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Taxas de desconto e suas aplicações

Taxas de desconto e suas aplicações

Um dos principais conceitos tratados em finanças é o do valor presente de fluxos de caixa futuros, metodologia amplamente utilizada para calcular o valor intrínseco de empresas e títulos de dívida. Neste artigo, abordaremos a base para o cálculo do valor presente, as taxas de desconto, e suas aplicações nos modelos de avaliação de empresas.

Retornos

Ao investir em ativos – que podem ser empresas, títulos públicos e privados, imóveis, entre outros – o investidor espera obter retornos financeiros ao longo do período em que seu capital está aplicado, em função do custo de oportunidade de estar com seus recursos indisponíveis durante a vigência do investimento. O retorno exigido será definido a partir da relação de risco e retorno do ativo em questão, de forma que, quanto maior for o risco do investimento, maior será o retorno exigido.

A taxa de retorno exigida é, portanto, o ganho mínimo exigido pelo investidor para investir em um ativo, por um período específico de tempo, em função dos riscos que envolvem esse ativo. Por outro lado, o retorno esperado da aplicação é consequência da expectativa futura do investidor para o ativo, que pode ser resultante de modelos de avaliação, expectativas econômicas ou percepções individuais. Assim, o retorno esperado poderá ser diferente para cada pessoa, uma vez que ele é resultante das expectativas futuras de cada indivíduo.

Caso o retorno esperado do investimento seja maior que o retorno exigido, isto é, o ganho esperado seja maior do que a compensação considerada justa pelo risco do ativo, a aplicação poderá ser considerada subvalorizada e, consequentemente, uma boa oportunidade de investimento. Em contrapartida, caso o retorno esperado seja menor que o retorno exigido, o ativo poderá ser considerado supervalorizado.

Taxas de desconto

As taxas de retorno exigidas para investir em ações ou emprestar dinheiro para uma empresa também são conhecidas como Custo de Capital Próprio (cost of equity ou Ke) e Custo da Dívida (cost of debt ou Kd), respectivamente. Tais custos serão utilizados na determinação da taxa de desconto do modelo de Fluxo de Caixa Descontado (DCF) adotado para a avaliação da firma, a qual será utilizada para calcular o valor presente da soma de todos os fluxos de caixa futuros, que podem ser livres para a firma (FCFF) ou para o acionista (FCFE). De maneira geral, o termo “taxa de desconto” se refere a qualquer taxa utilizada para encontrar o valor presente de um fluxo de caixa futuro.

Para uma empresa conseguir captar recursos, é necessário que sejam oferecidos os chamados prêmios de risco, que são retornos adicionais proporcionais ao risco de investimento na empresa.

O prêmio de risco do mercado acionário ou Equity Risk Premium (ERP) é o retorno adicional que os investidores exigem para se tornarem acionistas de empresas, dados todos os riscos relacionados ao mercado acionário. Em suma, o ERP é equivalente a diferença entre o retorno exigido por ações e uma específica taxa de retorno livre de risco.

De maneira similar, o prêmio pelo risco de crédito ou default risk será o principal determinante do retorno adicional exigido pelos credores da empresa, ou seja, quanto maior o risco de a firma não conseguir honrar as dívidas compromissadas e se tornar inadimplente, maior será o prêmio exigido para emprestar dinheiro a ela. As agências de classificação de risco de crédito, como Moody’s e Fitch, analisam as empresas com base no seu contexto operacional e financeiro, com o objetivo de determinar o seu risco de crédito. O prêmio de risco é atribuído de acordo com a classificação da empresa.

Custo de Capital Próprio (Ke)

Ao investir em uma empresa, o acionista exige uma rentabilidade sobre o capital aplicado na companhia. Esse retorno exigido é chamado de Custo de Capital Próprio (Ke) e pode ser estimado a partir de modelos já existentes ou novos modelos propostos pelo analista.

O Ke é a taxa de desconto utilizada para trazer os fluxos de caixa livres para o acionista (FCFE) ao valor presente, chegando ao valor do patrimônio líquido (equity value) da companhia. Esse modelo é uma das principais metodologias utilizadas para avaliar empresas.

O modelo clássico para estimar o Ke é o Capital Asset Pricing Model (CAPM), em função de ser uma aplicação prática, barata e amplamente utilizada na avaliação de empresas. A principal premissa desse modelo é de que os investidores avaliam o risco de um ativo em função da sua contribuição para o risco sistêmico, não diversificável, da sua carteira. Portanto, o coeficiente utilizado para quantificar o risco não diversificável de um ativo é o beta, que pode ser estimado a partir de uma regressão simples entre a série de variações percentuais no preço do ativo e na carteira de mercado. No Brasil, pode-se considerar o índice Bovespa (IBOV) como a carteira de mercado brasileira.

A equação utilizada no cálculo do CAPM é:

A taxa livre de risco é utilizada como a base de referência para estimar o retorno exigido de diferentes ativos. Assim, o retorno exigido para investir em uma empresa será igual à taxa livre de risco somada ao prêmio de risco da companhia. Segundo Damodaran (2002), um ativo será considerado livre de risco quando: (l) O retorno esperado é conhecido e igual ao retorno obtido (ll) Não houver risco de crédito (Default risk), ou seja, os únicos ativos que têm a chance de serem considerados sem risco são governamentais, pois há o controle de emissão de moeda. Apesar disso, não é seguro assumir que qualquer título público é 100% seguro, uma vez que cada país apresenta características e classificações de risco diferentes. (lll) O título não deve apresentar risco de reinvestimento, isto é, não deve haver pagamentos de juros ou amortizações ao longo do período em que o capital estiver investido. Esses títulos são chamados de Zero Coupon Bonds.

O retorno esperado do mercado (Km) é o retorno mínimo exigido por investidores para investir no mercado acionário. Ao subtrair o Km da taxa livre de risco, chega-se ao retorno adicional exigido para investir no mercado acionário ou Equity Risk Premium (ERP). Para Damodaran (2002), a abordagem padrão para estimar o ERP é a histórica, que consiste na subtração do retorno anual do mercado acionário pelo retorno anual de títulos livres de risco durante longos períodos. Assim, é possível estimar a média e mediana do ERP ao longo do tempo.

Apesar de bastante utilizado, muito se discute sobre o beta do modelo CAPM descrever o risco incompletamente, uma vez que considera apenas um fator de risco. Segundo estudos da CFA Institute, o coeficiente de determinação (R²) do beta de ações individuais varia de 2% a 40%, ou seja, explica menos de 40% do risco do ativo. Para solucionar isto, os modelos de múltiplos fatores foram criados, de forma que se tornou possível incluir outros fatores de risco no cálculo do Ke, como o risco de liquidez e de tamanho. Em 1993, os pesquisadores Eugene Fama e Kenneth French criaram o modelo de três fatores ou Fama-French Model, modelo amplamente conhecido e utilizado atualmente.

Custo da Dívida (Kd)

De maneira similar, o Custo da Dívida (Kd) representa o retorno exigido por credores para emprestar recursos a uma firma. O principal fator determinante do índice é o risco de crédito, ou seja, o risco de a companhia não conseguir honrar com seus compromissos.

Uma abordagem utilizada para estimar o Custo da Dívida é a partir da média ponderada das taxas de juros de todos os empréstimos e financiamentos atuais da empresa. Outra forma de estimar o custo da dívida, utilizada por Damodaran, é estimando adicionais de risco em função da classificação de risco de crédito da companhia e do país em que ela está inserida. Dessa forma, o custo da dívida da empresa será equivalente à taxa livre de risco somada ao risco-país e ao risco de crédito da empresa.

Os juros decorrentes da dívida da empresa são dedutíveis do imposto de renda, gerando, portanto, benefícios fiscais para a companhia. Esse benefício torna o custo efetivo da dívida mais baixo após a tributação.

Tendo em vista o benefício fiscal da dívida, diversos autores adotaram o uso do custo da dívida após impostos, a fim de considerar o custo efetivo das obrigações da companhia. Dessa forma, a equação do Kd após impostos é:

‌A taxa paga em impostos irá variar de acordo com o segmento da empresa e a regulação do país em que ela está inserida. No Brasil, grande parte das companhias pagam taxas efetivas de 34% (sendo 25% de IR e 9% de CSLL), porém é importante destacar que o efetivo pagamento de impostos pode variar no tempo, em função de diversos fatores, como compensações de prejuízos fiscais e atrasos no pagamento. Para Damodaran (2002), é possível utilizar taxas de impostos diferentes durante os anos projetados em um modelo de Fluxo de Caixa Descontado (DCF), desde que se tenham premissas para fundamentar tais variações e que na perpetuidade a taxa utilizada seja a efetiva do país, pois não se pode assumir que uma companhia conseguirá taxas mais atrativas para sempre.

Custo Médio Ponderado de Capital

A taxa de retorno exigida pelos fornecedores de capital da empresa é comumente chamada de custo de capital. Esse índice é estimado a partir do custo médio ponderado de capital (CMPC ou WACC), que considera a estrutura de capital da companhia, o custo de capital próprio (Ke) e o custo da dívida (Kd), conforme a equação:

O CMPC é a taxa de desconto utilizada para trazer a valor presente os fluxos de caixa livres para a firma (FCFF), chegando ao valor da companhia (EV). É possível calcular o valor do patrimônio líquido da empresa ao subtrair a dívida líquida do EV.

Conclusão

Como discorrido no texto, as taxas de desconto são de suma importância para o processo de avaliação de empresas por meio do método de Fluxo de Caixa Descontado. É importante compreender que não há uma única maneira de se estimar as taxas de desconto; são necessárias premissas que fundamentem os valores utilizados. Portanto, bons analistas conhecerão as características das taxas de desconto, da empresa avaliada e do mercado em que ela está inserida, a fim de elaborar boas premissas e taxas que reflitam a realidade do investimento.

Referências

DAMODARAN, A., (2002), “Investment Valuation – Tools and Techniques for Determining the Value of Any Asset”. 2nd edition.

Pinto, A. et al (2002), “Equity asset valuation”. 2nd edition. (CFA Institute investment series ; 27)

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Modelos de Valuation e suas Aplicações

Modelos de Valuation e suas Aplicações

Valuation é um processo de análise que busca determinar o valor justo de um ativo. Para que esse processo seja efetivo, dado que existem vários modelos para avaliar uma empresa, o analista deve compreender profundamente as metodologias e escolher aquela que mais se aplica ao caso que ele está analisando. Desse modo, este artigo busca discutir como funcionam e quando são aplicados alguns dos principais métodos utlizados no mercado, que são divididos em dois grupos: absoluto e relativo.

Os modelos de valor absoluto buscam o valor intrínseco do ativo analisado, determinando o valor presente ao descontar os fluxos de caixa futuros. Como esses fluxos são incertos, métodos de valor absoluto acabam sendo bastante complexos e exigem um alto grau de conhecimento, tanto da indústria quanto da empresa. Já os métodos de valor relativo comparam duas ou mais empresas e estabelecem relações entre os múltiplos observados e o preço de mercado. Em razão disso, esses modelos são mais simples, exigindo menos dados e previsões por parte do analista. Contudo, uma boa análise relativa exige experiência para entender a relevância e a origem dos dados obtidos.

Além disso, há alguns modelos que não se encaixam nessas duas categorias, como valuation por valor patrimonial e valuation por soma das partes. O primeiro método busca o valor justo do patrimônio líquido da empresa, ou seja, a soma dos ativos (circulantes e não circulantes) subtraída das dívidas e obrigações. O segundo avalia quanto cada divisão da empresa valeria caso fosse adquirida individualmente por outra companhia, de forma que o valor final seria o agregado de cada uma de suas partes.

A seguir, entraremos em detalhes sobre cada um desses métodos, buscando entender como e quando aplicá-los.

Valor Absoluto

A característica fundamental desses modelos é que o valor obtido é determinado exclusivamente por características do ativo analisado, uma vez que não são considerados os valores de outras empresas no setor. Nesse campo, encontra-se o valuation de valor presente por fluxo de caixa descontado (DCF), que é uma das ferramentas fundamentais ao analista de equity. A teoria por trás desse meio de análise é que o preço de um ativo para um investidor, no longo prazo, tem que estar relacionado com os retornos que esse investidor espera receber ao mantê-lo em sua carteira. Além disso, ao escolher este método, o analista deve estar preparado para estimar os fluxos de caixa, as taxas de crescimento e determinar uma taxa de desconto apropriada.

Uma das variáveis fundamentais para o DCF é a taxa de desconto, usada para trazer ao valor presente um fluxo de caixa futuro. Uma taxa de desconto reflete a compensação exigida pelos investidores, pois leva em consideração o valor do dinheiro no tempo. Essa taxa dependerá das características do investimento, uma vez que investidores exigirão um retorno maior para ativos de maior risco e vice-versa.

Ademais, em um modelo de fluxo de caixa descontado, é preciso decidir qual fluxo de caixa será escolhido para análise. Enre os mais utilizados, podemos citar:

  • Fluxo de Caixa Livre aos Acionistas (FCFE) – é o dinheiro disponível aos acionistas após o pagamento de todas as despesas de operação, juros e dívidas e todo o reinvestimento necessário tenha ocorrido. Desse modo, o FCFE é o fluxo de caixa das operações menos o reinvestimento (CAPEX) e o pagamento aos credores. Esse método é preferível quando a empresa possui uma estrutura de capital estável, já que mudanças na dívida da empresa impactarão o FCFE. Ademais, a vantagem desse modelo é que o somatório dos fluxos futuros, trazidos ao valor presente pelo custo do capital próprio (Ke), resulta diretamente no valor da companhia (EV), sem necessidade de ajustes:
  • Fluxo de Caixa Livre à Firma (FCFF) – é o montante disponível aos fornecedores de capital de uma companhia após todos os custos operacionais terem sido pagos e o reinvestimento tenha ocorrido. Esse método ajuda a avaliar empresas que possam estar com o FCFE negativo ou com estruturas de dívida mais instáveis, pois o FCFF não leva em conta o pagamento aos credores. Para determinar o valor da empresa, soma-se o FCFF, trazido ao valor presente pelo Custo Médio Ponderado de Capital (CMPC), e depois ajusta-se o valor obtido subtraindo a dívida líquida (DL), obtendo indiretamente o valor da companhia.
  • Dividendos – os modelos de desconto por dividendo (DDM) tomam como o fluxo de caixa os dividendos a serem pagos aos acionistas, de modo que o valor da empresa seria o valor presente líquido dos dividendos futuros. Entre os métodos mais famosos, temos o método de Gordon, que assume uma taxa de crescimento constante para os dividendos. A fórmula simplificada para o valor do papel da empresa é dada por:

  • Por ser necessário assumir um crescimento constante, o desconto por dividendo é melhor aplicado em companhias com longo tempo de mercado que distribuam boa parte de seus lucros aos acionistas. De maneira oposta, o modelo não fornece boas aproximações para empresas que não pagam dividendos ou empresas novas no mercado cujos dados históricos não permitam estabelecer um padrão de crescimento.

Observa-se que a aplicação do DCF exige do analista conhecimentos em contabilidade e modelagem financeira, necessários para escolher os diferentes modelos, as taxas de desconto e realizar as estimativas. Devido a essas características, os métodos de fluxo de caixa descontado necessitam de muitos dados, que nem sempre estarão disponíveis, principalmente quando tratamos de empresas não listadas na bolsa. A seguir, estudaremos um tipo de valuation mais simples, que pode ser aplicado à praticamente todas as empresas.

Valor Relativo

Os modelos relativos comparam o preço de ativos no mercado utilizando dados fundamentais da empresa, como lucro, dívida líquida ou valor patrimonial, que, quando divididos um pelo outro, passam a ser denominados múltiplos. Essa comparação é simples e os dados são de amplo acesso, o que torna um valuation de múltiplos fundamentalmente menos complexo que um fluxo de caixa descontado. Dessa forma, os múltiplos atuam como facilitadores na comunicação, resumindo em um único número relações entre o valor de mercado e outras variáveis relevantes.

Primeiramente, por comparar variáveis de empresas distintas, um modelo relativo é melhor aplicado quanto mais semelhantes forém as empresas analisadas, ou seja, buscam-se companhias com pouca diferença na operação, geralmente atuantes do mesmo setor. Isso ocorre, pois, múltiplos aparentemente altos para um setor consolidado em maturidade podem ser completamente aceitáveis em um setor novo com grande potencial de crescimento e risco envolvido.

Além disso, buscando aplicar o modelo, podemos analisar os múltiplos mais conhecidos, como o P/L (Preço sobre Lucro). Seu valor é calculado divindindo o preço do ativo por seu lucro por ação, expressando quantas vezes um investidor está pagando pelo lucro de uma empresa. Por exemplo, dada uma companhia A com P/L de 10x, o acionista estaria pagando dez vezes o lucro da empresa na compra. De maneira análoga, para comprar uma empresa B com P/L de 15x o acionista estaria pagando mais do que pagou por A para ter o mesmo lucro. Desse modo, assumindo que as empresas A e B atuam no mesmo setor e tem riscos de operação semelhantes, podemos afirmar que A está subvalorizada em relação a B ou que B está supervalorizada em relação a A. Ainda assim, vale ressaltar que existem muitos outros múltiplos relevantes além do P/L que podem expressar informações valiosas sobre o estado de uma empresa.

Embora essa análise possa parecer inicialmente trivial, em casos reais existem certos problemas na aplicação dos modelos de valor relativo que podem dificultar bastante a tarefa do analista. O primeiro problema deriva da seleção da empresa ou das empresas similares àquela que se busca avaliar. Essa escolha é fundamental e muitas vezes não é óbvia, já que a área de atuação da companhia pode ser única entre seus pares ou então seu setor pode ser muito abrangente. Outro fator a ser considerado é que, para certos múltiplos, não basta conhecer o valor numérico, de modo que o analista deve buscar a razão por trás desses números, o que pode envolver pesquisa aprofundada sobre o setor e a companhia. Por fim, mesmo uma análise relativa bem fundamentada apontando, por exemplo, uma empresa subvalorizada em relação aos seus pares, pode falhar. Isso ocorre porque todo o setor pode estar supervalorizado, de forma que, mesmo a companhia ganhando valor relativamente aos concorrentes, o retorno final da ação seja negativo dado o declínio do setor.

Valor Patrimonial e Lucro Econômico

Uma outra forma de avaliar ativos, que toma uma abordagem totalmente diferente das anteriores, é dada pelos modelos de valor patrimonial. Esses métodos buscam determinar o valor do negócio a partir da diferença entre os bens ativos e os passivos da organização, o que resulta no patrimônio líquido. Dessa forma, o valor patrimonial oferece aos analistas e stakeholders uma compreensão do valor contábil do negócio. Essa métrica tem sua utilidade na declaração exigida para o pagamento de obrigações ao governo em certos países, na análise de private equity e na venda de empresas, como uma referência na negociação ou valor de liquidação na falência.

Contudo, o valor contábil não fornece uma boa estimativa para o valor real do negocio, pois não leva em conta as estruturas construídas em volta desses ativos, ou seja, o intagível, que representa, entre outras coisas, a capacidade da empresa gerir o negócio. Desse modo, para utilizarmos o valor patrimonial em um valuation precisamos introduzir uma variável que represente a capacidade de geração de riquezas pelo intangível. Esse conceito é dado pelo lucro econômico.

Lucro econômico – ou em inglês, economic value added (EVA) – é o lucro líquido deduzido do custo de oportunidade dos acionistas da empresa, ou seja, é o montante restante após considerarmos o custo de todo o capital da empresa. Esse conceito é importante porque o lucro líquido considera apenas o pagamento dos credores, capital de dívida, enquanto o EVA mostrará se a empresa realmente está gerando valor aos seus investidores. Para melhor compreender o lucro econômico, considere o seguinte exemplo:

Uma companhia C com valor de mercado de R$10 milhões é financiada 50% por dívida e 50% por equity. Os juros da dívida são 8% e seu custo de capital próprio é 12% e ela paga impostos no valor de 25%. Considerando que no período a empresa teve um EBIT de R$1 milhão, seu lucro líquido será determinado da seguinte forma:

O lucro líquido no período foi positivo em R$450 mil, de modo que a empresa demonstra ser lucrativa contabilmente. Contudo, ao considerarmos o custo de capital dos acionistas, avaliado em R$600 mil (12% dos R$5 milhões em equity), observa-se que a empresa C na verdade não oferece o retorno exigido, ficando R$150 mil aquém do esperado no período. Logo, vemos que uma empresa deve ser capaz de cobrir todo o seu custo de capital e, para isso, não basta que ela seja lucrativa de maneira contábil.

Agora que compreendemos o valor patrimonial e o lucro econômico, podemos utilizar esses conceitos para avaliar uma empresa. O preço justo de uma ação baseado nos conceitos anteriores é o seu patrimônio líquido mais a sua capacidade de gerar riqueza ao longo do tempo, ou seja, é o valor patrimonial mais o somatório dos lucros econômicos, trazidos ao valor presente, divididos pelo número de ações.

Contudo, estabelecer alguns desses valores não é uma tarefa simples. A maior dificuldade em um valuation de valor patrimonial e lucro econômico é determinar o o patrimônio líquido da empresa. Embora os reports anuais ou trimestrais já tragam esses dados, em muitos casos, ativos podem estar supervalorizados, o que exige ajustes pontuais que variam de caso a caso para tentar chegar no valor justo. Desse modo, o método demanda grande conhecimento contábil por parte do analista e estudos profundos do formulário de referência da companhia analisada.

Valor por Soma das Partes

O modelo de valuation por soma das partes é o processo de avaliação de uma empresa quando a dividimos entre suas áreas de atuação e determinamos quanto cada uma dessas partes valeria caso fosse tratada como um negócio independente. Consequentemente, o valor final da empresa seria a soma dessas subdivisões.

A partir desse conceito, uma companhia consegue entender de onde deriva seu valor, ou seja, quais os setores que mais contribuem para a geração de riquezas na empresa. Além disso, a avaliação de partes de uma empresa é muito utilizada também em fusões e aquisições, quando tratamos de uma aquisição parcial de um negócio.

Para determinar o preço de cada uma dessas partes, o analista pode utilizar qualquer um dos métodos citados anteriormente. Por fim, é valido ressaltar que modelos de soma das partes são relevantes quando tratamos de empresas que atuam em setores, ou partes de um setor, muito distintas, sendo que essa atuação deve representar parte considerável da receita do negócio.

Conclusão

Durante a análise dos modelos, percebemos que cada um pode ser aplicado de maneira mais efetiva dependendo do caso de estudo. Além disso, para estabelecer aproximações, estimativas e comparações sensatas, o analista deve, independentemente do modelo escolhido, estudar a fundo as características do negócio. A partir disso, entendemos que a compreensão dos modelos é de fundamental importância para o ferramental de um analista de equity.

 REFERÊNCIAS 

1. Equity Asset Valuation, CFA Institute
2. Valuation Models, Aswath Damodaran
3. Suno Research
4. Investopedia
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O Que os Múltiplos Podem nos Dizer?

O Que os Múltiplos Podem nos Dizer?

O QUE É UM MÚLTIPLO?

Um múltiplo é a relação entre variáveis retiradas das informações financeiras de uma empresa. A finalidade dessa relação é identificar oportunidades de investimento. Porém, os múltiplos isolados não tem muito a dizer, por isso devem ser utilizados como um complemento da análise do investidor ou ser comparado com múltiplos de empresas do mesmo setor. Em momentos de recessão, os múltiplos sofrem distorções devido aos impactos circunstanciais, por isso é necessário ficar atento. Para entender melhor a análise através de múltiplos, será exemplificado os quatro principais múltiplos de mercado e suas utilidades a seguir.

PREÇO/LUCRO POR AÇÃO (P/L)

Um dos múltiplos mais comuns é o P/L, onde P é o preço da ação da empresa a ser analisada e L é o lucro por ação, que pode ser obtido através da divisão dos lucros obtidos pela empresa nos últimos 12 meses pela quantidade de ações. O índice P/L nos diz em quanto tempo a empresa irá gerar os lucros necessários para recuperar o capital usado na aquisição da ação. Em teoria, quanto menor o P/L, mais atrativo o investimento, mas depende do quanto o investidor está disposto a pagar pelos lucros. Empresas que possuem baixo índice tendem a estar desvalorizadas.

PREÇO/ VALOR PATRIMONIAL POR AÇÃO (P/VPA)

Outro múltiplo bastante conhecido é o P/VPA. Como explicado anteriormente, P representa o preço da ação da empresa no mercado. VPA é o valor patrimonial por ação, que é calculado dividindo o Patrimônio Líquido (PL) da empresa pela quantidade de ações disponíveis no mercado. O índice indica a quantidade de vezes em que o preço da ação está sendo negociado frente ao valor patrimonial da empresa, ou seja, para cada R$1,00 de patrimônio líquido, quanto o investidor possui de valor de mercado. Espera-se que o índice esteja acima de 1, indicando que o valor de mercado da empresa é superior ao seu valor contábil.

VALOR DA EMPRESA/EBITDA (EV/EBITDA)

Do inglês Enterprise Value, EV representa o quanto custa para comprar todos os ativos de uma empresa descontado o caixa. É calculado da seguinte forma: o valor de mercado é somado à dívida líquida da empresa. Para obter o valor de mercado, multiplica-se a quantidade de ações emitidas pela empresa com a cotação da ação. O EBITDA (Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization) é a sigla inglesa correspondente à sigla LAJIDA no português, que são os Lucros Antes dos Juros, Impostos, Depreciação e Amortização. O EBITDA é o indicador que nos mostra o potencial de geração de caixa de uma companhia. O índice EV/EBITDA é responsável por indicar quantos anos levaria para chegar ao valor da empresa através de sua geração de caixa operacional. É muito utilizado para comparar empresas nacionais e internacionais, porém pode falhar em algumas situações, como em momentos onde a empresa está muito alavancada financeiramente e pagando muitos juros.

DÍVIDA LÍQUIDA/EBITDA (DL/EBITDA)

O múltiplo DL/EBITDA tem como objetivo nos mostrar em quanto tempo (anos) uma empresa consegue pagar suas dívidas frente a sua geração de caixa. A dívida líquida (DL) é a dívida bruta menos as disponibilidades. O EBITDA, como já explicado anteriormente, indica o potencial de geração de caixa de uma companhia. Ao analisar a relação DL/EBITDA, o que se busca é saber até que ponto a empresa pode cobrir suas dívidas. Se a empresa possuir mais dinheiro do que dívida, podemos obter como resultado uma relação negativa. Vale ressaltar a importância de entender como as dívidas da empresa analisada são formadas, pois pode haver uma cobrança elevada de juros ou até mesmo serem expostas a outra moeda, afetando o índice.

APLICANDO OS MÚLTIPLOS

No exemplo a seguir, vamos utilizar o setor de locação de veículos para demonstrar como funcionam os múltiplos na prática de forma simplificada. A empresa de referência será a Localiza Hertz (RENT3).

Fonte: Investsite e Planner. Elaboração própria

Analisando a tabela, podemos comparar a situação financeira das empresas através do múltiplo DL/EBITDA. Nesse caso, ele está nos indicando que a Localiza está muito bem frente a concorrência e a média do setor, tornando-a uma ação mais atrativa em relação ao nível de endividamento. Quanto ao múltiplo P/VPA, o valor de mercado da Localiza está 4,7x acima de seu valor contábil, acima da média do setor e do valor de mercado dos concorrentes. O múltiplo EV/EBITDA nos mostra que a Localiza demoraria 15,7 anos para retornar o investimento da própria empresa se mantiver a mesma produção operacional (EBITDA). Apesar de estar acima das concorrentes e da média, pode nos indicar que o mercado está otimista em relação à empresa, pois as dívidas diminuíram e/ou o caixa aumentou, aumentando, assim, o Enterprise Value e a relação com o EBITDA. Por fim, o múltiplo P/L. A Localiza possui o P/L mais alto do setor e alguns investidores interpretam que isso significa que a ação está muito cara, porém após o conjunto de múltiplos analisados podemos concluir que o P/L alto da Localiza indica que o mercado tem grandes expectativas sobre a ação, pressionando o seu preço para cima.

CONCLUSÃO

Apesar de haver limitações, a avaliação por múltiplos continua sendo uma poderosa ferramenta de análise. Existem diversos múltiplos além dos demonstrados no texto que podem ser explorados e utilizados pelos investidores. Assim, podemos concluir que os múltiplos, apesar de serem uma abordagem simples e fácil, são um complemento importante na análise de ações e, com alguns cuidados, podem ser muito úteis para encontrar boas oportunidades de investimento.

 REFERÊNCIAS 

1. http://www.investsite.com.br/principais_indicadores
2. http://xvifinance.com.br/avaliacao-por-multiplos/
3. https://www.sunoresearch.com.br/artigos/multiplos-de-mercado/
4. https://www.btgpactualdigital.com/blog/coluna-andre-bona/acoes-conhecendo-os-principais-multiplos-fundamentalistas
5. https://www.sunoresearch.com.br/artigos/evebitda/
6. https://andrebona.com.br/buggpedia-o-que-e-a-divida-liquida-ebitda/
7. https://www.investopedia.com/terms/m/multiplesapproach.asp
Posted by Caroline Zago in Equity Research, 0 comments