Vale ressaltar que os atuais patamares não são negociados desde Junho de 2008, período pré crise financeira global.




                                 (
Fonte: Louisiana FRED)

Assim, podemos observar que o mercado já vem precificando essa inflação maior no futuro, tendo um aumento significativo nos juros dos Treasuries de 10 anos do governo americano. Esses aumentos dos juros nominais, acabam por consequência aumentando os juros reais, que impactam negativamente os ativos de custo de oportunidade. Esses ativos são aqueles que não possuem fluxo de caixa, fazendo com que seu retorno esperado seja 0, assim, eles ficam suscetíveis ao custo de oportunidade, que aumenta à medida que os juros reais sobem. Por isso o aumento dos juros acaba impactando negativamente o ouro, como podemos ver abaixo:



                                   (Fonte: Louisiana FRED)


O Federal Open Market Committee (FOMC), assim como o Copom e outros órgãos similares presentes em outros países, decide sobre aumentos ou diminuições na taxa de juros para manter a taxa da inflação estável e previsível, de forma que haja convergência com a meta estipulada pelo FED.

Com a crise global causada pela pandemia da COVID-19, é de se esperar que nos Estados Unidos, assim como está acontecendo em outros países, a inflação tenha perspectivas de aumento. Portanto, o FOMC decidiu em sua segunda reunião de 2021 pela manutenção da taxa básica de juros entre 0% e 0,25%, mantendo-a baixa e controlada. Também foi mantido o programa de recompra de títulos públicos e privados, sendo US$80 bilhões em títulos do Tesouro e US$40 bilhões em títulos lastreados em hipotecas. O FOMC espera que com estas decisões o nível de inflação e o desemprego se enquadrem nas metas estipuladas para o ano.


A pandemia da COVID-19

A pandemia da Covid-19 completou um ano no dia 11 de março, porém, ainda parece estar longe de acabar. A marca de 2,83 milhões de mortos ao redor do globo continua crescendo, enquanto muitos países enfrentam a terceira e quarta onda de contágio. Este cenário só poderá ser revertido com a vacinação em massa da população e o isolamento.

Em relação à vacinação, é possível ver que alguns países se destacam. Estados Unidos, China e Índia lideram em números de vacinas aplicadas, com 150 milhões, 119 milhões e 65 milhões respectivamente. Enquanto isso, Israel e Chile se destacam em número de vacinas aplicadas relativo à sua população, com 115% e 54%. No caso de Israel, o número significa que a vacinação se encontra já nas segundas doses.

Por outro lado, no Brasil, o mês de março foi marcado por novos recordes de mortes diárias e vacinação a passos lentos. A liderança no número médio de infecções diárias torna o país responsável por uma a cada oito infecções registradas em todo o mundo. Somente duas das quatro vacinas aprovadas pela Anvisa já foram importadas e estão sendo aplicadas na população, sendo elas a Oxford-AstraZeneca, adquiridas pela Fiocruz, e a Coronavac, do Instituto Butantan. Estoques das outras duas, BNT162 (da Pfizer/BioNTech) e Janssen (controlada pela Johnson & Johnson), ainda não chegaram ao país devido à demora na negociação com o governo, problemas de produção e atrasos nos envios.

Em contraste com o restante da situação do país, foram anunciadas duas vacinas brasileiras que podem já estar disponíveis a partir do segundo semestre. São elas a Versamune®-CoV-2FC, imunizante desenvolvido por pesquisadores da FMRP-USP, em parceria com a Farmacore Biotecnologia e a PDS Biotechnology, e a Butanvac, produzida pelo Instituto Butantan, em parceria com o Instituto Mount Sinai e a Universidade do Texas.


Cenário Fiscal.


A situação fiscal do governo brasileiro está bem delicada, devido aos enormes gastos para conter uma recessão econômica em virtude da pandemia, além de um mau gerenciamento dos gastos públicos há um bom tempo. Não é de hoje que vivemos uma diminuição dos recursos dos cofres públicos, desde 2014 o país sofre com consecutivos déficits e que vieram a estourar em 2020 com um grave aumento da dívida pública.


                              (Fonte: Tesouro Nacional)


No gráfico acima, conseguimos perceber o rombo no ano de 2020 durante os meses de abril a setembro, o que mostra uma preocupação ainda maior com a questão fiscal. Em junho do ano passado, tivemos somente neste mês um Déficit Primário de aproximadamente R$ 195 bilhões, representando mais do que duas vezes o Déficit do ano de 2019, ocorrido principalmente por uma queda expressiva da receita em aproximadamente 28% e aumento da despesa em 149% principalmente pelo auxílio emergencial, conforme visto nos dados abaixo.


 

                                      (Fonte: Tesouro Nacional)


Já em relação ao último dado público divulgado pelo Tesouro Nacional, fevereiro de 2021, mesmo com um bom aumento da receita não foi o suficiente para terminarmos o mês superavitário, tendo novamente mais um déficit. Isto mostra como as reformas não estão indo de acordo com a velocidade esperada para ter um melhor gerenciamento dos gastos do governo além de uma projeção baixa para o crescimento do PIB para 2021 em torno dos 3%, sendo que tivemos uma queda de 4,1% em relação a 2020. Logo, os déficits cada vez mais comuns fazem com que a dívida pública aumente para o patamar de 89% do PIB, não tendo uma perspectiva de queda já que existe uma projeção do aumento da taxa Selic, dificuldade no andamento das reformas e aumento de casos devido à pandemia. 


PEC Emergencial e MP 1034/2021


Para conter os gastos públicos e realizar a proposta de um novo auxílio emergencial para 2021, houve uma maior discussão da PEC Emergencial, criada pela equipe econômica em 2019. O assunto em si teve uma maior agilidade pois era necessário fazer ajustes dentro da Constituição para realizar este incentivo a economia e não ultrapassar o teto de gastos, o que poderia servir como crime de responsabilidade fiscal ao governo, podendo levar até o impeachment do Presidente. 

A emenda criada primeiramente possuía pontos importantes para enxugar a máquina pública, porém o texto aprovado no Congresso acabou tendo diversos trechos retirados os quais muitos enxergavam como essenciais. Os principais pontos não aprovados foram  a redução da jornada e salário de servidores, proibição de progressões e promoções na carreira de servidores além da vedação para salário e contratação de servidores ser realizado somente quando a despesa obrigatória ultrapassar 95% da despesa primária. Um dos pontos que permaneceram inalterados foi a não ampliação e a concessão de novos benefícios tributários e também a redução gradual destes valores. 

Com isso, vale ressaltar que a PEC emergencial não irá compensar os R$ 44 bilhões gastos no auxílio emergencial e só gerarão benefícios fiscais no médio prazo para o país. Além disso, uma parte dos gastos com o bolsa família estará junto neste valor de estímulo econômico, o que gerará uma certa folga no teto de gastos.


Outro assunto debatido e também aprovado no último mês foi a MP 1034/2021. Esta medida teve como resultado o aumento do CSLL para bancos e cooperativas de crédito o qual teve o intuito de manter a arrecadação, já que o governo diminui a alíquota de ICMS para combustíveis com o intuito de frear este aumento dos preços.


Câmbio

A taxa de câmbio continua muito depreciada, devido principalmente ao risco fiscal do país, além da demora na aprovação das reformas, como esperado pelo mercado. A média para o mês de março foi de R$5,66/US$ e a comparação com o mesmo período de 2020 demonstra uma depreciação de 20,40%. Apesar das medidas de expansão monetária promovidas pelo FED e um mercado com alta liquidez que tende a estimular a saída de capital dos Estados Unidos e a entrada em outras localidades, não está sendo refletida na cotação do real que continua sendo bastante afetada.

O estudo de autoria de Lívio Ribeiro, publicado pelo IBRE – FGV, demonstra que a depreciação do real, embora acompanhe os fundamentos globais, está diretamente ligada aos fatores internos.

Esses fatores são: risco fiscal da dívida, que aumentou com os gastos relacionados a pandemia, o que traz incertezas quanto à capacidade do Governo em honrar os pagamentos no longo prazo; demora na aprovação de reformas estruturantes da economia; cenário político conturbado; e a diferença entre os juros brasileiros em relação a outros países emergentes.

No cenário político de março é possível destacar a interferência do presidente Bolsonaro na presidência da Petrobrás, assim como, a suspensão das condenações do ex-presidente Lula o que favoreceu a saída de capital estrangeiro do país. Outros fatores como o recrudescimento da pandemia, retorno de medidas restritivas e as incertezas quanto à retomada da atividade econômica também contribuíram com a depreciação cambial.

Risco Jurídico

Como dito anteriormente, a anulação das condenações da Operação Lava-Jato sobre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva decretada pelo ministro do STF, Edson Fachin, tornou o ex-presidente elegível para concorrer às eleições presidenciais de 2022, fato que trouxe maiores incertezas sobre a evolução da economia brasileira nos próximos anos, ligadas principalmente às possíveis intervenções do Poder Judiciário, aumentando o grau de instabilidade jurídica no país. Além disso, ocorreu a suspeição do ex-ministro Sérgio Moro. Com o voto de Cármen Lúcia, a 2° Turma do STF o declarou suspeito e parcial nos casos envolvendo o ex-presidente.

Nesse mesmo dia o dólar chegou ao valor de R$5,77. Já o índice Bovespa fechou em queda de quase 4%. Esses acontecimentos levaram o Banco Central do Brasil a tomar algumas atitudes.

Intervenção do BC na taxa de câmbio

Com todos esses fatores adversos ao câmbio, o BCB precisou ser atuante no mês de março, onde alternou entre ofertas de swap cambial tradicional e reverso, assim como, a venda de dólar à vista. No dia 11, por exemplo, foi efetuado um leilão de swaps cambiais no valor de US$1 bilhão. Evento que foi precedido por outra oferta de US$405 milhões no mercado à vista. Suavizando a oscilação cambial e a depreciação do real.

Elevação do IGP-M

Em relação ao Índice Geral de Preços (IGP-M), que mede o movimento de preços e serve como parâmetro para reajuste dos aluguéis, o mês de março apresentou um aumento de 2,94% – maior desde a criação do real em 1994 – e acumula uma alta de 8,26% no primeiro trimestre deste ano. No consolidado dos últimos 12 meses o aumento é de 31,10%.

Como base de comparação, o aumento para o mês de março de 2020 havia sido de 1,24%, ou seja, menos da metade do observado no mesmo período deste ano. Todos os índices que compõem o IGP-M sofreram aceleração no mês de março, ocasionados pelo aumento nos preços de matérias-primas, que influenciam os preços de bens intermediários e finais. A desvalorização do câmbio, seguido pela expansão do preço das commodities, em especial dos combustíveis, também são fundamentais para explicar a elevação dos preços ao produtor e ao consumidor.

A cesta que compõe o IGP-M compreende o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA), o maior responsável pelo aumento do índice, já que a sua elevação em março foi de 3,56%. O grupo de Bens Finais aumentou 2,50%, causado principalmente pelo subgrupo de alimentos processados que saiu de -0,86% em fevereiro para 0,72% neste mês. Já o grupo de Bens Intermediários aumentou 6,33%, impactado pelo aumento de 18,33% nos preços de combustíveis e lubrificantes para a produção. No ano de 2020 esse mesmo índice apresentou um aumento acumulado de 31,64%, e neste trimestre já apresenta uma taxa acumulada de 10,57%.

Outro índice que compõe o IGP-M é o Índice Nacional de Custo da Construção (INCC), que teve um aumento de 2,00% no mês de março. O subgrupo que mais afetou esse índice foi o de Materiais e Equipamentos que teve um aumento significativo de 4,44% comparado a 2,39% no mês anterior.

Em relação ao Índice de Preços ao Consumidor (IPC), foi observado um aumento de 0,98%, ante 0,35% em fevereiro. A principal contribuição ocorreu através do subgrupo Transportes com um aumento de 3,97% causado pela grande elevação dos preços da gasolina. Além dos Transportes também foi encontrado aumento nos grupos de Habitação, Saúde e Cuidados Pessoais, assim como Vestuário.

Através do gráfico abaixo é possível perceber o aumento acentuado do índice desde o início de 2020.



                                  (Fonte: IBRE FGV)

IPCA

No dia 25 de março foi divulgado o IPCA-15, considerado uma prévia do IPCA, que é o índice de preços oficial do Brasil. A diferença entre os dois está relacionado com o período de coleta dos dados, sendo o primeiro quinzenal e o segundo mensal.

O IPCA-15 do mês de março registrou um aumento de 0,93% comparado com 0,48% no mês anterior. É o maior resultado para um mês de março desde 2015. Oito dos nove grupos que compõem o índice apresentaram alta. Destaque para os aumentos do Transporte e da Habitação, sendo o do primeiro causado pela elevação de 11,65% nos preços dos combustíveis, em especial a gasolina com elevação de 11,18%. Já o segundo grupo foi impulsionado pela elevação de 4,60% do preço do gás de botijão. O grupo que apresentou desaceleração foi o de Educação.


                                        (Fonte: IBGE)


Em 12 meses o IPCA-15 apresenta alta acumulada de 5,52%. Já a projeção da ANBIMA para o IPCA do mês de março é de aumento de 1,04%, já a projeção Focus é de 0,93%.

O IPCA acumulado dos últimos doze meses é de 5,25%. No mês de fevereiro foi registrado alta de 0,86%, a maior nesse período desde 2016. A causa desse aumento também é proveniente dos preços dos combustíveis, que foi de 7,09%, com destaques para a gasolina, etanol e diesel que aumentaram 7,11%, 8,06% e 5,40%, respectivamente. Os grupos mais impactados foram Transportes e Educação.

A gasolina foi o principal responsável por essa elevação, devido ao reajuste de preços nas refinarias e o consequente repasse aos consumidores finais. Assim como, a depreciação cambial que favorece o aumento dos preços de bens importados em moeda local.


                              (Fonte: Banco Central)


Elevação da taxa básica de juros

Na reunião de 17 de março, o Comitê de Política Monetária – Copom decidiu por aumentar a taxa básica de juros em 0.75 ponto percentual atingindo 2,75% a.a., a primeira alta desde 2015, entendendo que no momento não há necessidade de estímulos monetários especiais. Marcando o início da fase de normalização parcial da taxa de juros que deve seguir nas próximas reuniões com ajustes semelhantes a esse, reduzindo o grau de estímulo à economia imposto pelo início da pandemia de Covid-19.

O ajuste na taxa de juros baseia-se no aumento das projeções de inflação para os próximos anos, que estão próximas do limite superior da meta. Impulsionadas pela demora na retomada da cadeia de produção e aumento dos preços e custos dos produtos em diversos setores. Assim como, desvalorização cambial e inseguranças quanto ao cenário fiscal. Vale ressaltar que a incerteza com a retomada da economia nacional ainda se mantém elevada, já que os dados utilizados para a tomada de decisão não contemplam os efeitos causados pelo recrudescimento da pandemia no primeiro trimestre de 2021.

De acordo com o Copom, o aumento nos casos de Covid-19 e a deterioração da situação fiscal brasileira devido ao prolongamento das políticas fiscais e o atraso da aprovação de reformas estruturantes podem elevar o prêmio de risco do país, assim como, pressionar o balanço de riscos.

Em relação ao resultado do PIB do quarto trimestre de 2020, foi demonstrado uma recuperação da economia brasileira, mesmo com a redução do auxílio emergencial. Os indicadores de inflação permanecem acima do centro da meta, haja visto o acumulado dos 12 meses de 5,20% registrado no mês de fevereiro deste ano. Tanto é que as expectativas de inflação para 2021 estão ao redor de 4,6%, já para 2022 próximo a 3,25%, e para 2023 a expectativa é de 3,25% segundo o Boletim Focus. O aumento da inflação no ano de 2021 foi favorecido pelo aumento dos preços das commodities, em especial os combustíveis.

A elevação da taxa de juros tende a causar queda na inflação, já que diminui a atividade econômica e leva, consequentemente, a uma queda nos preços. Incentiva a entrada de capital estrangeiro devido ao aumento do retorno dos ativos nacionais, e com isso há uma valorização do real frente ao dólar. Porém, o efeito negativo é a desaceleração do crescimento econômico e aumento dos gastos com a dívida pública indexada à Selic. Como pode ser observado no gráfico abaixo, caso a taxa de juros alcance 5,00% a.a. ao final de 2021, o aumento de gastos com a dívida será de R$ 95,4 bilhões.

                                  (Fonte: Tendência consultoria)


No cenário externo destacam-se ainda novos pacotes de estímulos em diversas economias e o avanço dos programas de imunização. O Comitê ainda enxerga duração prolongada dos estímulos monetários e um processo de reprecificação de ativos financeiros.

Portanto, a forte alta na Taxa Selic tem como objetivo principal reduzir a probabilidade de não cumprimento da meta de inflação no curto e no longo prazo. Lembrando que a função fundamental do Banco Central é o de assegurar o poder de compra da moeda, por meio do controle da inflação.

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Autores: Artur Roman, Carolina Melo, Ricardo Pering, Vinícius Cadorin

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